Dionísio Azevedo e Flora Geni Dionísio e Flora: Uma Vida na Arte Dionísio Azevedo e Flora Geni Dionísio e Flora: Uma Vida na Arte Dionísio Jacob Imprensa oficial São Paulo, 2010 GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO Governador Alberto Goldman Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Diretor-presidente Hubert Alquéres Coleção Aplauso Coordenador Geral Rubens Ewald Filho No Passado Está a História do Futuro A Imprensa Oficial muito tem contribuído com a sociedade no papel que lhe cabe: a democratização de conhecimento por meio da leitura. A Coleção Aplauso, lançada em 2004, é um exemplo bem-sucedido desse intento. Os temas nela abordados, como biografias de atores, diretores e dramaturgos, são garantia de que um fragmento da memória cultural do país será preservado. Por meio de conversas informais com jornalistas, a história dos artistas é transcrita em primeira pessoa, o que confere grande fluidez ao texto, conquistando mais e mais leitores. Assim, muitas dessas figuras que tiveram importância fundamental para as artes cênicas brasileiras têm sido resgatadas do esquecimento. Mesmo o nome daqueles que já partiram são frequentemente evocados pela voz de seus companheiros de palco ou de seus biógrafos. Ou seja, nessas histórias que se cruzam, verdadeiros mitos são redescobertos e imortalizados. E não só o público tem reconhecido a importância e a qualidade da Aplauso. Em 2008, a Coleção foi laureada com o mais importante prêmio da área editorial do Brasil: o Jabuti. Concedido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), a edição especial sobre Raul Cortez ganhou na categoria biografia. Mas o que começou modestamente tomou vulto e novos temas passaram a integrar a Coleção ao longo desses anos. Hoje, a Aplauso inclui inúmeros outros temas correlatos como a história das pioneiras TVs brasileiras, companhias de dança, roteiros de filmes, peças de teatro e uma parte dedicada à música, com biografias de compositores, cantores, maestros, etc. Para o final deste ano de 2010, está previsto o lançamento de 80 títulos, que se juntarão aos 220 já lançados até aqui. Destes, a maioria foi disponibilizada em acervo digital que pode ser acessado pela internet gratuitamente. Sem dúvida, essa ação constitui grande passo para difusão da nossa cultura entre estudantes, pesquisadores e leitores simplesmente interessados nas histórias. Com tudo isso, a Coleção Aplauso passa a fazer parte ela própria de uma história na qual personagens ficcionais se misturam à daqueles que os criaram, e que por sua vez compõe algumas páginas de outra muito maior: a história do Brasil. Boa leitura. Alberto Goldman Governador do Estado de São Paulo Coleção Aplauso O que lembro, tenho. Guimarães Rosa A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa Oficial, visa resgatar a memória da cultura nacional, biografando atores, atrizes e diretores que compõem a cena brasileira nas áreas de cinema, teatro e televisão. Foram selecionados escritores com largo currículo em jornalismo culturalparaesse trabalho em que a história cênica e audiovisual brasileiras vem sendo reconstituída de maneira singular. Em entrevistas e encontros sucessivos estreita-se o contato entre biógrafos e biografados. Arquivos de documentos e imagens são pesquisados, e o universo que se reconstitui a partir do cotidiano e do fazer dessas personalidades permite reconstruir sua trajetória. A decisão sobre o depoimento de cada um na primeira pessoa mantém o aspecto de tradição oral dos relatos, tornando o texto coloquial, como se o biografado falasse diretamente ao leitor. Um aspecto importante da Coleção é que os resultados obtidos ultrapassam simples registros biográficos, revelando ao leitor facetas que também caracterizam o artista e seu ofício. Biógrafo e biografado se colocaram em reflexões que se estenderam sobre a formação intelectual e ideológica do artista, contextualizada na história brasileira. São inúmeros os artistas a apontar o importante papel que tiveram os livros e a leitura em sua vida, deixando transparecer a firmeza do pensamento crítico ou denunciando preconceitos seculares que atrasaram e continuam atrasando nosso país. Muitos mostraram a importância para a sua formação terem atuado tanto no teatro quanto no cinema e na televisão, adquirindo, linguagens diferenciadas – analisando-as com suas particularidades. Muitos títulos exploram o universo íntimo e psicológico do artista, revelando as circunstâncias que o conduziram à arte, como se abrigasse em si mesmo desde sempre, a complexidade dos personagens. São livros que, além de atrair o grande público, interessarão igualmente aos estudiosos das artes cênicas, pois na Coleção Aplauso foi discutido o processo de criação que concerne ao teatro, ao cinema e à televisão. Foram abordadas a construção dos personagens, a análise, a história, a importância e a atualidade de alguns deles. Também foram examinados o relacionamento dos artistas com seus pares e diretores, os processos e as possibilidades de correção de erros no exercício do teatro e do cinema, a diferença entre esses veículos e a expressão de suas linguagens. Se algum fator específico conduziu ao sucesso da Coleção Aplauso – e merece ser destacado –, é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o percurso cultural de seu país. À Imprensa Oficial e sua equipe coube reunir um bom time de jornalistas, organizar com eficácia a pesquisa documental e iconográfica e contar com a disposição e o empenho dos artistas, diretores, dramaturgos e roteiristas. Com a Coleção em curso, configurada e com identidade consolidada, constatamos que os sortilégios que envolvem palco, cenas, coxias, sets de filmagem, textos, imagens e palavras conjugados, e todos esses seres especiais – que neste universo transitam, transmutam e vivem – também nos tomaram e sensibilizaram. É esse material cultural e de reflexão que pode ser agora compartilhado com os leitores de todo o Brasil. Hubert Alquéres Diretor-presidente Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Tudo tem a sua hora e a sua vez… A Hora e a Vez de Augusto Matraga, de João Guimarães Rosa Crônicas do Sumaré Para Noel Capítulo I Memórias em um Tempo Veloz Esta seção que abre o livro, intitulada Crônicas do Sumaré, foi escrita já há certo tempo. Nela, eu narro a vida de meus pais, Dionísio Azevedo e Flora Geni, artistas que trabalharam no rádio, no cinema, no teatro e na televisão, onde foram pioneiros juntamente com uma geração de outros brilhantes atores e atrizes. Entretanto, quando foi idealizado, o livro não possuía a intenção de ser uma biografia escrita na terceira pessoa como faria algum estudioso do tema falando numa linguagem acadêmica ou mesmo jornalística. Mesmo porque, como foi dito acima, estou falando de pai e mãe e é difícil fazer isso de modo formal. Como o próprio título diz, esse texto tinha, e continua tendo, a intenção mais íntima de ser uma crônica familiar, de narrar desde um ponto de vista mais privado, por assim dizer, a trajetória deles. Mas havia inicialmente outras intenções além dessa. Era também a crônica urbana de um bairro que foi emblemático para a classe artística da cidade, por ter sido o lugar aonde se iniciou a história da televisão – bairro que sofreu como todos os outros os reflexos da nossa urbanização desenfreada e tem uma vida ele mesmo que está ligada intimamente à vida da minha família. E pegando carona neste aspecto, o texto original possuía a terceira intenção de falar para um público mais jovem e até futuro, que nada conhece daquele período, contando como se-ria uma infância nos anos 1950-1960, uma era, portanto, pré-histórica do ponto de vista da informática. Afinal, desde a inauguração da TV Tupi em 1950 transcorreram 60 anos, em que o impacto de uma tecnologia poderosa como a televisão foi acompanhado por uma sucessão vertiginosa de outros impactos, incluindo esta onda informatizada. Para a presente edição, no entanto, resolvi enxugar este aspecto mais amplo do projeto inicial e focar naqueles estritamente biográficos de meus pais e de nossa família, que é o objetivo final deste livro e desta coleção. Mas alguma coisa restou do antigo tratamento, pois o texto como um todo se tornaria sem sentido na falta de algumas daquelas passagens. E depois a crônica familiar e a vida profissional dos dois se completam, pois foram igualmente importantes para eles e uma alimentou e se refletiu na outra. Desculpo-me de antemão se permaneceu também um tom mais afetivo que todo passado ine vitavelmente evoca. Um tom que eu usei diversas vezes para contar para minha filha sobre seus avôs, que ela mal chegou a conhecer. Mas para que o livro ficasse mais completo, foram acrescentadas outras seções além desta crônica familiar. Há uma segunda parte com alguns depoimentos de colegas de profissão, amigos de longa data, artistas, enfim, cujos nomes – como se verá – dispensam apresentação e que celebram a memória deixada pelo Dionísio e pela Flora. Uma terceira seção traz uma biografia resumida ao estilo linha do tempo, acrescida da lista dos principais trabalhos realizados nas diversas áreas, a mais pormenorizada que me foi possível, com fichas técnicas, comentários quando necessários, e isso tanto de meu pai, quanto de minha mãe. Creio que esta parte dará uma ideia mais aproximada do grande esforço de uma vida dedicada à arte e da sensibilidade que eles depositaram de modo apaixonado no trabalho que escolheram. Foi um legado extenso que abrangeu mais de quatro décadas. Há também uma seção que, por falta de nome melhor, foi chamada Anexo, aonde poderão ser encontrados textos complementares, depoimentos dos dois, reproduções diversas e algumas curiosidades que servem para dar uma visão mais completa da vida e do trabalho deles. Por fim, procurei disponibilizar as fotografias do arquivo pessoal deixado por meus pais, tanto as fotos mais familiares que servem de apoio ao texto, como aquelas do começo da televisão que podem possuir algum valor documental para pesquisadores do tema e demais interessados. Vamos, portanto, ao Sumaré… Capítulo II Por Que o Sumaré? O bairro do Sumaré – nome de uma espécie de orquídea – situado na zona oeste de São Paulo e próximo da Pompeia, de Perdizes e de Pinheiros, foi durante muito tempo conhecido como um bairro de artistas. A razão disso é que lá no alto da sua principal avenida, a Alfonso Bovero, foram erguidos os estúdios da primeira televisão brasileira: a TV Tupi. E, antes da televisão, ali já era a sede da Rádio Tupi-Difusora, popular nos anos 1940. Por essa razão, muitos artistas passaram a procurar casas para alugar nas imediações daqueles estúdios famosos de rádio e televisão. Foi o que se deu com meus pais, que eram radioatores e depois, como todos, migraram para o novo veículo que então despontava e que se tornou tão influente na nossa vida diária. Característica física marcante do bairro são as vertiginosas ladeiras. Quem tem de andar a pé por elas precisa de bom preparo físico. Para quem não conhece, o Sumaré principia bem lá no alto, no fim da Avenida Doutor Arnaldo que o liga num plano reto até o espigão da Avenida Paulista. Por tanto, o ponto mais alto da cidade. A partir desta altura a Avenida Alfonso Bovero vai descendo e serpenteando na direção da Pompeia, criando de cada lado as mencionadas ladeiras. O ponto mais baixo do bairro fica na Avenida Sumaré que faz divisa com o bairro de Perdizes. Naquele tempo em que os artistas passaram o morar por ali, o bairro, embora fosse bem mais pacato do que hoje, já tinha suas principais ruas asfaltadas, com sistema de iluminação, água, esgoto, etc. Era um local bem urbanizado, mas sem os prédios que a partir dos anos 1970 passaram a tomar conta da paisagem de todos os bairros da cidade. Nós morávamos na Rua Bruxelas, uma rua de dois quarteirões apenas. O quarteirão de cima é uma ladeira inclinada que leva até o topo do bairro e de onde se descortina uma ampla vista cujo limite é o Pico do Jaraguá, hoje infelizmente obstruída por alguns inevitáveis prédios. Na parte baixa da rua existiam vários sobradinhos geminados, que estão lá até hoje, e onde morávamos nós e também outras famílias de artistas, atores, atrizes, escritores e diretores. Toda quarta-feira uma feira livre tomava conta da Bruxelas de alto a baixo. E naquele tempo era possível encontrar, fazendo a feira tranqui lamente com os demais moradores, artistas que um dia antes tinham aparecido na tela, ao vivo, interpretando algum personagem bem dramático. Lá estava uma Lady MacBeth comprando peixe ou uma Sherazade carregando uma sacola de frutas. Eram tempos mais bucólicos neste sentido: seria impensável algo assim nos dias de hoje. Todos aqueles artistas já eram famosos, mas a mídia não possuía ainda a força que passou a ter em décadas mais recentes. Era possível ir ao trabalho a pé, pois a maioria das casas ficava a uns dois quarteirões do estúdio. Uma das sensações mais antigas que me vêm à memória foi a estranheza de presenciar minha mãe saindo de casa depois de se despedir de mim e, algum tempo depois, aparecer naquele aparelho no meio da sala, com outras roupas e com uma personalidade que nem de longe parecia a minha mãe de todos os dias. Capítulo III A Era do Rádio Mas antes da televisão havia o rádio, é claro. E, pensando bem, que tecnologia impactante já era aquilo: alguém falava em algum lugar e sua voz ia flutuando entre as ondas, pelo ar, de transmissor em transmissor, até atingir localidades distantes. Recordo de meu pai e meus tios, reunidos em volta de um rádio, em 1958, ouvindo um jogo da Copa do Mundo em que o Brasil foi campeão pela primeira vez. Eu tinha 6 anos e não me interessava ainda por futebol, como vim a gostar mais tarde. O que mais me marcou na cena, além de seriedade absoluta que tomava conta das expressões daqueles homens em geral tão risonhos, foi a voz espectral fluindo do rádio, cheia de chiados, de falhas, de gorgolejos sinistros, com alguma coisa ectoplasmática, como se estivesse chegando não de outro continente, mas do próprio além. É difícil explicar para quem nasceu na era da televisão a força que o rádio teve como grande fenômeno de massas dos anos 1930 e 1940 do século passado. Eu mesmo só vim a saber disso por histórias que meus pais me contavam. Na época em que eu dava aula de artes, nos anos 1980, fiz um trabalho sobre o rádio com várias classes na escola em que trabalhava. Cheguei mesmo a convidar meu pai para falar e explicar como, guardadas algumas proporções, o rádio era algo como a televisão é hoje, e como seus artistas alcançaram imensa popularidade. Meu pai, que participou intensamente da era do rádio, contou para aqueles alunos que já tinham até microcomputadores em casa (mas ainda não internet), como as novelas radiofônicas eram acompanhadas por um público fiel, que seguia cada capítulo com os ouvidos encostados nos seus aparelhos. Entre estes havia desde os mais modestos até uns grandes de madeira, artigo de luxo para ser exposto no lugar mais nobre da sala – lugar que foi usurpado anos mais tarde pelos televisores. Ele começou a trabalhar como radioator no início dos anos 1940 e foi por causa deste veículo que alterou seu nome de batismo, passando a usar um nome artístico. Aliás, esta era uma prática muito comum. Era a busca do que se chamava audiogenia. Assim como uma pessoa para sair bem na foto precisa ser fotogênica, os nomes dos artistas necessitavam ser audiogênicos, isto é, sonoros, expressivos, o tipo de nome que você ouve e não esquece mais. O nome real de meu pai era Taufik Jacob, herdado da família árabe. Aí ele inventou o Dionísio Azevedo, por causa do patrono mitológico do teatro e do escritor Aluísio de Azevedo, de quem ele era admirador. Com esse nome ele se tornou um radioator de grande prestígio. Alguns anos mais tarde o mesmo ocorreu com minha mãe que trocou seu nome de batismo espanhol Eugênia Tortejada, por Flora Geni. E assim fizeram tantos outros artistas que acabaram por tornar este nome de fantasia a sua persona artística, como Lima Duarte e Fernanda Montenegro. As famílias se reuniam para ouvir o rádio e a grade de programação era variada. Além das novelas havia música, noticiário, programas humorísticos, tudo entremeado pelos inevitáveis comerciais de produtos diversos, como o coro que cantava com vozes angelicais: As flores desabrocham com a luz do sol… e a beleza das mulheres com Creme Rugol. As novelas exigiam grande expressividade vocal por parte dos atores. Minha mãe, mesmo depois de não mais participar do rádio, costumava dizer que aquele trabalho foi decisivo para a sua formação artística, pois era necessário passar apenas com a entonação da voz, sem o auxílio da expressão facial, toda uma carga de emoções variadas, além de adquirir uma pronúncia clara. Alguns capítulos eram feitos ao vivo. Quer dizer, eles eram transmitidos de um teatro na Rádio Tupi, por exemplo, com os atores numa espécie de palco. A transmissão era acompanhada por uma plateia que afluía até os estúdios do Sumaré para ver de perto seus ídolos radiofônicos – cujas vozes ouviam todos os dias em casa. Como o que contava era a qualidade da voz, muitas vezes os maiores galãs não eram exatamente os mais bonitos, apenas possuíam um timbre vocal expressivo. Coisa que, não raro, provocava um murmúrio de decepção na audiência feminina. Mas já havia desde aquele tempo uma diferenciação entre a radionovela e o radioteatro, aquela mais lacrimosa, com apelo popular e o segundo, com maior compromisso artístico, procurando explorar as possibilidades estéticas do veículo. Foram feitas grandes experiências de adaptações de clássicos da literatura e até de roteiros originais. Meu pai, além de atuar como radioator, também adaptou, escreveu roteiros originais, além de dirigir muitas dessas peças radiofônicas. E viveu intensamente aquela época de descobertas, da juventude, tornando-se uma voz marcante entre os radioatores e personagem conhecido da boemia paulistana. Por conta dessa vida intensa, o esquecimento dele e os atrasos eram lendários. O Oduvaldo Viana, um dos grandes homens do rádio paulista tinha um grande carinho por ele, de um modo paternal mesmo. Talvez por isso vivesse lhe dando broncas, às vezes de modo bem intempestivo, em geral por causa desses atrasos que vinham sempre com as mais melodramáticas desculpas. Certo dia, ele chegou para um ensaio de radioteatro com horas de atraso, e encontrou o Oduvaldo furioso, lançando mortíferos olhares em sua direção. Mas antes que o diretor abrisse a boca, meu pai olhou com perplexidade um relógio de pulso recém-adquirido, e como se aquele objeto fosse – ele sim –, a razão do atraso, tirou-o do pulso num gesto enfático e atirou-o ao chão pisoteando-o impiedosamente, na mais melodramática desculpa, própria, aliás, de um radioator. De resto, ele foi um apaixonado pela profissão e viveu aqueles anos em sua plenitude, como deixa entrever um retrato que Otávio Gabus Mendes pintou dele – anexado à terceira parte deste livro. Enfim, há uma magia qualquer no rádio, e no seu poder de evocação sonora. Meus pais se conheceram no final desta época de ouro da radiofonia. Minha mãe, antes de ser atriz, ensaiou uma carreira como cantora, chegando a gravar um disco, um daqueles antepassados do long-play, os pesados discos de 45 rotações. E quando a televisão iniciou sua caminhada os dois passaram a integrar o elenco de atores e atrizes da TV Tupi. Foi aí que resolveram casar e alugar uma casinha no bairro em que trabalhavam e que empresta seu nome ao título a essas crônicas. Mas as novelas de rádio não perderam seu público tão logo a televisão começou, mesmo porque as xarás televisivas iriam ainda demorar mais de uma década para decolar. Havia um público fiel que, mesmo com o advento da televisão, continuava ouvindo diariamente as novelas radiofônicas. Lembro de uma vizinha nossa, a dona Nina, que trabalhava como costureira. Era fã das novelas de rádio. Eu e meu irmão éramos colegas de seu filho, o Julinho, e íamos sempre brincar na sua casa. Enquanto fazia suas costuras, a pequena mulher deixava o rádio ligado e, sem perder a concentração no trabalho, entretinha-se com as tramas das novelas. Até hoje me recordo do tom daquelas vozes e da sonoplastia repleta de acordes instrumentais que carregavam de dramaticidade o ar de uma tarde comum, acompanhados por portas batendo violentamente, passos fugitivos e tempestades eventuais. Acordes que se perderam no tempo, substituídos por outros sons e outros tons. Capítulo IV A Televisão E veio a televisão. Parecia o futuro desaguando no presente: quem poderia imaginar aquilo? Imagens sendo transmitidas juntamente com os sons! Os rostos agora devidamente conectados com suas vozes entravam na intimidade dos lares trazendo notícias e emoções, música e drama. Nasci em 1951, um ano mais ou menos depois da primeira transmissão. De modo que pertenço à primeira geração que cresceu com aquele aparelho retangular intrometido no meio da sala de uma vez para sempre. Meu irmão Noel nasceu três anos depois, em 1954. E nossa infância já foi povoada por aquele entretenimento que o rádio estava impossibilitado de oferecer: o desenho animado. Está certo que, no início, muitos deles não eram nem dublados, vinham em inglês mesmo. Um resíduo da memória vem à tona de repente: uma cena de um desenho daqueles tempos iniciais onde os personagens entravam numa pirâmide e diziam: Is anybody here? Vários sarcófagos se abriam ao mesmo tempo e as múmias gritavam: No! E fechavam os sarcófagos com estrondo. Mas havia uma programação infantojuvenil que fazia muito sucesso. Além dos indefectíveis programas que apresentavam os desenhos, com nomes onomatopeicos do tipo Zás-Trás, ou Pim-Pam-Pum; havia já uma teledramaturgia para crianças. Além do emblemático Sítio do Picapau Amarelo, adaptado pela Tatiana Belinky e apresentado por seu marido Júlio Gouveia, havia outros menos culturais, como O Falcão Negro, com José Parisi, ou O Capitão Estrela, com Henrique Martins, no qual meu pai fazia um cientista de um século futurista, sempre às voltas com tubos de ensaios dos quais emanavam volutas de fumaça feitas de gelo seco. Um dia ele trouxe gelo seco para casa e eu e meu irmão ficamos brincando com aquela fumarada toda saindo dos copos da cozinha. A TV Record, que era o Canal 7, rivalizava com o Capitão 7 e com a Turma dos 7, uma turminha simpática de crianças entre as quais havia um menino que repetia o bordão michou o carbureto, quando alguma coisa dava errada e que se tornou uma mania na época. E também a grade de programação era bem mais limitada, principalmente perto das TVs a cabo, com seus Cartoons Networks. Não havia essa coisa de programa o dia todo. Muitas vezes, nos fins de semana eu e meu irmão acordávamos cedo e íamos ligar a TV. Mas tudo o que víamos era um gráfico estranho, com figuras geométricas, círculos concêntricos no meio dos quais dominava a imagem de um índio: uma figura parada, sem o menor movimento. O que era bom, pois saíamos para brincar na rua. Era um tempo em que a porta da rua vivia mais aberta, sem tantas grades ou receio tomando conta da cidade. Outra característica dos anos iniciais da nova mídia foi o surgimento do que se convencionou chamar de televizinhos. Como toda novidade, nem todos tinham aparelhos em casa, fosse por que não podiam comprar ou por alguma outra desconfiança. Então era muito natural que os vizinhos que tinham televisão recebessem em suas salas pessoas da região para assistir ao Repórter Esso (o Jornal Nacional da época), ou algum teledrama. De resto, o mesmo acontecia com o telefone. Mas para a nossa família, e outras do bairro, a televisão era mais do que apenas um novo meio de comunicação. Era de onde provinha o nosso sustento. Os artistas não ganhavam muito naquele tempo. Pelo menos nossa vida familiar sempre teve suas contas na ponta do lápis: o aluguel da casa, as compras do mês, as feiras, tudo ali contadinho, com algumas dívidas sendo esticadas. Mas foi graças ao trabalho na TV que tocávamos a nossa vida para frente. Contudo, para os meus pais, a televisão significava algo maior ainda do que o simples sustento. Era a realização de um sonho nascido na infância: o desejo de se tornarem artistas. Capítulo V Meu Pai Para meu pai este sonho de ser artista se referia inicialmente ao cinema. Desde garoto, crescendo no sul de Minas, ele costumava frequentar as matinês, que é como se chamavam as sessões diurnas e dominicais nos cinemas. Lá assistia aos antigos faroestes, talvez o gênero de maior sucesso até meados do século passado, com seus caubóis, xerifes, vilões, heroínas, índios e mexicanos. Algumas dessas películas eram projetadas na forma de capítulos de um seriado, e jogavam sempre um suspense para o próximo domingo. A atração desses filmes, segundo ele mesmo sempre dizia foi irresistível, e não somente pela adrenalina do momento, pela diversão. Eles fizeram nascer um desejo forte de um dia poder fazer cinema também, de participar de alguma forma daquela fantasmagoria fascinante que via chegar até as telas com suas imagens dançando na luz do projetor: pura magia visual. Sua fascinação pela arte de representar foi tão urgente que ele pensou mesmo em fugir certa vez com um circo que havia passado pela cidade. Acabou sendo detido a tempo, enquanto perambulava pela pequena estação de trem, indeciso quanto ao seu ato de coragem. Seu nome de batismo, como foi dito, era Taufik. Ele nasceu em 1922, passando a infância entre as cidades de Conceição Aparecida, também conhecida como Barro Preto e Muzambinho. Era filho de Rada e Isaac Jacob, dois frutos da onda de imigração que tinha trazido homens e mulheres de países longínquos do Oriente para tentar uma melhor sorte em terras norte e sul-americanas. Meu avô Isaac tinha um ritual, quando eu e meu irmão éramos crianças. Ele vinha nos visitar no Sumaré, sempre trazendo um cacho de bananas embrulhadas em jornal, simplesmente para não chegar de mãos vazias. Então pedia que nós trouxéssemos o Atlas escolar e nos mostrava o trajeto que fez para chegar ao Brasil, traçando o mesmo com o dedo indicador sobre o mapa: Líbano, porto de Marselha, o oceano Atlântico… Uma verdadeira aventura num mundo em que as distâncias eram maiores do que hoje. Como era habitual entre os imigrantes árabes, meu avô foi mascate durante um tempo. Mascates, como se sabe ou para quem porventura não saiba, eram comerciantes que iam vender suas mercadorias pelo sertão, atravessando quilômetros e quilômetros de terra, para chegar até fazendas distantes onde as pessoas tinham dificuldade de adquirir certos produtos. Eles fa ziam essas viagens em cavalos, levando burros de carga ou carroças e mesmo automóveis quando estes se tornaram mais habituais. Vendiam desde utensílios domésticos até roupas e cosméticos. Chegavam até as fazendas e povoados carregados de todo tipo de tranqueiras úteis e eram assediados pelas pessoas, afoitas por novidades. Não era uma vida fácil, ainda mais por que eles tiveram muitos filhos, dos quais meu pai foi o primogênito. E minha avó Rada, mulher muito religiosa e ativa, ainda acabou adotando mais uma menina negrinha, nossa tia Maria, de modo que a conta chegava a dez, coisa impensável hoje em dia. E foi de minha avó a decisão de se mudarem para São Paulo. Um dia ao ver que o futuro dos filhos possuía uma perspectiva muito limitada, simplesmente anunciou a decisão ao meu avô, iniciando uma correria que levou a família do interior de Minas Gerais, para a zona leste paulistana, mais precisamente para o bairro do Belém. Esta passagem muito narrada por minha tia Edna, irmã de meu pai, é um primor de conteúdo ecumênico, pois apesar de protestante aguerrida, nossa avó Rada mantinha boas relações com o Padre José, para quem costurava fantasias usadas em dramas de fundo religioso. Até uma fantasia de diabo ela fez, com roupa vermelha, rabo e chifres, contava rindo anos mais tarde, pois era de opinião que o dito cujo não deveria ter aquela aparência de teatro infantil. Antes: se aparência tivesse devia ser a de moço bonito, charmoso, de fala fácil e péssimas intenções. O fato é que o Padre José acabou auxiliando meus avôs, de um modo muito simpático, inclusive arrecadando um pequeno fundo para financiar a viagem. O casal veio na frente para ajeitar as coisas com a firme decisão de só mandar bus-car a filharada depois de arrumar pelo menos um teto. Mas diversos contratempos e dificuldades em São Paulo fizeram com que demorassem a dar uma resposta. E tal era a ansiedade de meu pai para conhecer a cidade grande que ele não pôde suportar a longa espera. Quando as notícias passaram a rarear, ele resolveu viajar sozinho numa aventura arriscada, em carona com caminhões. E, por incrível que possa parecer, conseguiu se virar e acabou chegando até onde seus pais estavam – para total pasmo dos mesmos. Um dia minha avó abriu a porta e lá estava o seu filho mais velho, o Taufik, ou Tufi, como era pronunciado, sozinho, sem ninguém. Esta história se tornou uma espécie de lenda familiar. Capítulo VI O Feijão e o Sonho A primeira impressão da metrópole deve ter sido avassaladora para um adolescente vindo de cidade pequena. Muitas décadas depois, ele ainda descrevia com emoção a primeira visão dos edifícios e dos bondes, esses antepassados dos ônibus que pareciam carregar a própria História pelos trilhos de São Paulo. Alguns desses bondes ostentavam orgulhosamente a frase: São Paulo, o maior centro industrial da América Latina. O impacto desta afirmação categórica foi grande. A prova é que na sua velhice, quando um médico pediu que ele escrevesse alguma coisa para ver como andava sua coordenação motora, foi exatamente esta frase que meu pai escolheu escrever, então com mais de 70 anos. Logo todos os outros irmãos vieram e a família juntou-se novamente passando a viver naquela região do Belém, do Brás, do Tatuapé, a zona leste muito antes que algum prefeito sonhasse em construir a famosa radial que corta a região. Minha avó descobriu uma igreja para frequentar, a Igreja Presbiteriana do Brás que se tornou um local de grande importância para toda a família. Todos os meus tios cresceram frequentando esta Igreja, participando das atividades religiosas e sociais. Meu pai mesmo deu seus primeiros passos como ator em encenações de temas bíblicos realizadas num pequeno teatro que havia no andar de baixo do prédio, onde se ministravam também as aulas da Escola Dominical. Ele cursou o colégio até o quarto ano e logo teve que começar a trabalhar. Seu primeiro emprego foi na antiga fábrica Alpagartas no Brás. Mas meu avô, como todo árabe, sonhava para ele alguma coisa mais consistente no comércio da Rua 24 de Março, famosa por suas lojas de tecidos de sírios, árabes e libaneses – hoje mais diversificada e com a presença de massiva de coreanos. Entretanto, aquele velho sonho acalentado em Minas de poder fazer cinema ainda era forte e engrossava mais ainda quando ele ia assistir aos filmes no cinema do Largo São José, no Belém, o centro social e cultural da região. Mais crescido acabou por descobrir um pequeno tesouro no centro de São Paulo: o Instituto Brasileiro de Cinema, uma instituição pioneira que procurava formar profissionais para esta atividade ainda tão precária naqueles anos de 1930 e começo de 1940. Ali meu pai conheceu uma pessoa que seria fundamental para sua formação, uma espécie de mestre, de mentor. Tratava-se do cineasta Lima Barreto, homônimo do famoso escritor, um dos primeiros grandes diretores brasileiros. Seu filme O Cangaceiro, realizado em meio a muitas dificuldades de produção ganhou uma menção importante no Festival de Cannes. Não foi o prêmio principal, mas o melhor filme de aventura, o que era algo relevante para um cinema ainda incipiente como o brasileiro na época. Meu pai apaixonou-se pelo Instituto e pelas possibilidades que ele lhe abria, a ponto de fazer serviços como faxina para poder frequentar as aulas. Algumas vezes dormia por lá mesmo de tanto que gostava do lugar. Esta atitude deve ter preocupado terrivelmente meus avôs. Cinema? Era algo fluido demais! Tanto que meu avô Isaac foi até lá com a firme decisão de levar meu pai para casa e encerrar aquela história que estava indo muito longe. Mas o Lima Barreto, que era uma pessoa afável teve, segundo meu pai, uma conversa longa e séria com meu avô. Nunca se soube o que ele disse. O fato é que o seu Isaac voltou para casa sem o filho e procurou tranquilizar minha avó. O Tufizinho, como era chamado em casa, continuou a frequentar os diversos cursos do Instituto. Teve aulas de atuação, segundo alguns métodos em voga, com vários professores. Ele costuma va contar, divertido, de um professor alemão, amante do cinema expressionista que ensinava seus alunos a representarem cientificamente, mexendo cada músculo de face. Agora… a zigomática direita com a sobrancelha esquerda, isso, assim ser expressón da desprezo… E para fazer isso o aluno tinha que enfiar o rosto num buraco numa tapadeira! Mas foi com o Lima que ele sorveu os mais humanos e duradouros ensinamentos. Também adquiriu noções teóricas de uso da câmera, de construção de roteiro, iluminação e até cenários e figurinos. Instruído pelo seu novo mentor, passou a devorar literatura. Lia tudo o que lhe caísse nas mãos. E assistia a todos os filmes que chegavam aos cinemas da cidade. Só que havia um problema: entre toda aquela informação adquirida e sua prática havia um abismo. Não havia uma indústria de cinema no Brasil. O mais próximo disso que tivemos naqueles tempos, os estúdios da Vera Cruz em São Bernardo do Campo, sequer tinham sido cogitados. O cinema era uma aventura, como meus avôs temiam e meu pai já era então um adulto que precisava encontrar alguma ocupação rentável. O Lima Barreto, notando que seu pupilo era dono de uma voz expressiva, lhe apresentou a pessoas influentes do ambiente do rádio paulistano, como Oswaldo Moles, Otávio Gabus Men-des e Oduvaldo Viana, entre outros. A partir daí iniciaram-se os contatos que levaram meu pai a se tornar um dos radioatores mais conhecidos nos anos 1940, trabalhando em diversas rádios importantes. E o Taufik, para espanto da família, transformou-se num inesperado Dionísio Azevedo e migrou da zona leste para a oeste, subindo as colinas do Sumaré para trabalhar na rádio e depois na televisão Tupi. Capítulo VII Minha Mãe A pequena Eugênia, ao contrário do Taufik, foi a última das filhas de Maria e Francisco Tortejada, casal vindo da Espanha para o Brasil nas primeiras décadas do século passado. Na verdade, ela nasceu gêmea, mas sua irmãzinha não resistiu ao parto. Também era uma família numerosa, com sete filhos. Foram viver na zona norte de São Paulo, no Tucuruvi, mais precisamente em Vila Mazzei, um bairro agradável, próximo à Serra da Cantareira, onde se podiam encontrar chácaras com videiras, plantações de hortaliças, galinhas e coelhos. Havia algo de bucólico mesmo, embora na sua parte mais central o bairro, pelo menos na minha infância, já fosse urbanizado, com ruas asfaltadas e iluminação. Minha avó materna era uma pessoa muito boa, mas também extremamente enérgica para criar o batalhão de filhos que ela e o marido puseram no mundo. E não podia ser de outro modo. Tudo era contadinho, não havia muito dinheiro, nem moleza para ninguém. Todos começaram a trabalhar cedo. Meu avô Francisco era pedreiro e construiu as casas em que moraram. Aquele tipo de casa que ainda pode ser vista, embora cada vez mais raramente nos bairros mais tradicionais, com uma varandinha em forma de arco. Tive pouco contato com ele, pois seu falecimento se deu quando eu contava uns 8 anos. Ainda assim me recordo bem do seu jeito tranquilo, culpando sempre as azeitonas pelos efeitos que a cerveja causava em seu organismo. Morreu em casa, como se usava naquele tempo e contam que um pouco antes do seu passamento ele delirava sorrindo e dizendo para os presentes que os músicos estavam chegando, referindo-se a uma banda musical, formada por amigos da sua cidade natal, Barcelona. Como filha caçula, minha mãe tinha seus deveres e um deles era buscar água num poço próximo da casa. Ela me contava que tinha um temperamento bem sonhador quando menina. Romântica mesmo. E demorava lá no poço, imitando as cantoras do rádio para um público que, segundo ela, consistia num pequeno cabrito, provavelmente não muito interessado. Mas esse foi o seu primeiro desejo real: tornar-se uma daquelas cantoras famosas cujas vozes chegavam até Vila Mazzei pelas melífluas ondas radiofônicas. Quando jovem chegou a se engajar nesta área, como crooner da orquestra do Sílvio Mazzuca que, entre outros trabalhos, animava os bailes carnavalescos da época. Crooner, para os mais jovens, era o cantor ou cantora que acompanhava as orquestras ou era acompanhado por elas. As grandes orquestras, principalmente as americanas, eram muito populares naquele tempo, tanto quanto as bandas de rock hoje em dia. Levavam multidões aos seus espetáculos. E sempre que ia cantar minha avó ia junto, com seu ar de espanhola brava. Permanecia o tempo todo sentada em qualquer banquinho que encontrasse na coxia, segurando uma bolsa e uma ameaçadora sombrinha, com a qual presumivelmente iria defender a integridade moral e física da filha caçula. É que naquele tempo não era muito comum mulheres trabalharem em certas atividades e a artística, principalmente, não era vista com bons olhos. Ainda assim ela perseverou, muito embora, num dado momento e por causa justamente da sua bela voz tenha sido convidada para fazer radioteatro. Apaixonou-se pela profissão e resolveu passar da área musical para a dramática. Ia de ônibus lá do Tucuruvi até o Sumaré para participar das transmissões. Meu avô Francisco ia sempre esperá-la num ponto, pois ela chegava tarde e não havia iluminação ainda no trecho que ia do ponto final até a Vila Mazzei. Também ela mudou seu nome de batismo Eugênia Tortejada, para Flora Geni, que se tornou sua identidade. Até o fim da sua vida a família e os amigos a tratavam por Flora, tia Flora, Floripes ou simplesmente Florinha. E, como eu disse antes, logo que se casou com meu pai acabou vindo morar no Sumaré, longe dos campos de Santana e do Tucuruvi, mais ainda naqueles tempos do que hoje. Capítulo VIII A TV Tupi E eis que no dia 18 de setembro de 1950, cravado bem no meio do século 20, com jeito de data para dividir em antes e depois, foi inaugurada a TV Tupi. Iniciava-se a trajetória da televisão no Brasil. Como tudo era inédito naquele veículo futurista, foi preciso uma geração de pioneiros para desbravar a nova linguagem. Entre aqueles inúmeros pioneiros estavam os meus pais. E o que caracterizava aquele meio de comunicação? Era um cinema caseiro? Ou um teatro de massas? É preciso ter em mente que o videoteipe não veio junto com a televisão: demorou quase uma década para chegar. Portanto, a não ser pelos filmes e desenhos, tudo na televisão se fazia ao vivo, inclusive os teleteatros. A dificuldade da empreitada é evidente. As primeiras câmeras eram imensas, não possuíam a mobilidade das câmeras modernas. Todas as ações precisavam ser muito bem sincronizadas e estavam sujeitas a erros que precisavam ser remediados em pleno ar. Todas essas coisas, entretanto, não inibiram os artistas e técnicos, bem ao contrário. Houve mesmo uma febre criativa que se expressou na forma da primeira teledramaturgia brasileira, com vários tipos de teleteatro que atravessaram toda aquela década inaugural. Os mais marcantes foram TV de Vanguarda, o Grande Teatro Tupi e o TV de Comédia. O TV de Vanguarda ia ao ar nos Domingos à noite fechando a semana e era muito assistido. E não era qualquer teleteatro. Eles adaptavam nada menos do que os maiores clássicos da literatura universal e nacional, para um veículo que ainda não possuía os recursos que agora possui. Grandes escritores de todas as nacionalidades, como Shakespeare, Tchecov, Eugene O´Neal, a nata da literatura mundial, era adaptada e encenada com muito esforço e dedicação, formando uma geração de atores que estão entre os maiores da televisão. Alguns como o Lima Duarte e a Laura Cardoso tiveram uma carreira longeva e ainda participam das grandes novelas nesta primeira década do novo século. Muito pequeno ainda naquele iniciozinho da TV, recordo, entretanto de certa efervescência no ar. Um entra e sai de casa. Aquele diz que diz sobre quem vai fazer o quê, nome de atores ressoando, ou de pessoas ligadas a todo o processo, como Durst, como Cassiano, sempre ecoando nas conversas. E hoje revendo na memória percebo a grande intensidade que aquilo foi para os en volvidos. Todos cinéfilos, ávidos leitores que, de repente, tinham nas mãos um brinquedo sério. Eles podiam fazer teatro e cinema todas as semanas, criando uma nova linguagem dramática: o teledrama. Naquele primeiro momento podiam adaptar o que quisessem, sem que houvesse ainda índices do tipo Ibope, ou qualquer outra coisa que restringisse a liberdade criadora de optar por este ou aquele texto. Foi, tão somente por isso, um momento único na televisão e que, por motivos óbvios, nunca mais se repetiu nem mesmo em televisões estatais, pelo menos não naquela intensidade e com a qualidade dos artistas envolvidos. Todos aqueles pioneiros podiam, enfim, colocar em prática o que haviam aprendido pela vida afora. A experiência no radioteatro foi aproveitada naquele momento raro, decididamente ousado e sem igual em toda a história da televisão. De fato, para meu pai especificamente era a oportunidade de pôr em prática todos os ensinamentos absorvidos desde o Instituto de Cinema, com o Lima Barreto. Ele já havia feito isso em escala mais modesta no rádio, adaptando textos e mesmo criando histórias. Mas agora existia a imagem: ele estava um pouco mais próximo do cinema! Recordo até hoje do som da máquina de escrever na cozinha de casa tiquetaqueando sem parar e ele ou minha mãe fazendo adaptações de peças da literatura para a televisão. Havia qualquer coisa de febril naquela atividade. Além de adaptar, ele atuava como ator e até como diretor de alguns teleteatros. Minha mãe não dirigia, apenas atuava. Mas fez inúmeras adaptações, pois gostava muito de ler e era rato de Biblioteca, como ela mesma dizia. De fato, ela era sócia da Biblioteca Mário de Andrade, no centro da cidade, onde completou sua formação como leitora. Participou de uma série baseada nos contos das Mil e Uma Noites, adaptando e fazendo o pa-pel de Sherazade. Como se pode ver ninguém pensava pequeno ou se inibia antes as inevitáveis dificuldades. A prova disso foi a já citada adaptação da obra de Monteiro Lobato, o Sítio do Pica-pau Amarelo, feita por Tatiana Belinky e apresentada por seu marido Júlio Gouveia. Quanto a meu pai, a participação dele no processo todo de implantação da teledramaturgia foi muito intensa em todos os sentidos. O ator Lima Duarte em seu depoimento é de opinião de que três autores/adaptadores foram muito significativos naquele momento de criação de uma linguagem televisiva: Durst, Péricles Leal e Dionísio. A sua paixão pelo trabalho era evidente. Atuou em inúmeros teledramas, a maioria deles listado na parte final deste trabalho. Mas houve alguns momentos especiais que merecem ser destacados. Um deles, sem dúvida, é O julgamento de João-Ninguém, de 1952, o primeiro TV de Vanguarda, que ele adaptou, dirigiu e atuou. Foi um início promissor e o comentário, segundo testemunhas da época, foi a de uma repercussão positiva e mesmo assombrada dos primeiros telespectadores. Era como se a televisão pudesse proporcionar um tipo de qualidade – ao menos de interpretação, uma vez que os recursos técnicos eram ainda incipientes –, semelhante ao do cinema. E por isso, talvez, houve aquela euforia inicial dos participantes do processo. Nunca eles teriam podido experimentar tanto no cinema, com os recursos da época. E mesmo no teatro: podiam fazer Shakespeare, se quisessem e quanto quisessem. E fizeram! Meu pai adaptou e dirigiu Othelo, Macbeth, Hamlet, além de Pirandello e outros clássicos da literatura universal. Paralelamente a esta descoberta das possibilidades estéticas, ainda desabrochando, houve uma vertente igualmente importante que se preocupava com a questão da identidade, da brasilidade. Afinal, havia já uma influência norte-americana, de roteiristas como Paddy Chayefsky, entre outros, que já escreviam há mais tempo para a TV. Iniciou-se todo um descobrimento do jeito de falar das diversas regiões brasileiras, movimento que acabou desaguando em diversas produções. Um dos momentos mais significativos desta tendência foi a produção de Calunga (1956), uma adaptação de Péricles Leal, da obra do poeta Jorge de Lima. Este teledrama teve enorme repercussão por diversos motivos. Além de trazer obras de evidente importância cultural, monumentos da literatura adaptados para o grande público, a televisão apontou com este trabalho que podia também oferecer crítica social, busca de raízes culturais e tudo isso possuía na época um ineditismo muito grande para uma mídia nascente e com a marca de berço de ser um veículo de massas. Décadas depois a TV Cultura de São Paulo, quando quis prestar uma homenagem para os pioneiros do TV de Vanguarda, escolheu justamente Calunga, refazendo a adaptação inteiramente ao vivo. A atuação como o personagem Totó, inválido numa rede, rendeu um prêmio a meu pai e sua atuação foi muito comentada. Mas houve outro momento ainda mais impactante pelo pioneirismo e que ele sempre considerou como a sua mais ousada participação no TV de Vanguarda: a adaptação de Guimarães Rosa, mais precisamente do conto A hora e a vez de Augusto Matraga (1959). A televisão se antecipou ao cinema com este trabalho pioneiro, e com uma equipe de atores de primeira grandeza, como o próprio Lima, entre outros. Na verdade, já havia sido feita uma experiência anterior como este autor, em 1952. Foi uma adaptação de um conto do livro Sagarana, Corpo Fechado, também com o Lima Duarte, que sempre compartilhou com meu pai uma espécie de veneração pelo Guimarães. De fato, meu pai encontrou no mineiro Guimarães Rosa, numa forma totalmente acabada, várias buscas particulares e respostas a inquietações tanto éticas, quanto estéticas. E encontrou amplamente, em diversos aspectos. Em primeiro lugar, precisamente na questão da mineiridade, se é que o nome cabe. Vários artistas vieram de Minas como ele, o Lima Duarte, a Vida Alves, só para citar alguns. E o som mineiro estava ainda bem dentro do ouvido, de modo que foi uma empatia imediata com a narrativa daquele escritor. Um segundo aspecto, embutido no primeiro, foi a já citada busca da brasilidade, que foi uma questão de generacionismo ou de traducianismo (doutrina segundo a qual a alma é criada, como o corpo, pelo pai ou pelos pais). Foi uma pesquisa bastante criativa que se deu naqueles meados dos anos 1950, até o fim da década. No anexo deste livro há um depoimento de meu pai para o Idart (Instituto de Desenvolvimento Artístico) onde ele fala um pouco sobre essa pesquisa que envolveu a todos que participavam dos teleteatros da Tupi, com grande intensidade. Houve uma procura consciente pelas características de fala de cada região, o falar mineiro, gaúcho, pernambucano, etc., com a intenção de trazer desde aquele início o homem brasileiro para a teledramaturgia. Mas, além da brasilidade, há um terceiro aspecto que meu pai sempre considerou que foi o da universalidade. Talvez Guimarães Rosa seja realmente o mais universal dos nossos regionalistas, pela amplidão dos temas que utiliza. E uma coisa que preocupava era que essa busca da brasilidade não caísse numa espécie de xenofobia, ou num culto ao sotaque pelo sotaque. Ao contrário, em todo TV de Vanguarda, ele foi um dos que mais se preocuparam em estender o leque de possibilidades adaptando, como foi dito antes, Shakespeare, Pirandello, os autores russos, entre muitos outros. A busca, enfim, de uma brasilidade com um horizonte largo e sem complexo em montar clássicos de outras culturas. E há ainda um quarto aspecto mais particular na obra de Guimarães Rosa que tocou meu pai muito de perto, embora ficasse num âmbito mais íntimo, que é a questão da religiosidade. Ora, nos anos 1940 e 1950 havia quase que um ateísmo obrigatório na área mais intelectual, com muita influência de Sartre, Marx, etc. Al-guns escritores que não foram tocados por este materialismo eram avis rara, e possuíam inclusive uma espécie de charme por reintroduzir a questão de Deus, como o próprio Guimarães, Clarice Lispector, Lígia Fagundes Telles, para não citar a vertente dos intelectuais católicos que marcaram presença na cultura brasileira, como o próprio Jorge de Lima, autor de Calunga. Obviamente era uma religiosidade expressa dentro de um ponto de vista estético. Afinal, sua formação religiosa na casa paterna havia sido muito forte – intimamente ele foi sempre um homem de fé. E o seu temperamento transbordante não conseguiria jamais se encaixar numa estética de programa. Por tudo isso o encontro com a obra de Guimarães foi para ele um momento raro de achado, quando várias buscas internas encontraram uma resposta magnificamente formulada. Assim como o Lima Barreto foi seu mentor de fato, Guimarães foi para ele o seu mestre espiritual, o escritor com quem ele mais se identificou em toda a sua vida. Lá pelo fim dos anos 1950, aquela teledramaturgia desenvolvida por toda uma década atingiu uma maturação expressiva com grandes teleteatros e a entrada em cena de programas como o TV de Comédia, que passou a se alternar aos domingos com o TV de Vanguarda. Meu pai acabou dirigindo a primeira experiência com o videoteipe, uma montagem de Shakespeare, que deu muito trabalho, pois o vídeo, além de uma tecnologia nova, não era fácil de utilizar como hoje. Uma nova leva de profissionais chegou, ansiando por participar do processo criativo, aumentando aquela febre que tomava conta das ladeiras do Sumaré. Capítulo IX Jogo de Cintura no Ar Quando se reuniam, muitos atores daqueles anos iniciais costumavam contar histórias engraçadas que se passaram durante os lendários primeiros teledramas. Tratava-se das falhas ou erros que ocorriam por conta de tudo se passar ao vivo. Era preciso ter jogo de cintura para corrigi-los no ar, ou então ao menos disfarçar um pouco. Como na ocasião em que um cavalo foi levado ao estúdio para participar de uma produção. Não sei de que história se tratava: se de algum con-to sertanejo brasileiro ou americano. O certo é que o cavalo ao ser amarrado pelo ator resolveu por algum motivo obscuro sair cavalgando pelo estúdio. Com esse gesto inesperado levou consigo a fachada falsa de uma casa, o que revelou a parede de tijolos que ficava atrás. O câmera teve que corrigir rapidamente o enquadramento e os atores reinventaram a marcação até que chegasse o intervalo. Outra história muito narrada, e às vezes com diferentes versões, foi a que ocorreu entre meu pai e o ator Lima Duarte, quando o Lima foi morto a dedadas. Esta história o Lima narra com bastante propriedade e com detalhes vívidos no depoimento que dá para este livro. Outra questão eram os imensos textos que eles tinham para decorar, como se estivessem representando no teatro, na hora, em tempo real. Com a diferença de que o tempo para ensaiar um teledrama era mais curto do que a preparação para uma peça teatral. E eles tinham que representar Shakespeare, com uma semana para decorar as falas! Em certos casos, os atores precisavam a recorrer ao artifício das dálias. Dálias eram uma espécie de cola, um pedaço de papel onde era escrito alguma passagem maior do texto. Os atores pregavam essas colas em geral atrás de vasos de flores do cenário, ou mesmo nas costas de outros atores para auxiliar no caso de algum branco. E veja bem que não era nada fácil utilizar este artifício! Precisava-se de uma enorme tarimba como ator. Era preciso ler o texto aplicado em algum ponto da cenografia sem sair do papel em nenhum segundo, isto em pleno ar. Muitas vezes ocorria algum acidente, como quando o grande ator Jaime Barcelos teve a sua dália retirada por engano por um cenotécnico, que simplesmente trocou ou levou o vaso de flores em que a cola se encontrava pregada. No momento em que se dirigiu para a marcação, o ator viu que tinha sido deixado na mão num momento crucial e precisou utilizar todos os seus recursos de improvisação, ou ativar a sua memória rapidamente para não deixar a peteca cair. Várias outras histórias como essas foram contadas e passaram a fazer parte de uma espécie de folclore dos tempos pioneiros da TV ao vivo. Mas elas se constituíam em exceção à regra: durante muitos anos, por uma década inteira, grandes teleteatros foram encenados, com excelentes atores e atrizes, para um público crescente que aguardava os domingos com ansiedade. Com toda essa movimentação, aquele aspecto de comunidade artística do Sumaré se desenvolveu bastante. Guardo com nitidez uma agitação no ar do bairro, vizinhos artistas se reunindo em casa para ler alguma coisa, talvez um conto de Sagarana, ou fazer a leitura de uma adaptação. Ou simplesmente para uma partida de buraco jogando conversa fora sobre arte, política, fofocas em geral e, principalmente, televisão. Havia sempre gente jogando cartas ou simples-mente tomando café e conversando na pequena sala da Rua Bruxelas, 62. Recordo, misturando um pouco várias épocas, da figura do Juca de Oliveira contando histórias engraçadas; da ami císsima de minha mãe, a Iara e do seu marido Fernando Faro, que produzia o programa de vanguarda Móbile e em algumas oportunidades levava junto gente ligada à área musical, como o Chico Buarque e o Rogério Duprat. Vinham também os atores pioneiros daquela época, como o Jaime Barcelos, o Turíbio Ruiz e a sua mulher Lídia Costa, insuperáveis no buraco. Lembro do Benedito Rui Barbosa e da Marilene, os compadres; da nossa vizinha de parede, a atriz Débora Duarte, uma espécie de radar do que acontecia naquela altura efervescente dos anos 1960 e que irrompia sempre com alguma novidade, como o último long-play dos Beatles ou qualquer coisa no gênero. Um fragmento feliz, bem antigo mesmo, e que resiste na memória, evoca um fim de ano e sintetiza um pouco uma circunstância rara. Reunimonos com os vizinhos em casa para assistir à São Silvestre que àquele tempo passava um pouco antes da meia-noite. Foi vencida creio que por Gaston Roelants. Depois vieram os abraços e os desejos de bom ano. Até que o Walter Stuart, que parecia não fazer distinção entre a televisão e a vida real, apareceu disfarçado de alguma coisa como um gaúcho, dando tiros de festim para o ar em plena calçada, chamando todos para a rua. A cena é bem antiga e a memória falha e não consegue completar os brancos. Recordo apenas nitidamente de estar de pijama, assim como meu irmão e de todos saírem para a rua, vizinhos artistas e outros, e subirem a Rua Bruxelas cantando o Feliz Ano Novo. Talvez a televisão nunca mais tenha alcançado a preocupação com o nível da sua teledramaturgia como naquela primeira década, ou pelo menos de ousar tanto apesar dos parcos recursos. De qualquer forma, mesmo se levando em conta as dificuldades, havia uma intenção honesta de se produzir o melhor da literatura brasileira e universal. Foi, para todos os envolvidos, uma aventura sem igual que marcou o Sumaré daqueles anos como um centro cultural. Capítulo X Nossa Casa O fato é que todos aqueles artistas que passaram a morar nas imediações da Tupi não estavam apenas fundando a teledramaturgia, mas uma família – o que complicava um pouco as coisas. A grande maioria era casada recentemente, com filhos pequenos que também passaram a povoar o bairro e as casas de aluguel. A casa da Rua Bruxelas, 62, era um sobradinho geminado, que foi nossa moradia por duas décadas. Dona Antonieta, a proprietária, uma senhora portuguesa, baixinha e rechonchuda, com um rosto austero, vinha pontualmente todo mês cobrar o aluguel e sentava-se na sala para alguns minutos de prosa e um cafezinho. Às vezes saía bufando por algum pedido de adiamento, partindo para as outras casas com a mesma determinação. Quem entrasse na Rua Bruxelas vindo da Avenida Alfonso Bovero, iria encontrar à direita, no meio do quarteirão, quatro casas geminadas. Elas pertenciam a famílias de artistas: colada à nossa se encontrava a casa do Lima Duarte, da Marisa Sanches, sua esposa e também atriz; e das filhas, a atriz Débora Duarte e a Mônica, colega de infância. Em seguida vinha a casa de dois grandes atores: o Fernando Balerone, o Balé, e da sua esposa, a Laura Cardoso, com suas filhas Fátima e Fernanda. A quarta casa era alugada pelo autor de novelas José Castelar e sua mulher também radialista, a Heloísa Castellar, que veio a ser diretora da TV Cultura e que ali viviam com os quatro filhos, nossos amigos de brincadeiras: a Dorinha, a Regina, a Ângela e o Zeca. Bem no cocuruto da Bruxelas, lá em cima, morava o Walter Stuart e sua família, a Moura, sua mulher e seus filhos: a Momice, a Laura e o ator e diretor Adriano Stuart. Havia ainda, espalhados pelo bairro, a Vida Alves, a Lolita Rodrigues, a Iara Lins, a Hebe Camargo… Seria entediante numerar tantos outros atores, cantores, músicos, técnicos, habitantes dos morros do Sumaré. Como as demais, nossa casa era simples, mas gostosa, com aquela cara de casa da gente, um lugar em que nos sentíamos bem. O escritório do meu pai era a cozinha, onde ele fazia suas adaptações depois que as refeições eram retiradas da mesa. Usava uma velha máquina de escrever Remington, com uma cor metálica esverdeada. Ele não chegou a fazer curso de datilografia e escrevia utilizando apenas os dois indicadores, mas com uma surpreendente velocidade. Vez ou outra parava de escrever e passava a andar de um lado para o outro na estreita cozinha, todo agitado, com aquele olhar esquisito de quem está procurando alguma ideia ou solução. Lembrava uma fera numa jaula, pois sua expressão era intensa e ele constantemente passava as mãos pelos cabelos, num gesto ansioso. Também chacoalhava as pernas obsessivamente quando sentava para voltar a datilografar, o que traía certa turbulência ao fundo da aparente calma mineira. Despertei certa noite com o matraquear da máquina na cozinha. Desci a velha escada de madeira que rangia nos degraus do meio e fui dar com meu pai andando para lá e para cá entre a pia e a mesa. Parecia aflito e ao mesmo tempo mantinha um enigmático sorriso que devia ter relação com o que ele estava escrevendo. Também tive a impressão naquele momento de que aquela atividade efervescente que se estendia pela madrugada devia ser algo da maior seriedade, da maior gravidade. Era tarde e ele deveria estar aproveitando as horas silenciosas para se concentrar melhor, prática, aliás, conhecida de bastante gente que escreve. Não me recordo de muito mais daquela noite, ou de como voltei para a cama. Apenas ficou em algum interstício da memória a imagem dele trabalhando com um entusiasmo febril de madrugada, envolto em fumaça de cigarro. E ele fumava muito naquele tempo. Largou o vício em idade avançada, depois de sentir não sei que pastoso na língua e talvez impressionado com um caso de enfisema pulmonar. Largou assim, de repente, sem necessidade de nenhum tipo de ajuda clínica. Nunca mais pôs um cigarro na boca, a não ser muito ocasionalmente, por causa de um personagem. Mas foram inúmeras as vezes em que eu fui buscar cigarro para ele na vendinha do seu Jacinto, situada bem na esquina da Bruxelas e onde todos ali compravam fiado ou anotando a compra numa caderneta, o mais antigo sistema de crédito. Hollywood, Carlton, Minister e outras marcas da época que eu trazia inocentemente pela calçada. E o cigarro causou pelo menos duas quase-tragédias na nossa casa. Numa noite, eu e Noel fomos despertados pelos gritos de minha mãe. Corremos até o quarto deles, separado do nosso por um pequeno corredor com tacos que viviam soltos, e a encontramos aos berros, num frenesi danado, abafando a fumaça e o fogo incipiente que saía do lençol. Meu pai, como se ainda estivesse atônito, olhava aquilo sem entender o que se passava. É que ele havia dormido lendo um script, com o cigarro colado no canto do lábio. A bituca acabou rolando para o lençol sem que ele desse por isso o que ocasio nou aquele pequeno incêndio na madrugada, felizmente debelado. A outra vez foi ainda mais dolorosa, pelo menos para nossa mãe. Ela havia acabado de fazer uma cirurgia plástica no rosto, uma novidade na época, início dos anos 1960. Queria corrigir alguma coisa no queixo ou no nariz, não me recordo. E, talvez, por ser ainda um procedimento novo, ela tinha o rosto envolto por uma armadura que evocava algum personagem de Alexandre Dumas ou de uma novela gótica: só se viam os olhos e a boca. E o médico tinha receitado repouso absoluto, além de ingestão de líquidos por dois dias. Estávamos, pois, todos na sala. Minha mãe permanecia recostada no sofá, descansando, com os pés esticados numa espécie de pufe. Meu pai, ao lado dela, lia qualquer coisa que poderia ser ou um capítulo de novela, ou um texto de teatro. Naquela época, além de dirigir novelas durante o dia, ele fazia teatro à noite e, salvo engano, estava atuando no espetáculo Círculo de Champagne, do Abílio Pereira de Almeida. Eu e Noel assistíamos televisão ao mesmo tempo em que brincávamos com a Marquesa, uma vira-latas adotada pela família. Por todo lado espalhavam-se jornais e revistas. Então ouvi mos um ganido, uma coisa vinda do fundo de um peito e olhamos assustados. Vimos nossa mãe emitindo aquele vagido fundo ao mesmo tempo em que estapeava as costas do meu pai. E ele olhava para ela zangado não entendendo o motivo da fúria. Minha mãe, criatura doce a maior parte do tempo, quando nervosa era possuída por uma espanhola brava e o chão tremia. Tinha grandes discussões com meu pai, em geral por conta da grana curta e da mão larga do marido. Ou de assuntos em geral vedados aos filhos. Era ela na verdade a responsável por tocar a casa e manter a economia doméstica nos trilhos. Mas naquele momento em especial, nada havia que pudesse justificar a furiosa atitude e como ela não podia articular duas sílabas que fossem, apenas projetava aquele urro fino, agoniado, ferido por não se sabe que dor insuportável. Dor cuja origem o Noel descobriu em seguida apontando para a perna dela. Em sua distração com o texto, meu pai errou a pontaria e em vez de apagar o toco do cigarro no cinzeiro, apertou-o contra o joelho da desesperada esposa. Os que conheceram meu pai contam diversas histórias sobre esse seu lado, essa sua distração. São tantas as histórias que já não é possível dizer o que de fato aconteceu ou não. Sempre encontro alguém que me diz: ...ah, eu tenho umas histórias do Dionísio, ótimas… São de fato inúmeras, como se todo aquele início aventuresco da televisão e suas peripécias tivessem se cristalizado na sua figura. Ele parecia estar sempre maquinando alguma coisa na cabeça, sonhando com algum projeto, resolvendo alguma questão de uma novela, ou seja, não inteiramente dentro do ambiente imediato, como a sala que o envolvia naquele momento. E a nossa salinha de então, muito modesta, tinha aquelas poltronas bem típicas da época, um design moderno hoje antigo, bem anos 1950, com aqueles pés de palito, formas retilíneas mescladas a curvas abruptas e estampas que refletiam a arte abstrata muito em voga então. Nada muito chique de verdade, tudo com cara de crediário. E, claro, a televisão, nosso sustento. Para falar a verdade, a sala vivia meio bagunçada, não uma bagunça de sujeira, mas uma desordem provisória de jornais e revistas espalhados aqui e ali. Algumas daquelas publicações não existem mais, como o jornal Última Hora e as revistas A Cigarra, O Cruzeiro, Manchete e Fatos e Fotos. Além das histórias em quadrinhos da Ebal, com seus Fantasmas e Mandrakes. Flutuando entre esses impressos havia sempre um ou outro objeto de algum teledrama, como uma coroa de latão de Macbeth, uma espada, uma maça, ou qualquer outro adereço que meu pai trazia para casa, e que acabávamos integrando em nossas brincadeiras. Mas o que mais tinha mesmo era livro. Por conta das adaptações para os teleteatros, e também pelo gosto da leitura, meus pais acabaram por formar uma extensa biblioteca de literatura brasileira e universal. Meu irmão e eu crescemos cercados por aqueles livros. Recordo até hoje das capas, principal-mente as da coleção de mistério Ellery Queen, com histórias policiais de grandes autores como Agatha Christie. Havia Monteiro Lobato, Jorge Amado, Érico Veríssimo, Raquel de Queiroz, além de antologias de contos indianos, chineses, etc. Obras de lombada dura como Dom Quixote de La Mancha, as peças de Shakespeare, e a Divina Comédia, ilustrada por Gustavo Doré, motivos de orgulho, tinham lugar especial na prateleira, pois eram livros caros dos quais eles gostavam muito. E claro, a Bíblia continuava e continuou sempre no seu criado-mudo, herança da sua mocidade na Igreja e da sua mãe – livro pelo qual, além dos aspectos religiosos, ele tinha em profunda consideração como documento de humanidade, como grande literatura mesmo por causa da força das imagens e do texto. Além da televisão, que era a tecnologia de ponta da época, havia alguns poucos outros eletrodomésticos típicos de uma casa de classe média: geladeira, enceradeira, um rádio elétrico, e depois os rádios a pilha que chegaram com furor nos anos 1960. Nada de forno micro-ondas, lava-louças e essas tecnologias que se popularizaram a partir do final dos anos 1970. Também demoramos em conseguir uma linha telefônica. Quando necessário, usávamos o da nossa vizinha de parede, a Marisa Sanches, esposa do Lima Duarte. Isto pode soar estranho nessa época de telefonia desenfreada que vivemos agora, mas funcionava. E os carros. Nosso primeiro automóvel foi um carrinho do Leste Europeu, chamado Skoda, com um desenho muito estranho. Depois meu pai adquiriu um grande Studebaker americano, uma banheira que vivia quebrando. Passamos algumas horas parados no meio de uma estrada, com fumaça saindo do motor e meu pai com aquela expressão metafísica de quem tenta entender um mecanismo inacessível. Outros carros que circulavam pelas ruas na época eram o DKW-Vemag, o Dauphine, que depois virou Gordini, o Simca Chambord, além da esdrúxula Romiseta, um projeto de três rodas cuja porta ficava à frente do carro. O ator Turíbio Ruiz adquiriu um daqueles. E um belo dia o Lima Duarte apareceu em um vistoso Karman-Ghia, com apenas dois assentos e um desenho aerodinâmico. Então vieram os Fuscas. A partir do momento em que a Volkswagen passou a produzir seus mundialmente famosos carros populares – e que se constituiu numa revolução na nossa indústria –, tivemos uma fileira de Fuscas. Até o final dos anos 1960, aquele foi o nosso meio de transporte e o de tanta gente que podia adquirir um. O Fusca se tornou uma mania nacional e ficou impresso de alguma forma na memória afetiva de muitas famílias daquele tempo. Vez ou outra meu pai sonhava com um carro maior, pois tinha na sua natureza algum gene árabe com toda certeza. Apreciava fartura. Era só ver a cesta de frutas vazia, que saía e voltava carregado delas, fazendo a fruteira virar o chapéu da Carmem Miranda. Também não podia ver ambiente escuro: acendia todas as luzes que encontrava. Gostava de alegria e essa expansividade gene-rosa era um traço marcante do seu caráter que se prodigalizava não apenas para ele ou para nós, mas para todos em sua volta. Só para ficar num pobre exemplo, recordo de ele adquirir de um vizinho em dificuldades, que passou a vender livros de porta em porta para se sustentar, uma caríssima enciclopédia médica, que nos aterrorizou por anos com fotos realistas de doenças de pele, furúnculos, erisipelas e coisas piores. E, mesmo mais recentemente, depois do seu falecimento, encontrei um conhecido dele, um sujeito com quem ele não trocara mais de duas palavras, que veio me agradecer pela cesta de vinho e queijos importados que meu pai lhe enviara em razão do seu aniversário! Era uma atitude quase infantil, uma revolta interna contra a mesquinharia das coisas, contra a visão pequena, contra a inelutável ponta do lápis e seu rigor aritmético. Talvez por isso tenha se tornado um juscelinista assumido, nem tanto por motivos propriamente políticos – pois ele sempre foi antes de tudo um sentimental –, mas pela simpatia generosa, pelo sopro de prosperidade, pela visão ampla e ousada. Essa atitude, com certeza, apesar de todo o romantismo, combinada com o dinheiro contado poderia nos levar à bancarrota, não fosse contrabalançada pelo bom senso da nossa mãe. A verdade é que se ganhava pouco na época da Tupi. Mas enquanto o Chateaubriand era vivo parece – segundo algumas pessoas que viveram aquele tempo –, que a coisa funcionava melhor. Com o seu envelhecimento, iniciou-se uma fase crítica que culminou no desmantelamento total da Tupi nos anos 1970. Mas já àquele tempo houve fases de grandes dificuldades, onde muitas vezes o pagamento era feito à base de eletrodomésticos em lojas que possuíam convênio com a emissora. Fazia-se de tudo para complementar a renda, como dublagens, por exemplo. Ainda assim, o Fusca, apesar de prático e econômico, não devia corresponder ao jeitão expansivo de meu pai. De fato, no início dos anos 1970, a ininterrupta linhagem de Fuscas foi interrompida por um Opala. Mas nos anos 1960, o Fusca reinou soberano nas nossas vidas. Com ele íamos visitar os avôs, no Belém, ou em Vila Mazzei. E também enfrentávamos estradas empoeiradas que ele atravessava valentemente apesar do seu tamanho pequeno e da sua forma de besouro metálico. Capítulo XI A TV Excelsior Meu pai era atacado, vez ou outra, pela mania da reforma. Tinha um especial prazer em viver num canteiro de obras. Despertávamos, numa certa manhã, com picaretas fazendo saltar lascas de um antigo piso e a partir daí paredes eram derrubadas. Pedreiros passavam a circular pela casa, medindo, quebrando, raspando, colando, rejuntando, e se eram nordestinos meu pai ficava recitando versinhos de cordel, falando do meu padim Ciço, puxando prosa, rindo. Mandava trazer cafezinho, pagava cerveja na padaria, emprestava algum para uma emergência e ficava circulando pelos aposentos, descobrindo mais alguma coisa para reformar. Fazia um grande estardalhaço e parecia estar em seu elemento, pois sentia que as coisas estavam melhorando. Essas reformas começavam para dar um jeitinho num piso velho, e se estendiam aos poucos. Quando se via, aqueles trabalhadores já estavam por lá quase uns dois meses. Acredito que ficariam por um tempo indeterminado se minha mãe não iniciasse a contrarreforma, mostrando energicamente que o dinheiro já havia evaporado. Recordo perfeitamente a primeira vez em que meu pai foi atacado pela febre reformista. Foi lá por meados dos anos 1960, ainda na Bruxelas. Com a devida permissão da senhoria, derrubou parte da parede da nossa pequena sala, fazendo circular um pouco mais de ar e criando um novo ambiente, mínimo é verdade, debaixo da escada, que virou o cantinho da televisão. Além disso, ladrilhou o quintal, repintou o porão e fez um puxadinho na varanda do nosso quarto que se tornou, a partir daí, nosso quarto de estudos. Ah! E também comprou um Volkswagen, zeroquilômetro, salvo engano o primeiro da longa linhagem de fuscas. Era início dos anos 1960. No comecinho daquela década a paisagem compacta do Sumaré como uma comunidade de artistas gravitando em torno da Tupi sofreu um esgarçamento. A TV Excelsior, canal 9, entrou com tudo no mercado, trazendo uma grade de programação dinâmica com musicais, noticiários, novelas, filmes e programas humorísticos. E inflacionado o mercado, elevando o patamar dos salários dos artistas para um nível impensável na época. O videoteipe havia mudado o jeito da televisão. Os programas podiam ser gravados e editados. O apelo popular e comercial, próprio da mídia, ganhou força e as produções longas e culturais como as do TV de Vanguarda perderam espaço. Minha mãe e depois meu pai, foram contratados pela Excelsior. Ele chegou a se tornar diretor artístico da emissora, responsável pelo setor de teledramaturgia. Ali ele utilizou a experiência adquirida na Tupi para participar juntamente com outros autores e diretores do nascimento do gênero novela, que tanta força tem até hoje na televisão e que se tornou mesmo uma faceta cultural. Mas como continuavam apegados ao Sumaré, não mudaram do bairro. Apenas embicavam o carro Consolação abaixo, na direção da Rua Nestor Pestana, exatamente onde ficava o auditório da emissora, depois transformado no Teatro Cultura Artística sob o grande mural do Di Cavalcanti. O canal 9 começou com uma política agressiva, chamando muitos artistas de outros canais, elevando o patamar dos salários. Uma marca de cigarro famoso na época exibia, na parte posterior do maço, a foto de um artista famoso com a inscrição: Ele também está no 9! A ponto de o comediante José Vasconcelos, num sketch humorístico da própria Excelsior fazer a autocrítica da emissora, pois estava tendo um ataque de coceira e dizia das pulgas que: Elas também estavam no 9! Logo que foi para a Excelsior, meu pai chegou a dirigir três novelas em sequência, todas de muito sucesso: Ambição, com Arlete Montenegro; A Moça que Veio de Longe, com Rosamaria Murtinho e Hélio Souto; e A Outra Face de Anita, com minha mãe no papel de Anita e um elenco de primeira linha. Esses trabalhos foram ao ar num momento em que a novela estava iniciando o seu ciclo na televisão e auxiliaram enormemente a consolidar o gênero nascente. No final da novela Ambição, a cena de casamento, feita na Igreja da Consolação – uma das primeiras externas gravadas –, teve muitas dificuldades para ser realizada pela afluência de populares: gente de monte queria bater na vilã, a Arlete Montenegro, uma grande estrela das radionovelas que migrara para a telinha. Nos anos finais da Excelsior, ele também dirigiu A Pequena Orfã, um sucesso muito grande de público. Além da direção, fez o papel do Velho Gui, pelo qual ficou muito marcado na fase final da sua carreira. Mas apesar de todo o fenômeno de massas que foi o início das telenovelas na televisão, o que mais o interessava era retomar as preocupações do início da Tupi. Por aquela época, começou a estreitar sua par-ceria com o Benedito Rui Barbosa, que rendeu muitos frutos. No seu depoimento para este livro, Rui conta como se deu o processo. Mas o que interessava mesmo a meu pai era retomar as pesquisas de linguagem que haviam sido abandonadas, desde os tempos do TV de Vanguarda. Chamou, então, o Teixeira Filho, o Teixeirinha, para adaptar a obra O Tempo e o Vento, do Érico Veríssimo. Queria fazer uma novela esteticamente mais elaborada, com um visual mais refinado e menos estereótipos na dramaturgia. Apesar de a televisão ter recursos mais avançados em relação aos anos nascentes, estava bem longe das possibilidades que se abririam a partir dos anos 1970. Mesmo assim o trabalho teve uma ótima aceitação de público e crítica, principalmente a partir da segunda fase com Ana Terra. Mas o grande sucesso se cristalizou com a sequência Um Certo Capitão Rodrigo, protagonizado pelo Carlos Zara. A atriz Geórgia Gomide, que fez a Ana Terra, recebeu uma carta escrita pelo próprio Érico Veríssimo que, apesar de algumas críticas, apreciou a adaptação como um todo, com elogios para atuação de Geórgia como Ana Terra e para Davi José, como Pedro Missioneiro. Nesta carta, de 1968, as críticas do autor recaíram principal-mente sobre a dramaturgia da primeira fase com A Fonte, que julgou sem autenticidade, embora elogiasse bastante o tratamento visual da novela. Mas admitia que a partir de Ana Terra e de Um Certo Capitão Rodrigo, tudo passou a caminhar muito bem, fazendo referência à direção segura, honesta e de bom gosto de Dionísio. Aliás, segundo o próprio Benedito Rui Barbosa, que era o supervisor geral da novela, Érico só aceitou vender os direitos para a televisão ao confirmar que a direção seria de meu pai. De fato, O Tempo e o Vento, se constituiu num momento único e muito importante da história da televisão, por vários motivos. Em primeiro lugar, ele resgatou para a cultura nascente das telenovelas uma série de preocupações herdadas da época do TV de Vanguarda, e até mesmo antes, dos grandes radioteatros: a de um entretenimento de massas mais consequente em termos culturais, mais sério, mais artístico, por assim dizer. Ao mesmo tempo deu início à era das grandes produções novelescas, das cidades cenográficas. Este trabalho se encontra num momento crucial, numa encruzilhada mesmo da televisão em que os aspectos comerciais entrariam em luta contínua com os mais culturais e ele é um marco dessa ambição de realizar projetos ousados e ao mesmo tempo identificados com a cultura brasileira. Neste sentido, há nele qualquer coisa de inaugural, de pioneiro, não em relação ao tema, pois os teleteatros da Tupi já haviam desfraldado essa bandeira uma década antes, mas na formatação desse projeto para a nova realidade da televisão, trazida pela Excelsior e pelas telenovelas. O Tempo e o Vento antecipa em quase uma década todas as futuras grandes produções de telenovelas ou minisséries baseadas em autores clássicos da nossa literatura ou mesmo de outras. E tudo isso foi feito dentro de um clima de entusiasmo e com uma intensidade criativa de descoberta mesmo. O sucesso de público foi expressivo, principal-mente a partir de Ana Terra. Era muito grande o número de pessoas que paravam meu pai na rua, na vizinhança, em todo lugar que ele fosse para falar da novela, para comentar com admiração esta ou aquele passagem, como na cena em que Ana Terra descobre sua imagem no espelho, uma sequência irretocável feita com grande sensibilidade por Geórgia Gomide. Um momento emblemático desse prestígio da novela e da sua penetração ocorreu quando a atriz Bibi Ferreira, que tinha um programa de entrevistas na Excelsior, entrevistou Pelé, no auge da sua carreira como jogador. E ele confessou que assistia à novela, com o elenco do Santos, na concentração. Hoje em dia parece algo até normal de se falar, mas é preciso não esquecer o fato de que, naquele início, era muito difícil que um homem confessasse abertamente assistir às novelas de televisão. Eram consideradas entretenimento de donas de casa. Uma passagem engraçada pode ilustrar um pouco o temperamento do Dio, como alguns amigos o chamavam, dado a excessos de emocionalidade. Ele conseguia ficar bravo e depois se arrepender em seguida, e mudar totalmente o clima instaurado. E se tinha uma coisa que espantava tanto a mim quanto ao Noel, quando íamos ver as gravações, era a mudança de atitude geral. Como toda pessoa criativa ele tinha várias facetas: um lado bem conhecido dos amigos, expansivo, alegre, gaiato. E outro, mais íntimo, dado a certa melancolia cismadora. E então surgia este terceiro aspecto, tempestuoso, quando não furioso mesmo. O ar bondoso, um tanto sonhador, era substituído por uma persona enérgica, dado a achaques de ira: outro homem! Totalmente envolvido pela direção das cenas, deixava-se tomar por uma energia, em que havia qualquer coisa agressiva envolvida, pelo menos para nós, pois o contraste com a pessoa que conhecíamos em casa era total. Até sua expressão facial parecia diferente. Bem… No set de Um Certo Capitão Rodrigo havia de tudo, até animais, como galinhas e cavalos. E lá pelas tantas, um vendedor de sanduíches entrou quietinho no estúdio, causando certo alvoroço entre técnicos e até atores. Ao perceber a desconcentração, meu pai teve um desses chiliques violentos. Esbravejou com todos, berrou, procurando pôr ordem na casa. O vendedor saiu de fininho e o Benedito Ruy Barbosa, que assistia à gravação e tinha adquirido um sanduíche, ocultou-o nas costas. Mas inutilmente porque um cavalo próximo o abocanhou com a maior naturalidade, levando-o embora. Isto seria engraçado o suficiente, mas não foi tudo. Ainda em meio à sua fúria, pois queria todos concentrados na cena, meu pai soltou um berro: – Quero silêncio absoluto no estúdio! E, de fato, ninguém falou mais nada, uma quietude extrema tomou conta do lugar. Mas exatamente em seguida a esse berro, e com uma noção de timing de fazer inveja a um comediante, uma galinha que estava num cercado emitiu um tímido, porém audível, cacarejo, um leve cóóó... Ao que meu pai retrucou: – Eu disse: silêncio!!! Não é preciso dizer que todos caíram na maior gargalhada, inclusive ele mesmo. O Benedito Rui Barbosa, em seu depoimento, não apenas confirma esta história, como conta outras deste tempo de aventuras, de implantação da grande novela. Aliás, esse era um traço mesmo do caráter dele, essa intermitência de estados de espírito sempre entusiasmados, descendo duas oitavas rapidamente. Ou mudando totalmente de tonalidade. Mas o tempo da Excelsior foi, talvez, um dos momentos mais felizes do meu pai, como dire-tor de televisão. Embora conhecesse bem a sua empolgação no trabalho, nunca em minha vida lembro-me de o ver tão efusivo. Parecia transbordante de energia, no auge mesmo da sua vitalidade criativa. Muitas vezes íamos até a Rua Nestor Pestana para acompanhar alguma programação. Naquele tempo não existiam as boates eróticas e o centro, embora já não fosse tão calmo como nos anos 1940 e 1950, estava longe da deterioração atual. Lembro de uma lanchonetinha chamada Sun Valley, bem em frente à televisão, onde havia queijadinhas (sei lá o porquê de me recordar disso!). Do mesmo lado do quarteirão, numa casa antiga, o Restaurante Gigetto já era famoso junto à classe artística e ficou lá por um bom tempo antes de ir para a Avanhandava. E tinha o Vikings, um dos primeiros self-services da cidade, com a grande embarcação viking no meio do salão, servindo de mesa para as saladas e outros pratos. Por uma época o canal 9 passou a utilizar os estúdios da Vera Cruz, em São Bernardo do Campo, para gravar suas novelas, antes de ir para a Vila Guilherme. Eu e Noel assistimos às gravações do Morro dos Ventos Uivantes, com a Débora Duarte e o Marcos Paulo. A intenção era retomar a antiga audácia dos primeiros tempos da televisão de adaptar sem nenhum pudor textos clássicos da literatura universal. Entretanto, creio que uma das contribuições mais importantes que ele realizou àquela época foi o esforço para trazer mais gente de teatro para a televisão, ajudando a quebrar certo gelo que realmente existia. Acontece que após os primeiros anos pioneiros, quando a televisão num dado momento chegou a rivalizar com o teatro na modernização da interpretação de um modo geral, houve uma queda na qualidade. A verdade é que aquela primeira geração responsável pelo TV de Vanguarda prestou uma tarefa importantíssima de arejamento, de seriedade, de busca de identidade. Muitas pessoas com quem conversei são de opinião que aqueles primeiros teledramas eram mesmo mais ousados do que o próprio TBC neste sentido de busca de uma linguagem mais moderna de interpretação e também mais brasileira, pois havia um ar um tanto europeu na companhia teatral, em que pese a excelência de seus principais espetáculos. De qualquer forma, com a chegada do videoteipe, a TV passou a revelar sua natureza mass-media com mais força. A parte artística convivendo com o aspecto de fofocas, de revistinhas especializadas falando da vida dos artistas. E no iniciozinho das novelas houve mesmo um retrocesso em relação às conquistas dos anos 1950, com uma teledramaturgia mais próxima da novela radiofônica lacrimosa, com um acento hispânico. Havia muitos profissionais argentinos trabalhando na Excelsior naquele início. Por aquela época nós já tínhamos idade para acompanhar as conversas do nosso pai com os amigos, e sentimos claramente que a grande preocupação dele, ao assumir a direção artística da Excelsior, foi não perder de vista sua origem na taba. Queria dar uma melhorada no nível geral. Apesar de sentir que o aspecto industrial do veículo viera para ficar, achava que ele poderia conviver com uma maior ousadia estética se fosse administrado inteligentemente. Sentiu na pele que os tempos haviam mudado, quando fez a primeira parte do ciclo O Tempo e o Vento, A Fonte, buscando um tratamento visual mais cinematográfico do que novelesco, o que foi criticado pelo próprio Érico: já não era mais possível a radicalidade da década anterior. Já havia uma opinião pública, um ibope, uma concorrência com outras emissoras, um público diversificado. Então, a partir de Ana Terra, ele buscou um equilíbrio entre a trama novelesca e a qualidade da imagem. E, retornando, se esforçou por buscar atores e atrizes de prestígio que trabalhavam no Teatro Oficina, então no auge da criatividade, como Etty Fraser, Renato Borghi e também dramaturgos da excelência do Lauro César Muniz. Era uma coisa da qual ele se orgulhava muito e a sua intenção era de fato melhorar o nível geral da teledramaturgia. Na época da TV Excelsior, eu e Noel éramos maiores e pudemos acompanhar bastante as gravações. Muitas vezes íamos até a Vera Cruz para ver os cenários. Lembro de uma sequência em que a Rosamaria Murtinho, em A Moça que Veio de Longe, voltava para casa de trem e o vagão foi reproduzido no estúdio, num praticável que era mexido por cenotécnicos para fazer o movimento dos trilhos. A iluminação vinda da janela produzia tiras que pareciam luz natural. Havia todo um cuidado artesanal, um capricho na produção de cada cena que ia desde os detalhes cenográficos até o trabalho paciente com os atores. Talvez ele não conseguisse se adaptar com a novela dirigida de modo mais industrial, com diretor de estúdio e diretor de externa: ele era a própria figura romântica do diretor autoral que centralizava toda a produção. E era irresistível para duas crianças perambular por trás daquelas falcatruas cenográficas, vendo as armações de madeira por trás das fachadas, abrir portas que não davam para lugar nenhum e todo o ilusionismo artístico. Mas o que vem em primeiro lugar à minha memória é a grande energia de nosso pai, circulando por aquele universo todo como se estivesse em casa, rindo alto, brincando com alguém, ralhando, pedindo silêncio no estúdio. Às vezes ele nos via e vinha tagarelar um pouco. Levava-nos até a sala de edição, apresentava o editor, voltava para o estúdio e nós ficávamos lá, olhando aquelas telinhas onde se multiplicavam as cenas sempre repetidas, as claquetes intermináveis. E ouvindo sua voz poderosa ecoar pelo estúdio. Ele sempre teve reconhecidamente uma voz bonita, modulada, plástica mesmo, desde os tempos do rádio. Sempre foi chamado para lo cuções diversas, voz off em comerciais e outros eventos. Talvez uma das últimas ocasiões em que isso aconteceu foi através do produtor musical Fernando Faro, que o chamou para narrar o texto de abertura do disco Casa de Brinquedos, do Toquinho, hoje um clássico. É um texto muito bonito e sensível e caiu como uma luva para a voz dele. Mas para nós, seus filhos, era também, antes de tudo, a voz paterna. E uma voz que soava generosa, e mais que tudo, com uma qualidade apaziguadora. Principalmente em momentos de crise, ela sempre representou a instauração de uma segurança, um apoio irrestrito, uma mineirice, uma calma que o mundo é nosso, uma presença, enfim, firme e serena. Aquela fase da TV Excelsior representou, tanto para meu pai, quanto para minha mãe, a maturidade artística. Ela se encontrava no domínio dos seus recursos de atriz, protagonizando novelas como A Outra Face de Anita, ou fazendo detestáveis vilãs em outras como A Grande Viagem. Era, sem dúvida, uma das grandes estrelas da época e foi a primeira de uma linhagem de grandes vilãs que surgiriam em telenovelas posteriores, apimentando as tramas. Ele, entrado nos 40 anos, se achava no auge do vigor criativo. Depois de três décadas de trabalho em televisão, no rádio, no teatro e no cinema, havia aprendido muito e tinha bastante a ensinar. O Benedito Ruy Barbosa em seu depoimento confirma esse caráter de alguém que havia chegado a uma mestria no seu ofício. Ele era, reconhecidamente, um grande diretor de ator. Possuía uma sensibilidade intuitiva para trabalhar com atores iniciantes, jovens, sabia extrair o máximo das potencialidades humanas de cada um. Apesar de gostar de atuar, sua paixão por dirigir era imensa. Tinha muitos planos e ideias para novas novelas e programas. Vivia num estado quase febril, lia todos os capítulos, estudava-os em casa à noite, chegava cedo ao estúdio e saía tarde. Não era mais aquele que chegava sempre atrasado, ao contrário, agora era ele quem vociferava contra os não pontuais. Quando uma novela terminava parecia sugado em sua energia. Mas logo começava a pensar no próximo trabalho. Às vezes minha mãe dava umas reclamadas, mas não tinha jeito. Ele possuía uma obsessão pelo trabalho. E ela se conformava. Mesmo porque, com o tempo, foi percebendo que, quando ele não tinha uma novela para dirigir ou um filme para atuar, começava a derrubar as paredes de casa. Capítulo XII Vida em Locação Nossa infância, minha e de meu irmão Noel, transcorreu de uma forma mista. Por um lado era como qualquer outra infância, com todos os seus rituais; por outro tínhamos consciência de que nossos pais possuíam uma condição especial: eram reconhecidos na rua. Muitas vezes ao caminhar com eles pelo bairro, ou na praia, tínhamos nosso trajeto obstruído por um pedido de autógrafo, por um súbito reconhecimento, seguido de uma conversa às vezes longa e sem o menor interesse para nós. Com certeza isso se dava numa proporção bem menor do que mais tarde e, principalmente, do que nos dias de hoje, com a força crescente da mídia. Ainda assim estava sendo inaugurado naquele preciso momento o grande paradoxo que a televisão instaurou e que o rádio não podia fornecer por motivos óbvios: a capacidade de levar para a intimidade das casas, para os corações dos lares, os rostos dos artistas. Claro que o cinema já tinha sua mitologia, mas era preciso o ritual de se vestir e de sair de casa para assistir a um filme ou mesmo a uma peça. Agora, quando uma pessoa via um artista na rua, o reconhecia imediatamente por aquela familiaridade impensável no passado. E ao mesmo tempo estranha: afinal o artista em questão tinha entrado na sua sala de estar enquanto ela jantava, ou brincava com seu filho pequeno – e ao mesmo tempo habitava o mundo inconsútil das celebridades. Essa estranheza e essa familiaridade também fizeram parte da nossa percepção do mundo. Muitas vezes, na escola, víamos algum professor sussurrar para outro, apontando em nossa direção e sabíamos que devia ser uma referência aos nossos pais. O que de modo algum, pelo menos no nosso caso, representou uma vantagem. Brincávamos com amigos variados sem que essa noção se intrometesse no relacionamento e no geral vivemos a mais normal das infâncias. Mas a palavra normal também não é inteiramente adequada, pois há qualquer coisa de lendário em toda infância e que se mescla mesmo com as coisas mais corriqueiras, como um trajeto para a escola. Eu e meu irmão Noel fomos matriculados desde cedo no Liceu Tiradentes, um colégio situado na Pompeia, por indicação do Davi José, de quem éramos grandes fãs por conta da sua participação como o Pedrinho no Sítio do Picapau Amarelo. Fizemos ali o primário e o ginásio, que corresponde hoje ao Ensino Fundamental. Para chegar até o Liceu a pé, descíamos a Avenida Afonso Bovero, cujo trajeto sinuoso era atravessado por ruas cujos nomes de tribos indígenas evocavam um mundo aventuresco: Caiowá, Apinajés, Tucuna, Cotoxó, só para ficar em alguns. O interessante é que bem no meio delas havia uma rua chamada simplesmente Diana, que nunca entendemos se era alguma tribo desconhecida ou um ato falho da administração pública. Depois que fazíamos as lições de casa íamos brincar. Não havia televisão toda hora, de modo que nos atirávamos porta afora, com aquela fome de jogo de toda criança. Naquele tempo era normal você sair para a rua encontrar amigos. Não que fosse um mundo sem nenhum perigo: os pais já alertavam os filhos para tomar cuidado com o homem do saco, alguém que presumivelmente enfiava as crianças pequenas num saco e as levava. Era um alerta para que não ficássemos de prosa com estranhos e nos mantivéssemos sempre nas proximidades de casa. Ainda assim parecia um paraíso bucólico comparado com os tempos atuais, pelo menos no aspecto violência. É só assistir aos telejornais para comprovar esta tese. Ou andar pelas ruas observando as casas com portões que parecem grades. Andávamos pelo bairro em bando, com a maior naturalidade, sem grandes temores. A maioria das brincadeiras se dava fora das casas. E a presença da TV Tupi no alto da Avenida Alfonso Bovero, de algum modo magnetizava o lugar: era o bairro da televisão. Mas havia também vida fora do Sumaré. Nos fins de semana, saíamos da zona oeste e íamos visitar os avôs em bairros para nós distantes. A coisa era dividida com rigor: num fim de semana ficávamos com os avôs paternos e no outro com os maternos. E não podia haver contraste maior. A família de origem árabe era protestante e morava no bairro industrial do Belém, e a espanhola, católicos de formação, migraram com o tempo para o kardecismo e habitavam no descampado Tucuruvi. E, claro, em algum momento tínhamos que tirar férias. Nos anos mais antigos, nossas férias eram passadas na Fazenda da Seara, que pertencia às Associadas. Pois ainda não havia contratos feitos para este ou aquele e todos os atores e atrizes tinham carteira assinada e eram funcionários da empresa, podendo, pois, usufruir daquele recanto. Recordo apenas vagamente das instalações, do Lima Duarte e da Marisa Sanches, e outros atores da Tupi que frequentavam o lugar com seus filhos. A partir de um tempo, porém, nossas férias passaram a ser em Santos. E aquela cidade cintilava na nossa imaginação, pois significava praia e também o time de futebol. Ali, eu e meu irmão, sentíamos como se a presença de Pelé magnetizasse o ar das ruas com uma presença invisível. Como o dinheiro era curto, as férias eram modestas, mas agradáveis, em geral partilhadas por duas famílias de artistas. Ficamos em diversos lugares, casas e apartamentos alugados, alguns até arejados, como uma casa que possuía uma árvore no quintal em que nos emperiquitávamos depois do almoço, passando ali parte da tarde. O único inconveniente daquela casa é que ficava antes da linha do trem e a ida até o mar, pelas manhãs, era um trajeto a ser vencido com coragem, principalmente na volta carregando aquela tralha toda nas costas, guarda-sol, esteira, banquinhos. Mas recordo também de um apartamento tão exíguo que para entrar nele se fazia necessário subir uma tábua presa à parede e que servia de mesa de almoço naquilo que tinha a pretensão absurda de ser uma cozinha. É interessante isso porque àquela época, eles já eram famosos, reconhecidos e tudo – o que gerava às vezes um constrangimento. Certa vez, logo que chegamos a um destes apartamentos, na hora de descarregar o carro e levar as coisas para cima, meu pai evaporou. Minha mãe comentou com seu humor característico: – Ele não quer ser visto carregando panela. De fato, com o retumbante sucesso das novelas da Excelsior, eles se deparavam com uma mudança brusca entre o tempo em que a fama do artista podia ainda conviver com a vida do dia a dia e o que veio mais tarde, quando a celebridade se tornou um ícone mesmo, inacessível. Atravessava-se naquele momento uma faixa intermediária que necessitou certa acomodação à impressionante e nova, neste sentido de massa, força da imagem televisiva. Muitas vezes meus pais e os nossos vizinhos, os Castellar, rachavam o aluguel de uma casa. E como o trabalho na televisão também não dava folga, ficávamos com algum adulto mais disponível e os outros desciam nos finais de semana, quando podiam. Recordo de sempre visitarmos a Laura Cardoso e o Fernando Baleroni em São Vicente. Passamos muitas férias na região entre o Boqueirão, o Gonzaga e José Menino, que tinha àquele tempo praias menos poluídas. Também costumávamos ir até o litoral norte com o pessoal do Fernando Faro: a Iara, a Zezé, a Zu, o Zezinho, a Psiu. E mais tarde com a família do Rui Barbosa, em Barequeçaba. Era uma época em que todos ainda estavam numa certa dureza, ou lutando para impor o trabalho cada qual na sua área, fosse escrevendo, produzindo, dirigindo, atuando, tentando, enfim, melhorar de vida e, no meio disso tudo, criando filhos. E era difícil encontrar, dentro daquele tipo de agenda multitarefa e fora do horário comercial da vida artística, momentos de lazer para eles. Depois de uns 15 dias de férias subíamos a serra de volta para nossa casa no Sumaré. Meu pai ia dirigindo, conversando com minha mãe sobre algum assunto relacionado ao trabalho na televisão, no cinema ou à nossa casa, todo aquele universo sempre cheio de contas e cálculos da vida adulta. Eu e Noel, no banco traseiro, olhávamos pela janela do Fusquinha a cidade desaparecer na distância, flutuando lá embaixo como uma miragem, com o fogo da usina de Cubatão ardendo bela e sinistramente. E tinha também aquele oleoduto que descia a montanha. Anos mais tarde, subindo de Santos à noitinha com a Tatiana, minha mulher e com nossa filha Beatriz ainda pequena, revi no olhar dela o espanto com o oleoduto ponteado por luzes brilhando na noite, e senti vaga nostalgia, como se ele evocasse naquela escuridão alguma remota constelação de um país da infância. Mas havia também outro tipo de mudança que vinha por conta das locações cinematográficas. Além dos trabalhos em televisão, meu pai realizava simultaneamente sua carreira no teatro e no cinema. Afinal, o sonho que o trouxera à vida artística foi, antes de tudo, o sonho do cinema, que, naquele tempo, era muito mais do que hoje um trabalho de risco. Construiu ao longo dos anos uma expressiva filmografia como ator, documentada na terceira parte deste livro. Participou de filmes pioneiros como Quase no Céu e O Sobrado, além de fazer parte do elenco original de O Cangaceiro, clássico do Lima Barreto, também ganhador da categoria de filme de aventura em Cannes. Mas acabou não podendo realizar o filme, o que foi para ele uma grande frustração. É que as locações demoraram bem além do previsto e uma carta da minha mãe contando sobre dificuldades financeiras no Sumaré, o obrigaram a retornar antes do tempo. Naquela fase pioneira, as locações de um filme podiam durar realmente uma eternidade. Meu pai enviava muitas cartas, algumas prometendo que aquela seria a última vez que ele ficaria tanto tempo afastado da gente. Muitas vezes as cartas vinham em forma fotográfica. Durante as locações de O Cangaceiro, do Lima Barreto, ele fotografou bastante com uma Leyca tipo caixão. Depois enviou as pequenas fotos pelo correio com comentários escritos com caneta tinteiro na frente e no verso, numerando-as em sequência. Pelas fotos era possível ver a incrível precariedade daquela produção antológica. Os atores dormiam em tendas militares, os recursos eram precários. Mas, apesar de ter saído antes, ele sempre pôs o filme no seu currículo, porque, segundo dizia, a experiência foi uma espécie de aprendizado prático de fazer cinema, com o seu mestre Lima Barreto. Nas cartas descrevia com pormenores de como estava aprendendo isto ou aquilo. Grudou em Chick Fowles, cinegrafista histórico e também no artista plástico Caribé, que desenhava o storyline do filme. Enfim, procurou absorver da maneira mais completa e essa experiência foi fundamental quando ele realizou seu primeiro longa-metragem, o Chão Bruto. O fato é que ficamos em casa uns bons meses apenas recebendo suas cartas fotográficas. E ele sempre voltava das filmagens com histórias interessantes que gostava de contar. Uma delas aconteceu na Bahia, durante as filmagens de O Pagador de Promessas, história que ele narrava como se fosse de assombração. É que durante as filmagens ocorreu uma grande estiagem, o céu fixo num azul chapado, sem nuvens e havia a necessidade de uma cena de chuva. A situação era grave: fim de recursos, todos de malas prontas para voltar, faltava uma sequência e... nem sinal de chuva. Passavam o dia olhando o céu, na expectativa de ver alguma nuvem ameaçadora, mas o tempo se mantinha firme e forte. Então ouviram falar de uma senhora, uma negra, muito respeitada na cidade que podia ajudá-los e, em desespero de causa, o diretor Anselmo Duarte foi até ela. A senhora, gorda e com uma pose hierática em suas vestes brancas, perguntou a data da filmagem e ficou calada. Depois disse para o Anselmo que ele podia fazer a cena sem susto no dia seguinte. Como não tinham nada a perder, foram-se todos, atores, diretor, técnica e armaram o set, um tanto desconsolados, pois o céu continuava intensamente azul, sem o menor sinal de mudança. Aí uma pequena nuvem surgiu, minúscula mesmo. Depois outra maior. Logo o céu estava coalhado de nuvens cinzentas. Em questão de menos de uma hora caiu um aguaceiro graúdo – tudo o que eles precisavam! Terminada a sequência e no mesmo dia o sol voltou para dar sequência à estiagem. Nunca se soube ao certo se foi uma grande e feliz coincidência ou se a mulher tinha algum conluio secreto com as nuvens. Durante aquele período, até meados dos anos 1960, ele atuou em muitos outros filmes, viajando muito. Um dos seus preferidos foi sem dúvida A Primeira Missa (1961), a última obra do seu mestre Lima Barreto, no qual ele interpretou o Mestre Zuza, um personagem marcante. Mais tarde ele fez outros personagens mais ou menos nessa linha de mestre ou mentor. Talvez não fossem tão dramáticos como o desse filme, mas todos possuíam um subtexto comum: a figura carismática de um Gepeto moderno. O Portuga, de O Meu Pé de Laranja-Lima, o Reitor de As Pupilas do Senhor Reitor, ou o Velho Gui, de A Pequena Órfã, tornaram-se muito populares, com o perigo mesmo de fixar sua imagem como a de um senhor de cabelos brancos, com expressão sonhadora, o sorriso doce – coisa de que ele não gostava muito e uma armadilha que nunca seduziu nenhum ator de recursos. Muito antes disso, entretanto, atuou em produções internacionais como O Pescador e sua Alma, além dos muitos filmes para a Cinedistri do Oswaldo Massaini – de quem foi sempre muito amigo – películas como O Santo Milagroso e Corisco, o Diabo Loiro, entre outras. Infelizmente não conseguiu realizar uma filmografia própria tão extensa quanto desejava, pois esta era, na verdade, a sua ambição. Mas circunstâncias di versas, financeiras, profissionais, familiares, o afastaram sempre do seu grande sonho de dirigir filmes. Apesar disso, deixou quatro longasmetragens realizados com muito esforço através de três décadas: Chão Bruto, de 1958; o Anjo Assassino, de 1965; A Virgem, de 1973 e uma refilmagem do Chão Bruto, com Adriano Stuart e Regina Duarte, de 1975. O primeiro Chão Bruto foi um filme preto e branco, baseado no romance homônimo de Hernani Donato, produzido com sacrifício, pouquíssimos recursos e uma locação que foi uma vida. Real-mente não posso precisar o tempo exato da sua duração. Tudo o que sei é que praticamente mudamos do Sumaré para São João da Boa Vista e lá ficamos por um período que nos pareceu, a mim e a meu irmão, como interminável. Como ainda não frequentávamos escola, a família foi inteira para o interior. Moramos a princípio na casa de uma família da cidade e as minhas recordações dessa época são, como outras desse tempo, de fragmentos soltos. Vejo nitidamente meu irmão na janela que dava para a rua numa noite, seguro por minha mãe, enquanto riscava fósforos de cor, pois devia ser alguma festa junina. Então um fósforo caiu dentro da sua bota e foi um corre-corre danado. Das filmagens mesmo recordo pouca coisa: dois caminhões pequenos que serviam para levar as câmeras, holofotes e adereços cênicos para as locações mais distantes e da marmita que vinha forrada até a boca com comida para os técnicos; de meu tio Jorge, assistente de meu pai, jogando escravos de Jó num intervalo. E de horas e mais horas numa região de pedras e vegetação árida, dos rebatedores de luz, de uma cena em que um dos atores era atingido por tiros e caía estrepitosamente no meio das pedras para, depois do corta!, levantar e seguir calmamente espanando a terra da calça, coisa que, por algum motivo, achei muito engraçado. E lembro, principalmente, de meu pai com olhar siderado, correndo por todos os cantos da locação, gritando, falando, enfim, dirigindo. A sua imensa vitalidade criativa, o seu entusiasmo com o trabalho sempre foi uma marca muito forte da sua personalidade. Da casa na cidade, por alguma razão, fomos transferidos para uma fazenda um tanto soturna e, segundo minha mãe, de maus agouros. A sala era escura, cheia de móveis velhos e dava para a cozinha através de uma escadinha de três degraus, na qual minha mãe levou um tombo segurando o Noel e ficou com o pé torcido, enfaixado, o que paralisou as filmagens, pois ela era a atriz principal. O clima no set de filmagem não era dos melhores. Dificuldades de toda ordem cercavam a realização do filme, desde verbas até relacionamentos pessoais. Então minha mãe mandou chamar a Dulce, uma ajudante que trabalhava conosco no Sumaré. E como não havia nada, nada, para se fazer o dia inteiro, o negócio era ficar brincando por uma área cheia de canaletas fundas que deveriam servir para o escoamento de algum grão, provavelmente café. Podíamos caminhar dentro daquelas canaletas, sem que nossa cabeça aparecesse para fora, por metros e metros de terreno. Era um ótimo cenário para as brincadeiras mais diversas. Na fazenda também havia um cão gigantesco, não recordo de que raça, mas muito feroz – tanto que vivia enjaulado durante o dia. Soltavam-no ao escurecer e ele aterrorizava as noites com seus latidos e rosnados. Então meu pai retornava exausto da locação, com a cabeça cheia de problemas e ficava revisando o roteiro, fazendo contas. Numa tarde, quando todos saíram para as filmagens, me deixei levar pela imaginação correndo pelas canaletas e não percebi que todos já tinham ido embora. Quando dei por mim, a luz do dia declinava e vi o vulto do cão ao longe, já solto, caminhando pela fazenda. Pensei em sair correndo, mas um pavor profundo me congelou. Já haviam fechado a porteira que separava aquela área de plantio da casa da fazenda e eu não sabia o que fazer. Olhei uma vez mais, apenas com a testa para fora e lá estava o cão indo e vindo ao longe. Temia que ele viesse para próximo das canaletas e me agachei bem no fundo, aterrado como nunca me lembrei de ter ficado na vida. A noite caiu e da minha posição podia perceber algumas luzes do terreno e da casa sendo acesas. Pessoas passavam gritando pelo meu nome: minha mãe, a Dulce, meu pai, mas eu não podia responder, pois tinha medo de que o cão, ouvindo a minha voz, corresse em meu encalço. Parecia que aquele momento não ia terminar nunca mais. Pude distinguir a voz cada vez mais aflita da minha mãe, até que senti alguém dizer meu nome mais próximo. Era a Dulce que viera até as canaletas por puro instinto e puxou a minha mão. Ele está aqui!, gritou. A reação da minha mãe foi uma mistura de alívio e raiva. Levei uns belos tapas na bunda e fui direto para a casa onde achei por bem permanecer por algum tempo em total anonimato. Noel também não estava bem, choramingando muito. Esta cena, embora não tenha relação direta com a filmagem, traduz um pouco o clima final da mesma, ou a forma como os menores captam o universo adulto através da atmosfera ambiente. Meus pais discutiam. Minha mãe parecia exausta com o filme que não acabava mais. Nossa casa no Sumaré estava abandonada, com meses de aluguel atrasados. Não se tinha mais dinheiro para nada. Uma situação realmente grave. Revendo na memória hoje em dia, apenas imagino a luta que foi realizar o grande sonho do primeiro filme. Depois de muitas dificuldades, meu pai conseguiu terminar as filmagens e voltamos para a Rua Bruxelas completamente descapitalizados. O filme rendeu ao meu pai um troféu Saci de melhor roteiro, dado pelo jornal O Estado de S. Paulo, mas não teve retorno financeiro algum, o que o deixou um tanto desestimulado e sem fôlego para uma nova aventura. Somente depois de sete anos ele foi dirigir seu segundo longa, O Anjo Assassino, baseado na novela A Outra Face de Anita, que minha mãe tinha acabado de protagonizar na TV Excelsior. A novela era da Ivani Ribeiro, mas quem fez o roteiro cinematográfico foi o Lauro César Muniz. Além de minha mãe atuaram no filme Raul Cortez, Egídio Eccio, Edson França, Carlos Adese e David Netto, entre outros. A trilha sonora foi do Chico Buarque de Hollanda, e ganhou um prêmio num festival. Essa locação, toda feita na cidade de Itu, foi igualmente longa e com orçamento apertado, mas sem tantos problemas como no filme anterior. Como eu e meu irmão já estávamos na escola, não foi possível acompanhar meus pais o tempo todo durante as filmagens. Minha tia Edna e seu marido José Delfino vieram passar uns tempos na casa da Bruxelas para que meus pais pudessem filmar tranquilos, enquanto nós prosseguíamos nossa rotina escolar. Mas sempre que havia um feriado prolongado, minha mãe vinha nos buscar e lá íamos nós para a locação. Não houve em Itu aqueles momentos aflitivos da locação anterior. Ao contrário, era divertido ficar no set, ver todo o trabalho que antecede uma tomada de cena, a iluminação, a preparação dos atores. Muitas cenas foram feitas numa fazenda bonita, cedida de bom grado por um senhor muito simpático e atencioso, o que piorou o constrangimento do meu pai quando um dos técnicos, ao carregar uma tapadeira, espatifou um vaso da casa. Uma coisa interessante das locações é a relação que se cria entre a comunidade e a equipe de filmagem durante um determinado tempo. Minha mãe naquela época teve a ideia, que infelizmente não concretizou, de escrever um roteiro sobre uma equipe de cinema que chega a uma cidade pequena, transforma a vida diária e as relações das pessoas, indo embora ao fim. E o que aconteceu em Itu já era mesmo quase um roteiro. Hoje em dia talvez isso não seja tão evidente, pois atores e cantores viajam muito com peças de teatro, shows e existe mais interação em toda a parte. E também a televisão e as diversas mídias novas deixaram as distâncias mais curtas. Mas naquele tempo a aparição de uma equipe de filmagem alterava completamente todo o cotidiano de uma cidade, criando situações inesperadas. Desde um diz que diz diário que percorria toda a população até romances passageiros entre moças locais e técnicos, com direito a cenas de ciúmes. Um dos atores, o Edson França, apaixonou-se na época por uma moça da cidade e chegou a casar-se com ela. A cidade, orgulhosa por abrigar uma locação e ciente de que seria citada nos créditos, comprava o filme, com a população colaborando alegremente com tudo o que podia, desde participações em cenas de multidão até empréstimos de casas, móveis, e o que mais pudesse auxiliar a equipe técnica. Foi um período longo de trabalho, por conta de verbas, e meu pai ao percorrer fazendolas para encontrar locações adequadas, acabou comprando vários móveis rústicos, antiguidade mesmo – coisas de até dois séculos atrás – que estavam em casas antigas e eram consideradas pura velharia. Estes móveis acabaram indo lá para a Rua Bruxelas e tornaram-se parte da nossa casa para sempre. Aconteceu, lá pelo meio da filmagem, de um rapaz da cidade morrer afogado na piscina de um clube, mas enquanto ainda não havia encontrado o corpo, a polícia local emprestou os holofotes para uma busca noturna. E lá se foram, equipe e pessoas da cidade em grande tensão até que acabaram por encontrar o rapaz. Era um jovem muito conhecido, inclusive da equipe técnica, e a notícia gerou grande comoção, estreitando mais ainda os laços da cidade com o pessoal do filme. E chega sempre uma hora em que o filme termina em qualquer locação e surge um sentimento melancólico, de despedida: houve um apego à família do seu Joel que nos hospedava e que acabou ganhando uma ponta como jurado na cena de tribunal. Nessas horas laços afetivos menos duradouros são rapidamente desfeitos. Caminhões levam toda a tralha cinematográfica. A cidade sente uma leve nostalgia pela rotina tumultuada dos dias de filmagem. O jornal local publica alguma matéria sobre aquela temporada desejando sorte ao filme. E o povo de cinema, os técnicos, os atores, habituados a essas mudanças, preparam-se para invadir uma nova locação. Quanto a meus pais, voltaram para o destino de sempre: a Rua Bruxelas, no Sumaré. Capítulo XIII A Rua Zaíra Mas havia também, além desse Dionísio da televisão e do cinema, o Dionísio do teatro. E esta foi sempre foi uma de suas paixões: estar no palco, fazendo jus ao pseudônimo escolhido a dedo por ele mesmo. Aliás, foi exatamente essa paixão pelo teatro que o fez adaptar obras de Shakespeare e Pirandello para o TV de Vanguarda. Desde 1949 e até o fim da vida nunca deixou os tablados, mesmo quando já se encontrava debilitado fisicamente. Atuou em várias montagens importantes do teatro paulista, fazendo desde peças brasileiras de Abílio Pereira de Almeida como Círculo de Champagne eo Bezerro de Ouro, até clássicos da dramaturgia contemporânea, comédias diversas e espetáculos experimentais, teatro da mais pura vanguarda, como foi o caso da sua participação nas montagens de Victor García, O Balcão (1970) e Autos Sacramentais (1974). Um dos seus momentos mais marcantes em cena foi a atuação como Willy Loman em A Morte do Caixeiro Viajante, (1962) de Arthur Miller, no Teatro Brasileiro de Comédia, o TBC, juntamente com Cleyde Yáconis, direção de Flávio Rangel. Na terceira parte deste livro estão listados esses e outros de seus trabalhos nos palcos. Assim, lá pelos meados dos anos 1960, meu pai atuava numa intensidade muito grande em di-versos campos. Fazia simultaneamente televisão, teatro e cinema. Sempre lembrando que ele exercia a função de diretor artístico da Excelsior, ou seja, responsável não apenas pelas novelas que dirigia, mas por todas as outras. E cumpria com zelo essa função, colaborando na criação, no acompanhamento minucioso do projeto cenográfico, escolha de atores e tudo o que envolve a logística de uma telenovela. Num mesmo ano atuou na mencionada montagem do TBC, e fez o O Pagador de Promessas, único filme brasileiro a ganhar a Palma de Ouro em Cannes. Toda essa atividade coroava três décadas de dedicação ao rádio, ao cinema, ao teatro e à televisão. Foi então que juntamente com minha mãe, resolveram que era hora de sair da vidinha de aluguel e adquirir uma casa própria. Mas não queriam mudar de bairro, pois os dois continuavam apegados ao Sumaré, como, aliás, outros artistas daquela primeira hora. Depois de idas e vindas acabaram por descobrir uma casa que estava sendo construída na Rua Zaíra, na parte mais baixa do bairro, próxima à recém-inaugurada Avenida Sumaré. A casa representou uma espécie de conquista, ainda mais recordando todas as dificuldades daqueles anos. Ela se situa bem próxima ao trecho onde, anos antes, se erguia o campo de futebol do Sumaré Futebol Clube soterrado pela então moderna avenida. Eu e meu irmão chegamos a jogar ali e até hoje trago uma pequena cicatriz na mão feita por um caco de vidro ao apanhar uma bola que tinha ido parar num charco. Aliás, toda aquela região mais baixa do bairro era repleta de brejos e charcos naquele tempo. Ainda no final dos anos 1960 e início dos 1970, era possível dormir ouvindo o coaxar de sapos. Nosso quarto, nos fundos da casa, dava para um desses brejos habitados por não sei bem se sapos, rãs ou outro tipo de batráquios. Uma cantoria alta e desenfreada varava a noite. Uma vez, descendo a Zaíra de volta da escola, deparei com um sapo enorme no meio da rua, inflando o papo, perplexo com aquele mundo urbano erguido tão rapidamente em torno do seu antigo império. Aos poucos foram sendo expulsos e, já em meados dos anos 1970, não se ouvia mais o coaxar que embalava o sono. Nossa nova residência era maior que a da Bruxelas e arejada. Mudamos para lá em julho de 1969, a tempo de testemunhar naquela casa a descida do homem na Lua. Ficamos contentes, embora a lembrança da casinha da Bruxelas deixasse saudades. Por aquela época, meu pai dirigia uma novela e meu irmão Noel pediu para trabalhar. Como havia um papel pequeno, de uma criança, ele conseguiu o trabalho, que era remunerado. Foi uma surpresa para nós. Noel e eu já fazíamos um curso de pintura para adolescentes, na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e gostávamos bastante de pin-tar. Tenho até hoje umas telinhas que ele fazia. Mas ele nunca tinha demonstrado nenhum interesse maior pela carreira de ator, mesmo porque era um menino. O fato é que meu pai ficou animado com o desempenho dele. Com o seu primeiro salário ele comprou uma bicicleta e já saiu para explorar o bairro. A Avenida Sumaré, recém-inaugurada, era praticamente deserta. Apesar de iluminada por uns postes com um desenho moderno, diferente dos sistemas de iluminação das avenidas mais tradicionais, não havia ainda em toda a sua extensão nenhum comércio. Portanto, ideal para aqueles que gostavam de velocidade e de emular os heróis da Fórmula Um. O fato é que um carro surgiu repentinamente, acelerando de modo frenético e atingiu a bicicleta do meu irmão em cheio. Ele não resistiu ao choque e veio a falecer no hospital, com a idade de 14 anos, produzindo um baque fundo nas nossas vidas. Capítulo XIV Noel Quando Noel nasceu eu tinha 3 anos, e nas lembranças mais antigas sua presença já era uma rotina na minha vida. Era um estar sempre lá. E tudo o que se fazia, era para se fazer juntos: sentávamos para almoçar e para jantar, tomávamos o lanche à tarde e assistíamos à televisão que, mais do que um entretenimento, era o ganha-pão de nossos pais. No nosso quarto, sua cama ficava ao lado da minha e toda a manhã eu tinha de despertá-lo dizendo: Noel, acorda pra escola!, com a voz empastada de sono. E quando bem pequenos abaixávamos a cabeça no banco de trás do carro, quando ele beirava o precipício cheio de neblina das curvas da Anchieta. Também juntos nós saíamos de casa nos finais de tarde mastigando, apressados, um pedaço de pão com manteiga, na direção dos campinhos ou da rua para jogar bola. Embora não fôssemos especialmente belicosos e nos déssemos bem a maior do tempo, não podíamos deixar de brigar e discutir pelas coisas que os irmãos constantemente brigam e discutem. Tanto que um dia o ouvi comentar com nosso vizinho, que era filho único: Você que é sortudo! Como eu era mais velho em geral ele me seguia. Quando resolvi torcer para o Santos, ele também se tornou santista. Quando comecei a me interessar por artes, ele também se animou. Mas apesar da diferença de idade, nós falávamos sempre de igual para igual e a sua sensibilidade era muito grande para perceber as coisas. Porque tínhamos que dividir absolutamente tudo. Nada que um ganhasse o outro deixava de ganhar. Nada um fazia sem a sombra do outro. E eu sabia que devia esperá-lo no fim das aulas, no portão do Liceu, para subirmos juntos a Alfonso Bovero voltando para casa. Muitas vezes eu andava com meninos mais velhos. Mas era difícil que ele não estivesse ao alcance do olhar. E não que isso fosse algo imposto. Era tão somente a disposição natural das coisas. Nós gravitávamos juntos em torno da nossa infância. Os olhos do meu irmão eram azuis, coisa estranha, pois as duas famílias tinham olhares castanhos. Minha mãe dizia que os olhos do meu avô Francisco eram azuis e talvez daí venha esse seu sinal tão característico. Com o passar dos anos, Noel se tornou uma ausência presente em cada dia. Não teve época em que não eu calculasse quantos anos ele teria agora, ou o que poderia estar fazendo se estivesse vivo. E então aquilo que na infância era uma simples rotina de ter irmão, tornou-se um desejo de atualização impossível, a não ser através da memória. E ela traz de volta uma ceninha cotidiana: quando a casa da Zaíra ainda não estava pronta, Noel, minha mãe e eu fomos até lá para inspecionar o andamento da pintura, ansiosos pela mudança. Subimos até o quarto que dava para a parte de trás de casa e ficamos olhando pela janela que, àquela época enquadrava, além de um charco, um pequeno morro de terra avermelhada, morro que muitas vezes tínhamos escalado nas nossas expedições pelo bairro. Então o Noel saiu correndo freneticamente e, deixando a casa, deu a volta no quarteirão. Em pouco tempo eu e minha mãe já o víamos, ao longe, galgando habilmente o costado do morro. Quando chegou bem no topo, virou-se em nossa direção e acenou alegre e vitoriosamente. E este aceno ficou na lembrança. Para sempre. Capítulo XV Vida que Segue Para meus pais foi preciso grande força e fé para tocar a vida para a frente. Nunca havia visto meu pai daquele jeito: alguma coisa parecia ter implodido dentro dele, por aquela que talvez seja uma das dores mais difíceis de suportar. Minha mãe praticamente se distanciou da carreira artística. Focou suas energias em outros campos. Apenas depois de muito tempo voltou a atuar, quando convidada, em alguma peça ou novela. Mas era sempre mais uma participação, sem o compromisso anterior em levar a cabo seriamente uma carreira. E ela havia sido uma das principais atrizes da televisão durante os anos 1950 e 1960. Mas era uma mulher corajosa, apesar da aparência frágil. Recordo dela dirigindo o carro, qualquer que fosse a marca da hora. Ela dirigia melhor que meu pai e com o tempo foi assumindo de vez a direção dos veículos. Foi muito chamada para ajudar este ou aquele, levando e trazendo gente em todo tipo de situações, algumas delas beirando um episódio de Indiana Jones. Como quando, chamada por uma amiga atriz, foram as duas ajudar uma terceira que, numa crise de depressão, ameaçava se atirar pela janela do seu apartamento. As duas tiveram que segurá-la pelas pernas e depois levá-la a uma clínica. Outros casos assim ocorreram, com amigas, parentes, e mesmo conhecidos. Ela parecia estar sempre naquele volante, buscando alguma coisa, levando alguma ajuda. Mesmo no auge dos seus trabalhos como atriz não houve um momento que tivesse se descuidado de casa, sempre organizando tudo, tomando nossas lições, feito contas. Recentemente descobri um velho caderno, todo amarelado, com continhas a lápis para uma festa de aniversário nossa muito antiga. Era um evento complicado logisticamente, pois se tratava do único momento em que a gente do Tucuruvi e do Belém se encontrava no Sumaré e a nós parecia que os primos brotavam das esquinas numa floração espontânea. Lutou bravamente com a doença que a levou também tão depressa aos 60 anos. E sempre manteve o humor, a alegria, a ponto de quando encontramos hoje em dia com suas velhas amigas, todas não param de falar na falta que sentem da Floripes. Já meu pai prosseguiu sua carreira, apesar do baque, até por motivos práticos. Era necessário sobreviver, em todos os aspectos. Não trabalhou mais como diretor na televisão, o que não deixou de ser uma frustração, mas teve grandes momentos como ator. Um momento especialmente marcante foi quando Pelé, que gostava muito dele, até por serem mineiros, o convidou para um jogo beneficente na Vila Belmiro, juntamente com outros atores e jogadores. Quando o nome de Dionísio foi anunciado pelos alto- falantes, grande parte da plateia passou a cantar uma canção tema de uma novela em que ele fazia o Velho Gui, e que estava fazendo enorme sucesso na época. Mas um dos momentos mais populares, sem dúvida, foi a sua participação numa novela da TV Globo, O Astro, escrita por Janete Clair, em que interpretou o papel de Salomão Hayalla, um marco de audiência no fim dos anos 1970. E prosseguiu atuando em diversos projetos, fossem televisivos, cinematográficos ou teatrais, por mais de duas décadas e meia. Teve até o fim uma carreira longa e bem- sucedida. O carisma da sua imagem foi sempre poderoso. Mesmo nos tempos finais, quando ele estava afastado do vídeo, era reconhecido até por pessoas bem jovens, o que sempre me espantou. Durante toda a sua vida profissional esse carisma e a credibilidade de seu trabalho como artista abriram portas para inúmeros projetos que não seriam feitos sem ele, como foi o caso de O Tempo e o Vento, na Excelsior, ou do ciclo de novelas da Record, para o qual o Paulo Machado de Carvalho fez questão absoluta da sua participação, uma vez que a emissora não tinha know-how nesta área. Creio também que ele gostaria de ser lembrado por ter dado a primeira oportunidade – com aquele entusiasmo de que era possuído ao ver um rosto ou uma personalidade que o encantava –, para muitos atores, que desenvolveram depois belas carreiras. Na terceira parte deste livro procurei dispor em ordem cronológica a incrível quantidade de seus trabalhos no teatro, no cinema e na televisão, tanto dele, como de minha mãe. No último ano de vida, já impossibilitado de trabalhar, recebeu o título de Cidadão Paulistano na Câmara dos Vereadores, das mãos de seu amigo Alberto Calvo, o que foi algo realmente simbólico naquela altura: enquanto assistia à cerimônia, vendo-o receber o diploma com os cabelos brancos, sua marca registrada, aflorou à memória o que ele contava sempre sobre a sua chegada, ainda menino em São Paulo. O olhar assombrado que lançou até os arranha-céus de então, como o edifício Martinelli e para os bon-des levando as multidões urbanas pelas ruas no início dos anos 1930. Minha mãe também recebeu uma homenagem póstuma: uma rua da cidade se chama Flora Geni e penso que ela acharia certa graça nisso – ela que vivia dirigindo por essas mesmas ruas. Com certeza teceria algum comentário sobre este fato com aquele humor bem espanhol, muitas vezes ácido. Mas, mais importante do que essas homenagens oficiais, pelo menos para mim, é a recordação vívida dos dois, das figuras humanas que eles foram com seus defeitos e qualidades, suas marcas pessoais e que fizeram deles pessoas maravilhosas de verdade. Uma última lembrança que fica também como um tributo: eu levava meu pai ao hospital para um exame, quando uma desconhecida senhora de meia-idade reparou nele. Aproximou-se com certo receio e perguntou polidamente se ele era o Dionísio Azevedo. Ele acenou afirmativamente num meio sorriso, e a senhora então, sem saber mais o que dizer, permaneceu um tempo fitando o seu rosto e sorrindo também de modo encorajador. Depois disse apenas, baixinho: Obrigada, Dionísio, e se retirou, como alguém que não quer perturbar. Aquilo o tocou bastante. Foi uma cena rápida, singela, sem nada de muito especial ou grandioso, mas para mim foi como se a simpática mulher representasse naquele pequeno momento particular o público, aquele público anônimo a quem todo o ator no fundo quer comover, ou receber o aplauso sincero, direto, que realmente interessa, e pode ser o propósito de uma vida. E para fechar o Sumaré e suas crônicas: permanecemos na casa da Zaíra que com o tempo sofreu diversas reformas. E o Sumaré também mudou, claro. Como todos os bairros da nossa cidade ele foi atingido pelo processo praticamente irreversível da verticalização. Pude acompanhar tão perplexo quanto o sapo na calçada uma floração arquitetônica de prédios irem gradativamente tomando os espaços no entorno da nossa casa. Logo que nos mudamos para a Zaíra, a Praça Irmãos Karmann – na qual a nossa rua deságua e que se interpõe entre ela e a Avenida Sumaré –, apesar de asfaltada, era vazia e escura, com suas grandes árvores. Quando voltava para casa à noite, descendo de algum ônibus na avenida, tinha que atravessar o que chamava de buraco negro, pois era assim que parecia: uma praça sem iluminação, na qual uma vida secreta coaxava à minha passagem. Hoje a praça está inteiramente iluminada, repleta de comércio, padaria, academias de ginástica, de tênis, jornaleiros, pontos de táxi. E em toda a sua volta formidáveis edifícios se ergueram como gigantes mirando através dos seus mais altos andares o horizonte que eles mesmos nos roubaram: o Pico do Jaraguá e outros contornos que levam para fora da cidade. Como muitas outras pessoas daquele tempo, fiéis ao bairro, moro ainda no Sumaré neste início de milênio, com minha esposa Tatiana e com a minha filha Beatriz que, enquanto escrevo essas linhas, está com 15 anos e caminha por ruas que eu e meu irmão caminhávamos quando crianças. O Sumaré ainda respira um ar artístico. Os prédios que abrigavam a Rádio e a TV Tupi, agora hospedam a ESPN Brasil e a MTV. Ao lado deles fica a Real, padaria que durante décadas foi o ponto de encontro dos artistas da Tupi, hoje um restaurante e casa de lanches muito frequentada pelos moradores do bairro. Em frente à Real fica o Parque da Sabesp. Na nossa infância era simplesmente a Caixa d´água e não se podia transpor aqueles muros. Não sei a partir de quando ele foi aberto ao público e se tornou um ponto de referência de lazer para as famílias, que levam os filhos pequenos e para os que gostam de caminhar. Muitas vezes vou dar umas voltas por aquelas alamedas e em alguns dias é como se as diversas camadas da memória deslizassem revelando a topografia do tempo: na frente da MTV adolescentes histéricas gritam por causa da presença de algum cantor, cena bem habitual na região. E eu vejo meus pais entrando na Tupi com aquelas roupas do fim dos anos 1950. Um flash-back típico de roteiro de cinema, com direito, talvez, a uma fusão… Parecem duas eras tão distintas, por causa da tecnologia e das mudanças de comportamento. Mas se tem algo que a arte teatral ensina é que tudo isso são apenas figurinos, o que fica mesmo são os perenes sonhos e dramas, as coisas da alma. E que, no fundo, no fundo, parafraseando o já velho verso: Apesar de tudo que fizemos seremos sempre como nossos pais. Dionísio Jacob Sumaré, São Paulo Maio 2000 – Janeiro 2010 Depoimentos Depoimentos Gravados de Lima Duarte, Fernando Faro e Benedito Rui Barbosa Tanto o Lima Duarte, o Fernando Faro, como o Benedito Rui Barbosa representaram para meus pais, em épocas diferentes, aquela amizade em que o lado profissional e o afetivo se misturaram de um modo mais profundo. Em que, mais do que colegas de trabalho, foram amigos de vida, de compartilhar vidas familiares, de crescimento conjunto. E apesar de esses três depoimentos não possuírem uma intenção cronológica, de ter mais o jeito de uma fala correndo solta, cobrem vários períodos fundamentais. Com Lima, há todo o momento inicial de descoberta, os anos de juventude, a época de solteiros, o rádio, a TV Tupi, as coisas engraçadas e comoventes que ocorreram e que ecoaram por toda a vida. Além disso, durante a época da Rua Bruxelas, a casa dele era colada à nossa, de modo que a intimidade entre as famílias era inevitável e vivíamos uns na casa dos outros, convivendo com ele, com a Mônica, a Débora e a Marisa Sanches. A mesma coisa se pode dizer do Faro, o baixo, ou baixinho, como ele é chamado pelos amigos e como chama a todos eles – e da sua família, a Iara, a Zezé, a Zu, o Zezinho e a Fernanda. Com o Rui o relacionamento se inicia nos anos 1960, já na TV Excelsior e se estica pelas décadas posteriores, com trabalhos conjuntos e pioneiros feitos na TV Record, na TV Cultura e na TV Bandeirantes, até meados mais ou menos dos anos 1980. E que se refletiu igualmente na estreita amizade que se deu entre as famílias, com a sua mulher Marilene e os filhos Edmara, Edilene, Ruizinho e Marcelo. Depoimento de Lima Duarte Depoimento gravado de Lima Duarte feito para Dionísio Jacob e Tatiana Nogueira, no dia 11 de janeiro de 2010. Sobre os Tempos do Rádio e os Primeiros Contatos – Bom, eu comecei a trabalhar em 1947, tinha 17 anos, eu tenho 80 agora… 17 anos! E foi bem curioso porque… bem… eu cheguei no caminhão, de Minas, aquela história, também era mineiro como o Dionísio. E… um dia uma mulher me levou lá pra fazer um teste lá, fiz o teste… Fui reprovado… Fiquei operador de som. O fato é que um dia quando eu comecei a trabalhar na Tupi… eu vou entrando na Tupi, já trabalhando de operador, lá… e o Dionísio foi a primeira pessoa que me olhou com carinho mesmo, com curiosidade, assim. Ele parou, assim e disse: O que você faz? Eu disse: Eu trabalho aí, como operador…– Ah, é?,– É.– Então muito bem. Eu sou o Dionísio… muito prazer… Então foi a primeira pessoa que me marcou, e ficou um grande amigo meu. A minha vida se confunde com a dele. Nós fomos sempre tão amigos que resolvemos morar vizinhos… E… e tinha uma mulher lá na Teodoro Baima… Você já ouviu falar da Marieta? Ah, a Marieta era muito legal… Aliás, a Marieta tinha uma casa na Teodoro Baima, vizinha do Teatro de Arena, e ela tinha umas jovens lá, caridosas… que nos acolhiam, tal. E era meio ainda no tempo da guerra, e o Dionísio pegava açúcar lá, delas. Aí ele saía lá da casa delas com um pacotinho e eu dizia: O que é isso, Dionísio? E ele dizia: É açúcar… a cota delas é muito grande, eu vou levar pra minha mãe… Ele tinha muitos irmãos… E eu: Mas você toma açúcar da Marieta? – Tomo. Ela não precisa… E eu tinha uma mulher lá também, todos nós de rádio tínhamos uma na casa onde o Dionísio era o… bem, você sabe… a Marieta e coisa e tal! Então foi um tempo tão lindo, desses de descoberta, do amor e… vindo com o sexo e tudo e… tomar açúcar dela! Isso me marcou muito… E mais pra baixo um pouquinho morava o Oduvaldo Viana, outro grande amigo e assim um grande fã do Dionísio. O Oduvaldo adorava o Dionísio! E o Dionísio nesse tempo era talvez o maior radioator do Brasil, porque ele tinha uma voz privilegiada… Era famoso pela voz… Uma voz sonora… Eu me lembro que ficou famoso na época… era uma novela do Oduvaldo chamada Suspeita… E ele falava… lá pelo meio ele falava (Lima imita o tom do radioteatro) Suspeita… Ficou famoso! Todo mundo repetia… ah, esse é o homem da Suspeita… era o Dionísio Azevedo. Nós gravávamos também uma série para o radioteatro… tudo radioteatro, né? Pra Rádio Nacional do Rio de Janeiro, ele era o Vingador e ele também dizia muito bem… aqui em São Paulo… Ninguém sabe o mal que se esconde nos corações humanos. O Sombra sabe! Ele era a voz do Sombra! E eu sei… tomava açúcar da mulher! Então, nós fomos tão felizes, fomos tão amigos, rapaz… Os carros que ele comprava, eu palpitava. Ele tinha um Skoda… é… Skoda… Ele dirigia e a Flora dava palpite e ele falava: Dirige você então! Ela dirigia melhor que ele… Sobre o Início da Teledramaturgia – Mas viu… e uma coisa também que me marcou no Dionísio é que ele… ele mexia muito com teatro. Todos nós éramos, afinal, cinéfilos. Então eu acho que a teledramaturgia de modo geral hoje deve muito a duas… a três pessoas! Walter Durst, Dionísio Azevedo e Péricles Leal. Eles cunharam a teledramaturgia. Toda a teledramaturgia que pauta ainda hoje, o que se faz ainda hoje foi feito por Dionísio Azevedo, Péricles Leal e Walter George Durst. O Dionísio… A Vida Alves deu o primeiro beijo na televisão, eu fui o primeiro bandido, mas ele fez o primeiro Shakespeare. Isso, sim, é maravilhoso. O Dionísio fez o primeiro Shakespeare da televisão, que foi o Hamlet, num TV de Vanguarda. Fez também o primeiro (TV de Vanguarda) que foi o O Julgamento de João-Ninguém, que foi ele quem dirigiu. E… e… o primeiro Shakespeare… e eu era o Hamlet. Eu era o Hamlet! Ah, e teve o Calunga! Calunga foi um grande sucesso. Um grande sucesso! Foi uma adaptação do Walter Durst, para o Jorge de Lima, né? E o Dionísio fez um sucesso pessoal muito grande. Ele fazia um aleijado, sempre numa rede e eu o rapaz que queria mudar lá, tudo… Queria pelo menos que as pessoas parassem de comer barro. Foi um momento marcante, né? Marcante… marcante! Foi definitivo. Dois, pra mim, foram… Foi o Calunga e… como chamava… um de um autor colombiano, o Manuel Robles, eu era um soldado assim de esquerda, era… a prisão do Simon Bolívar. Esqueço o nome… ah! Era Massacre! Massacre foi um grande sucesso, porque o Massacre… não sei por que o Hugo Chaves ainda não fez esse filme… Bolívar e a caminhada libertária dele aí pelas Américas. E a gente usava muito como metáfora do Brasil de então, oprimido, preso, em busca de liberdade, lutando… E a gente fez muito sucesso no TV de Vanguarda. Foram dois grandes sucessos. Os Problemas com a Televisão ao Vivo – Tínhamos uma semana pra decorar (Shakespeare). E olha lá… É, uma semana. E o grande problema do Dionísio, por exemplo, era ensinar o Astrogildo Filho que fazia o Rei, o King Claude, a pronunciar corretamente: Hamlet. Ele falava Ramlet! Ramlet! Então o Dionísio passou um bom dia tentando… E isso tendo só uma semana pra ensaiar e você tem que ensinar o ator a dizer Hamlet… Era muito difícil, muito difícil… A gente terminava o TV de Vanguarda no domingo à meia-noite, e vinha o momento fugaz de glória, lá, na segunda-feira pela manhã: ... Parabéns, parabéns! E às duas horas já tinha ensaio da outra. Era uma loucura… A escolha do texto era meio pessoal. O Dionísio cismava de fazer um… Ele dividiu mais ou menos o TV de Vanguarda com o Durst, né? O Cassiano era diretor de TV. Cortava. Mas quem adaptava mesmo era o Durst, que fez a maioria. E o Dionísio, mais ousado. Ele fez o Macbeth, também, né? E o Matraga! A Hora e a Vez de Augusto Matraga… primeiro Guimarães Rosa! O Guimarães Rosa… a edição do Sagarana é de 1936, a primeira. Então… em … 1952… por aí… a gente já lia… e já achava um encanto pois nós éramos lá de Minas. E nós nos reuníamos na casa dele ou na minha, nós éramos vizinhos, pra ler o Sagarana. Conversa de boi. A Hora e a Vez de Augusto Matraga. O duelo. Todos, né… os contos do Sagarana… A volta do marido pródigo… Ele queria fazer A Volta do Marido Pródigo… E ele fez o primeiro Guimarães… E tem aquela famosa história da dedada. Foi na época da TV ao vivo, né? É porque os revólveres nunca funcionavam. Naquela época nunca… E eu ia… a sua mãe ia comigo, a sua mãe era minha companheira… nós servíamos no bando dele. Isso é uma adaptação do Péricles Leal. Um original do Péricles Leal, chamado Terra em Fogo… uma coisa assim. E nós servíamos no bando de Antônio Silvino, que era o leão da Serra da Borborema, foi o precursor do Lampião. No bando de Antônio Silvino é que Lampião começou. E ele (Dionísio) era o Antônio Silvino. E eu era um cangaceirinho que estava roubando dele. Mas depois eu conheci sua mãe, a Flora, e me apaixonava e ela também… Então eu resolvi abandonar o bando. Nesse ínterim o bando foi traído e ele pensou que fosse eu. Falava: (imita) Aquele safado… aquele cabra safado… agora nós vamos matar ele… Eu sei que na hora do êxodo, que muita gente vem pro Norte… quer dizer, pro Sul… eu e sua mãe com as baturinhas… eu chego assim no terreiro da minha casa… olho e lá vem o bando do Antônio Silvino entrando, aquela tomada famosa: mostra as alprecatas (alpargatas), e a câmera vai subindo, vai subindo, até chegar na cara de Antônio Silvino. E eu digo: Padinho… Chamava ele de padinho. E ele puxou o revólver… E eu padinho? e ele… tec! Falhou. E eu digo padinho? E ele, tec! Falhou! E eu padim? Tec! Ah, safado… o Dionísio disse. Você vai é aqui na faca mesmo. E puf! Era só o cabo da faca! E eu lá padim, padim, padim… E ele: Algum cabra aí me dê uma arma! E não tinha nenhum cangaceiro armado! Era tudo de pau! E eu padim, padim. E ele: Tu vai aqui ó safado é… puf! (Lima faz o gesto de enfiar o dedo na barriga) E eu morri de dedada! Morri gemendo. Depois eu tenho morrido várias vezes, mas de dedada nunca mais. Sobre a Amizade nos Tempos Difíceis – Mas… o Dionísio… nós nos amávamos muito, muito mesmo. Você sabe, né… sua mãe, as minhas filhas… Crescemos todos juntos… desde aquele olhar que ele me deu em 1947, que eu não pude me esquecer nunca, foi muito acolhedor… eu era um menino, vindo da roça… e precisando trabalhar… e ele me apresentou pro Oduvaldo… me apresentou pra Marieta… e eu andava carente de Marietas… … e eu tive lá também a minha companheira (Lima ri). E também conheci muito sua família, sua avó, ia muito lá no tempo do bonde ainda… tinha um bonde Rubino de Oliveira que a gente pegava e ia lá. Mas então foi isso… Eu acho que toda a televisão, a dramaturgia de um modo geral é muito Dionísio… E ele era muito sonhador… Como ele sonhava! Como ele… procurava realizar os sonhos. Era tão bonito. Ele vivia isso. Só falava isso, né? Uma pessoa muito linda, muito linda. E, naquele tempo, muito cinéfilo, ele fez curso com o Lima Barreto… era muito amigo do Lima Barreto e o Lima Barreto consultava muito ele, ele participou da elaboração do roteiro (de O Cangaceiro). Eram tempos difíceis. Eles não pagavam (na Tupi), atrasavam três meses! A gente tinha família, né? Eles pagavam… tinha a EletroDisco, era uma casa de eletrodomésticos que tinha na 7 de Abril. E eles me pagavam com liquidificador, com enceradeira. Eu trabalhei 27 anos. Tinha carteira assinada e tudo… eu comecei como operador, depois fui radioator, depois fui teleator, depois fui diretor… do Beto (Rockfeller). É, falam tanto. Mas pagamento… Atrasava muito, a gente vivia de vale, eles me pagavam também em ponte aérea. Porque eles recebiam ponte aérea na permuta, e me davam cinco, seis… E eu ia lá no aeroporto: O senhor vai pro Rio, quer comprar a minha? e tal e coisa… E vendia ponte aérea, assim na fila, pra pagar as comidas. Era muito difícil o tempo, muito difícil. Isso depois que o Chateaubriand ficou doente. Antes era mais… o Chateau era mais… danado. Depois quando começou a degringolar aquele império, né… virou uma companhia muito pobre, de diretores muito ricos. Então nós… nós comemos da banda podre. Sobre a Ousadia das Primeiras Produções – Fizemos de tudo (na Tupi). Eu não vejo nada novo que a gente não tenha feito lá. Shakespeare, TV de Vanguarda. Até O Vento Levou nós fizemos. Acho que eu era a única pessoa que nunca tinha visto esse filme. Mas eu fiz! Eu era o Clark Gable de ocasião. E eu fiz de cigarrilha e tudo! E a Fernanda, a Maria Fernanda, filha da Cecília Meirelles, ela fazia a Scarlet O´Hara. Fazíamos o que fosse! Ninguém sabia nada! Então a gente fazia. E aceitava como verdade. O povo nos amava! O público nos adorava. Mesmo como diz o Alvin Tofler: Ninguém gosta da televisão. Só o povo. O povo adorava… adorava! A televisão no Brasil foi um… foi uma devastação, entendeu? A primeira transmissão o Chateaubriand foi comprar 30 aparelhos. Não tinha. Os engenheiros diziam: Tá pronta, pode pôr no ar, e ele bota no ar!, mas, pera aí!, não tem receptor! Ele foi para os Estados Unidos, comprou 30 aparelhos e botou um na 7 de Abril, um no Viaduto do Chá, ah!… um no Pacaembu… um no cine Metro… espalhou os 30 por aí e a televisão foi pro ar com 30 aparelhos. Um ano depois já tinha mais de mil. E foi uma loucura, uma loucura… Então todos esses momentos nós vivemos… Fomos vencendo tudo isso… e fazendo e fazendo, e sonhando, e tentando realizar os sonhos. Me lembro tanto da adaptação do Macbeth, que o Dionísio fez. Eu falei: Não, Macbeth eu não faço, tô cansado! Ele fez o Macbeth e eu pra não deixar ele sozinho fiz o McDuff, que é um papelzinho menor… sei que ele fez o Hamlet, fez o Macbeth… o Rei Lear, nós não ousamos fazer… O Rei Lear é difícil pra decorar em uma semana… Porque não tinha essa conversa, não. Se for pra fazer a gente faz, o problema era decorar… que era tudo ao vivo, cara. E o primeiro, também, Shakespeare em videoteipe foi Dionísio Azevedo quem fez. Foi o Hamlet também, que nós começamos a gravar sábado ao meio-dia e terminamos de gravar domingo às 8h30, meia hora antes de ir pro ar. Era uma fita grande e você tinha… cortava, né, … e emendava. Não era como é hoje. Quando você errava, tinha que voltar do começo! Ah… E a gente: não esquece, não esque ce… senão volta do começo! Aiii, terrível! … E o Dionísio era o rei de esquecer. Ele pregava nas costas dos outros o texto… Nas minhas costas… Ficava assim atrás. O enquadramento era eu, a minha cara, ele atrás e falando e falando… e eu ouvindo, aterrorizado, contristado com o que ele dizia, mas o texto estava pregado aqui na minha cacunda. Uma semana rapaz… (para decorar) Sobre a Influência do Rádio – Tinha muita gente maravilhosa… o Jaime Bar-cellos, o Baleroni, o Turíbio Ruiz. Os melhores começaram lá. Hoje ainda… a Laura, né,… E uma coisa importante, que eu tenho certeza… E isso é muito Dionísio... é que… bom, hoje se fala muito mal na televisão. Eu vejo a moçada falar e é horrível, é um troço, um embrulho, sabe… E o Dionísio falava… sabe… e dizia para os seus atores que falassem, sabe, falassem como o personagem, que estudassem a palavra, que pronunciassem… sabe… e isso era muito legal. E a formação do rádio foi fundamental… fundamental! Todos os que hoje eu reconheço que falam bem são pessoas que vieram do rádio. Que foram, primeiro, grandes dubladores, eu… o próprio Dionísio, e hoje, quem fala bem são uns três ou quatro remanescentes daquele tempo. Fernanda Montenegro… fala maravilhosamente bem. A Laura… É difícil quem fala bem, hoje nas novelas é um amontoado de (faz um som embrulhado). E o Dionísio que veio do radioteatro, era muito responsável por isso… (preocupação com a fala). Quando eu comecei o Dionísio era o grande nome. E o Manuel Durães, na Rádio Record. E a época do radioteatro é até difícil de evocar. É feita de tantos sonhos, e a gente sonhava em ser o Orson Welles! Fizemos adaptação do Orson Welles, Suspeita, A Marca da Vingança, todos os Orson Welles a gente fazia e procurava falar como ele, que era um homem de rádio, o Orson Welles. Ele fez… o grande programa dele foi no rádio, A Invasão dos Mundos. E o Orson Welles tinha uma voz poderosa! A gente meio que fazia um paralelo entre Dionísio e Orson Welles… e ele gostava! Sobre o Dionísio e a Flora –… É isso aí. É como quando me pediam para falar para a biografia do Chateaubriand… Eu falava, escrevam aí o que vocês quiserem... É a mesma coisa falar do Dionísio. É uma coisa muito pessoal. Uma coisa muito de afeto, muito de vida, muito de paixão. Muito que está ainda no que eu faço, no meu trabalho, no que eu vejo. Na ideia que eu tenho do que seja interpretar, do que seja televisão, do que seja teatro. Aí habita o terreno tão inconsútil, onde habita o Dionísio… e a Florinha! Fui testemunha do amor de sua mãe e do seu pai. E um pequeno segredo. Ela foi minha namorada antes de casar com o seu pai! Eugênia Tortejada! Florinha, tão querida, tão meiga, tão terna. Me lembro que vínhamos eu e o Dionísio no ônibus do Anhangabaú pra cá, sentados na última fila, e o Dionísio: Cara, eu acho que eu vou casar!, e eu: O quê?! Vai casar? Para com isso! E as nossas noites? E a Marieta? E todo açúcar que você levou da Marieta? Vai ficar no passado?; e ele Vou casar!, e eu Com quem?, – Com a Flora Geni!,– O quê? Você vai casar com a Flora?, – Vou!, – Ah… Você está louco… E ele casou… e eu continuei participando da vida dos dois… Então diga aí que eu amei o teu pai. Amei mesmo. Fomos juntos, a vida inteira. Depoimento de Fernando Faro Depoimento prestado a Dionísio Jacob em 30 de março de 2010, na TV Cultura. Sobre Trabalhos em Conjunto – Bom, então deixa eu te falar... Lá pro início de 1962, ou meio de 1963, naquela casa, o sobrado da Rua Bruxelas... e que uma vez o Dio tinha me pedido pra arrumar uns músicos. E eu arrumei... Esses músicos eram o Chico Buarque, o Thomas Lee... O Dionísio tinha feito um filme e precisava de uma trilha sonora. (O Anjo Assassino, com música do Chico Buarque, que ganhou um prêmio num festival). O Chico eu tinha levado pra fazer o Móbile comigo (programa pioneiro da televisão, com um formato revolucionário para a época). Eu fui buscar o Chico lá na... na rua... como é que chama... Rua Maria Antônia, onde ele estudava. E falei com ele. Eu lembro depois ele chegando na Tupi, de carro... ele disse: Olha, baixo, eu trouxe um cara aqui... que é cantor... (Taiguara) leva ele pra fazer o programa. E eu: Não, eu quero você. Aí eu levei esses músicos para o Dio e ele passou a ideia pro Chico e pro Thomas. E depois chegou e disse assim pra mim: Baixo, tá ótimo! Eu fiquei contente à beça... Eu conheci o Dionísio antes disso, quando eu fui pra Tupi. Eu saí da Paulista e fui pra Tupi. Eu cheguei pro Cassiano e disse: Olha, eu trouxe uma carta aqui pra você. E ele disse: O quê? Não quero isso... O pessoal todo aqui fala muito de você... Dionísio, Lima, Zé Castellar... todo mundo. Aí ele disse: Eu quero que você faça um TV de Vanguarda. E eu fiz um que era tirado do Tempo e o Vento do Érico Veríssimo. Eu participei também da parte do teleteatro, né? Fiz o TV de Vanguarda, o Estúdio 4... Casos Especiais, fiz uma porção. E tudo isso o Dionísio e o Lima estavam lá, juntos. É... Foi o começo mesmo da TV... Cheguei a morar também lá no Sumaré... como é que chama mesmo aquela ruazinha que vai dar... na Alfonso Bovero... não lembro o nome. E aí... fora isso, a convivência, né? Eu me lembro do Dio me falando do Adoniran (Barbosa), que ele arrumou trabalho pro Adoniran... no Cangaceiro. O Dio não chegou a terminar o filme, e pôs o Adoniran. E a gente trabalhava junto... Cassiano... Lima... Durst... o Dio... Eu tô querendo lembrar outra coisa que fiz junto com o Dio, baixo... Certamente a gente fez outros trabalhos, a gente estava sempre junto. Na casa da Rua Bruxelas... toda aquela gente, o Castellar, o Lima... Ah, eu lembro de um filme que o Dioní sio dirigiu... em São João da Boa Vista... O Chão Bruto. Eu fui assistente do Dionísio. Então eu lembro que eu fiz todo planejamento... O Lima não pode... porque o Lima tem TV de Vanguarda..., esse tipo de coisa... Ficamos muito tempo numa fazenda... demorou. Sobre os Tempos Iniciais Aí… depois disso comecei a ficar mais na parte musical. Na Tupi, os caras me deram pra fazer um programa chamado Hora de Bossa, com Bossa Nova. Era todo domingo ao meio-dia. Então eu juntava Peri Ribeiro, o Vandré, o Taiguara... o Hugo Santana... A Marisa, a Gata Mansa... Fiz uma especial com a Norma Bengell. A Norma tinha acabado de lançar um disco. Então o Cassiano pediu pra eu fazer um especial. E eu fiz... O Móbile foi mais para os anos 1960. Móbile foi 1962, por aí... foi até 1964, 1965. E veio até aqui... tem agora na Cultura, o Ensaio... (Programa Ensaio, TV Cultura). Mas aquele começo foi difícil, pra todo mundo. A gente ganhava uma mixaria, né. O Lima... to-dos nós. O Lima era engraçado. Ele tinha aquelas brigas com a Marisa e o Dio falava: É um ator..., não liga, não... é um ator. (ri) Mas eu tenho muita saudade... Foi uma época boa, apesar de tudo. Todo mundo junto... até viajar junto... pro litoral a gente ia. O Sumaré... a rua Bruxelas, a rua da TV Tupi, a Alfonso Bovero, tudo aquilo, baixinho. Vivia todo mundo sempre junto... o Zé Castellar, a Maria José... Foi um começo fantástico. Tinha o Dio, a Florinha, vocês, o Noel... A Laura (Cardoso), o Balé (Fernando Baleroni), a Débora (Duarte) pequeninha. – Ah, baixo... A Florinha e o Dionísio eram... eram como da família. A Iara gostava muito deles. E eu gostava mais ainda. Vivemos muita coisa juntos. Eu queria muito bem a eles dois. Depoimento Benedito Rui Barbosa Depoimento dado para Dionísio Jacob e Tatiana Nogueira em janeiro de 2010. Sobre Trabalhos em Conjunto – … Bom. Eu costumo dizer que… eu estive com o seu pai nas coisas mais importantes que eu fiz na vida. Sempre que precisamos provar alguma coisa nós provamos juntos. Eu considero que o Dionísio foi meu mestre, meu professor. Não de escrever, porque isso… eu nasci com esse dom, com a graça de Deus, já era jornalista, enfim… publicitário e tudo o mais. Mas em termos de televisão, de teatro, eu aprendi com ele muita coisa que até hoje eu uso. Quando escrevo uso a margem esquerda pra muita coisa, como a gente discutia muito. Mas quando nós fizemos Meu Pedacinho de Chão na TV Cultura, (1971-72) que eu fui buscá-lo na TV Record, pra trabalhar comigo, nós provamos pra TV Cultura que podia se fazer uma novela (lá). E foi uma novela fantástica Meu Pedacinho de Chão, passava quatro vezes por dia… nunca mais aconteceu isso na televisão. E dava grande audiência em todos os horários. Esse foi um dos momentos que eu acho épicos nas nossas vidas. Outro também que eu acho espetacular, foi quando eu propus pra Colgate-Palmolive que se passasse a fazer novelas com temas brasileiros, de autores nossos (1967-1968). E a Colgate, um pouco relutante no começo, acabou aprovando e eu fui com o Dionísio e com o Teixeira Filho, lá em Porto Alegre. Tivemos duas reuniões com o autor de O Tempo e o Vento (Érico Veríssimo) e eu sempre digo que ele me vendeu… eu comprei os direitos do livro por R$ 10 mil… quer dizer, US$ 10 mil, na época. E ele… e eu sei que ele só me vendeu por causa do Dionísio. Que quando ele viu o Dionísio, ele… nossa! O Érico Veríssimo era uma pessoa maravilhosa, então eu fiquei amigo dele… porque teu pai tinha feito um filme… (O Sobrado) e ele tinha visto esse filme… E aí ele perguntou quem ia dirigir e eu falei: Ah, é o Dionísio…, Então… sem problema, eu vendo, né? E foi uma luta fazer isso (a novela). Nossa! Nós fizemos A Fonte, fizemos Ana Terra, fizemos Um Certo Capitão Rodrigo. E provamos pra Colgate que se podia fazer isso. E foi outra coisa que fizemos juntos… O texto foi do Teixeira. Eu fazia… era supervisor geral. E era ajudante de ordens do seu pai. E ficava enchendo o caso, porque eu era da Colgate na época, né?!. Mas a gente não podia errar. E eu lia o texto do Teixeira, fazia uma supervisão do texto dele. E… não tivemos problemas, foi uma novela sensacional. Eu até falei, um tempo atrás, quando a Globo fez O tempo e o Vento, eles fizeram Ana Terra… e eu falei: Olha, não é por falar, mas… na nossa emissora lá, na… Excelsior, nós fizemos em preto e branco, sem nenhum desses recursos que nós temos hoje, e dava de dez a zero no que foi feito aqui. O Tempo e o Vento que vocês fizeram, nós fizemos melhor, deu melhor rendimento, foi fantástico… E era verdade, porque nós usamos linguagem cronologicamente certa. E a Colgate… a Colgate, não, a Globo, ia e voltava, ia e voltava, ia e voltava. As pessoas não entendiam o que estava havendo, não é? Muito flash-back, muita bobagem. E nós resolvemos que não dava pra fazer flash-back, pela natureza do público. Hoje o público está vendo televisão melhor. Mas quando o Globo apresentou, minha mãe me ligava: (imita) Filho, eu não entendi nada… Minha sogra ligava: (imita) O que é que está havendo, o que é que houve… a menina tava morrendo, agora tá viva de novo! Não entendiam, né? Era um negócio muito engraçado. … Depois eu fiz com o seu pai também… nós fizemos Algemas de Ouro (TV Record 19691970)… eu fiz com ele e… foi nessa época que o seu irmão morreu. Eu botei ele de ator, pra ver se tirava ele daquela situação que ele estava. Ele ficou muito chocado. E eu confesso que foi um problema pra mim porque eu tinha que escrever a novela e tinha que ir lá ver ele gravar. Porque o Dionísio, ele estava… volta e meia ele parava a gravação, ia atrás lá de um cenário, e chorava. E eu conversava com ele quase todo dia: Dionísio… eu vou precisar de um ator aí, vou usar você de ator, pra gente tocar, né… Mas foi uma passagem difícil da vida dele. Graças a Deus ele foi bastante forte pra… superar isso. E… fizemos mais o quê? Fizemos um filme também, né? Ele trabalhou num filme meu… O Dia em que o Santo Pecou…(1975) Nós fizemos muita coisa. Novela nem sei quantas aí… Eu levei ele duas vezes pra Record. Depois fui buscar, tirei ele de lá (ri)… a Record ficou louca da vida comigo. Mas eu precisava dele pra fazer o Meu Pedacinho de Chão. Eu falei: Se tiver outro diretor eu não consigo fazer isso, né? Por que eu gostava do estilo dele. Muito carinha que aprendeu com ele… que não reconhecia isso ou queriam não reconhecer… aprenderam com ele. Aprenderam ali… e eu via! Pô… aí, o cara usava tudo aquilo, como se… (pausa). O Dionísio foi um professor. Ele… olha… muita gente que fez sucesso depois na televisão deve a ele os primeiros passos, eu acho. Foi muito, muito importante. Ah… e tem também o trabalho maravilhoso que ele fez no… no… Pé de Vento (TV Bandeirantes, 1980). Tua mãe também trabalhou. Naquele ano o Brasil ganhou (a São Silvestre pela primeira vez), parecia que era uma premonição (acontecia o mesmo com o personagem da novela). Foi uma choradeira na sua casa. Depois a Gazeta me pediu pra fazer uma matéria, me deram uma página inteirinha pra falar do Pé de Vento. Mas nessa época também ele me ajudou muito, muito, muito… Ele trabalhou como ator e fez um trabalho que… Depois o Boni veio me cumprimentar: Olha… parabéns! Que novela sensacional. Você não faria na Globo. Com aquele final do Mestre André (personagem de Dionísio), recebendo… recebendo a … aposentadoria… É! Ele falou que nunca terminaria assim (na Globo)… Acabou a novela começou a chover telefonema em casa. Eu tinha três linhas de telefone, as três estavam ocupadas… e as pessoas choravam… porque terminava a novela, ele (o Dionísio) deitado… morto, né… com a mão assim (faz o gesto)… Aí… Tocavam a campainha. Na cena. Toda a família em volta no velório. E era um carteiro que entregava uma carta do INPS. Ela (a esposa) lê a carta, pega a carta e coloca na mão dele e fala: Mestre André, chegou a tua aposentadoria. (ele ri). Foi a última coisa. O Boni me falou: Nunca que você faria isso aqui na Globo! Ninguém deixaria! E foi sensacional, deu uma repercussão danada. Marcou demais. O Mestre André… E ele (Dionísio) disse assim: Eu quero fazer no caixão… eu vou fazer! E a gente bateu muito papo jogando buraco… falando da vida, do trabalho. Buraco a gente jogava em casa até as 6 da manhã. Passava a noite inteira. A gente fumava muito, todos nós. Tinha hora que acabava o cigarro e a gente começava a fumar bituca. Era uma vergonha aquilo… Então a gente tinha muita afinidade, e conversava muito… E a noite inteira a gente falava de quê? De peça, né… De novela… isso e aquilo… e o Dionísio sabia de todos os meus projetos. Conversamos sobre meus projetos: Pérola Nostra, Rei do Gado… Eu sempre tive muito projeto na gaveta. Pantanal ficou oito anos na Globo pra ser feito. Sua mãe fez uma participação no Pantanal… Ah! Ô… Os Imigrantes! (TV Bandeirantes, 1981)… Foi importantíssimo. Até hoje me falam dessa novela. No exterior falam nos Imigrantes! Por isso que eu falo… As coisas mais importantes que eu fiz, o Dionísio está lá… E também foi a fase mais difícil, porque era o começo, né? Por isso que eu te falei. A gente tinha que provar. Vamos provar que pode, vamos… tem que dar certo, vamos fazer não sei o quê… E vamos em frente… Dionísio como Diretor na Excelsior – E tem muita história com o Dionísio… coisas que ele fazia… Tem outra passagem também que é muito boa. Nós tínhamos feito o cenário da Ana Terra. Aí teu pai chegou… Pô, tá bom pra burro, nossa, e tal e coisa. E ele olhava todos os detalhes, que ele era muito detalhista, né? Ih, eu tenho cada história… Bom, aí ele olha e olha e olha... De repente ele parou e disse: Pô, tá faltando uma coisa aqui… Eu disse: Ô, Dionísio, não tá faltando nada, pô, não enche o saco! Duas horas da manhã e ele vinha falar que estava faltando coisa! E ele: Tá faltando alguma coisa e eu não sei o que é… mas tá faltando, deixa aí eu vou ver. Tá bom… vamos lá… vamos gravar outras coisas, né… Aí ele olhou, olhou e voltou: Já sei. Eu quero um poleiro aqui com um papagaio! E a produção estava lá: Pois não, seu Dionísio, mas papagaio não é fácil, e ele: Como não… vai lá na estação tal e você compra um papagaio…Se vira, põe um papagaio aí, Tá bom…, Aí foram lá, compraram o papagaio, puseram o papagaio. E o papagaio não falava! Parecia mudo. Só prestava atenção. Aí um dia eu estava sentado vendo gravar a cena, e começa. E ele lá: Atenção! Luz, câmera, ação! Aí começava a cena e daí a pouquinho alguém gritava: Atenção, câmera! E o Dionísio furioso: Ei, desgraçado! Você não tá vendo que a gente tá gravando, pô? Para com isso! - Mas Dionísio, ninguém falou nada!, - Falou, pô, eu ouvi daqui (da sala de corte)! Vamos de novo, vai! Atenção, luz, câmera, ação… E começava a cena. Daqui a pouquinho: Câmera, ação, gravando! Na quarta vez ele não aguentou, mas ele xingava, eu fiquei até com medo que ele tivesse um ataque. Falei: Dionísio, pô, calma…, e ele: É brincadeira, pô… três da manhã! Quem é o filho da puta?!. Aí quando veio outro gravando, ele: Já vou! Desceu (da sala de edição) com uma cara de meter medo… putz… todo mundo lá… olhando pra ele. Aí ele: Vocês estão brincando comigo? Vocês sabem que horas são? Vocês sabem que nós entramos aqui às sete da manhã? Vocês sabem que muita gente aqui toma ônibus? Começou a dar uma… Todo mundo quieto ali ouvindo. Dionísio, aqui ninguém falou nada, -Falou! Falou, deu pra ouvir lá… (na edição) falou ou não falou, Rui?, Falou…, eu disse, pelo menos eu ouvi, né? E o Dionísio: Não vamos gravar mais, chega! Amanhã vocês trabalham dobrado… E xingou todo mundo, ralhou pra burro. Acabou! Estava todo mundo cansado. Aí nós fomos saindo e quando ele passou na porta, o papagaio: Gravando! E ele: Mata esse filho da puta, não quero mais papagaio! E era o papagaio mesmo… Ai, nunca me esqueço disso, rapaz… E também quando a gente estava fazendo O Tempo e o Vento, eu vinha na cidade comprar pizza. Levava um monte de pizza pra lá, né, que a Colgate que bancava, às vezes não tinha pizza eu levava sanduíche, e aí teve aquela passagem do sanduíche, que ele desceu já gritando com todo mundo, eu pus a mão pra trás e o cavalo… quase pegou a minha mão! Ah… Era uma festa, era um negócio muito bom. Eu gostava muito do seu pai, gostava mesmo. Fizemos muita coisa juntos. Eu digo sempre para a Marilene, o Dionísio… e a sua mãe também, foram aqueles amigos, assim… de todas as horas. Não só das horas… pô, sabe, de quando está tudo bem? Eles estiveram presentes na hora da dureza… fomos muito amigos. Sempre que precisar de alguma coisa para o Dionísio e para a Flora, podem pedir, as portas estão abertas… Depoimentos Escritos Dionísio e Flora Dionísio e Flora foram dois artistas excepcionais e seres humanos de raríssima qualidade com quem tive a honra e o privilégio de conviver e trabalhar. Ele começou no Rádio, que – óbvio – não deixaria escapar o fascínio da sua voz grave e poderosa, com que marcou todas as grandes personagens que viveu. Dionísio exerceu poderosa influência na maneira do ator brasileiro representar e sentir a sociedade em que vivia; não só pelo seu enorme talento, magnetismo pessoal, mas, sobretudo, pela autenticidade e visão poética do artista mineiro e solidário com que impregnou o rádio, a televisão, o cinema e o teatro deste País. Todas as grandes experiências pioneiras da nossa teledramaturgia foram marcadas pelo dínamo criador do Dionísio. Suas grandes atuações como ator e enorme talento como diretor, deixaram marcas profundas no processo de amadurecimento e modernização da TV no Brasil. O TV de Vanguarda, célula-mãe da teledramaturgia brasileira, conserva traços profundos da poderosa influência desse portentoso artista mineiro. Em 1959 adaptou, dirigiu e atuou como ator em A Hora e a Vez de Augusto Matraga, de Guimarães Rosa, considerada uma obra-prima dessa série de grandes espetáculos. Teve participação antológica como o padre em O Pagador de Promessas (1962), nossa única indicação à Palma de Ouro. Ator, corroteirista e diretor de dezenas de filmes, teleteatros e telenovelas, ainda hoje lembradas como modelos inesquecíveis. Foi um astro de primeira grandeza, enorme popularidade e prestígio, gravado pra sempre na história da cultura deste País. Tive a honra e o privilégio de trabalhar com Dionísio em A Morte do Caixeiro Viajante de Arthur Miller, direção de Flávio Rangel no TBC, em 1962. Jamais esqueci a densidade humana e a angústia lancinante do seu Willy Loman, que ainda hoje me inspira, cada vez que ensaio uma nova peça. Trabalhar com Dionísio foi uma escola. Ela, Flora Geni, brilhante atriz de teatro, cinema e televisão. Atuou com enorme talento e popularidade, se consagrando como uma das primeiras grandes damas da teledramaturgia brasileira em atuações inesquecíveis. Uma delas, antológica, foi na TV Excelsior no papel da vilã de A Outra Face de Anita, de Ivani Ribeiro, que acabou pavimentando para suas colegas o caminho e a técnica de todas as grandes vilãs da televisão brasileira que vieram depois. Outro grande momento foi o seu inspiradíssimo desempenho em A Grande Viagem, também de Ivani, ao lado de Regina Duarte, na direção do grande Walter Avancini. Foram duas interpretações que me marcaram para sempre como ator. Na TV Tupi, além de aparecer como protagonista no elenco da emissora, escreveu e adaptou textos do teatro universal para o TV de Vanguarda, o mais importante teleteatro da TV brasileira ainda hoje. O cinema brasileiro também deve à Flora sua destacada participação como atriz. Foi a grande protagonista de Chão Bruto e O Anjo Assassino, para citar dois importantes filmes dirigidos pelo seu marido Dionísio de Azevedo. Ambos, Dionísio e Flora foram meus grandes e inesquecíveis amigos. Como o Tacus é ainda hoje. O Noel nos deixou ainda menino. Mas para quem conviveu intimamente com esses dois artistas geniais e seres humanos raríssimos na capacidade de afeto, solidariedade, altruísmo, entusiasmo, generosidade e bom humor, a falta de ambos é permanentemente grande e desoladora. Sim, é uma enorme pena que não estejam presentes pra tomarmos juntos um drinque, rirmos e nos abraçarmos com efusão, como sempre fazíamos… E ouvir aquele impagável refrão de Dionísio a cada encontro e despedida: Lá pras banda do mercado tá um fedô!… Juca de Oliveira Dionísio Azevedo Um dos maiores atores brasileiros de rádio, televisão, cinema e teatro. Era um diretor inteligente, sensível e com uma visão moderna sobre interpretação. Aprendi com Dionísio a falar com os olhos, ele dizia que o olhar era uma das coisas mais importantes no ator. Foi pioneiro da TV no Brasil, muita coisa que hoje está no ar veio do talento de Dionísio Azevedo. Infelizmente, a nossa memória esquece os grandes valores que ajudaram a construir o rádio, a TV, o teatro e o cinema no Brasil. Dionísio faz parte dos artesãos que ajudaram a fazer a TV no Brasil; Dionísio Azevedo tinha uma voz belíssima. Viva Dionísio Azevedo! Flora Geni Uma atriz sensível, delicada, inteligente, responsável, profissional. Criava seus personagens com amor, cuidado, colocando neles seu talento. Fez grandes personagens na TV. Foi também radioatriz encantando com sua voz suave, educada, delicada. É também pioneira da TV onde batalhou muito para que se criasse muita coisa do que se assiste hoje. Viva Flora Geni! Laura Cardoso Dionísio, o Apaixonado. Conheci Dionísio Azevedo em 1944, na Rádio Panamericana, hoje Jovem Pan, onde fazíamos radioteatro, sob a direção de Oduvaldo Viana. Ele era bem jovem, e já apaixonado. Eu era uma garotona bonita, segundo diziam, em começo de carreira. Dionísio fazia papéis bons e ajudava o diretor em tudo. Mas não se livrava de cada bronca… É que Dionísio já era um pouquinho confuso, esquecia uma coisa, esquecia outra… e Oduvaldo não perdoava. E mais: o diretor, que era o mestre, queria fazer de Dionísio o principal discípulo. Em 1950 veio a televisão. Eu já estava na TV Tupi, Dionísio também. E seu jeito só fez aprimorar, isto é, a paixão era maior, os esquecimentos também... frutos daquela obsessão que tinha pela arte, pelas histórias que incessantemente lia, adaptava, produzia… Foi dele o primeiro Grande Teatro, peça inteira ao vivo, não esqueçam: O Julgamento de João-Ninguém, na TV Tupi. Um sucesso, ou melhor, um susto: – Como é que eles conseguiram fazer isso? Parece um cinema em casa. Magistral!. Dionísio fazia parte do círculo de criação, digamos assim, embora o nome não fosse usado, da nova televisão brasileira. O diretor artístico era o Cassiano Mendes, mas Dionísio era um de seus braços executores. Ah, pulei uma coisa importante, pelo menos para mim, que vou registrar agora. Eu gostava muito do Dionísio, do Lima, dos colegas todos. Mas deles em particular. Talvez por serem mineiros, como eu, ou por serem apaixonados, como eu. Minha paixão, porém, me levou logo a um caminho que eles percorreram mais tarde. Casei. Apareceu para trabalhar na TV Tupi um engenheiro italiano, bonito, Gianni, com quem me casei, no ultimo dia de 1949. E de quem engravidei em seguida, dando à luz meu filho Heitor, em outubro de 1950. Sabem quem foi meu padrinho de casamento? Dionísio Azevedo! Era um gesto de gratidão, com que quis agradar o Dionísio, que eu achava um amigão. Um tempo depois, não me lembro quando, Dionísio se casou com Flora. Graciosa, meiga, sensível, grande atriz. Me lembro de Dionísio me cochichando: Sabe, Vida, com quem vou me casar? – Com a Florinha Geni, disse ele, olhos marejados. Chorei também. Ele não podia fazer escolha melhor. Ele precisava de uma companheira que aceitasse seus enormes talentos, mas perdoasse aqueles defeitos que continuavam: os esquecimentos... Aos quais me referi no começo do texto. Lembram-se? E eles eram constantes. Florinha perdoava tudo. Levava seu barco com amor e firmeza. Remava às vezes sozinha, mas determinada. Tiveram dois filhos: Dionísio, chamado Tacus e Noel,... lindos e queridos garotos. Noel foi embora cedo, Deus o levou; Flora, ao lado do caixão, transida, morta, era a imagem da Virgem Maria, ao lado de Cristo, pois ela perdera um filho também. Lembro-me muito bem. Eu estava lá. Dionísio Azevedo, que em verdade se chamava Taufik Jacob, teve uma vida artística rica. Flora Geni, a Eugênia Tortejada Jacob também. Mas outros falarão sobre isto neste livro. Não quero fazê-lo. Quero apenar contar a todos que quando passo na casa tão próxima à minha, onde eles moravam, ou quando vou à feira, que Florinha frequentava, vejo-os felizes, vivos, na minha memória, como se pode ser feliz nesta vida, e inteiros e integrados, e unidos, como poucos casais são, sejam artistas ou não. E me emociono sempre. Acompanhei-os ao leito final. Primeiro Flora. Depois Dionísio. Rezei por eles. Chorei por eles e por isso digo aqui: não os esquecerei jamais. E registro: Dionísio e Flora, obrigada pela amizade com que vocês enfeitaram a minha vida. Vida Alves Dionísio no Rádio Da época do rádio não ficaram muitos registros. Mas foi uma época importante da sua vida, onde Dionísio pôde expandir muito da sua capacidade expressiva vocal. Sua voz sempre foi marcante e mesmo nos últimos anos ele era chamado para fazer locução. Ele também sempre se referiu à época do rádio como uma grande escola, pois o ator precisava criar na modulação da sua voz, sem mostrar o rosto, uma gama grande de sentimentos. De tudo o que restou dessa época, o documento mais expressivo foi uma crítica feita por Otávio Gabus Mendes, grande radialista e jornalista da época. Esta matéria é de fevereiro de 1944 e saiu no Diário de S. Paulo, o que mostra que já nesta época, bem antes de a televisão surgir, Dionísio se encontrava entre os grandes nomes do radioteatro paulista. Se as vozes tivessem fisionomia, a voz do Dionizio Azevedo teria os traços de Lon Chaney Senior. Porque ele faz com suas expressões de voz tantos malabarismos, que só Lon Chaney Senior, com seu rosto fazia expressões tão variadas. A voz do Dionizio se caracteriza e toma o aspecto do pa-pel. Ele, dentro do estúdio, durante um trabalho de radioteatro é inteiramente outro. Torna-se a figura que está interpretando. E esquece de todo mundo para só se lembrar do papel. Faz gestos e expressões. Empolga exatamente por isso: – é um excelente artista! Quando entrou para o rádio, viu logo que seu nome não tinha audiogenia. Taufik Jacob não podia ser um nome feliz no rádio. E aí nasceu o Dionizio Azevedo de hoje. (…) (…) Dionizio Azevedo tem grande semelhança com Paul Muni em rosto e fisionomia. É um sentimental cem por cento. Bom colega… a modéstia resolveu morar no seu íntimo. Em suma: – um magnífico companheiro! E aí está, num esboço de poucas linhas, alguma coisa sobre Dionizio Azevedo, um dos azes mais importantes das Associadas. Otávio Gabus Mendes Como se pode ver acima, a grafia do seu pseudônimo sempre teve algumas variações. Muitas vezes seu nome era grafado na imprensa com Z e havia mesmo quem o chamasse Dionizio de Azevedo. Mas ele mesmo sempre utilizou o Dionísio Azevedo como sua persona artística. Linha do Tempo de Dionísio Azevedo Cronologia de Dionísio Azevedo Principais Trabalhos para a Televisão TV Tupi Durante todo este período inicial da televisão brasileira, Dionísio teve uma atuação bastante intensa, adaptando, atuando e dirigindo di-versos teleteatros, notadamente para o TV de Vanguarda, um dos grandes momentos criativos da televisão, ainda mais se levando em conta que não havia chegado o videoteipe e todas as encenações iam ao ar ao vivo. Dionísio trabalhou em todas as produções abaixo, produzindo, dirigindo, adaptando e/ou atuando apenas como ator. Abaixo uma relação dos principais trabalhos naquele período. Aqueles em que ele não adaptou ou dirigiu, atuou somente como ator. TV de Vanguarda 1959 • A Hora e a Vez de Augusto Matraga, de Guimarães Rosa Primeira adaptação feita da obra do escritor brasileiro para outro veículo. Adaptação e direção de Dionísio Azevedo. Com Lima Duarte no papel de Augusto Matraga. ) 1958 • Os Miseráveis, de Victor Hugo Adaptação e direção de Dionísio Azevedo Com Fernando Baleroni como Jean Vanjean, Laura Cardoso como Fantine e Débora Duarte como Cosette. Também participaram Jaime Barcellos, Rolando Boldrin, Luciano di Roma, Manoel Figueiredo, Flora Geni, Dalva Guimarães, Xisto Guzzi, Emílio Lenham, Romano Luiz, Aída Mar,; Stela Maria, Henrique Martins, J. Nogueira, Laura Prado, Célia Rodrigues, Turíbio Ruiz, Sílvio Saraiva, Ona Stuart, Mário Alimari, Alfredo Talarico. 1954 • Conflito, de Clifford Odets Adaptação de José Marques da Costa. Elenco: Dionísio Azevedo, Heitor de Andrade, Teixeira Filho, Marlene Morel, Francisco Negrão, David Neto, Albano Pereira, Márcia Real, Turíbio Ruiz • A Morte do Caixeiro Viajante, de Arthur Miller Adaptação de Dionísio Azevedo, dirigida por Luis Gallon. Com Heitor de Andrade, Lima Duarte, Teixeira Filho, Cassiano Gabus Mendes, Neide Landi, Odete Lara, Henrique Martins, David Neto, Luiz Orioni, Célia Rodrigues, Turíbio Ruiz • Passos Que Sobem, de Cornell Woolrich Adaptação e direção de Dionísio Azevedo Com Lia de Aguiar, Heitor de Andrade, Nedy de Oliveira, Lima Duarte, Teixeira Filho, Xisto Guzzi, Francisco Negrão, David Neto, Luiz Orioni, Turíbio Ruiz. • Do Mundo Nada Se Leva, de Moss Hart Adaptação e direção de Walter George Durst. Com Dionísio Azevedo, Lia de Aguiar, Zuleica Maria, Francisco Negrão, David Neto, Cachita Stuart. • Bel-Ami, de Guy de Maupassant Adaptação e direção de Walter George Durst Com Vida Alves, Dionísio Azevedo, Wilma Bentivegna, Maria Cecília, Bárbara Fazio, Newton Fowler, Odete Lara, Henrique Martins, David Neto, José Parisi, Márcia Real. • Noite Sem Lua, de John Steinbeck Adaptação de José Marques da Costa Com Percy Aires, Dionísio Azevedo, Heitor de Andrade, Lima Duarte, Luiz Gustavo, Henrique Martins, Francisco Negrão, David Neto, José Parisi, Márcia Real. • Casa de Bonecas, de Henrik Ibsen Adaptação e direção de Dionísio Azevedo Com Jaime Barcellos, Lia de Aguiar, Heitor de Andrade, Nedy de Oliveira, Guiomar Gonçalves. • Macbeth, de Willian Shakespeare Adaptação e direção de Dionísio Azevedo Com Dionísio Azevedo como Macbeth, Márcia Real como Lady Macbeth e Lima Duarte como Macduff. Também atuaram Percy Aires (Seyton), Roberto Alrean (Assassino), Jaime Barcellos (Duncan), Luiz Gustavo (Malcolm), Geraldo Louzano, Hervê Leblon (Feiticeiro), Henrique Martins (Ross), Francisco Negrão (Banquo), Luiz Orioni (Assassino), Célia Rodrigues (Feiticeira), Turíbio Ruiz (Sacerdote), Romeu Sanches (Jovem Siward). 1953 • De Ratos e Homens, de John Steinbeck Adaptação de Walter George Durst, dirigida por Cassiano Gabus Mendes. Com Dionísio Azevedo, Lima Duarte, Hélio Golovaty, Rosa Maria, Francisco Negrão, David Neto, João Restife. • Os Humildes • Tio Vanya, de Anton Chekhov Adaptação de Dionísio Azevedo, dirigida por Cassiano Gabus Mendes. Com Vida Alves, Dionísio Azevedo, Lima Duarte, Bárbara Fazio, David Neto, Luiz Orioni. Escrito e dirigido por Dionísio Azevedo Com Heitor de Andrade, Flora Geni entre outros. Henrique IV • Henrique IV, de Luigi Pirandello Adaptação e direção de Walter George Durst. Com Vida Alves, Dionísio Azevedo, Lima Duarte, Bárbara Fazio, David Neto, Luiz Orioni. • Raposas, de Lillian Hellman Adaptação e direção de Cassiano Gabus Mendes. Com Walter Avancini, Dionísio Azevedo, Lia de Aguiar , Samuel Dos Santos, Lima Duarte, Lúcia Lambertini, David Neto, Márcia Real. • A Máquina de Escrever, de Jean Cocteau Adaptação e direção de Dionísio Azevedo. Com Zuleica Maria. • O Culpado, de Robert Arthur Adaptação e direção de Dionísio Azevedo. Com Heitor de Andrade e David Neto, entre outros. • Ao Sopro dos Ventos, de Victor Ninovitchenko Adaptação e direção de Dionísio Azevedo Com Cidinha de Freitas e Adriano Stuart, entre outros. • Massacre, Emmanuel Roblès Adaptação de Miroel Silveira, dirigida por Cassiano Gabus Mendes. Com Dionísio Azevedo, Heitor de Andrade, Lima Duarte, Flora Geni, Hélio Golovaty, Guiomar Gonçalves, Luiz Gustavo, Rui Luiz, David Neto, José Parisi. • Hamlet, de William Shakespeare Adaptação e direção de Dionísio Azevedo Com Murilo Amorim Correia, Dionísio Azevedo, Lia de Aguiar (Gertrude), Lima Duarte (Hamlet), Astrogildo Filho (Claudius), Flora Geni (Ophelia), Caetano Gherardi, Odete Lara, Alberto Maduar (Horatio), Henrique Martins, Francisco Negrão (Laertes), David Neto (Polonius), Luiz Orioni, João Restife, Araken Saldanha. • No Caminho da Vida, de Lillian Hellman Adaptação e direção de Cassiano Gabus Mendes. Com Dionísio Azevedo, Marly Bueno, Lia de Aguiar, Samuel Dos Santos. Lima Duarte, Flora Geni, David Neto, Cachita Oni, Luiz Orioni, José Parisi. • • Nina, de André Roussin Adaptação de Wlater George Dust, direção de Luis Gallon Com Dionísio Azevedo, Lia de Aguiar, Henrique Martins, Francisco Negrão. • Sinfonia Pastoral, de André Gide Adaptação e direção de Walter George Durst. Com Dionísio Azevedo, Bárbara Fazio, Célia Rodrigues, entre outros. • Markhein, de Robert Louis Stevenson Adaptação e direção de Walter George Durst Com Dionísio Azevedo, Lima Duarte, Cassiano Gabus Mendes, entre outros. 1952 • O Julgamento de João-Ninguém O primeiro TV de Vanguarda. Adaptação de Dionísio Azevedo. Elenco: Dionísio Azevedo (como Reverendo Millard), Maria Cecília, Salles de Alencar, Lima Duarte (como João-Ninguém), Francisco Negrão como Promotor, David Neto, José Parisi, Walter Stuart (como Elmo Durgeon). • Corpo Fechado, de João Guimarães Rosa Adaptação e direção de Dionísio, numa primeira experiência com o seu autor predileto, experiência que anos depois frutificaria na grande montagem do Augusto Matraga. Com Lima Duarte no elenco. • Crime Sem Paixão, de Ben Hecht Adaptação de Walter George Durst, dirigida por Cassiano Gabus Mendes. Com Dionísio Azevedo, Maria Cecília e Lima Duarte entre outros. • Othelo, de William Shakespeare Adaptação e direção de Dionísio Azevedo. Com Dionísio Azevedo como Othelo, Lima Duarte como Iago e Flora Geni como Desdemona, entre outros. • Ninho Encantado Adaptação de Dionísio Azevedo, dirigida por Cassiano Gabus Mendes. Com Lia de Aguiar, Guiomar Gonçalves , Yara Lins, David Neto, Célia Rodrigues, J. Silvestre, Adriano Stuart, Walter Stuart. • O Homem Que Vendeu a Alma, de Stephen Vincent Benet Adaptação de Walter George Durst, dirigida por Cassiano Gabus Mendes. Com Vida Alves, Dionísio Azevedo, Maria Cecília, Lima Duarte, David Neto, Adriano Stuart. • O Inspetor Geral, de Nikolai Gogol Adaptação e direção de Walter George Durst. Com Dionísio Azevedo, Lima Duarte, Sônia Greiss, David Neto, Luiz Orioni, Márcia Real, Torresmo. ra Geni, David Neto, Cachita Oni, Luiz Orioni, José Parisi. Outros episódios de teleteatro ao vivo que Dionísio participou como ator. 1959 • Profundo Mar Azul Com Dionísio Azevedo, Laura Cardoso, Lima Duarte, Geraldo Louzano, Henrique Martins, Geny Prado, Lolita Rodrigues, Araken Saldanha. • Fim de Semana no Campo Direção de Dionísio Azevedo, com Percy Aires, Vida Alves, Lídia Costa, Odilon del Grande, Amilton Fernandes, Flora Geni, Geraldo Louzano, Wania Martini, Geny Prado. • Adeus Mr. Chips Direção de Dionísio Azevedo, com Geny Prado, Marisa Sanches, José Mauro de Vasconcelos • Um Lugar ao Sol Adaptação do clássico de Theodore Dreiser, feita e dirigida por Dionísio Azevedo, com Marly Bueno, Laura Cardoso, Henrique Martins, Glória Menezes, entre outros. 1958 • Sublime Obsessão Adaptação e direção de Dionísio Azevedo. Com Percy Aires, Dionísio Azevedo, Maurício Barroso, Gilberto do Amaral Campos, Cidinha de Freitas, Xisto Guzzi, Nydia Lícia, Amaral Novais, Neide Pavani, Rosita Ramirez, Célia Rodrigues, Turíbio Ruiz, Nair Silva, Alves Teixeira. • Pode-se Tip Tap de Patins Com Eduardo Abbas, Dionísio Azevedo, Jaime Barcellos, Maria Helena Dias, Xisto Guzzi, Romano Luiz, Ana Maria, Luiz Orioni, Célia Rodrigues, Arnaldo Weiss. • Atenção, Emergência Com Percy Aires, Dionísio Azevedo, Ana Maria, Geny Prado, Marisa Sanches, Maria Valéria. • Marcelino, Pão e Vinho Com Percy Aires, Dionísio Azevedo, Jaime Bar-cellos, Amândio Silva Filho, Valdir Galdi , Xisto Guzzi, João Monteiro, David Neto, Luiz Orioni, Arnaldo Weiss. • Cala a Boca, Etelvina – TV de Comédia Com Percy Aires, Dionísio Azevedo, Lídia Costa, Odilon del Grande, Amândio Silva Filho, Marlene Morel, Geny Prado, Cachita Stuart. • Traição Com Dionísio Azevedo, Jaime Barcellos, Lima Duarte, Flora Geni, Xisto Guzzi, Henrique Martins, Francisco Negrão, Luiz Orioni, Turíbio Ruiz, Araken Saldanha. • O Último Bandido Com Eduardo Abbas, Percy Aires, Dionísio Azevedo (Pat Garrett), Fernando Baleroni, Odilon del Grande, Geraldo Louzano, Célia Rodrigues, Turíbio Ruiz, Araken Saldanha. • O Preço da Glória Com Dionísio Azevedo (Coronel Dax), Eduardo Abbas, Percy Aires, Mario Alimari, Fernando Baleroni, Jaime Barcellos, Othon Bendix, Rolando Boldrin, Odilon del Grande, Oswaldo De Souza, Luciano di Roma, Amilton Fernandes, Enio Gonçalves, Xisto Guzzi, Geraldo Louzano, Romano Luiz, Henrique Martins, Carlos Menon, Douglas Oliveira, José Parisi, Cândido Pinto, Turíbio Ruiz, Araken Saldanha. • Para Onde a Terra Cresce Com Dionísio Azevedo, Jaime Barcellos, Marly Bueno, Lima Duarte, Henrique Martins, Douglas Oliveira, Luiz Orioni, Célia Rodrigues, Turíbio Ruiz, Néa Simões. • A Conversão do Diabo Com Dionísio Azevedo, Lima Duarte, Diná Machado, Douglas Oliveira, Luiz Orioni. 1957 • O Pequeno Incidente Com Dionísio Azevedo, Laura Cardoso, Heitor de Andrade, Sônia Maria Dorse, Flora Geni, Guiomar Gonçalves, David José, Rogério Márcico, David Neto, Douglas Norris, Luiz Orioni, Lolita Rodrigues, Turíbio Ruiz, Araken Saldanha, Marisa Sanches, Néa Simões, Adriano Stuart. • O Pequeno Mundo de D. Camilo Com Otelo Zeloni como Dom Camilo, Dionísio Azevedo, Heitor de Andrade, Chico de Assis, Lina de Roma, Amândio Silva Filho, Norah Fontes, Aída Mar, Silvana Marçal , Rogério Márcico, Douglas Norris, Luiz Orioni, Geny Prado, Turíbio Ruiz. • Coração Inquieto De Péricles Leal. Com Percy Aires, Dionísio Azevedo, Lia de Aguiar, Célia Rodrigues. • Os Três Mosqueteiros Com Vida Alves (Milady), Dionísio Azevedo (Treville), Fernando Baleroni (Portus), Angelo Buonafina (Jussac), Fábio Cardoso (Buckingham), Astrogildo Filho (Aramis), Flora Geni (Ana), Rogério Márcico (Aramis), David Neto (Rochefort), José Parisi (D’Artagnan), Geny Prado, Turíbio Ruiz (Richelieu), Cachita Stuart ( Ketty), Walter Stuart (Athos), Maria Valéria (Constance). 1956 • O Homem do Chapéu Coco Com Dionísio Azevedo, Jaime Barcellos, Verinha Darci, José Parisi, Dulcemar Vieira. • Calunga (como Totó) Com Dionísio Azevedo, Batucada, Lima Duarte, Astrogildo Filho, Norah Fontes, Luiz Gustavo, Rogério Márcico, Henrique Martins, Douglas Norris, Luiz Orioni, Lolita Rodrigues, Turíbio Ruiz. Este teleteatro foi inegavelmente um dos pontos altos do início da televisão. Tanto que foi escolhido para ser remontado mais de três décadas depois, numa homenagem que a TV Cultura de São Paulo prestou ao pioneirismo da época do TV de Vanguarda. A ideia partiu de Heloísa Castellar, vizinha de Dionísio da antiga Rua Bruxelas, e responsável então pelo núcleo de ficção da TV Cultura. Todo o especial foi realizado ao vivo, como na época heroica. Assim comentou o crítico Álvaro de Moya no Jornal da Tarde, do dia 18 de setembro de 1986: (…) A direção foi feita ao vivo, com seus percalços normais e acidentes de percurso, como na época heróica da TV, inserindo inclusive garotas propagandas e objetos pré-históricos. A curiosidade alcançou o telespectador atual. O resultado foi altamente positivo. A recriação de Calunga, contando com assessoria de responsáveis pelo original, funcionou. A garra total da equipe se sentia nos nervos, na forma de interpretação, principalmente nos dois atores principais, Toni Ramos e Jofre Soares homenageando Lima Duarte e Dionísio Azevedo. Henrique Martins, que fizera um papel na versão original, dirigiu o espetáculo, em homenagem a Durst, Cassiano e Dionísio. (…) • O Cavaleiro de Pardaillan Com Dionísio Azevedo, Wilma Bentivegna, Nelson Machado, José Parisi. • Pais e Filhos Com Percy Aires, Dionísio Azevedo, Fernando Baleroni, Marly Bueno, Lia de Aguiar, Chico de Assis, Rogério Márcico, Jussara Menezes, David Neto, Douglas Norris, Célia Rodrigues, Turíbio Ruiz, Araken Saldanha, Marisa Sanches, Dulcemar Vieira. • Vaidosa Com Percy Aires, Dionísio Azevedo, Fábio Cardoso, Verinha Darci, Hugo da Veiga, Lia de Aguiar, Luiz Gustavo, Rogério Márcico, Douglas Norris, Luiz Orioni, Araken Saldanha. • E o Vento Levou Com Lima Duarte como Rhett Butler e Maria Fernanda como Scarlet O’Hara. Também participaram Jaime Barcellos (Gerald O’Hara), Batucada, Fábio Cardoso, Renato Cardoso, Hugo da Veiga, Lia de Aguiar, Luiz Gustavo, Geraldo Louzano, Wania Martini, Célia Rodrigues. 1955 • Posto Avançado De Péricles Leal, com Dionísio Azevedo, Lima Duarte e Lolita Rodrigues. • A Mão de Deus De J. Silvestre, com Vida Alves, Dionísio Azevedo, Wilma Bentivegna, Aída Mar, Francisco Negrão, J. Silvestre. • Mãos Sangrentas De Carlos Hugo Christensen, com Tônia Carrero e Sadi Cabral. Dionísio participou fazendo locução off. • Oliver Twist Adaptação de Flora Geni e direção de Dionísio do clássico de Charles Dickens. Com Adriano Stuart como Oliver Twist. Também participaram Percy Aires, Jaime Barcellos (Fagin), Verinha Darci, Heitor de Andrade, Lima Duarte, Guiomar Gonçalves, Luiz Gustavo, Laura Prado, Célia Rodrigues, Araken Saldanha, Marisa Sanches, Néa Simões, Cachita Stuart. • Bocage Adaptação de Dionísio, com Jaime Barcelos. • Inocência, de Visconde de Taunay Adaptação e direção de Dionísio Azevedo Com Dionísio Azevedo, Wilma Bentivegna, Henrique Martins, Jaime Barcelos, entre outros 1954 • O Destino Desce de Elevador De Péricles Leal, com Vida Alves, Dionísio Azevedo, Wilma Bentivegna, Maria Cecília, Lima Duarte, Luiz Gustavo. TV Excelsior – Canal 9 Dionísio como diretor artístico da Excelsior entre 1964 e 1969 Na época da TV Excelsior, Dionísio notabilizouse principalmente como diretor de telenovelas, gênero que começava a dar seus primeiros passos no gosto popular. A sequência de novelas: Ambição, A Moça que Veio de Longe e A outra Face de Anita marcaram época. Uma superando a anterior em popularidade e cristalizando definitivamente a novela como um marco cultural. Seus principais trabalhos foram: 1968 • A Pequena Órfã Novela de Teixeira Filho, com a menina Patrícia Aires no papel de Toquinho e Dionísio Azevedo como o velho Gui, papel que se tornou muito mar cante como referência popular em sua carreira. Com Eduardo Abbas, Yara Amaral, Antônio Carlos, Ruthinéa de Moraes, Lurdinha Félix, J. França, Hemílcio Fróes, Antonio Ghigonetto, Rodney Gomes, Nádia Lippi, Edmundo Lopes, Djalma Lúcio, Rachel Martins, Roberto Maya, Marize Ney, Riva Nimitz, Glória Pires, João José Pompeo, Tony Vieira. 1967 • O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo Grande esforço de produção da época, na adaptação da obra-prima do escritor gaúcho, feita por Teixeira Filho. Foram utilizados os novos estúdios localizados na Vila Guilherme e um grande elenco que contava com: Maria Aparecida Alves (Rosinha), Walter Avancini (Bento Amaral), Carminha Brandão (Henriqueta Terra), Maria Cecília (Arminda Terra), Renato Consorte (Padre Lara), Maria Isabel de Lizandra (Eulália Terra), Maurício do Valle (Rafael), Mário Ernesto (Ramon), Maria Estela (Bibiana Terra Cambará), Carlos Zara (Capitão Rodrigo Cambará), Sílvio Francisco (Antônio Terra), Hemílcio Fróes (Pedro Terra), Flora Geni, Geórgia Gomide (Ana Terra), Castro Gonzaga (Ricardo Amaral), Gianfrancesco Guarnieri, David José (Pedro Missioneiro), Altair Lima, Edmundo Lopes (Maneco Terra), Geraldo Louzano, Maracy Mello, Maurício Nabuco, Vanja Orico, Adolfo Pinto, Rui Resende, Milton Ribeiro, Ivanise Sena, Jacyra Silva, Nelson Turini, Tony Vieira. 1966 • Ninguém Crê em Mim Novela de Lauro César Muniz Atuaram: Maria Aparecida Alves, Fernando Baleroni, Renato Borghi, Henrique César, Raul Cortez, Débora Duarte, Egídio Eccio, Paulo Figueiredo, Etty Fraser, Flora Geni, Clivanir Gregório, Altair Lima, Silvana Lopes, David Neto, Dinah Ribeiro, Susana Vieira, Arnaldo Weiss. • O Morro dos Ventos Uivantes Adaptação da obra de Emily Brontë, com Débora Duarte e Marcos Paulo. 1964 • Ambição Novela de Ivani Ribeiro, com Arlete Montenegro como Belinha. Também atuaram: Dionísio Azevedo (Guilherme), Lídia Costa (Nair), Tarcísio Meira (Miguel), Mauro Mendonça (Ulisses), Lolita Rodrigues (Guida), Turíbio Ruiz (Otávio), Paulo Villa (Roberto). • A Moça que Veio de Longe Novela de Ivani Ribeiro, com Rosamaria Murtinho no papel de Maria Aparecida e Hélio Souto no de Dr. Raul. Também atuaram: Neuza Amaral, Maria Aparecida Baxter, Bentinho, Cleide Blota, Wilma de Aguiar, Lurdinha Félix, Sílvio Francisco, Flora Geni, Edmundo Lopes, Nívea Maria, Renato Master, Marília Melilo, Ivan Mesquita, Lourdes Rocha, Gilberto Sálvio. • A Outra Face de Anita Novela de Ivani Ribeiro, com Flora Geni no papel de Anita. Também atuaram: Fúlvio Stefanini, David Neto, Armando Bógus, Riva Nimitz, Lídia Costa, as irmãs Áurea e Nívea Maria e Célia Coutinho, entre outros. Interessante observar sobre estas três novelas que elas estavam no nascedouro mesmo do gênero novela como fenômeno de massas. Elas ainda possuíam um tempo de duração curto. Ambição foi passada inteira entre março e abril de 1964. A Moça que Veio de Longe durou de maio a julho do mesmo ano, enquanto A Outra Face de Anita ocupou os meses de julho a setembro, cada uma um pouco maior do que a outra, até que o gênero assumisse a proporção atual em novelas como Redenção e outras. Flora narra num depoimento sobre a Excelsior (ver anexo), que testemunhou pessoalmente a transformação do gênero em fenômeno de audiência na seguinte passagem: no último capítulo da novela Ambição, Dionísio quis inovar gravando a cena final do casamento numa externa, na Igreja da Consolação. A novidade é que a televisão ainda não costumava se valer de cenas externas. Mas o público que afluiu foi tão grande e tão incontrolado em sua raiva para com a vilã, que quase destruiu peças da igreja. Tanto que a partir daí não houve mais permissão para se gravar novelas naquele lugar. E com a novela seguinte, A Moça que Veio de Longe, o fenômeno de audiência aumentou ainda mais, sedimentando de vez o gênero novela no gosto popular. Estes três sucessos seguidos fizeram com que Dionísio fosse alçado à condição de diretor artístico da Excelsior, colaborando com a preparação de novelas em que ele não participou como ator ou diretor, como foi o caso de A Deusa Vencida, outro sucesso de audiência. • Uma Sombra em Minha Vida Novela de Cristina Leblon. Atuaram: Neuza Amaral, Murilo Amorim Correia, Odete Barros, Maria Cecília, Antonio Fracari, Irina Greco, Freddy Kleemann, Altair Lima, Tarcísio Meira, Mauro Mendonça, Glória Menezes, Lucy Rangel e Gilberto Sálvio, entre outros. 1963 • Corações em Conflito Novela de Ivani Ribeiro, com Flora Geni. Novelas que Dionísio dirigiu em outras emissoras Depois do fim da Excelsior, Dionísio ainda atuou como diretor em diversas emissoras. TV Record Chamado por Paulo Machado de Carvalho para implantar a teledramaturgia naquela emissora, mais acostumada aos musicais e humorísticos, Dionísio chegou a produzir alguns importantes trabalhos. 1972 • O Príncipe e o Mendigo, de Mark Twain Adaptação de Marcos Rey Com Fernando Baleroni, Kadu Moliterno, Adoniran Barbosa, Sebastião Campos, Wilma Chandler, Lídia Costa, Júlio César Cruz, Manoel da Nóbrega, Wilma de Aguiar, Adriana de Góes, Thilde Francheschi, Flora Geni, Suzana Gonçalves, Célia Helena, Nancy Helena, Kita, Nádia Lippi, Edmundo Lopes, Cláudio Lopomo, Miriam Mehler, Mauro Mendonça, Rubens Moral, Riva Nimitz, Gabrielo Paone, Rosa Ratz, Roni Rios, Ademir Rocha, Perry Salles, Walter Seyssel, Clayton Silva. 1971 • Os Deuses Estão Mortos Novela de Lauro César Muniz Com Rolando Boldrin, Fúlvio Stefanini, Márcia Maria, Jonas Mello, Laura Cardoso, Lia de Aguiar, Márcia Real, Roberto Bolant, Sérgio Mamberti, Carlos Augusto Strazzer, Linda Gay, Lolita Rodrigues, Adriano Stuart, David Netto, Maria Estela, Rogério Márcico, Newton Prado, Reny de Oliveira, Oscar Thiede, José Paulo Moutinho Filho, Luiz Carlos Braga, Edy Cerri, Henrique César, Irene Cruz, Arnaldo Fernandes, João Lourenço, Cláudio Mamberti, Lucy Meirelles, Célia Olga, Perry Salles, Ivanise Sena, Néa Simões. 1970 • As Pupilas do Senhor Reitor, de Júlio Diniz Adaptação de Lauro César Muniz. Com Dionísio Azevedo (Reitor), Márcia Maria, Maria Estela, Geórgia Gomide, Laura Cardoso, Agnaldo Rayol, Fúlvio Stefanini, Rogério Márcico, Lia de Aguiar, Lucy Meirelles, Linda Gay, Sérgio Mamberti, Lolita Rodrigues, David Neto, Edy Cerri, Carlos Augusto Strazzer, Hebe Camargo, Yolanda Cardoso, Carlos Eduardo (Kadu) Moliterno. 1969 • Algemas de Ouro Novela de Benedito Rui Barbosa e Dulce Santucci. Com Lolita Rodrigues, Laura Cardoso, Fernando Baleroni, Ivan Mesquita, Fúlvio Stefanini, Márcia Maria, Roberto Bolant, Reny de Oliveira, Suzana Vieira, David Netto, Rolando Boldrin, Maria Es-tela, Sérgio Mamberti, Adriano Stuart, Ademir Rocha, Teresa Campos, Altair Lima, Célia Rodrigues, Haroldo Botta, Linda Gay, Yolanda Cardoso. TV Cultura Em 1971, num intervalo dos trabalhos na Record, Dionísio é chamado por Benedito Rui Barbosa para dirigir a primeira novela produzida pela TV Cultura, emissora então com apenas dois anos de existência. A novela, intitulada Meu Pedacinho de Chão, foi escrita pelo próprio Rui. Integravam o elenco: Patrícia Aires, René de Vielmond, Percy Aires, Maria Aparecida Alves, Xandó Batista, Canarinho, Ênio Carvalho, Renato Consorte, Marilena de Carvalho, Maurício do Valle, Lurdinha Félix, Hemílcio Fróes, Castro Gonzaga, Mário Guimarães, Cacilda Lanuza, Sílvia Leblon, Ayres Pinto, Janete Pires. Esta novela, apesar das limitações de produção da TV Cultura, acabou tendo uma grande audiência, pelo texto simples e direto e pelo cuidado artesanal da direção. Tanto que a própria Globo adquiriu seus direitos e passava concomitantemente com o Canal 2. Enquanto os capítulos iam ao ar às 13 e às 18 horas na Globo, eram exibidos às 10h30 e às 22 horas pela emissora da Fundação Padre Anchieta. A novela, além da trama dramática propriamente dita, possuía uma intenção didática, com cenas que ensinavam o homem do campo a combater a verminose, construir instalações sanitárias, etc. E todos os temas rurais característicos do autor já estavam presentes em embrião naquele trabalho. TV Tupi Dionísio ainda chegou a colaborar com a TV Tupi, que estava já próxima da extinção, dirigindo dois trabalhos: no primeiro deles codirigiu com Gonzaga Blota, Jerônimo, o Herói do Sertão (1972), baseado no personagem criado por Moisés Weltmann. E a novela O Velho, o Menino e o Burro (1975), escrita por Carmem Lídia onde voltou a interpretar o famoso personagem velho Gui. Trabalhos como ator A partir de meados dos anos 1970 os trabalhos em televisão de Dionísio foram todos como ator: 1984 • Meu Destino É Pecar Adaptação do romance que Nelson Rodrigues escreveu sob o pseudônimo de Suzana Flag. Novela feita por Euclydes Marinho e dirigida por Ademar Guerra e Denise Saraceni. A parte musical foi feita por Dori Caymmi. Dionísio in terpretou Miguel Santa Rita, num elenco que contava com Tarcísio Meira, Lucélia Santos, Nicete Bruno, Osmar Prado e outros. 1983 • Pão, Pão, Beijo, Beijo (Rede Globo) Fez uma participação especial nesta novela de Walter Negrão, dirigida por Gonzaga Blota e Henrique Martins. • Champagne (Rede Globo) Interpretou Juca Mercadante, nesta novela de Cassiano Gabus Mendes, dirigida por Wolf Maya. 1982 • Quem Ama Não Mata (Rede Globo) Fez o papel do general Aurélio Flores, nesta minissérie escrita por Denise Bandeira e Daniel Filho, direção de Denis Carvalho. 1981 • Os Imigrantes (Rede Bandeirantes) Nesta grande novela de Benedito Rui Barbosa, que marcou época, fez o papel de Tufik, numa homenagem aos imigrantes árabes. A novela foi dirigida por Henrique Martins e Atilio Riccó. 1980 • Pé de Vento (Rede Bandeirantes) Novela de Benedito Rui Barbosa, dirigida por Paulo Plínio Fernandes e Arlindo Pereira. Fez o papel de Mestre André, cuja morte no final causou grande comoção. • O Meu Pé de Laranja Lima (Rede Bandeirantes) Original de José Mauro de Vasconcelos. Adaptação de Ivani Ribeiro, direção de Edison Braga e Waldemar de Moraes. Fez o papel do Portuga. 1979 • Pai Herói (Rede Globo) Outro sucesso de Janete Clair, dirigida por Walter Avancini, Gonzaga Blota, Roberto Vignati, Roberto Talma, com a supervisão de Daniel Filho. Atuaram, além de Dionísio, Glória Menezes, Paulo Autran, Tony Ramos, Lélia Abramo, Beatriz Segall, ao lado de numeroso elenco. • Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues (Rede Globo) Roteiro de Domingos de Oliveira. Direção de Paulo José. 1977 • Dona Xepa (Rede Globo) Fez o papel de Agenor na novela de Gilberto Braga, baseada no original de Pedro Bloch e dirigida por Herval Rossano. Yara Cortes fez dona Xepa e o elenco também contava com Rubens de Falco, Nívea Maria, Reinaldo Gonzaga, Cláudio Cavalcante, Edwin Luisi, Fregolente, entre outros. • O Astro (Rede Globo) Estrondoso sucesso de público. Dionísio fez o seu papel mais marcante na Globo, Salomão Hayala. Quem matou Salomão Hayala?, foi a pergunta que acompanhou todo o final da trama, escrita por Janete Clair e dirigida por Gonzaga Blota e Daniel Filho. No elenco havia nomes como Francisco Cuoco, Tony Ramos, Dina Sfat, Elisabeth Savalla, Tereza Rachel, Rubens de Falco, Heloisa Mafalda, Carlos Eduardo Dolabella, Edwin Luisi, entre outros. Cinema Como Ator 1995 • Eternidade (como Balteano) Filme português, baseado em novela de Ferreira de Castro. Roteiro e direção de Quirino Simões. Derradeiro filme de Dionísio, cujas locações em Portugal foram feitas ainda em 1989. Falecido em 1994, Dionísio não chegou a ver o filme nas telas. 1989 • Kuarup (como D. Anselmo) Adaptação da obra-prima de Antonio Callado, feita e dirigida por Ruy Guerra. 1985 • Os Bons Tempos Voltaram (episódio Primeiro de Abril) Roteiro de Daniel Más e Miguel Paiva, direção de Ivan Cardoso e John Herbert. • A Marvada Carne (como Nho Totó) Adaptação da peça de Carlos Alberto Sofredini, feita e dirigida por André Klotzel. Filme muito premiado em diversos festivais. Dionísio interpretou Nho Totó, atuando ao lado de Fernanda Torres (Carula) e Adilson Barros (Quim). 1983 • O Menino Arco-íris Roteiro e direção de Ricardo Bandeira. 1982 • O Fuscão Preto (como Lucena) Estreia de Xuxa Meneghel como atriz. Roteiro de Chico de Assis e direção de Jeremias Moreira Filho. • Verde Vinho Produção portuguesa, escrita e dirigida por Manuel Gama. 1979 •O Caçador de Esmeraldas (como Padre João Leite) Roteiro de Hernani Donato, baseado em seu próprio original. Direção de Oswaldo de Oliveira. 1976 • A Noite das Fêmeas Adaptação de original de Marcos Rey, filme realizado e dirigido por Fauzi Mansur. 1975 • O Dia em que o Santo Pecou Roteiro de Benedito Ruy Barbosa e direção de Cláudio Cunha. • Bacalhau Uma sátira ao sucesso Tubarão, escrita e dirigida por Adriano Stuart. 1974 • Sedução Adaptação de original de Marcos Rey, feita e dirigida por Fauzi Mansur. 1973 • Obsessão Filme baseado em original de Janete Clair, adaptado por Luis Antônio Piá. Direção de Jece Valadão. • A Pequena Órfã (como Velho Gui) Adaptação para as telas do sucesso da extinta Excelsior, com roteiro de Teixeira Filho e direção de Clery Cunha. 1972 • Longo Caminho da Morte Roteiro e direção de Júlio Calasso. • Independência ou Morte (como José Bonifácio de Andrada e Silva) Superprodução da Cinedistri, dirigida por Carlos Coimbra. Dionísio também colaborou no roteiro 1969 • Corisco, o Diabo Loiro (como Compadre Mariano) Roteiro e direção de Carlos Coimbra, baseado no original de Antônio Amaury de Oliveira. Produção de Oswaldo Massaini (Cinedistri) 1966 • O Santo Milagroso (como Padre José) Adaptação da obra de Lauro César Muniz, dirigida por Carlos Coimbra. Produção de Oswaldo Massaini (Cinedistri) 1964 • Lampião, o Rei do Cangaço Adaptação do livro de Eduardo Barbosa, feita por Carlos Coimbra, que também foi responsável pela direção. Produção de Oswaldo Massaini (Cinedistri) 1962 • O Pagador de Promessas (como Padre Olavo) Adaptação da peça de Dias Gomes feita e dirigida por Anselmo Duarte. O filme surpreendeu ao receber a cobiçada Palma de Ouro no Festival de Cannes. Também foi indicado ao Oscar como melhor filme estrangeiro, além de ganhar o Festival de Cartagena na Colômbia e o prêmio Golden Gate, como melhor filme e melhor trilha sonora, no Festival de San Francisco. Dionísio, além de atuar, teve um trabalho paralelo de consultor do diretor Anselmo para a parte artística. Produção de Oswaldo Massaini (Cinedistri) 1961 • O Pescador e sua Alma (The Fisherman and his soul) Produção brasileira e americana, baseada no conto de Oscar Wilde. Uma fábula sobre um pescador e uma criatura do mar, transportada para a paisagem brasileira dos jangadeiros. O filme foi premiado no Festival de Cinema de Edimburgo. Elenco: Dionísio Azevedo (Padre Serafim), Anthony Pompeii (Luiz), Cary Carmel (Janaína, a criatura do mar), Clênio Wanderley (Pimp), Lourdes Monteiro (Luzia), Jair Pimentel (Clarinetista), Flávia de Barros (Feiticeira), e os jangadeiros de Gaibu e Nazaré. Ficha Técnica: Direção: Charles Guggenheim Produção: Charles Guggenheim e Bernardo Segall Adaptação cinematográfica: Dale Wasserman e Bernardo Segall, baseado no conto de Oscar Wilde. Diálogos: Cláudio Petraglia Cenografia: Martino Martini e Adão Pinheiro Maquiagem: Gilberto Marques Guarda-roupa: Bernardo Dimenstein. Edição: Dede Allen Direção de fotografia: Haskell Wexler e Chick Fowle Música, composição e regência: Bernardo Segall. Laboratório: Rex Filmes. Estúdio/equipamentos: Cia. Cinematográfica Vera Cruz Distribuição: Cinedistri • A Primeira Missa (como Mestre Zuza) Roteiro e direção de Lima Barreto, baseado numa história de Nair Lacerda. Foi um momento pessoal muito importante para Dionísio que considerava o Lima Barreto como seu mentor nas artes. Ainda frustrado por não por ter podido participar do mais importante filme do diretor, que foi O Cangaceiro, ficou feliz por tomar parte nesta que foi sua derradeira película, que lhe rendeu também o prêmio Governador do Estado de melhor ator em 1962. 1960 • Cidade Ameaçada Roteiro e direção de Roberto Farias. Com Reginaldo Faria, Jardel Filho, Eva Wilma, Frego lente, Milton Gonçalves, Dionísio Azevedo, Douglas Oliveira. 1959(?) • Weit ist der Weg No currículo escrito por Dionísio mesmo sobre seus trabalhos, este filme é citado apenas de passagem, sem datação precisa e com o seguinte comentário feito por ele: Produção alemã sobre a construção de Brasília, aliás, tendo como fundo Brasília sendo construída, num paralelo com a arquitetura Barroca de Salvador. 1956 • O Sobrado (como Fandango) Adaptação de um episódio da saga O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo, feito por Walter George Durst e dirigida por ele e por Cassiano Gabus Mendes, com assessoria de Barbosa Lessa. 1953 • O Cangaceiro Dionísio, apesar de ter sido escalado por Lima Barreto para atuar no filme e ter participado de toda a fase inicial de preparação (ver fotos em Crônicas do Sumaré), acabou tendo de voltar para São Paulo por conta de dificuldades financeiras da família. Este fato se constituiu numa de suas grandes frustrações como ator. Mas ele sempre punha o filme em seu currículo, pois o considerava seu grande aprendizado prático como homem de cinema, como ele mesmo escreveu para sua esposa Flora enquanto estava nas locações: … nem queira saber como está sendo útil para o seu marido esta minha participação em O Cangaceiro. Fiz ótimas amizades, com Chick Fowles, grande sujeito, grande cinegrafista, que se (colocou) à minha disposição para acompanhar o trabalho dele atrás das câmeras, quando não estiver em cena e me dar qualquer explicação sobre o que eu desejar. E também com Caribé, desenhista da produção (grande artista que mora na Baía, São Salvador, e já pôs a casa dele à nossa disposição… É meu intento não perder o menor detalhe durante as filmagens para acrescentar aos meus conhecimentos teóricos – e por que não? Práticos… A frustração de meu pai foi ainda maior ao ver a grande receptividade mundial obtida pela película. O filme, escrito e dirigido por Lima Barreto, com diálogos de Rachel de Queiroz, era inspirado na figura mítica de Lampião e iniciou todo um ciclo da cinematografia brasileira. Além disso, foi o primeiro filme nacional a conquistar as telas do mundo. Considerado por muitos como a grande realização da era da Vera Cruz, o filme ganhou dois prêmios no Festival Internacional de Cannes: melhor filme de aventuras e melhor trilha sonora com a música Olé, muié rendeira, interpretada por Vanja Orico. O sucesso em Cannes levou o filme a 80 países, sendo vendido para a Columbia Pictures. Na França ficou em cartaz durante cinco anos. 1949 • Quase no Céu Roteiro e direção de Oduvaldo Viana 1948 • A Gata (filme experimental de Cassiano Gabus Mendes) Filmes Dirigidos por Dionísio Apesar de sempre ter acalentado o sonho de dirigir cinema, Dionísio atuou neste segmento mais como ator. Deixou, entretanto, quatro longas-metragens de sua autoria. São eles: 1976 • Chão Bruto Este foi o último filme dirigido por Dionísio e uma refilmagem do seu primeiro longa-metragem. Regina Duarte e Adriano Stuart interpretaram os papéis que foram de Flora Geni e Lima Duarte na primeira versão. O tom épico e o preto e branco foram trocados por um filme em cores com uma atmosfera geral mais intimista – embora enfatizando a mesma mensagem da versão de posse da terra, um assunto sempre presente na nossa história. Direção: Dionísio Azevedo Roteiro: Dionísio Azevedo e Hernani Donato Duração: 100 m. Produtora: Misfilmes Distribuidora: Art Filmes, Embrafilmes Elenco: Regina Duarte como Sinhana, Adriano Stuart como Lino. Maurício do Valle, Geórgia Gomide, Nuno Leal Maia, Xandó Batista, Ivanise Sena, Umberto Magnani, José Parisi, Genésio de Carvalho, Turíbio Ruiz, Walter Prado, Tony Tornado, José Fernandes, Marcos Câmara. Ficha Técnica: Fotógrafo: Reynaldo Paes de Barros Produção: Ciro Carpentieri Neto Música: Rogério Duprat Montagem: Luís Elias Decorador: Campelo Neto Figurinista: Nabor Maquiagem: Mário Lúcio, Luiz Antônio de Lima. Dionísio deixou também o primeiro tratamento de um roteiro baseado no conto de Guimarães Rosa Traços Biográficos de Lalino Salathiel, ou A Volta do Marido Pródigo. Este roteiro para cinema foi adaptado para televisão para a TV Cultura. Ainda para a TV Cultura, Dionísio assinou a adaptação de outro conto de Guimarães Rosa, Corpo Fechado, em 1975. 1973 • A Virgem Filme retratando o conflito entre cultura urbana e rural. Quatro jovens da cidade e suas namoradas saem pelo interior num clima alegre e descontraído, que termina em tragédia, quando a virgindade de uma das meninas vira um jogo para os rapazes. Roteiro e direção de Dionísio Azevedo Elenco: Nádia Lippi, Kadu Moliterno, Nuno Leal Maia, Nadir Fernandes, Célia Helena, Maria Luiza Imperial, Miriam Mayo, Tony Tornado, Alexandre Rodovan, Roberto Homsi, Clery Cunha, Marcos Rossi, Célia Olga Benvenutti, Lígia Mara. Ficha Técnica: Duração: 90 min. Distribuição: Cinedistri Assistente de direção: Marcos Rossi Produção: Saheb N. Homsi Gerente de produção: Waldemar BatistaAssistente de produção: Hélio Cunha Coprodução: Profilbrás Cinematográfica Música: Carlos Castilho Sonografia: Júlio Perez Caballar Fotografia: Gyula Koslozvari Câmera: José M. Gonçalves Edição: Luiz Elias Assistente de montagem: Darcy Faria Maquiagem: Paulo L. Alves Continuidade: Conceição C. Rocha Contrarregra: Waldemar Januário Eletricista: José G. Silva Divulgação: Maurício Kus Laboratório: Líder Cinematográfica Sistema Sonoro: Westrex Sonorização: Odil Fono Brasil Efeitos especiais: Prova Filmes Efeitos sonoros: Vanguarda Filmes O filme ganhou o Prêmio Governador do Estado, de 1973, para melhor argumento (Dionísio Azevedo) e Atriz Coadjuvante (Célia Helena). Nota do autor: Em relação a este filme talvez seja necessário algum esclarecimento sobre sua origem, que ouvi de meu pai. De fato, à época de sua exibição houve algum estranhamento sobre o fato de Dionísio ter produzido um filme tão fora do seu universo habitual. Na verdade, o argumento do filme foi escrito quase uma década antes, em meados dos anos 1960. Ele surgiu juntamente com todo o fenômeno da cultura Jovem Guarda, dos play-boys que entravam na Rua Augusta a cento e vinte por hora, como dizia a música. Todo aquele movimento urbano o impressionou, pois sua formação literária e mesmo humana tinha se dado mais no âmbito do regionalismo. Ele teve a ideia de fazer uma espécie de crônica de costumes, contrapondo o mundo jovem urbano, com suas liberalidades de costumes, com o mundo rural e suas tradições. Tinha apenas um título provisório, que era A Disputa ou alguma coisa parecida, pois o original acabou se perdendo. Este argumento foi parar na gaveta e ali esquecido por vários anos. No início dos anos 1970, meu pai se encontrava numa fase muito difícil, quase chegando mesmo a perder a casa da Zaíra, sem trabalho na televi são. Sobreviveu graças a participações no cinema atuando em filmes como Independência ou Morte e O Caçador de Esmeraldas. Foi então que se lembrou do argumento antigo e resolveu unir a necessidade de ganhar um dinheiro e voltar a dirigir. Conseguiu atrair com isso a atenção do produtor do filme. O roteiro sofreu adaptações diversas, para se enquadrar aos tempos em que foi filmado e embora deixasse a sua assinatura no filme, meu pai realmente não se satisfez inteiramente com a versão final – uma vez que não possuiu autonomia absoluta. O mesmo ocorreu com o título do filme, na verdade uma tentativa pueril de atrair o enorme público que afluía às salas onde eram exibidas as pornochanchadas, um fenômeno de bilheteria daquela década. 1967 • O Anjo Assassino Filme baseado no grande sucesso de Ivani Ribeiro A Outra Face de Anita, novela levada ao ar em 1964 pela TV Excelsior. Flora, que havia protagonizado a novela, fez o papel de Anita no filme também. Produtora: Cinepro Distribuidora: Cinedistri Roteiro: Lauro César Muniz Direção: Dionísio Azevedo Duração: 110 m. Elenco: Flora Geni, Altair Lima, David Neto, Raul Cortez, Edson França, Egídio Eccio, Nadir Fernandes, Celso Faria, Carlos Adese, Lélia Abramo, Ricardo Campos, Luciano Gregory, Athílio Guimarães, Edmundo Lopes, Wilson Louzada, Ivan Mesquita. Equipe técnica: Fotógrafo: Toni Rabatoni Produtores: Oswaldo Massaini, David Neto, Sérgio Ricci Canção tema: Chico Buarque de Hollanda Arranjo: Gabriel Migliore Montagem: Glauco Mirko Laurelli Desenho de produção: Jorge Vede Figurinista: Maria Inês da Silva Chefe de arte: João Carlos Barbosa Diretor assistente: Oswaldo de Oliveira Sonoplastia: Rosendo Bonnas, Carlos Foscolo, João Sagatio, Edgar Ferreira da Silva. O filme recebeu o prêmio de melhor música no Festival de Cabo Frio. Crítica do filme, feita por Alfredo Sternheim, veiculada no Estado de S. Paulo, em 1966: Fatalismo em Filme Nacional (…) Não obstante todos esses meandros folhetinescos, típicos dos originais para telenovelas e que incluem diálogos redundantes e enfáti cos demais, o filme adquire certa consistência, maior do que se esperava. É porque Dionizio Azevedo, confirmando o talento demonstrado na sua primeira longa-metragem, apresenta aqui um domínio artesanal, posto em função do entrecho, possibilitando a atmosfera que se fazia necessário. Utilizando moldes clássicos, o realizador de Chão Bruto, além da fluência, obteve um clima denso e mórbido, similar ao de vários serie noire do cinema francês, dirigidos por Julien Duvivier e outros nomes tradicionais. Não há, no atual cartaz dos cines Rivoli e Marabá, nenhum apego a virtuosismos fáceis e primários, como é comum verificar-se em muitas outras fitas do gênero, apenas para acirrar o suspense. Em vez disso, Dionizio comparece com um trabalho na maioria das vezes elegante e que, auxiliado pela iluminação de Toni Rabatoni e pelos acertos da música de Chico Buarque de Holanda, acrescenta natural fatalismo à intriga. (…) No elenco, Flora Geni é a presença que mais se impõe. Muito bem dirigida, a atriz empresta total naturalidade e charme à Anita e sua volúpia (…) 1958 • Chão Bruto Baseado no romance do mesmo nome de Hernani Donato, que trata da saga da ocupação do sudoeste paulista. Roteiro de Dionísio Azevedo e Hernani Donato. Direção de Dionísio Azevedo. Produtora: Gianelli Filmes Distribuidora: Cinematográfica Boa Vista. Elenco: Flora Geni, Lima Duarte, Cacilda Lanuza, Ayrton Ambrósio, Jorge Azevedo, Marly Bueno, Armando Castilho, Abdala de Aguiar, Iléa de Oliveira, Braz Evaristo, Aldo Ferreira, José Rodrigues Gonçalves, Barbosa Lessa, Benedito Luiz, Hugolino Michelazzo, Francisco Negrão, David Neto, Parrazio Pinto, Alberto Prado, Roberto Rocha, Turíbio Ruiz, César Skayer, Américo Taricano. Equipe técnica: Assistente de direção: Fernando Faro Fotógrafo: Dino Gianelli Música: Maestro Guerra Peixe Montagem: Lúcio Braun Desenho de produção: Geraldo Ambrósio Figurinista: Regina Pozi Maquiagem: Jerry Fletcher Diretor assistente: Jorge Azevedo Sonoplastia: Juarez Dagoberto Costa. O filme ganhou os seguintes prêmios: o Prêmio Saci de Cinema, dado pelo O Estado de S. Paulo, em 1959, como melhor roteiro. E também os prêmios Governador do Estado e Prefeitura de São Paulo, para a música de Guerra Peixe, Cacilda Lanuza, como atriz coadjuvante e Melhor Edição. Dionísio no Teatro Quando teve que escolher seu pseudônimo artístico, no início dos anos 1940, Taufik Jacob, ou Tufi, como também era conhecido na família, optou pelo sobrenome Azevedo em homenagem ao escritor brasileiro Aluizio de Azevedo, seu autor preferido. Já o primeiro nome foi uma referência ao mito grego, o patrono do teatro. E, durante 40 anos, Dionísio Azevedo frequentou os palcos paulistanos de modo bastante assíduo, participando de diversas produções. Algumas delas marcaram época. Atuou em peças do dramaturgo Abílio Pereira de Almeida, como O Bezerro de Ouro (1960) e Círculo de Champagne (1964). Mas um dos momentos mais marcantes no palco foi na peça A Morte do Caixeiro Viajante, de Arthur Miller, realizado no TBC (Teatro Brasileiro de Comédia). Dionísio interpretou o papel de Willy Loman. O espetáculo teve a seguinte ficha técnica: 1962 • A Morte do Caixeiro Viajante – São Paulo/SP Autoria: Arthur Miller Cenografia: Maria Bonomi Direção: Flávio Rangel , , Elenco: Carmen Silva (Jenny), Cleyde Yáconis (Linda Loman), Dionísio Azevedo (Willy Loman), Elísio de Albuquerque (Tio Ben), Juca de Oliveira (Happy Loman), Laércio Laurelli (Howard Wagner), Leonardo Villar (Biff Loman), Maria Célia Camargo (A Mulher), Nilda Maria (Srta. Forsythe), Ruthinéa de Moraes (Letta), Silnei Siqueira (Linda Loman), Stênio Garcia (Bernard), Xandó Baptista (Charley), Produção: Teatro Brasileiro de Comédia Tradução: Luís Jardim Ainda no TBC tomou parte na montagem de O Pagador de Promessas, de Dias Gomes, com direção de Flávio Rangel, substituindo Elísio de Albuquerque como o Padre Olavo, papel que interpretaria no premiado filme de Anselmo Duarte. No início dos anos 1970 foi convidado pelo diretor argentino Victor García, para tomar parte na revolucionária montagem do texto de Jean Genet, O Balcão. Era a época das grandes experimentações teatrais e o cenário rompia totalmente com o clássico conceito da quarta parede, criando uma estrutura de ferro que envolvia os espectadores na ação e praticamente reformulou todo o Teatro Ruth Escobar, onde foi realizado. Ficha técnica do espetáculo: 1969 • O Balcão 29/12/ 1969 – São Paulo/SP Teatro Ruth Escobar Autoria: Jean Genet Cenografia: Wladimir Pereira Cardoso Concepção: Victor García Coreografia: Paula Martins Direção: Victor García Direção (assistente): Carlos Augusto Strazzer e Seme Lufti. Elenco: Carlos Alberto de Brito (Revolucionário), Carlos Augusto Strazzer (Roger), Célia Helena (Carmen),David George (Sangue; Revolucionário), Dionísio Azevedo (General), Gileno Del Santoro (Esperma; Fotógrafo III; Revolucionário), Hélio José de Oliveira (Fotógrafo II; Revolucionário), Inês Paulino (Revolucionário), João Luís Amaral (Ritualista), Jonas Mello (Carrasco), José Andrade (Revolucionário), José Eduardo Vicente (Revolucionário), José Roberto Barbosa Vilar (Revolucionário), Leonardo Neto (Revolucionário), Márcio Ferreira (Revolucionário), Maria de Fátima de Barros Elihimas (Revolucionário), Mariano Castro (Escravo), Neide Duque (Ladra), Nezito Reis (Ritualista), Nilda Maria (Chantal), Paulo César Peréio (Chefe de Polícia), Raul Cortez (Bispo), Rofran Fernandes (Bispo), Ruth Escobar (Mme. Irma), Seme Lufti (Lágrimas; Fotógrafo I; Homem I; Revolucionário), Sérgio Mamberti (Juiz), Thelma Reston (Moça-Égua), Vera Lúcia Buono (Mulher Pecadora), Figurino: Victor García Produção: Ruth Escobar Victor García ainda convidou Dionísio para outra montagem, desta vez de A Vida é Sonho, de Calderón de la Barca, encenada no Festival de Teatro de Teerã (1974). Na década de 1970, Dionísio participou intensamente da vida teatral, em São Paulo e mesmo no Rio de Janeiro. Além das montagens com o diretor Victor García, atuou em diversas outras peças. As principais foram: 1987 • Vampíria Dionísio Jacob (Tacus) Teatro do Bexiga (São Paulo) Elenco: Dionísio Azevedo (Vovô Vlad), Flora Geni (Mamãe Dárvula), Miguel Ramos (Papai Voivoda), Geraldo Petean (Horloc), Helena Bag-noli (Letúcia), Décio Pinto (Renfélderson), Nelci Marcelo (Radu), Tatiana Nogueira (Ivonete e Sra. Zambellini), Paulo Giardini (Rodolfo e Sr. Zambellini), André Ceccato (Presidente) Ficha técnica: Direção geral: Dionísio Azevedo Assistente de direção: Marilene Barbosa Cenários e figurinos: Carlos Moreno e Marcos Bottasi Expressão corporal: Paula Martins Adereços e maquiagem: Neneco Iluminação: Dionísio Azevedo Sonoplastia: Tunika Assistente de sonoplastia: Márcio Megaton Música Saudades da Transilvânia, composta por Gustavo Kurlat em parceria com Dionísio Jacob. Arranjo: Gustavo Kurlat 1985 • Direita, Volver – Lauro César Muniz Teatro Paiol (São Paulo) Elenco: Dionísio Azevedo (Senador João Carioba), Cleyde Yáconis (Marina), Rosamaria Murtinho (Vera), J. França (Patrício), Flávio Guarnieri (Rafael), Bárbara Bruno (Bel), Cláudio Curi (General). Direção geral: Emílio Di Biasi Cenários: Walter Quaglia Figurinos: Ronaldo Damian Assistente de direção: Flávio Guarnieri Administração: Roberto Ashcar Produção executiva: Riwka Tauba Schwarc Programação visual: Zaé Júnior Produção: Uno e Escala Produções Artísticas S/C Ltda. 1984 • Um Tiro no Coração Oswaldo Mendes Auditório Augusta Elenco: Dionísio Azevedo (Getúlio Vargas), Walderez de Barros (Vedete), Umberto Magnani (Profeta), Luiz Serra (Carlos Lacerda), Annamaria Dias (Alzira), João Acaiabe (Gregório Fortunato), Vicente Acedo (General). Coro: Antonio Chagas, Luís Eduardo Fernandes, Paulo Novaes, Susie Walker, Renato Modesto, Miguel Vicente. Direção geral: Plínio Rigon Cenário e figurinos: J.C. Serroni Direção musical e músicas: Dyonisio Moreno Iluminação: Abel Kopansky Sonoplastia: Luiz Carlos Costa Assistente de direção: Walmor Borges Direção de produção: Aurélio Laborda Produção: Rigon Produções Artísticas Ltda. Produtores associados: Oswaldo Mendes, Aurélio Laborda e Sílvio de Abreu. 1981 • O Dia em que Raptaram o Papa – João Bethencourt Teatro Itália (São Paulo) Elenco: Dionísio Azevedo, Etty Fraser, Luís Carlos Arutin, Riva Nimitz e Henrique César, entre outros. Direção geral: José Renato 1979 • O Pagador de Promessas – Dias Gomes Teatro Adolpho Bloch (Rio de Janeiro) Elenco: Dionísio Azevedo (Padre Olavo), Tony Ramos (Zé do Burro), Fátima Freire, Carlos Koppa, Júlia Miranda, Jorge Chaia, Fernando Azevedo e outros. Direção geral: Flávio Rangel Cenários e figurinos: Arlindo Rodrigues 1978 • Gata em Teto de Zinco Quente – Tennessee Williams Teatro Brigadeiro – São Paulo Elenco: Dionísio Azevedo (Papaizão), Flora Geni (Mamãezona), Cléo Ventura (Maggie), João Paulo Adour (Brick), Yvete Bonfá (Mãe), Osmar Di Pieri (Gooper), Marcos Lander (Reverendo Tocker), Geraldo Louzano (Dr. Tom), Franscisca Lopes (Governanta) Ficha Técnica: Tradução e direção geral: Kiko Jaess Cenografia e figurinos: Gianni Ratto Produção executiva: Lilio Abramo Trilha musical: Murilo Alvarenga Assistente de direção: David Le Roy Administração: Guaracy Campos Produção: Emmerich&Perdigão Produção executiva: Lilio Alonso 1975-1976 • Concerto n° 1 para Piano e Orquestra Texto de João Ribeiro Chaves Netto Teatro Brigadeiro – São Paulo Elenco: Dionísio Azevedo (Armando), Madalena Nicol (Joana), Regina Duarte (Mariana), Umberto Magnani (Clóvis), Eduardo Andrews (Osvaldo), Aizita Nascimento (Dália), Liana Duval (Dona Consuelo), Maria Ylma (Judite), Cláudio Savieto (Um amigo) Ficha técnica: Direção: Sérgio Mamberti Assistente de direção: Regina Duarte Cenários e figurinos: Sarah Feres Preparação corporal: Ivaldo Bertazzo Música: Cláudio Savietto Trilha sonora: Tunika Sonoplastia: Tunika e Hugo Rothschild Iluminação: Giancarlo Bartolloti Assessoria jurídica: D´Antino Administração: Umberto Magnani Produção executiva: Theresa Freitas Espetáculos Alternativos/Leituras Além destes espetáculos acima citados, Dionísio ainda participou de algumas montagens experimentais e/ou leituras encenadas publicamente, entre 1986 e 1989. As principais foram: • O Quarteto, de Antônio Bivar (com Geórgia Gomide) • Lua Turca, espetáculo alternativo (Espaço Off) • As Mãos Sujas (laboratório com Augusto Boal sobre o texto de Sartre) • O Homem e o Cavalo, de Oswald de Andrade, leitura encenada por José Celso Martinez Corrêa, num ciclo de leituras sobre a obra de Oswald realizado no Teatro Sérgio Cardoso. Linha do Tempo de Flora Geni Cronologia de Flora Geni Principais trabalhos na televisão TV Tupi 1958 • O Anel Teleteatro de Walter George Durst e Cassiano Gabus Mendes, com direção de Cassiano Gabus Mendes. Em meados dos anos 1950, Flora adaptou e produziu episódios de As Mil e Uma Noites, fazendo o papel de Sherazade. 1957 • Os Três Mosqueteiros Adaptação de J. Silvestre da obra de Alexandre Dumas, pai. 1955 • Engenho das Almas Teleteatro de Péricles Leal 1954 • Sangue na Terra Teleteatro de Péricles Leal 1953 • Olhos Mortos de Sono Teleteatro baseada na obra de Tchecov, com direção e adaptação de Dionísio Azevedo. 1952 • Rosas para o Meu Amor Teleteatro de José Castellar Participações no TV de Vanguarda 1953 • Massacre Teleteatro baseado na obra de Emmanuel Roblés, com adaptação de Miroel Silveira e direção de Cassiano Gabus Mendes. • Os Humildes Teleteatro escrito e dirigido por Dionísio Azevedo • Hamlet (como Ophelia) Adaptação e direção de Dionísio Azevedo da obra de William Shakespeare • No Caminho da Vida Adaptação e direção de Cassiano Gabus Mendes da obra de Lillian Hellman. 1952 • Othelo (como Desdemona) Adaptação e direção de Dionísio Azevedo da obra de Willian Shakespeare Outros teleteatros 1959 • O Aventureiro • Marco Milhão (Flora ganhou o prêmio de melhor atriz por este trabalho) • Fim de Semana no Campo Adaptação e direção de Dionísio Azevedo da obra de Noel Coward. 1958 • Traição • Ralé • Suspeita Adaptação e direção de Dionísio Azevedo da obra de J.B. Priestley • Os Miseráveis Adaptação e direção de Dionísio Azevedo da obra de Victor Hugo. 1957 • Tragédia em Nova Iorque • Tio Vânia • A Joia Roubada, de Tchecov • O Pequeno Incidente • Sinfonia Inacabada • Ilusão • Bocage 1956 1955 Participações de Flora no TV de Comédia 1959 • Manhãs de Sol • O Conde e a Plebeia 1958 • Veneno de Cobra • Vende-se um Passado • Inimigos Íntimos Trabalhos na TV Excelsior – Canal 9 1969 • A Menina do Veleiro Azul (como Letícia) Novela de Teixeira Filho e Dárcio Ferreira, dirigida por David Grimberg. 1968 • O Direito dos Filhos Novela de Teixeira Filho, dirigida por Henrique Martins. 1967 • Os Fantoches (como Nazaré) Novela de Ivani Ribeiro, dirigida por Walter Avancini. • O Tempo e o Vento (como Maria Valéria) Concepção teledramatúrgica de Dionísio Azevedo a partir da obra homônima de Érico Veríssimo, adaptada por Teixeira Filho. 1966 • Ninguém Crê em Mim (como Paula) Novela de Lauro César Muniz, dirigida por Dionísio Azevedo. • Redenção (como Sílvia) Novela de grande duração com vários autores e diretores, entre eles Reynaldo Boury. 1965 • Aquele que Deve Voltar (como Vera) Novela de Ciro Bassini e Délia Gonzales Marques, dirigida por Mauro Mendonça. • A Grande Viagem (como Irene) Novela de Ivani Ribeiro, dirigida por Walter Avancini. 1964 • As Solteiras (como Carmen) Novela de Dulce Santucci, dirigida por Tito di Miglio. • Ambição Novela de Ivani Ribeiro, dirigida por Dionísio Azevedo. • A Moça que Veio de Longe (como Theresa) Novela de Ivani Ribeiro, dirigida por Dionísio Azevedo. • A Outra Face de Anita (como Anita) Novela de Ivani Ribeiro, dirigida por Dionísio Azevedo. 1963 • Corações em Conflito (como Beatriz) Novela de Ivani Ribeiro, dirigida por Dionísio Azevedo. Participação em novelas de outras emissoras, após o fim da TV Excelsior. 1990 • Pantanal – TV Manchete (participação especial como Ana) Novela de Benedito Ruy Barbosa, dirigida por Jayme Monjardim. 1983 • Sabor de Mel – Rede Bandeirantes (como Leila) Escrita por Jorge Andrade (substituído por Lafayette Galvão) e dirigida por Roberto Talma. 1982 • Pão, Pão, Beijo, Beijo – Rede Globo (como Gema) Novela de Walter Negrão, dirigida por Henrique Martins e Gonzaga Blota. 1981 • Os Imigrantes – Rede Bandeirantes (como Rosita) Novela de Benedito Ruy Barbosa, dirigida por Henrique Martins e Atílio Riccó. 1980 • Pé de Vento – Rede Bandeirantes (como Leila) Novela de Benedito Ruy Barbosa, dirigida por Paulo Plínio Fernandes e Arlindo Pereira. 1979 • Os Gigantes – Rede Globo (como Ivone) Novela de Lauro César Muniz, dirigida por Régis Cardoso e Jardel Mello. 1977 • Um Sol Maior – Rede Tupi (como Maria de Lourdes) Novela de Teixeira Filho, dirigida por Edson Braga, Henrique Martins e Waldemar de Moraes. 1972 • O Príncipe e o Mendigo – TV Record (como Mrs.Canty) Novela de Marcos Rey, adaptada da obra homônima de Mark Twain. • A Patota – Rede Globo (como Aurélia) Novela de Maria Clara Machado, dirigida por Reynaldo Boury. 1971 • Editora Mayo, Bom-dia – TV Record (como Helena) Novela de Walter Negrão, dirigida por Carlos Manga. • Meu Pedacinho de Chão – TV Cultura Novela de Benedito Ruy Barbosa, dirigida por Dionísio Azevedo. 1970 • Tilim – TV Record (como Lídia) Novela de Dulce Santucci, dirigida por Wanda Kosmo Atuações no Cinema 1983 • O Menino Arco-íris Escrito e dirigido por Ricardo Bandeira. 1979 • O Guarani Roteiro de Odi Fraga e Fauzi Mansur, dirigido por Fauzi Mansur. 1976 • A Noite das Fêmeas Roteiro de Marcos Rey, dirigido por Fauzi Mansur. 1975 • O Dia em que o Santo Pecou Roteiro de Benedito Ruy Barbosa, dirigido por Cláudio Cunha. • Cada um Dá o que Tem (segmento O Despejo) Roteiro de Sérgio Jockyman e Marcos Rey, dirigido por Sílvio de Abreu e John Herbert. 1974 • Sedução Roteiro de Marcos Rey, dirigido por Fauzi Mansur. 1973 • Obsessão História de Janete Clair, roteirizada por Luiz Antônio Piá e dirigida por Jece Valadão. 1972 • Independência ou Morte Roteiro de Carlos Coimbra e Dionísio Azevedo, dirigido por Carlos Coimbra. 1965 • O Anjo Assassino (como Anita) Adaptação para o cinema da novela A Outra Face de Anita, de Ivani Ribeiro. Roteiro de Lauro César Muniz e direção de Dionísio Azevedo. 1958 • Chão Bruto Filme com direção e roteiro de Dionísio Azevedo, baseado na obra homônima de Hernani Donato. 1949 • Quase no Céu Filme escrito e dirigido por Oduvaldo Vianna. Atuações no Teatro 1989 • De Repente, no Último Verão, de Tennessee Williams Direção de Kiko Jaess. Teatro Municipal de Santo André. 1987 • Vampíria, de Dionísio Jacob Direção de Dionísio Azevedo. Teatro do Bexiga. Flora, além da carreira de atriz, chegou a fazer adaptações para a televisão, na época do pioneirismo. Roteirizou histórias de As Mil e Uma Noites e também obras de fôlego – Oliver Twist, Nascida Para o Mal, Um Lugar ao Sol e O Vento Levou. Em seus anos finais utilizou este conhecimento para divulgar a fé espiritualista que praticava. Com a ajuda de Dionísio fez um roteiro cinematográfico para a obra E a Vida Continua, de André Luís, que, entretanto, não chegou a ser filmado. Mas seu trabalho mais ambicioso foi a peça teatral Quero Voltar Para Casa. O espetáculo recebeu e vem ainda recebendo diversas montagens de grupos especializados em teatro espírita, como o grupo de teatro do Centro Espírita Ismael (São Paulo, Jaçanã) e da União Municipal Espírita de Petrópolis – Umep (Rio de Janeiro). Além dessas montagens não profissionais, a peça acabou ganhando uma bela produção em 1993, Flora e Dionisio em Vampíria no Teatro Maria Della Costa, com a seguinte ficha técnica: Elenco: Angelina Muniz, Marilene Barbosa, Olívia Camargo, Tânia Beckler, Marcelo Galdino, Paulo Almeida e Paulo Celestino. Cenário e figurinos: Márcio Medina Música: André Abujamra Adaptação: Edmara Barbosa Administração: Antoninho Matias Supervisão: Dionísio Azevedo Direção geral: Annamaria Dias Produção: Leila Lopes. Houve ainda uma remontagem desta produção em 1997, quando a produtora e atriz Leila Lopes substituiu Angelina Muniz no papel principal. 1982 • Os Filhos do Silêncio, de Mark Medoff. Esta peça foi uma grande produção que inaugurou o Teatro Sesc-Pompeia, ousado projeto da arquiteta Lina Bo Bardi. A direção geral do espetáculo ficou a cargo de José Possi Neto. Fizeram parte do elenco: Irene Ravache (Sarah), Odilon Wagner (James Leeds), Flora Geni (Sra. Norman), Aldo Cezar (Franklin), Mira Haar (Lydia), Thereza Freitas (Edna Klein), Hélio de Abreu (Orin). Na parte técnica trabalharam: Aldo Perachi, terapeuta e consultor do espetáculo. Felippe Crescenti, cenógrafo. Valéria S. Wagner, assistente de direção e figurinista. Abel Kopanski, montagem e operação de luz. Carmo Luís, contrarregragem e operação do som. Artelino Macedo, administração e divulgação do espetáculo. Anexos Dionísio Fala Sobre Interpretação Trechos do depoimento dado por Dionísio para Carlos Queiroz Telles, em 1979, transcrito com a autorização do CCSP/DADOC/AMM (Centro Cultural São Paulo/ Divisão de Acesso e Documentação e Arquivos Multimeios). (Este depoimento fazia parte de uma pesquisa sobre a História da Televisão Brasileira, feita com a supervisão de Queiroz e que contava com os seguintes pesquisadores: Edgard Ribeiro de Amorim, Flávio Luiz Porto e Silva, Rita Okamura, Maria Elise V. de Albuquerque, Vera Lúcia Rocha, Yara Marina Rodrigues e Nancy V. Hernandes). Sobre a técnica da interpretação do ator brasileiro, do teleteatro até a telenovela atual. As primeiras pesquisas no tempo da Tupi. Dionísio: (…) Antes da TV, os atores faziam teatro, rádio e um pouco de cinema na fase da Vera Cruz. Daí apareceu a televisão, trazida pelo Chateaubriand, e nós pensamos: e agora, o que vamos fazer com isso? Como todos tinham ideias de cinema, imagens de cinema, começou assim a se imaginar as primeiras coisas que poderiam ser feitas na TV. Os atores, como eram todos de radioteatro ou radionovela, mas com muita bagagem de teatro, começaram a pensar numa forma de interpretação para televisão. Foram feitos muito exercícios, muitas experiências no sentido de buscar uma atmosfera, um clima de interpretação que correspondesse à TV, com ritmos certos, falas, posicionamentos, etc. Isso porque os atores tinham uma marcação teatral muito acentuada, e muito antiga, da década de 1930, visto que o TBC, o Arena, o Oficina só apareceriam mais tarde. E a representação na TV precisava ser mais real, mais próxima do cinema, sem a rigidez e a empostação do teatro da época. Assim foram sendo feitas as primeiras experiências e deram os primeiros resultados. Quando nós fazíamos textos clássicos, evidentemente utilizávamos uma postura mais clássica, mas sempre tendo em vista que estávamos na televisão. Assim fizemos os primeiros programas de TV de Vanguarda. Nos baseávamos também nos filmes italianos (Roma Cidade Aberta), com uma interpretação mais expressiva a nós, mais latina, mais real. Mas para falar a verdade tudo ainda era muito confuso, e é lógico, tinha que ser. Com o correr do tempo vimos que tínhamos de levar autores brasileiros para o TV de Vanguarda e não apenas Tchecov, Tennessee Williams e outros estrangeiros. Levamos Guimarães Rosa… E precisamos fazer pesquisas sobre interpretação, laboratório mesmo, para elaborar bem a nossa realidade. Assim, passamos a criar mais, a sermos mais ousados, irmos com a câmera para a rua (a pracinha atrás da Tupi foi palco de inúmeras peças). Um dia, na minha casa, por volta de 1957, com amigos da Tupi, pegamos o Sagarana, o Corpo Fechado e começamos a estudar aquele jeito tão mineiro, tão brasileiro de falar, e começamos a analisar, a fazer expressão corporal. Naquele tempo nós fazíamos também gaúchos, pernambucanos, etc., numa ânsia de descobrir as verdades daqueles textos: de interpretação, cenográficas, de figurinos, de gestos, numa experiência muito criativa. Sobre a interpretação na fase das novelas, na Excelsior. Dionísio: (…) nós tínhamos (na Excelsior) cenógrafos muito importantes, por exemplo, o Klaus, que já picou a mula e nunca mais o vi. Naquela época, o responsável pelo teatro ou novela era o responsável por tudo, pelo figurino, pelo cenário, por tudo... e nós tínhamos discussões sobre todos os detalhes da produção com cada equipe e era um trabalho muito forte. Assim, quando o roteiro chegava até o ator, tudo já estava mastigado, muito facilitado para ele interpretar, apesar dele, ator, também participar de tudo, saber de tudo. Isso até quando as novelas eram três vezes por semana. Quando a novela explodiu diária com o Alô…, aliás, essa novela surgiu assim sem nenhuma intenção de estourar, era para ser bem emoção, no estilo bem mexicano, sem maiores propostas, sem nenhuma ambição, era uma história lacrimogênea. No momento eu senti que os atores representavam sem muita garra, sem muita elaboração. Num modo: estamos aqui só para faturar, sem maiores preocupações. A novela fez sucesso e esse gênero estourou. Mas a coisa não podia durar muito nessa ideia de lágrima pela lágrima. Precisava voltar a ideia da pesquisa, de produção elaborada, de estudo cenográfico. Como diretor na Excelsior, propus muitas mudanças para quebrar esse esquema apenas emocional. Assim, passaram a gravar nos estúdios da Vera Cruz, podendo se armar grandes cenários, elaborar mais em cima do texto e daí aconteceu a grande fase de sucessos da Excelsior, A Moça que Veio de Longe, etc… Essa fase continuou, mas com os estúdios transferidos para a Vila Guilherme e com todo o sucesso das novelas dessa época da Excelsior. Mas com o ator ocorreu a mesma acomodação: Novela é uma coisa que dá bom dinheiro, é muito desgastante, o sucesso vem fácil, não é preciso se esforçar muito. Qualquer coisa boa eu faço no teatro. Aliás, um dia ocorreu uma coisa curiosa, o Florentino Valenti, da Serrador, me perguntou por que o ator brasileiro era bom na novela e não era bom no cinema (pergunta feita ainda nos anos 1960) , isso porque eu estava lidando com cinema, fiz um filme da novela A Outra Face de Anita, que no cinema chamou O Anjo Assassino. Isso foi em 1965. Eu disse que talvez fosse porque o ator estava mais acostumado com o esquema da novela, se soltava mais, não tinha tanto compromisso de teor artístico, sei lá. Ele disse: é, talvez… Realmente eu acho que a novela soltou mais o ator, porque ele priva constantemente com ela, está sempre com a mão na massa, está familiarizado. É o que acontece com o ator europeu ou americano, que tem sempre trabalho por lá. Não é o que acontecia aqui em 1962, 1963, quando um ator trabalhava e não sabia quando iria trabalhar de novo. Quando a novela passou a ser diária, o ator viu isso como mais um lugar onde ele poderia ganhar dinheiro, com continuidade. Assim, a novela acomodou os atores, mas não todos. Havia um bom grupo que fazia com garra, queria pesquisar, queria fazer política. Fizemos novelas maravilhosas, como A Muralha, O Tempo e o Vento, com os seus três episódios, com muita arte de interpretação, montagem, cenários, etc. Havia por outro lado um ponto positivo: vinham atores de teatro, de cinema, de televisão, fazer a mesma novela. Surgia certo cuidado, certo amor próprio de interpretação e a novela enriquecia muito neste sentido. Hoje, por exemplo, o ator sabe que tem que desenvolver o seu trabalho, para fazer algo de bom, já. (…) O ator não deve se acomodar num tipo físico ou psicológico. O ator tem que descobrir seu personagem, atuar e criar em cima dele, sempre procurando melhorá-lo, compreendê-lo, e não encontrá-lo pronto. Sobre o futuro da telenovela (obs.: depoimento feito em 1979) Dionísio: Stendhal disse: O romance é um espelho ao longo da vida… (a partir daqui o texto não está transcrito literalmente, apenas expõe as observações que Dionísio fez). Dionísio faz uma grande apologia do Brasil, da vida brasileira, das riquezas regionais, étnicas, geográficas, históricas, sociais, dos problemas atuais do País e que tudo isso dará tema de novela. Fala também sobre as propostas de Bráulio Pedroso, desde Beto Rockfeller (dirigida pelo Lima Duarte), que criaram novas vertentes, elogia a Globo por reunir sob contrato autores tão bons como Lauro César Muniz e outros. Diz que está sempre vindo gente nova para atuar, para escrever e cita a Fênix que sempre renasce. Comenta sobre quantos ainda estão começando o principal do seu trabalho e ainda não deram tudo o que podem. Faz o elogio da novela ambiciosa, com produção bem-feita, cuidado artesanal, com pesquisas de texto, em detrimento das novelas pequenas, de mentalidade pobre, as tacanhas. Flora Fala Sobre a TV Excelsior Em 1984, Flora deu um depoimento para o pesquisador Edgard Ribeiro de Amorim, do Idart, sobre a sua experiência no Canal 9, TV Excelsior. Este depoimento fazia parte de uma pesquisa intitulada A História da TV Excelsior e contava também com o trabalho da pesquisadora Selma de Carvalho Kauffmann e com a supervisão de Flávio Luiz Porto e Silva. Reproduzimos abaixo alguns trechos selecionados do longo depoimento, com a devida autorização do CCSP/DADOC/AMM (Centro Cultural São Paulo/Divisão de Acesso e Documentação e Arquivos Multimeios). Sobre o início de Flora na Excelsior e também da própria Excelsior Edgard: Então tá, Flora. Eu queria que você contasse desse seu início na TV Excelsior. Flora: Eu fui para o Canal 9 em 1960. Não me lembro exatamente, mas é 1960. Eu era atriz do Canal 4, mas fui para o Canal 9 que na época tinha muito pouco teleteatro. Tinha o Brasil 60 com a Bibi Ferreira… tinha ainda pouca programação o Canal 9… estava iniciando, né? Edgard: Era mais aquilo de filmes, né? Flora: Era… filme. Eu fazia a apresentação da noite dos filmes. Tinha uma sessão… que nem a Coruja (sessão Coruja)… agora. E eu apresentava o filme, falava dos personagens principais, todo dia às 11 horas da noite. Fazia isso… fazia comerciais… e logo depois começou uma novela, foi a primeira novela do Canal 9… novelas argentinas… que tinham diretores argentinos.. Edgard: Essa primeira novela você lembra o ano? Ainda 1960 ou 1961? Flora: Por aí. Já era 1961 quase… era Alô… o número do telefone eu não lembro qual era… era a Glória Menezes e o Tarcísio Meira… Edgard: Foi a primeira diária, né? Flora: Foi a primeira diária, … mas aí essas novelas ainda eram argentinas, eram trazidas… a Glória Magadan era da Colgate-Palmolive… eram novelas cubanas e argentinas traduzidas… muito ruins… Edgard: Você trabalhou nessas…? Flora: Nessas eu não trabalhei. Nessa época eu ainda fazia só comerciais… Edgard: E apresentações… Flora: Tinha um teatro semanal… aí o Dionísio foi para lá e começou a se fazer um teatro comercial… um teatro semanal… Edgard: E as direções de quem era desses teatros? Era sempre do Dionísio ou… variava? Flora: … eu lembro mais do Dionísio… O Walter George Durst também fez algumas coisas, mais como autor, adaptador… o Túlio de Lemos também dirigia alguma coisa… O Avancini dirigia ainda o programa da Bibi Ferreira… que era o programa mais importante da época (no 9)…o Brasil 60 … Aí eu fiz a segunda novela Corações em Conflito. A adaptação era da Ivani Ribeiro, mas era novela argentina… Era eu, o Carlos Zara, Edmundo Lopes, Arlete Montenegro, Lídia Costa… Edgard: Isso foi na época do Edson Leite ou ainda não? Flora: Do Edson Leite… Quando o Edson Leite foi para lá… começou a movimentar mais… começou a contratar… Sobre as externas Edgard: … você teve alguma briga com a Tupi ou não? Você simplesmente saiu e se foi? Flora: Não. Eu saí. E o Dionísio também, terminou o contrato e saiu. Não interessou… as bases propostas… fomos embora… Aí chegou o Edson Leite e começou a movimentar… e começou a novela diária… O Dionísio resolveu falar com o Edson e fazer novelas brasileiras, acabar com aquele negócio (de novelas argentinas). (…) Aí o Dionísio falou com a Ivani Ribeiro e eles fizeram a primeira novela brasileira que foi Ambiçãoe foi feita a primeira externa… foi feita na Igreja da Consolação… era o casamento do Tarcísio Meira com a Lolita Rodrigues… e no casamento final da mocinha com o mocinho, o Dionísio bolou a primeira externa. Tudo era feito no estúdio antigamente… no tempo da Tupi, TV de Vanguarda, não existia videoteipe… então externa… eles transportavam uns galhos aí à tarde, botavam no estúdio e a noite ficava aquele galho seco, já estava seco à noite, mas era externa, era floresta, era rua e no Canal 9 o Dionísio ficou… como um dos inovadores da externa. Aí acabaram com a Igreja da Consolação, acabaram com os altares… Edgard: Mas isso o quê? O público ou… Flora: O público. É (foi) uma loucura. Foi aí que começou… a mexer realmente… Nunca mais o padre daquela Igreja, é um padre famoso, permitiu que ninguém mais fosse gravar nada, nunca ninguém gravou mais nada porque realmente foi um reboliço. Edgard: Flora, eu não sei se você se lembra, teve muita dificuldade técnica pra fazer isso? Por que era uma ousadia, né? Flora: Era difícil… Aí depois desse sucesso começaram só novelas brasileiras. A Ivani fez A Moça que Veio de Longe, que foi um sucesso absurdo. E foi o grande sucesso do Hélio Souto como galã. Era a Rosa Maria Murtinho, o Hélio Souto, Neusa Amaral, eu, o Ivã Mesquita… o Gilberto (Sálvio) (…) Depois veio A Outra Face de Anita… também um grande sucesso… eu fiz (a personagem Anita)… era com o Fúlvio Stefanini, Armando Bógus, Bentinho... que fez muito sucesso… fez um personagem débil mental (…) Aí o Avancini começou a dirigir… veio a Deusa Vencida. O Dionísio também fez um ciclo do… Érico Veríssimo… foi a primeira vez que (se) saiu de São Paulo para fazer externas… aqui perto de São Paulo… em São José… Edgard: São José dos Campos? Flora: São José dos Campos. (…) Então ele fez externas, depois saiu uma caravana, uma coisa assim impressionante, foi uma das primeiras coisas que se gravaram fora, porque as externas eram sempre próximas. (…) estava tudo mais adiantado, já tinham mais condições técnicas… Sobre as inovações Edgard: E como era trabalhar no Canal 9 em termos de figurino, em termos de direção? Flora: Acho que foi o grande renovador… (o Canal 9), porque eles fizeram estúdios muito grandes e • o Edson Leite era uma pessoa muito ambiciosa… não era comedido… então ele largava a imaginação. Eles fizeram uns estúdios, pela primeira vez… agora na Globo ainda se monta e desmonta • o cenário (obs.: este depoimento foi dado em 1984) … No Canal 9 não tinha isso, cada novela… porque aí já existiam várias novelas, de uma novela diária passou para três novelas, começou um sucesso muito grande, aí já tinha novela das 7, novela das 8, novela… tinha três novelas… E então em cada estúdio era montada a novela. Esse estúdio era fechado à noite… e os cenários ficavam montados… vários camarins muito bons… e… cuidado, muito cuidado com os figurinos … a (novela) Muralha… quando foi feita… A Deusa Vencida… eram muito bem produzidas… Edgard: E a cenografia também, né? Flora: Muito boas as cenografias (…) Tanto que o ciclo que o Dionísio fez de O Tempo e o Vento foi muito bem realizado, muito bem produzido … tinha cavalos… tinha tudo que precisava, os cenários (eram) muito bem-feitos… tinha galinha, o Dionísio era muito exigente, ele queria galinha mesmo, ciscando, então eram muito bem- feitas as novelas, tanto que foi um sucesso e só parou porque ela (a TV Excelsior) começou a entrar em decadência financeira por causa da má administração… só pode ser, porque ela era um sucesso e os atores começaram a sair… a debandar… Sobre a interpretação Edgard: A interpretação das novelas tinha uma postura mais carregada, uma marcação assim mais rígida? Flora: Dentro da época… Edgard: Não é como hoje, né? Flora: Não… hoje em dia há um naturalismo… muito naturalismo, muitos atores, entendeu? Se talvez mandar esse ator fazer uma peça… Edgard: De maior fôlego, né? Flora: De maior fôlego, de maior texto… porque é muito fácil… Oba, o cara, cê tá bom? Não tá legal?… aquela coisa natural… que é legal, mas às vezes é um pouco natural demais… A gente veio do TV de Vanguarda, no Canal 4… Pirandello, Shakespeare, todos os grandes clássicos… então a interpretação era mais marcante. Agora já mudou, como tudo muda, houve muita mudança de interpretação, a Globo deu outro ritmo… E tinha muito bons atores (no Canal 9), todos os grandes atores estavam lá… Sobre a valorização financeira do ator Flora: (…) Era uma loucura porque a gente, por exemplo, ganhava… o Dionísio estava ganhando pouco… ganhava assim, por exemplo, vinte e cinco mil cruzeiros na Tupi (obs.: dinheiro que circulava na época do depoimento)… aí o Edson Leite chegou e falou: você quer ganhar duzentos? A gente ficou louco… a gente pensou que tivesse ficado rico de repente… sabe… (como) você ganhar na loteria esportiva? Duzentos mil por mês? Mas como? De vinte e cinco? Então era assim… ele oferecia e pagava. A gente já recebia… só paramos de receber no final mesmo… em 1968, 1969, a coisa começou a… Edgard: E como é que foi isso para a cabeça do ator? Por que a Tupi não valorizava muito o ator (financeiramente) e de repente a Excelsior parece uma Hollywood brasileira. Flora: Foi uma loucura… Edgard: Isso na cabeça do ator como é que foi? Ele começou a se dar mais… o sucesso… Flora: Não, o trabalho lá… é gozado, o ambiente era muito bom no Canal 9, era muito gostoso, talvez pela euforia de estar indo tudo muito bem e não havia essa ameaça de desemprego, porque a gente tinha a Tupi, a Globo estava começando no Rio também, então no mercado de trabalho não existia essa expectativa tão angustiante que tem agora… (Obs.: sempre lembrando que o depoimento se refere a meados dos anos 1980). Agora você começa a fazer uma novela… você foi contratado só para aquela novela. Há exceções, raríssimas exceções de atores… que são contratados pela Globo por anos. (…) A maioria… faz um contrato para aquela novela… para aquele personagem… e de repente aquele personagem sai da novela… Então você faz a novela pensando: daqui a seis meses, daqui a quatro meses, o que eu vou fazer, onde eu vou trabalhar? Termina o vínculo. E esse negócio de firma agora, todo mundo tem que ter firma… então você não tem décimo terceiro, você não tem fundo de garantia. (…) Naquele tempo era diferente, os contratos eram muito maiores, a gente fazia o contrato por um ano, por dois anos, então te dava uma segurança… Então havia uma abertura na convivência… ninguém olhava para o outro dizendo: será que vai roubar meu lugar aqui? Não havia esse problema. Havia três novelas de muito sucesso… a gente ganhava bem, então foi um… o Canal 9 realmente foi um momento muito bom para os atores brasileiros. Sobre a decadência da Excelsior Edgard: E depois de A Outra Face de Anita você fez mais o que no Canal 9? Flora: … saí para fazer um filme baseado em A Outra Face de Anita, O anjo Assassino, aí voltei e fiz uma novela que fez muito sucesso, que foi dirigida pelo Henrique Martins, aí o Henrique estava dirigindo também, Teixeira Filho também estava escrevendo (O Direito dos Filhos)… foi onde eu conheci a Leila Diniz que veio trabalhar conosco, ela fazia a minha filha… uma criatura sensacional, maravilhosa, estava começando. Depois eu fiz A Menina do Veleiro Azul, aí já foi a última novela que eu fiz, aí já estava degringolando… (a Excelsior). Edgard: Como você sentiu essa época, Flora, já com essa crise financeira? Flora: … foi difícil… foi numa época muito difícil para mim particularmente porque nós perde mos um filho nessa época, em 1969, então foi justamente nessa época que começou a mudar tudo e eu já estava meio afastada… eu me afastei de todo o acontecimento (…) o Dionísio já tinha saído, ele foi para a Record fazer novelas. Agora… eu perdi muito dinheiro, fiquei um ano sem receber. Edgard: Um ano seguido? Flora: É… cheguei a trabalhar uns seis, sete meses sem receber, depois parei. Edgard: E nessa novela? (A Menina do Veleiro Azul) Flora: … já sem ninguém recebendo, mas sempre com aquela esperança de... não, agora esse mês pagou isso, aquilo (…) Edgard: E nessa fase você sentia assim… menos cuidado no figurino, menos condições? Flora: Aí degringolou tudo. A coisa ficou sem líder, ficou sem… não tinha moral mais para nada. Alguns atores largavam a novela na metade e iam embora. Atores famosos iam para o Rio… então, outro entrava correndo… aí virou uma baderna. Sobre o início do fenômeno de massas da televisão Flora: … mas foi uma época muito boa a do Canal 9 (referindo-se a antes da fase final). Foi muito importante porque ela deu, ela elevou, ela deu um salto para o ator, no salário do ator, não é? Deu um grande salto. Edgard: Acho que como televisão também, né? Flora: Foi a grande inovadora… (a Excelsior) e foi quando se descortinou a novela para o público brasileiro… no Canal 9 se plantou a novela… na época, o Canal 5 tentava fazer umas novelas, ainda da Glória Magadan, novelas cubanas e não conseguia competir. Então a gente ia fazer • o último capítulo da novela A Moça que Veio de Longe no Rio de Janeiro, nós fomos todos, porque o Canal 9 tinha a sucursal no Rio já… nós fomos fazer no auditório… porque o Canal 9 no Rio fazia sucesso com programas musicais, lembra? Times Square… Então nós fomos fazer • o último capítulo da novela no Rio, era uma loucura… chegamos lá e tinha que andar com bombeiros, com guardas segurando, carros de bombeiros… A Dercy Gonçalves ia estrear um programa em outra emissora… e ela adiou (por causa do tumulto todo)… nós fizemos no palco • o último capítulo da novela. A Moça que Veio de Longe foi uma novela assim que estourou, foi um grande sucesso, o primeiro grande sucesso mesmo de público. Nós fomos para Santos… fomos fazer no Atlântico, fomos hospedados lá e fizemos uma apresentação num palanque… não se podia chegar até o palanque de tanta gente. Foi uma coisa assim… foi quando a novela foi plantada solidamente. Edgard:… mas não teve um final no Pacaembu, uma coisa assim? Flora: Não… era apresentação. A gente fazia… a cada final de novela, o público era tanto… que quando acabava a novela se fazia uma espécie de apresentação do elenco e (também) a apresentação do elenco da futura novela. Sobre sua persona de vilã na época da Excelsior Flora: (…) Eu, sempre nessa época… fazia as mulheres más, então era horrível (nas apresentações de elenco)… porque eles assobiavam, vaiavam, não queriam saber. Eu fazia as grandes personagens más. Quando a Regina Duarte estava começando no Canal 9, eu fiz Os Fantoches com ela… dirigida pelo Avancini. Edgard: E foi da Ivani, né? Flora: Foi da Ivani Ribeiro. Um elenco… tinha a Márcia de Windsor, Márcia Real, Regina Duarte começando bem menininha, eu, o Paulo Goulart, Nicete Bruno, Vera Nunes, Altair Lima, o Procópio Ferreira… eu fazia uma criatura misteriosa… aquela assassina que ninguém sabe quem é, eu era a assassina que só no final descobriam. Então, no final, num dos últimos capítulos, eu pegava a Regina Duarte que era assim adoradíssima porque ela fazia a figura… era linda… Edgard: A mocinha? Flora: A mocinha. A Regina sempre teve empatia muito grande… desde que apareceu, então o público adorava aquele personagem… Eu era gerente do hotel, Grande Hotel, lá de Os Fantoches, então fujo com ela como refém, com um revólver na mão, agarrando ela, e nós gravamos a noite toda num pântano, aqui perto da Anchieta, no alto da serra, numa noite escura, aquelas coisas tenebrosas, com garoa, com chuva, os cachorrões da Força Pública procurando a gente… a Força Pública colaborava, né? … A gente entrava naquelas lagoas sujas… eu segurava ela pela cabeça, com um revólver na mão, enfiava a cara dela na água, fazia assim loucuras. As pessoas me odiavam. Essa gravação nunca mais esqueci porque foi triste demais… eu tenho pavor de água, pavor de bichinho, essas coisas… eu tinha um casaco preto, de pelúcia, então… eu não podia largar minha refém, a menina, e não podia largar o revólver… Ai!... Era uma loucura! Mas fez muito sucesso a novela. Edgard: E por que você fazia esses papéis de mulher má? Os diretores… Flora: … aquela coisa. Porque você faz um. Eu comecei com A Outra Face de Anita. A Anita era assim… uma pessoa… que tinha uma aparência simpática, mas era diabólica… aí marcou. (…) Então todas as novelas eu era escalada de vilã, um protótipo, né? Custei para me libertar dessa figura má. Olha… eu fiz A Outra Face de Anita, Os Fantoches, A Grande Viagem, também com a Regina Duarte. Eu fazia uma paralítica que não era paralítica e fazia mil e umas… à noite pintava e bordava… Eu me libertei desse personagem na (novela) Direito dos Filhos, onde eu fiz uma dona de casa comum, nova, um personagem muito bonito, uma novela muito bonita, muito humana, sabe? A história da mulher que era casada e não acompanhou o marido. Aí o marido começou a evoluir na vida comercial dele e ela ficava parada cuidando dos filhos, da casa e ficou para trás. Era o conflito dessa diferença que existe. (…) Edgard: Escuta, Flora, como era para a cabeça da atriz passar de mocinha para o papel de mãe? (…) É uma coisa natural? Flora: (…) Foi natural no começo, na primeira novela, a primeira mudança foi nessa novela, mas eu gostei, o personagem era muito bom, sabe? … O personagem (Norma) é que interessava para mim no meu caso. Não era o fato de ser mãe, nunca me importei muito com isso de… mas, por isso, muitas atrizes se negam a fazer mãe, porque a partir do momento em que elas começam… fica difícil elas voltarem, sabe? (…) Sobre a falência do Canal 9 Edgard: Flora, o que levou o Canal 9 a essa falência? Flora: A total má administração e não sei, eu não posso acusar se houve corrupção ou não. Mas deve ter havido. Porque o dinheiro entrava muito… era muito bem patrocinada… (a emissora). Edgard: Tinha muito sucesso de audiência, né? Flora: Era muito sucesso, muito dinheiro, e foi mal administrada. Eu sei lá, não sei o que aconteceu exatamente, mas foi total má administração, ou alguém se locupletou… houve corrupção… não entendo. Eu não sei da política mais assim em alto nível que houve, com os políticos no meio, não sei… se houve interesses maiores, isso eu não posso lhe informar. Edgard: Eu tenho entrevistado algumas pessoas que dizem que… mais ou menos… da derrocada… foi quando o Simonsen morreu, o pai, e daí a revolução em 1964, começou a perseguir a família e cassar os bens econômicos dos Simonsen. A Excelsior ficou desprotegida e começou a degringolar. Flora: Eu sei que havia interesses maiores… E nessa época, como te contei, eu estava passando uma fase muito difícil da minha vida, então eu não posso nem te dizer… foi um momento… uma fase meio obscura assim, sabe, e no final eu nem participei de mais nada, eu não fui mais lá… Edgard: Eu estranho um pouco porque eu fui acompanhar os índices no Ibope, essas coisas todas, e as novelas eram quase sempre as de melhor índice de audiência, mesmo em relação às da Tupi que também eram famosas, e as da Globo... que também estavam despontando. Flora: É, as nossas tinham melhores índices. Edgard: As da Globo e da Tupi não chegaram a abalar o sucesso. Flora: Não, não abalaram. Edgard: Isso então devia arrecadar muito dinheiro de publicidade. Flora: Era muito dinheiro, entrava muito dinheiro. Então com a morte (do Simonsen) não sei se os filhos não souberam, o Wallace, era o Wallinho, não sei se eles não souberam gerir, não sei se houve coisas políticas maiores que a gente não estava a par, a coisa pifou… mas pifou de uma tal maneira que não teve jeito. Não sei… pessoas queriam comprar… não sei… não sei, não posso dizer, realmente não sei. Edgard: E quando você saiu o Edson Leite já tinha saído ou ele ainda estava? Flora: Já tinha saído. Edgard: E você lembra quem assumiu? Flora: Não. Edgard: Não era ainda o Ferreira Netto? Flora: O Ferreira Netto ficou por pouco tempo. Edgard: Ficou mais para o final mesmo. Flora: … muito no final, quando entrava gente, ficava 15, 20 dias, saía (da direção). O Ferreira Netto tentou lá, foi uma esperança. Lembro quando ele chegou, todo mundo confiou, esperou e… não deu, porque não dava mesmo, não tinha condições… Edgard: Eu estive falando com ele e ele disse que se a Excelsior não tivesse sido cassada pelo Médici… Flora: Ela foi cassada? (Flora explica em outra parte que se encontrava alheada neste momento por conta da morte de seu filho). Edgard: Foi… Ele (Ferreira Netto) acha que ela teria saído da crise, mesmo tateando, mesmo pondo filme velho, e aquela coisa toda, mas ela teria saído… Flora: Eu tenho a impressão de que foi realmente mais por pressões políticas mesmo. Edgard: É. Parece que no final foi isso. Flora: E ele (Ferreira Netto) deve estar por dentro do assunto porque ele estava na direção, essa coisa toda, então deve estar sabendo de tudo. Porque era uma emissora de prestígio, de muito prestígio, tinha muito patrocinador (…) o dinheiro era para… tapar os buracos, aquela coisa, então… o nível começou a cair, começou a sair todo mundo… Edgard: Não recebendo, né? Flora: Muita gente trabalhou como eu, seis, sete meses, sem ganhar. Edgard: E você ainda tinha aquela esperança de melhorar a situação? Flora: De pelo menos receber os atrasados, né? Sobre a importância do Canal 9 nos tempos áureos, a valorização dos atores nacionais e as cidades cenográficas, a grade de programação. Flora: (…) Mas o Canal 9 foi um período maravilhoso, um período bonito da televisão (…) Edgard: Inclusive em termos industriais. Flora: É, porque antigamente existia o filme de sucesso, que era o Dr. Kildare, Ben Casey, lembra? (…) O Dionísio comenta sempre (comentava na época) nós temos que botar os nossos atores nas capas de revistas, as revistas especializadas em televisão só traziam Dr. Kildare na capa e os atores americanos. O ator brasileiro, com a novela o ator brasileiro… Edgard: Se impôs. Flora: A novela teve o mérito de ajudar financeiramente os atores, pois eles se firmaram, e criou todo um estilo, você vê… Eu ganhava muito pouco na Tupi, a gente tinha um contrato de dois anos e davam um aumento de pouco valor. Aí eu fui para o Canal 9, ainda não era aquela coisa… e fui ganhar vinte e cinco mil cruzeiros, foi um pulo para mim. Edgard: Compensou bem, né? Flora: Claro! (…) Edgard: Escuta Flora, e a cidade cenográfica que construíram na Vera Cruz, dá para você falar um pouco como ela era? Flora: Foi a (novela) Redenção, não é? Foi feita essa cidade cenográfica para Redenção porque o Dionísio queria (ele era diretor artístico da emissora nesse tempo), depois que ele fez essa novela do Érico Veríssimo, que foi muito bonita, ele começou a fazer a produção de A Muralha ou da Deusa Vencida, não lembro direito. E ele queria fazer aí perto do Rio de Janeiro, em Paraty… (…) Edgard: E você chegou a gravar alguma outra novela nessa cidade cenográfica? Flora: Não, nenhuma. (…) Quando a gente veio para a Vila Guilherme (depois que saíram da Vera Cruz) tinha até cobra, porque era um galpão enorme, e era um lixão. (…) Depois é que eles foram construindo, fechando. O começo era terrível. (…) Edgard: E os equipamentos nessa época, eram bons, eram muito modernos e havia muito equipamento? Flora: É, o Canal 9 foi o primeiro a fazer televisão colorida, eu lembro da experiência no palco, quando ainda era aqui na Nestor Pestana. (…) Edgard: E você concorda que o Canal 9 foi uma grande escola de televisão? Em termos de indústria, porque de aventuras foi a Tupi, é claro! Flora: A Tupi foi o celeiro de atores, eu acho… Edgard: É, é verdade… Flora: A Tupi foi um laboratório onde todo mundo aprendeu – Cassiano, Dionísio, Lima. Todos que estão aí hoje em dia começaram lá. Eu também comecei na Tupi. E o Canal 9 foi o grande inovador, foi muito importante para nós… deu categoria para a classe e para todos os profissionais... atores, cenógrafos, todo mundo começou a trabalhar melhor, mais categorizado, sempre numa importância muito grande, um apoio muito grande para a televisão brasileira. Edgard: E parece que até encarando já a televisão como indústria. Flora: Como indústria… Porque ela começou a trabalhar como empresa… a todo vapor, fazia três novelas, tinha uma programação toda rígida. Ela foi a primeira a criar os bonecos, essa coisa, o visual. O Canal 9 que começou e… a Globo veio com o arrastão, e agora a Globo tem uma estrutura que ninguém pode pôr defeito, é uma estrutura fabulosa… Edgard: Como empresa… Flora: Colocada mesmo nos trilhos. Edgard: Muito antigo profissional do Canal 9 diz que a Globo hoje se baseou nos princípios da Excelsior, com essa programação horizontal de acostumar em tal faixa ter novela, na outra ter música, na outra ter filmes. Flora: Mesmo o visual, tinha os bonequinhos… Edgard: É, e o cuidado com o visual… Eles (a Excelsior) tinham o bonequinho, eles tinham um certo ritmo, o comercial era todo mais organizado. Porque me parece que não existia muito ritmo antigamente e o Canal 9 deu. Flora: Mesmo em comercial. Edgard: Porque as outras ficavam 15, 20 minutos em comercial. Flora: Não… O Canal 9 tinha assim dois, três minutos de comercial e entrava a programação, tinha todo um ritmo… Disso o grande inovador aí, me parece, que é o Edson Leite, o grande lance foi ele quem deu. Ele era um bom diretor comercial, era muito vivo, muito dinâmico, né, o Edson Leite. Edgard: E de muita ideia, né? Flora: Muita ideia, muita imaginação e… não era comedido, largava, largava a imaginação e largava dinheiro. Ele inflacionou, né, tanto que todo mundo teve que seguir e pagar. E nunca mais caiu… Edgard: Bom, isso é que foi bom… Flora: Foi bom… Edgard: Pelo menos o respeito profissional ficou valendo… Flora: Ficou valendo… Foi realmente ótimo em termos industriais e mesmo visuais, ela (a Excelsior) fez coisas, novelas muito bonitas. Não sobrou nenhuma... não gravaram, não guardaram; foi pena, porque eram novelas muito bonitas, muito bonitas mesmo. E os atores estão todos aí trabalhando, atores muito bons. Foi muito bom, muito importante, eu gostei de participar da década do Canal 9, trabalhei quase uma década lá, foi muito bom. Edgard: Obrigado, então, Flora… Daniel Azevedo, em pé, ao centro, sorridente. Ao seu lado, também em pé se encontram: Gessy Fonseca, Dias Gomes, Dionisio Azevedo, Manoel Figueiredo e José Inocêncio. Sentados: Lia de Aguiar, Janete Clair, Sonia Maria e o menino Zezinho Cutolo. Daniel Azevedo Daniel Azevedo é o nome artístico de Salomão Jacob, irmão cinco anos mais moço de Dionísio. Quando resolveu ingressar no ambiente do radioteatro paulistano, adotou o sobrenome do irmão mais velho. Daniel nasceu também em Minas, em Conceição da Aparecida, em 26 de abril de 1927 e veio para São Paulo juntamente com a família. Com uma voz muito bonita, ele logo encontrou trabalho na Rádio Difusora, tornando-se conhecido do público e integrado na classe artística. Dono de um grande e versátil talento, Daniel, além de trabalhar no rádio como ator e roteirista, também desenhava e pintava muito bem, e escrevia poemas. Um de seus grandes momentos como radioator aconteceu na novela O Direito de Nascer, sucesso mundial de Félix Caignet, onde fez o papel do galã Alfredo Limonta. Em 1948, casou-se com Olinda Dias. Tiveram cinco filhos: Cláudio, Sylvia Regina, Cybele, Marcos e Joel. De formação autodidata nunca parou de estudar, desenhar e escrever. Veio a falecer no dia 27 de novembro de 2004. Outros Irmãos e Irmãs de Dionísio e Flora Além de Daniel (ou Salomão), Dionísio teve vários irmãos e irmãs: Edna, Sarah, Ester, Maria, Milton, Jorge e Abraão. Também Flora cresceu cercada: Henriqueta, Vitorino, Paquito, Helena, Serrate e Margarida. Dionisio, cercado por alguns de seus irmãos quando recebeu o título de Cidadão Paulistano: Milton, à esquerda, de cabelos brancos, Abraão, ao centro e Edna, logo ao lado deste. Também se encontram na foto outros familiares como Dirã, Mirian e Tabita. Legados Artísticos De seu mestre Lima Barreto, além das lições do ofício, Dionísio ganhou também dois retratos feitos pelo próprio que gostava de desenhar a carvão durante as locações. O primeiro é de 1953 e esboçado durante as filmagens de O Cangaceiro, que Dionísio teve de abandonar. O segundo foi realizado durante as filmagens de A Primeira Missa, em 1960. Dionísio sempre guardou com carinho estes trabalhos. De O Cangaceiro, Dionísio herdou também um espólio muito especial. Ganhou do famoso artista argentino, naturalizado brasileiro e mais ainda, baiano, Caribé cerca de 20 desenhos que ele produziu em papel cartão durante a locação. Os desenhos eram de produção, o que mostra o esmero artesanal de Lima Barreto, esmero que, sem dúvida, se tornou também uma marca do Dionísio como diretor. Esta poesia foi encontrada entre os pertences pessoais de Dionísio após o seu falecimento. Infelizmente não está datada, mas pelo tipo de papel e também pela ortografia, e pela citação final parece ser do começo de 1950 e da fase inicial de TV de Vanguarda. Deixamos esses versos aqui no final meramente a título de curiosidade Retratos de Dionísio feitos por Lima Barreto, em 1953 e 1960 Desenho a carvão de Caribé, do set de O Cangaceiro e também porque eles de algum modo firmam a sua profissão de fé no trabalho que escolheu. Um Ator Dionísio Azevedo Segui de perto o transcorrer das eras Já fui filho de tudo quanto é raça Fui caçador e também já fui caça Fera temida pelas próprias feras Já pertenci a todos os planetas Já habitei em tudo que é reinado Às vezes Rei, às vezes condenado Forte guerreiro, fraco de muletas Fui arquiteto das colunas gregas Do século dez mil gênio inventor Vítima e algoz, aluno e professor Vivendo eras felizes e outras negras Pois sendo ator um ser que em si contém Todas as seivas do universal amor É criatura tanto quanto é criador É poderoso tanto quanto é João-Ninguém. Poema de Dionísio Azevedo Carta de Érico Veríssimo Créditos Este livro foi organizado por Dionísio Jacob, a partir de seu texto Crônicas do Sumaré. Nas demais partes, ele contou com o auxílio de Tatiana Nogueira tanto nas pesquisas, como no recolhimento dos depoimentos. Os depoimentos de Dionísio e Flora foram cedidos gentilmente pelo Idart e autorizados para publicação. Os demais depoimentos de colegas foram todos concedidos unicamente para esta edição. As fotografias utilizadas neste livro são todas do arquivo pessoal de Dionísio e de Flora, e estão em sua posse desde os anos 1950 e 1960. Nem todas possuem identificação, mas muitas delas, principalmente as da TV Tupi, foram feitas pelo fotógrafo Raymundo Lessa de Mattos, que fotografou a grande maioria daqueles primeiros teledramas e pertencem hoje aos arquivos de seu irmão Davi José Lessa de Mattos. Agradecimentos Queria agradecer, antes de tudo, a todos aqueles que emprestaram seu tempo ao fazer os depoimentos sobre meus pais, mostrando quanto Dionísio e Flora estão vivos na memória de seus amigos de trajetória: Lima Duarte, Fernando Faro, Juca de Oliveira, Laura Cardoso, Vida Alves e Benedito Rui Barbosa. A Vida Alves, com seu trabalho em prol da preservação da memória da televisão, colaborou, além de seu depoimento, com opiniões, falando sobre os velhos tempos pioneiros e no reconhecimento de colegas em fotografias. Não poderia deixar de citar o Davi José Lessa Mattos, por informações sobre meus pais, sobre o início da teledramaturgia e também sobre datas precisas de alguns trabalhos. Gostaria também de agradecer ao pessoal da D´Antino & Associados pela ajuda, principal-mente Mônica Maluf, colega de infância e dos tempos da Rua Bruxelas. Agradeço de coração ao pessoal do Arquivo Multimeios do Centro Cultural São Paulo (Idart), a Marta Paolicci, a Marisa Nunes e a Dorileu Gabriel, pela atenção, simpatia e presteza na pesquisa de dados importantes para a feitura deste livro. À Galeria Nova André, agradeço a permissão de utilizar a reprodução do desenho de Caribé que ilustra uma das seções. Também sou grato ao Rubens Ewald Filho, dire-tor desta coleção, por confiar e dar acolhida a um texto ainda incipiente e pelas sugestões que ajudaram a melhorá-lo. Por fim, queria agradecer à presença constante da minha companheira de todas as horas, a Tatiana, que muito colaborou com a pesquisa, na localização de amigos, acompanhando os depoimentos e por realizar observações sobre o material escrito. Galeria de Imagens Família reunida, meados dos anos 1950: Flora, Noel, Dionísio Jacob e Dionísio Dionísio Azevedo, época da TV Tupi Flora Geni, época da TV Tupi Flora Geni, época da TV Tupi Flora e Dionísio, na época do casamento, 1950 Rádio Tupi Difusora: Dionísio, com outros integrantes da Rádio Tupi, em fins dos anos 1940 Dionísio (penúltimo à direita), ensaiando um radioteatro com elenco da Rádio Tupi Difusora, anos 1940 No início da televisão, os teledramas eram anunciados no jornal, como uma peça de teatro TV de Vanguarda, início dos anos 1950: primeiras imagens da televisão, ainda sem videotape e com influência da iluminação cinematográfica TV de Vanguarda, 1953: Dionísio em adaptação pioneira da obra de Guimarães Rosa, A Hora e a Vez de Augusto Matraga, em que também atuou e dirigiu TV de Vanguarda, 1953: A Hora e a Vez de Augusto Matraga, com Lima Duarte TV de Vanguarda, 1957: Dionísio com Zuleika Maria em O Inspetor Está Lá Fora TV de Vanguarda, 1957: A Canção de Bernadete, com Flora Geni (em pé), Célia Rodrigues, Zuleika Maria e Laura Prado TV de Vanguarda, 1957: A Canção de Bernadete, com Flora Geni (ao centro), Francisco Negrão, Dionísio, Zuleika Maria e Laura Prado Teledrama da TV Tupi, com Dionísio e Eduardo Abas Inocência: outro TV de Vanguarda, com Dionísio e Wilma Betivegna Otelo: adaptação da obra de Shakespeare, em 1958, com direção de Dionísio, também atuando como o mouro de Veneza, e Flora como Desdêmona Marco Milhão: adaptação da peça de Eugene O’Neil, com Flora e José Parisi, 1956 TV Excelsior, canal 9, anos 1960: reunião de elenco de A Outra Face de Anita, novelade Ivani Ribeiro, dirigida por Dionísio e estrelada por Flora, em 1964. (em pé) David Neto, Ruth Rocha, Armando Bógus, Riva Nimitz, atriz não identificada e Fúlvio Stefanini; (sentados) Maria Tereza, Dionísio, Célia Coutinho, Nívea Maria, Lídia Costa e Flora; (no chão) o fotógrafo e ator Freddy Kleeman Flora em ensaio fotográfico de Freddy Kleeman Flora em ensaio fotográfico de Freddy Kleeman Festival de Cinema de Maringá, 1960: Flora (camiseta listrada), com Eva Wilma, Liana Duval, Odete Lara e outras O Pagador de Promessas: foto do set de filmagens, com Dionísio como Padre Olavo A Primeira Missa: Dionísio no último filme de seu mestre Lima Barreto A Primeira Missa: Dionísio com o crítico francês Georges Sadoul, em pausa das filmagens O Anjo Assassino: set de filmagens da película baseada na novela A Outra Face de Anita, com adaptação de Lauro César Muniz e música de Chico Buarque de Hollanda. Flora, sentada ao centro, com Dionísio abaixado a seu lado Dionísio com o diretor de fotografia de O Anjo Assassino, Toni Rabatoni, e seus filhos Noel (agachado) e Dionísio Jacob O Anjo Assassino: Flora com Raul Cortez O Anjo Assassino: Flora, cena de tribunal, com Altair Lima em primeiro plano Flora e Dionísio numa das últimas fotos tiradas pelo casal em 1990, com 40 anos de casados Índice No Passado Está a História do Futuro – Alberto Goldman 5 Coleção Aplauso – Hubert Alquéres 7 Crônicas do Sumaré 13 Memórias em um Tempo Veloz 15 Por Que o Sumaré? 19 A Era do Rádio 23 A Televisão 31 Meu Pai 35 O Feijão e o Sonho 43 Minha Mãe 49 A TV Tupi 55 Jogo de Cintura no Ar 65 Nossa Casa 71 A TV Excelsior 85 Vida em Locação 103 A Rua Zaíra 137 Noel 143 Vida que Segue – Dionísio Jacob 149 Depoimentos 159 Depoimento de Lima Duarte 163 Depoimento de Fernando Faro 177 Depoimento Benedito Rui Barbosa 181 Depoimentos Escritos 191 Linha do Tempo de Dionísio Azevedo 203 Cronologia de Dionísio Azevedo 207 Linha do Tempo de Flora Geni 301 Cronologia de Flora Geni 307 Anexos 335 Dionísio Fala Sobre Interpretação 337 Flora Fala Sobre a TV Excelsior 345 Daniel Azevedo 371 Legados Artísticos 373 Créditos 379 Agradecimentos 381 Galeria de Imagens 383 Crédito das Fotografias Todas as fotografias pertencem ao acervo de Dionísio Jacob A despeito dos esforços de pesquisa empreendidos pela Editora para identificar a autoria das fotos expostas nesta obra, parte delas não é de autoria conhecida de seus organizadores. Agradecemos o envio ou comunicação de toda informação relativa à autoria e/ou a outros dados que porventura estejam incompletos, para que sejam devidamente creditados. Coleção Aplauso Série Cinema Brasil Alain Fresnot – Um Cineasta sem Alma Alain Fresnot Agostinho Martins Pereira – Um Idealista Máximo Barro Alfredo Sternheim – Um Insólito Destino Alfredo Sternheim O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias Roteiro de Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert e Cao Hamburger Anselmo Duarte – O Homem da Palma de Ouro Luiz Carlos Merten Antonio Carlos da Fontoura – Espelho da Alma Rodrigo Murat Ary Fernandes – Sua Fascinante História Antônio Leão da Silva Neto O Bandido da Luz Vermelha Roteiro de Rogério Sganzerla Batismo de Sangue Roteiro de Dani Patarra e Helvécio Ratton Bens Confiscados Roteiro comentado pelos seus autores Daniel Chaia e Carlos Reichenbach Braz Chediak – Fragmentos de uma Vida Sérgio Rodrigo Reis Cabra-Cega Roteiro de Di Moretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo Kauffman O Caçador de Diamantes Roteiro de Vittorio Capellaro, comentado por Máximo Barro Carlos Coimbra – Um Homem Raro Luiz Carlos Merten Carlos Reichenbach – O Cinema Como Razão de Viver Marcelo Lyra A Cartomante Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis Casa de Meninas Romance original e roteiro de Inácio Araújo O Caso dos Irmãos Naves Roteiro de Jean-Claude Bernardet e Luis Sérgio Person O Céu de Suely Roteiro de Karim Aïnouz, Felipe Bragança e Maurício Zacharias Chega de Saudade Roteiro de Luiz Bolognesi Cidade dos Homens Roteiro de Elena Soárez Como Fazer um Filme de Amor Roteiro escrito e comentado por Luiz Moura e José Roberto Torero O Contador de Histórias Roteiro de Luiz Villaça, Mariana Veríssimo, Maurício Arruda e José Roberto Torero Críticas de B.J. Duarte – Paixão, Polêmica e Generosidade Luiz Antonio Souza Lima de Macedo Críticas de Edmar Pereira – Razão e Sensibilidade Org. Luiz Carlos Merten Críticas de Jairo Ferreira – Críticas de invenção: Os Anos do São Paulo Shimbun Org. Alessandro Gamo Críticas de Luiz Geraldo de Miranda Leão – Analisando Cinema: Críticas de LG Org. Aurora Miranda Leão Críticas de Ruben Biáfora – A Coragem de Ser Org. Carlos M. Motta e José Júlio Spiewak De Passagem Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias Desmundo Roteiro de Alain Fresnot, Anna Muylaert e Sabina Anzuategui Djalma Limongi Batista – Livre Pensador Marcel Nadale Dogma Feijoada: O Cinema Negro Brasileiro Jeferson De Dois Córregos Roteiro de Carlos Reichenbach A Dona da História Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho Os 12 Trabalhos Roteiro de Cláudio Yosida e Ricardo Elias Estômago Roteiro de Lusa Silvestre, Marcos Jorge e Cláudia da Natividade Feliz Natal Roteiro de Selton Mello e Marcelo Vindicatto Fernando Meirelles – Biografia Prematura Maria do Rosário Caetano Fim da Linha Roteiro de Gustavo Steinberg e Guilherme Werneck; Storyboards de Fábio Moon e Gabriel Bá Fome de Bola – Cinema e Futebol no Brasil Luiz Zanin Oricchio Francisco Ramalho Jr. – Éramos Apenas Paulistas Celso Sabadin Geraldo Moraes – O Cineasta do Interior Klecius Henrique Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta Cinéfilo Luiz Zanin Oricchio Helvécio Ratton – O Cinema Além das Montanhas Pablo Villaça O Homem que Virou Suco Roteiro de João Batista de Andrade, organização de Ariane Abdallah e Newton Cannito Ivan Cardoso – O Mestre do Terrir Remier João Batista de Andrade – Alguma Solidão e Muitas Histórias Maria do Rosário Caetano Jorge Bodanzky – O Homem com a Câmera Carlos Alberto Mattos José Antonio Garcia – Em Busca da Alma Feminina Marcel Nadale José Carlos Burle – Drama na Chanchada Máximo Barro Liberdade de Imprensa – O Cinema de Intervenção Renata Fortes e João Batista de Andrade Luiz Carlos Lacerda – Prazer & Cinema Alfredo Sternheim Maurice Capovilla – A Imagem Crítica Carlos Alberto Mattos Mauro Alice – Um Operário do Filme Sheila Schvarzman Máximo Barro – Talento e Altruísmo Alfredo Sternheim Miguel Borges – Um Lobisomem Sai da Sombra Antônio Leão da Silva Neto Não por Acaso Roteiro de Philippe Barcinski, Fabiana Werneck Barcinski e Eugênio Puppo Narradores de Javé Roteiro de Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu Olhos Azuis Argumento de José Joffily e Jorge Duran Roteiro de Jorge Duran e Melanie Dimantas Onde Andará Dulce Veiga Roteiro de Guilherme de Almeida Prado Orlando Senna – O Homem da Montanha Hermes Leal Pedro Jorge de Castro – O Calor da Tela Rogério Menezes Quanto Vale ou É por Quilo Roteiro de Eduardo Benaim, Newton Cannito e Sergio Bianchi Ricardo Pinto e Silva – Rir ou Chorar Rodrigo Capella Rodolfo Nanni – Um Realizador Persistente Neusa Barbosa Salve Geral Roteiro de Sergio Rezende e Patrícia Andrade O Signo da Cidade Roteiro de Bruna Lombardi Ugo Giorgetti – O Sonho Intacto Rosane Pavam Viva-Voz Roteiro de Márcio Alemão Vladimir Carvalho – Pedras na Lua e Pelejas no Planalto Carlos Alberto Mattos Vlado – 30 Anos Depois Roteiro de João Batista de Andrade Zuzu Angel Roteiro de Marcos Bernstein e Sergio Rezende Série Cinema Bastidores – Um Outro Lado do Cinema Elaine Guerini Série Ciência & Tecnologia Cinema Digital – Um Novo Começo? Luiz Gonzaga Assis de Luca A Hora do Cinema Digital – Democratização e Globalização do Audiovisual Luiz Gonzaga Assis De Luca Série Crônicas Crônicas de Maria Lúcia Dahl – O Quebra-cabeças Maria Lúcia Dahl Série Dança Rodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo – Dança Universal Sérgio Rodrigo Reis Série Música Maestro Diogo Pacheco – Um Maestro para Todos Alfredo Sternheim Rogério Duprat – Ecletismo Musical Máximo Barro Sérgio Ricardo – Canto Vadio Eliana Pace Wagner Tiso – Som, Imagem, Ação Beatriz Coelho Silva Série Teatro Brasil Alcides Nogueira – Alma de Cetim Tuna Dwek Antenor Pimenta – Circo e Poesia Danielle Pimenta Cia de Teatro Os Satyros – Um Palco Visceral Alberto Guzik Críticas de Clóvis Garcia – A Crítica Como Oficio Org. Carmelinda Guimarães Críticas de Maria Lucia Candeias – Duas Tábuas e Uma Paixão Org. José Simões de Almeida Júnior Federico Garcia Lorca – Pequeno Poema Infinito Antonio Gilberto e José Mauro Brant Ilo Krugli – Poesia Rasgada Ieda de Abreu João Bethencourt – O Locatário da Comédia Rodrigo Murat José Renato – Energia Eterna Hersch Basbaum Leilah Assumpção – A Consciência da Mulher Eliana Pace Luís Alberto de Abreu – Até a Última Sílaba Adélia Nicolete Maurice Vaneau – Artista Múltiplo Leila Corrêa Renata Palottini – Cumprimenta e Pede Passagem Rita Ribeiro Guimarães Teatro Brasileiro de Comédia – Eu Vivi o TBC Nydia Licia O Teatro de Abílio Pereira de Almeida Abílio Pereira de Almeida O Teatro de Aimar Labaki Aimar Labaki O Teatro de Alberto Guzik Alberto Guzik O Teatro de Antonio Rocco Antonio Rocco O Teatro de Cordel de Chico de Assis Chico de Assis O Teatro de Emílio Boechat Emílio Boechat O Teatro de Germano Pereira – Reescrevendo Clássicos Germano Pereira O Teatro de José Saffioti Filho José Saffioti Filho O Teatro de Alcides Nogueira – Trilogia: Ópera Joyce – Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso – Pólvora e Poesia Alcides Nogueira O Teatro de Ivam Cabral – Quatro textos para um teatro veloz: Faz de Conta que tem Sol lá Fora – Os Cantos de Maldoror – De Profundis – A Herança do Teatro Ivam Cabral O Teatro de Noemi Marinho: Fulaninha e Dona Coisa, Homeless, Cor de Chá, Plantonista Vilma Noemi Marinho Teatro de Revista em São Paulo – De Pernas para o Ar Neyde Veneziano O Teatro de Samir Yazbek: A Entrevista – O Fingidor – A Terra Prometida Samir Yazbek O Teatro de Sérgio Roveri Sérgio Roveri Teresa Aguiar e o Grupo Rotunda – Quatro Décadas em Cena Ariane Porto Série Perfil Analy Alvarez – De Corpo e Alma Nicolau Radamés Creti Aracy Balabanian – Nunca Fui Anjo Tania Carvalho Arllete Montenegro – Fé, Amor e Emoção Alfredo Sternheim Ary Fontoura – Entre Rios e Janeiros Rogério Menezes Berta Zemel – A Alma das Pedras Rodrigo Antunes Corrêa Bete Mendes – O Cão e a Rosa Rogério Menezes Betty Faria – Rebelde por Natureza Tania Carvalho Carla Camurati – Luz Natural Carlos Alberto Mattos Cecil Thiré – Mestre do seu Ofício Tania Carvalho Celso Nunes – Sem Amarras Eliana Rocha Cleyde Yaconis – Dama Discreta Vilmar Ledesma David Cardoso – Persistência e Paixão Alfredo Sternheim Débora Duarte – Filha da Televisão Laura Malin Denise Del Vecchio – Memórias da Lua Tuna Dwek Elisabeth Hartmann – A Sarah dos Pampas Reinaldo Braga Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida Maria Leticia Emilio Di Biasi – O Tempo e a Vida de um Aprendiz Erika Riedel Etty Fraser – Virada Pra Lua Vilmar Ledesma Ewerton de Castro – Minha Vida na Arte: Memória e Poética Reni Cardoso Fernanda Montenegro – A Defesa do Mistério Neusa Barbosa Fernando Peixoto – Em Cena Aberta Marília Balbi Geórgia Gomide – Uma Atriz Brasileira Eliana Pace Gianfrancesco Guarnieri – Um Grito Solto no Ar Sérgio Roveri Glauco Mirko Laurelli – Um Artesão do Cinema Maria Angela de Jesus Ilka Soares – A Bela da Tela Wagner de Assis Irene Ravache – Caçadora de Emoções Tania Carvalho Irene Stefania – Arte e Psicoterapia Germano Pereira Isabel Ribeiro – Iluminada Luis Sergio Lima e Silva Isolda Cresta – Zozô Vulcão Luis Sérgio Lima e Silva Joana Fomm – Momento de Decisão Vilmar Ledesma John Herbert – Um Gentleman no Palco e na Vida Neusa Barbosa Jonas Bloch – O Ofício de uma Paixão Nilu Lebert Jorge Loredo – O Perigote do Brasil Cláudio Fragata José Dumont – Do Cordel às Telas Klecius Henrique Leonardo Villar – Garra e Paixão Nydia Licia Lília Cabral – Descobrindo Lília Cabral Analu Ribeiro Lolita Rodrigues – De Carne e Osso Eliana Castro Louise Cardoso – A Mulher do Barbosa Vilmar Ledesma Marcos Caruso – Um Obstinado Eliana Rocha Maria Adelaide Amaral – A Emoção Libertária Tuna Dwek Marisa Prado – A Estrela, O Mistério Luiz Carlos Lisboa Mauro Mendonça – Em Busca da Perfeição Renato Sérgio Miriam Mehler – Sensibilidade e Paixão Vilmar Ledesma Naum Alves de Souza: Imagem, Cena, Palavra Alberto Guzik Nicette Bruno e Paulo Goulart – Tudo em Família Elaine Guerrini Nívea Maria – Uma Atriz Real Mauro Alencar e Eliana Pace Niza de Castro Tank – Niza, Apesar das Outras Sara Lopes Paulo Betti – Na Carreira de um Sonhador Teté Ribeiro Paulo José – Memórias Substantivas Tania Carvalho Paulo Hesse – A Vida Fez de Mim um Livro e Eu Não Sei Ler Eliana Pace Pedro Paulo Rangel – O Samba e o Fado Tania Carvalho Regina Braga – Talento é um Aprendizado Marta Góes Reginaldo Faria – O Solo de Um Inquieto Wagner de Assis Renata Fronzi – Chorar de Rir Wagner de Assis Renato Borghi – Borghi em Revista Élcio Nogueira Seixas Renato Consorte – Contestador por Índole Eliana Pace Rolando Boldrin – Palco Brasil Ieda de Abreu Rosamaria Murtinho – Simples Magia Tania Carvalho Rubens de Falco – Um Internacional Ator Brasileiro Nydia Licia Ruth de Souza – Estrela Negra Maria Ângela de Jesus Sérgio Hingst – Um Ator de Cinema Máximo Barro Sérgio Viotti – O Cavalheiro das Artes Nilu Lebert Silnei Siqueira – A Palavra em Cena Ieda de Abreu Silvio de Abreu – Um Homem de Sorte Vilmar Ledesma Sônia Guedes – Chá das Cinco Adélia Nicolete Sonia Maria Dorce – A Queridinha do meu Bairro Sonia Maria Dorce Armonia Sonia Oiticica – Uma Atriz Rodriguiana? Maria Thereza Vargas Stênio Garcia – Força da Natureza Wagner Assis Suely Franco – A Alegria de Representar Alfredo Sternheim Tatiana Belinky – ... E Quem Quiser Que Conte Outra Sérgio Roveri Theresa Amayo – Ficção e Realidade Theresa Amayo Tony Ramos – No Tempo da Delicadeza Tania Carvalho Umberto Magnani – Um Rio de Memórias Adélia Nicolete Vera Holtz – O Gosto da Vera Analu Ribeiro Vera Nunes – Raro Talento Eliana Pace Walderez de Barros – Voz e Silêncios Rogério Menezes Walter George Durst – Doce Guerreiro Nilu Lebert Zezé Motta – Muito Prazer Rodrigo Murat Especial Agildo Ribeiro – O Capitão do Riso Wagner de Assis Av. Paulista, 900 – a História da TV Gazeta Elmo Francfort Beatriz Segall – Além das Aparências Nilu Lebert Carlos Zara – Paixão em Quatro Atos Tania Carvalho Célia Helena – Uma Atriz Visceral Nydia Licia Charles Möeller e Claudio Botelho – Os Reis dos Musicais Tania Carvalho Cinema da Boca – Dicionário de Diretores Alfredo Sternheim Dina Sfat – Retratos de uma Guerreira Antonio Gilberto Eva Todor – O Teatro de Minha Vida Maria Angela de Jesus Eva Wilma – Arte e Vida Edla van Steen Gloria in Excelsior – Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira Álvaro Moya Lembranças de Hollywood Dulce Damasceno de Britto, organizado por Alfredo Sternheim Maria Della Costa – Seu Teatro, Sua Vida Warde Marx Mazzaropi – Uma Antologia de Risos Paulo Duarte Ney Latorraca – Uma Celebração Tania Carvalho Odorico Paraguaçu: O Bem-amado de Dias Gomes – História de um Personagem Larapista e Maquiavelento José Dias Raul Cortez – Sem Medo de se Expor Nydia Licia Rede Manchete – Aconteceu, Virou História Elmo Francfort Sérgio Cardoso – Imagens de Sua Arte Nydia Licia Tônia Carrero – Movida pela Paixão Tania Carvalho TV Tupi – Uma Linda História de Amor Vida Alves Victor Berbara – O Homem das Mil Faces Tania Carvalho Walmor Chagas – Ensaio Aberto para Um Homem Indignado Djalma Limongi Batista © 2010 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Jacob, Dionísio Dionísio e Flora: uma vida na arte / Dionísio Jacob – São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010. 440p. : Il. – (Coleção Aplauso. Série Perfil / Coordenador geral Rubens Ewald Filho). ISBN 978-85-7060-945-8 1. Atores e atrizes de cinema – Biografia 2. Atores e atrizes de teatro – Biografia 3. Atores e atrizes de televisão -Biografia 4. Azevedo, Dionísio, 1922-1994 5. Geni, Flora, 1929-1991 I. Ewald Filho, Rubens. II.Título. III. Série. CDD 791.092 Índices para catálogo sistemático: 1. Atores brasileiros : Biografia: Representações públicas : Artes 791.092 Proibida reprodução total ou parcial sem autorização prévia do autor ou dos editores Lei nº 9.610 de 19/02/1998 Foi feito o depósito legal Lei nº 10.994, de 14/12/2004 Impresso no Brasil / 2010 Todos os direitos reservados. 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