Miguel Magno O Pregador de Peças Miguel Magno O Pregador de Peças Andréa Bassitt Imprensa Oficial São Paulo, 2010 GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO Governador Alberto Goldman Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Diretor-presidente Hubert Alquéres Coleção Aplauso Coordenador Geral Rubens Ewald Filho No Passado Está a História do Futuro A Imprensa Oficial muito tem contribuído com a sociedade no papel que lhe cabe: a democratização de conhecimento por meio da leitura. A Coleção Aplauso, lançada em 2004, é um exemplo bem-sucedido desse intento. Os temas nela abordados, como biografias de atores, diretores e dramaturgos, são garantia de que um fragmento da memória cultural do país será preservado. Por meio de conversas informais com jornalistas, a história dos artistas é transcrita em primeira pessoa, o que confere grande fluidez ao texto, conquistando mais e mais leitores. Assim, muitas dessas figuras que tiveram importância fundamental para as artes cênicas brasileiras têm sido resgatadas do esquecimento. Mesmo o nome daqueles que já partiram são frequentemente evocados pela voz de seus companheiros de palco ou de seus biógrafos. Ou seja, nessas histórias que se cruzam, verdadeiros mitos são redescobertos e imortalizados. E não só o público tem reconhecido a importância e a qualidade da Aplauso. Em 2008, a Coleção foi laureada com o mais importante prêmio da área editorial do Brasil: o Jabuti. Concedido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), a edição especial sobre Raul Cortez ganhou na categoria biografia. Mas o que começou modestamente tomou vulto e novos temas passaram a integrar a Coleção ao longo desses anos. Hoje, a Aplauso inclui inúmeros outros temas correlatos como a história das pioneiras TVs brasileiras, companhias de dança, roteiros de filmes, peças de teatro e uma parte dedicada à música, com biografias de compositores, cantores, maestros, etc. Para o final deste ano de 2010, está previsto o lançamento de 80 títulos, que se juntarão aos 220 já lançados até aqui. Destes, a maioria foi disponibilizada em acervo digital que pode ser acessado pela internet gratuitamente. Sem dúvida, essa ação constitui grande passo para difusão da nossa cultura entre estudantes, pesquisadores e leitores simplesmente interessados nas histórias. Com tudo isso, a Coleção Aplauso passa a fazer parte ela própria de uma história na qual personagens ficcionais se misturam à daqueles que os criaram, e que por sua vez compõe algumas páginas de outra muito maior: a história do Brasil. Boa leitura. Alberto Goldman Governador do Estado de São Paulo Coleção Aplauso O que lembro, tenho. Guimarães Rosa A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa Oficial, visa resgatar a memória da cultura nacional, biografando atores, atrizes e diretores que compõem a cena brasileira nas áreas de cinema, teatro e televisão. Foram selecionados escritores com largo currículo em jornalismo cultural para esse trabalho em que a história cênica e audiovisual brasileiras vem sendo reconstituída de maneira singular. Em entrevistas e encontros sucessivos estreita-se o contato entre biógrafos e biografados. Arquivos de documentos e imagens são pesquisados, e o universo que se reconstitui a partir do cotidiano e do fazer dessas personalidades permite reconstruir sua trajetória. A decisão sobre o depoimento de cada um na primeira pessoa mantém o aspecto de tradição oral dos relatos, tornando o texto coloquial, como se o biografado falasse diretamente ao leitor. Um aspecto importante da Coleção é que os resultados obtidos ultrapassam simples registros biográficos, revelando ao leitor facetas que também caracterizam o artista e seu ofício. Biógrafo e biografado se colocaram em reflexões que se estenderam sobre a formação intelectual e ideológica do artista, contextualizada na história brasileira. São inúmeros os artistas a apontar o importante papel que tiveram os livros e a leitura em sua vida, deixando transparecer a firmeza do pensamento crítico ou denunciando preconceitos seculares que atrasaram e continuam atrasando nosso país. Muitos mostraram a importância para a sua formação terem atuado tanto no teatro quanto no cinema e na televisão, adquirindo, linguagens diferenciadas – analisando-as com suas particularidades. Muitos títulos exploram o universo íntimo e psicológico do artista, revelando as circunstâncias que o conduziram à arte, como se abrigasse em si mesmo desde sempre, a complexidade dos personagens. São livros que, além de atrair o grande público, interessarão igualmente aos estudiosos das artes cênicas, pois na Coleção Aplauso foi discutido o processo de criação que concerne ao teatro, ao cinema e à televisão. Foram abordadas a construção dos personagens, a análise, a história, a importância e a atualidade de alguns deles. Também foram examinados o relacionamento dos artistas com seus pares e diretores, os processos e as possibilidades de correção de erros no exercício do teatro e do cinema, a diferença entre esses veículos e a expressão de suas linguagens. Se algum fator específico conduziu ao sucesso da Coleção Aplauso – e merece ser destacado –, é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o percurso cultural de seu país. À Imprensa Oficial e sua equipe coube reunir um bom time de jornalistas, organizar com eficácia a pesquisa documental e iconográfica e contar com a disposição e o empenho dos artistas, diretores, dramaturgos e roteiristas. Com a Coleção em curso, configurada e com identidade consolidada, constatamos que os sortilégios que envolvem palco, cenas, coxias, sets de filmagem, textos, imagens e palavras conjugados, e todos esses seres especiais – que neste universo transitam, transmutam e vivem – também nos tomaram e sensibilizaram. É esse material cultural e de reflexão que pode ser agora compartilhado com os leitores de todo o Brasil. Hubert Alquéres Diretor-presidente Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Dedico este livro a todos que conheceram Miguel Magno e aos que vão conhecê-lo agora Andréa Bassitt Introdução Este livro não era para ser um livro, mas sim uma peça de teatro. Uma peça sobre as inúmeras peças que habitavam o mundo do ator Miguel Magno. Conheci Miguel em 1992, quando ele ensaiava o espetáculo Porca Miséria, com Regina Galdino, minha companheira e parceira de trabalho. Da amizade deles nasceu a nossa, minha e dele. Durante os anos de convívio ouvi Miguel con-tar histórias que ele viveu no teatro ou que de alguma maneira conheceu - fazia isso naturalmente, como um modo de se expressar, de se comunicar. Ele costumava imitar o jeito, a voz das pessoas – hábito totalmente compreensível para um comediante nato –, falava de cantoras, tias, professoras, camareiras, empregadas, santas, atrizes, mulheres... Talvez por isso ele tenha sido um ícone na interpretação de personagens femininos. Quando estreou Quem Tem Medo de Itália Fausta?, ao lado de Ricardo de Almeida, seu grande parceiro de cena, não sabia que estava assinando seu nome no hall do Teatro Brasileiro. O espetáculo, em que eles transitavam por diferentes personagens femininas, tornou-se um enorme sucesso que se repetiu durante anos e até hoje é tido como referência no desenvolvimento do teatro besteirol – palavra que não revela a complexidade e a inteligência desse artista. Formado em Letras pela USP, Miguel Magno tinha amplo conhecimento de literatura, línguas e arte em geral. Seu repertório pessoal ia desde orações a pequenas e hilariantes curiosidades do seu cotidiano, ou universo artístico, até citações filosóficas, poesias, trechos de Shakespeare, Fassbinder... Amava Clarice Lispector, Fernando Pessoa, Eugénio de Andrade... Ao longo de sua riquíssima carreira, Miguel viveu situações das mais diversas. Ganhou e perdeu amigos queridos, fez papéis grandes e pequenos, sentiu o sucesso e a falta dele, fez televisão, teatro, trabalhou e conviveu com artistas como Aracy Balabanian, Antonio Abujamra, Thales Pan Chacon, Fernanda Montenegro, Alcides Nogueira, Myrian Muniz, Zezé Polessa, Regina Casé, Diogo Vilela e muitos, muitos outros colegas de São Paulo e do Rio de Janeiro, que são parte da sua família teatral. No final de 2006, eu o convenci a registrar suas histórias para que pudéssemos fazer uma peça. Fizemos dez encontros em que gravamos seis horas de depoimentos, nos quais eu deveria me basear para escrever o texto teatral. Mas, por ironia do destino, as histórias engraçadas foram dando lugar a uma biografia pessoal, que não deixava de fora o humor peculiar de Miguel. A peça não aconteceu, não conseguimos patrocínio. E, dessa vez, o tempo foi implacável: nos dois anos que se seguiram, Miguel teve vários problemas de saúde e faleceu no dia 17 de agosto de 2009. Na sua missa de sétimo dia, Edison Paes de Melo – que junto com Irene Ravache ajudaria a produzir a peça – falou comigo sobre algo que eu já tinha em mente: consultar a editora Imprensa Oficial para transformar em livro a peça imaginada – ideia que o próprio Miguel chegou a expressar em determinado momento. Imediatamente, comecei a organizar os depoimentos e escrever a biografia. Procuramos a editora, que avaliou a proposta. O texto foi lido e aprovado para publicação na Coleção Aplauso, que, como Miguel fazia, tem hoje a função de imortalizar personagens do teatro brasileiro. Assim, este livro não é somente um registro de um período importante do nosso teatro; é a realização de um desejo. O desejo de revelar o universo de coisas e pessoas que Miguel guardou cuidadosamente em sua memória. Como o poeta que ele tanto adorava, Miguel Magno guardava seus rebanhos – rebanhos cercados pelo teatro. Teatro que ele vivia e pregava, nos fazendo rir, admirá-lo e amá-lo sempre. Miguel, singular comediante, foi e é um inesquecível pregador de peças. Andréa Bassitt “(...) Enfim, a posteridade. Que sempre nos julgará. Seremos salvos da fogueira Fahrenheit 560? Aqui, da clausura intelectual em que me desencontro, só faço é agradecer. Agradecer o amor, o carinho e algum respeito pela minha figura (...), figura confiante na amizade que é delícia dos deuses, ambrosia dionisíaca, Baco, evoé! Amém. Assim seja, por todo sempre. Beijos. Miguel.” Trecho de um bilhete enviado à amiga Regina Galdino, agradecendo por ela ter mandado seu currículo de autor a um anuário de dramaturgia. Poesia que escrevi depois de quatro meses fazendo teatro: Quando piso no palco, Não sei que eu sou. Sei que domino algo que, entretanto, desconheço. A vida, daí então, Vai saindo modificada, E é nesse grande investigando, Que cada vez mais São menores as certezas. Não se pode, Enfim, Conter a Fé! Miguel Magno Capítulo I Família Mamãe tinha 33 anos quando eu nasci. Papai, 36. Eram pessoas maduras. Quando papai morreu, mamãe fez o seguinte resumo: Conheci seu pai num baile de orquestra típica regional argentina, ele estava no palco, era crooner da orquestra, mas só cantava uma música,, um tango, e eu fiquei fascinada por ele. Ele se vestia bem, camisa impecável... Fiquei olhando para ele, ele percebeu, continuamos nos olhando... Quando acabou de cantar, ele desceu do palco, me convidou para dançar e nunca mais nos separamos. Eles ficaram juntos até papai morrer. Passei minha infância ouvindo papai cantar Mano a mano no banheiro: Rechiflao en mi tristeza hoy te evoco y veo que has sido en mi pobre vida paria solo una buena mujer; tu presencia de bacana puso calor en mi nido, fuiste buena, consecuente, y yo se que me has querido como no quisiste a nadie, como no podras querer. E cantava boleros também: Reloj, no marqué las horas Porque voy a enloquecer Ella se ira para siempre Quando amanezca otra vez... Ou ainda Sabra Dios... Sabrá Dios, si tú me quieres o me engañas Como no adivino seguiré pensando Que me quieres solamente a mí No tengo derecho en realidad para dudar de ti Y para no vivir feliz pero yo presiento Que no estas conmigo aunque estas aqui... Meus pais só se casaram quando eu nasci, em 1951. Eles já viviam juntos há três ou quatro anos, para indignação da família do meu pai. Meus padrinhos de batismo foram seu Adolfo e dona Catarina, muito queridos, que obrigaram meu pai e minha mãe a se casar quando eu nasci. Meus pais eram modernos, principalmente papai. Porém, seu temperamento era prejudicado por certa tormenta mental, eu diria. Ele chegou até a fazer uns tratamentos, depois acharam que era encosto. Mamãe sofreu muito com isso porque adorava papai. Lá em casa não havia pudores tolos, tínhamos um comportamento bem natural. Minha mãe vem de uma família que se origina na cultura indígena, era filha de mineiros do norte do Es tado, e eu reconheço a influência dessa origem no comportamento de minha mãe. Papai sempre nos deu tudo do bom e do melhor, ele gostava de comer e beber bem. Mamãe também se preocupava com isso. Meu pai tinha uma atividade, na verdade, ilícita, quase que por herança familiar. Ele lidava com o jogo do bicho e apostas em cavalos. O jogo do bicho foi herança do avô, que tinha um empório e gostava de jogar. Mas, para minha irmã e eu não passarmos vergonha, meu pai tinha uma profissão legal para colocar no nosso boletim. Profissão do pai: comerciante. Então, papai mantinha uma loja na Rua Matias Aires, que foi de tudo: foi um chalé – um chalé de jogo de bicho –, um chaveiro, um depósito de bebidas, uma lotérica, foi um monte de coisas. Já minha mãe sempre trabalhou em casa, ela nunca trabalhou fora. Papai era mais aberto. Uma vez ele pegou um flagra meu. Minha mãe e minha irmã não estavam em casa, eu estava sozinho. E passou na rua um vizinho nosso, o Zezinho. Eu chamei: Quer entrar, Zezinho? Parecia um filme da Dercy Gonçalves. Ele entrou. Nossa casa da Bela Vista tinha um quartinho, construído num praticável alto, o pé direito era uma coisa absurda. Na frente do quartinho, foi feita uma garagem, mas não subiram uma parede separando os ambientes. Colocou-se só um corrimão de madeira e uma cortina cobrindo o ambiente. Então, quem entrasse em casa já dava de cara com o quartinho. Eu estava lá, namorando o Zezinho, e ouço um barulho no cadeado e o portão se abrindo... O papai chegou!, falei. Nós dois, descemos correndo, o Zezinho se enfiou no banheiro perto da cozinha, eu tentava pôr a roupa, no escuro. Papai andava devagar, tinha um problema num pé que era meio torto. Fiquei na cozinha. Quando ele chegou, acendeu a luz, me viu e falou: Ei, o que você tá fazendo aí? Ele tinha uma voz grossa. Nada... Tô bebendo água, eu falei, trêmulo. Ele mexeu na porta do banheiro, estava trancada. Ué, quem está aí? – É o Zezinho, papai. . Zezinho?. O Zezinho aparece, mais branco que uma vela: Oi!, seu Caetano... Tudo bem?, e foi embora rapidinho. Eu fechei a porta e fui pra meu quarto, e papai foi dormir: Tchau, meu filho. – Tchau, papai. Quem disse que eu conseguia dormir? Não conseguia! Pensava: Meu Deus, meu pai... coitado. Vou lá falar com ele. Fui lá e menti: Ó, papai... O que o senhor viu não era nada daquilo... O Zezinho veio aqui e a gente só estava... Então – isso é que é surpreendente –, ele falou: Tudo bem, meu filho. Eu só não quero que você sofra. Eu tenho um amigo que tem esse comportamento, e ele sofre muito. Eu não quero isso pra você. É minha única preocupação. Anos mais tarde, eu contei isso pro Abujamra e ele ficou emocionado: Pô, teu pai era um puta cara! Mamãe também teve seu momento comigo, eu tinha 5 anos. Nós morávamos do lado de uma vila, onde eu brincava nas horas vagas. Uma noite, os meninos me levaram pra um daqueles cantinhos da vila e começaram a mexer comigo. Voltei correndo para casa, minha mãe estava na mesa da cozinha, passando roupa, e eu falei: Mãe, sabe o que aconteceu? Os meninos, Zezinho, Luisinho, o Mickey e o Pateta, mexeram comigo. Ela levantou o ferro e falou: Meu filho, se eles fizerem isso de novo, você me avisa, que eu mato! Aí, eu não deixei que ela matasse os meninos, nunca mais contei nada e eles continuaram vivos! Mamãe tem umas coisas engraçadas. Ela adora a música F Comme Femme Elle est éclose un beau matin Au jardin triste de mon cœur Elle avait les yeux du destin Ressemblait-elle à mon bonheur? Oh, ressemblait-elle à mon âme? Je l’ai cueillie, elle était femme Femme avec un F rose, F comme fleur Se ouve isso, ela vai às nuvens! Não entende o francês, mas fica encantada com F Comme Femme. Atualmente, ela adora a música da Marisa Monte: Amor I Love You, amor I Love Youuu-u u. Ela gosta de ouvir as músicas do rádio. Não é noveleira, mas assiste às novelas, pelo menos algumas. Quando aparece alguém que ela não gosta, ela a bota o controle remoto na cara e tapa os olhos. Eu falo: Mamãe, o que é isso? E ela: Ah, não suporto esse ator! Fátima Maria, minha irmã, nasceu em 1954. Fátima é uma amiga de todas as horas. Sempre que precisei, ela me acompanhou o tempo todo. Hoje em dia ela é um anjo de pessoa, mas o que eu apanhei dela! Desde pequeno apanhava, apesar de eu ser mais velho. Ela gostava de chutar, ainda mais no saco. Eu não revidava porque ela era pequenininha e muito bonitinha. Uma vez, ela pegou catapora e ficou com uma feridinha no nariz e, brincando de guerra de travesseiro, eu acertei a cara dela, a casca caiu e ela ficou com uma cicatriz. Quando menina, ela era uma moleca. O portão de casa tinha uns 2 metros, e era todo trabalhado em ferro. Encaixando os pés nas arestas, dava pra escalar o portão e sair do outro lado, na rua. Ela aprendeu isso rapidinho, e fugia. Um dia, minha tia, Gioconda, tocou a campainha lá de casa. Quando mamãe apareceu, ela mandou: Você está louca? Tua filha está brincando com uma mala velha lá no meio da rua! Minha mãe saiu feito doida atrás dela. A Fátima foi pinta-brava. Aos 10, 12 anos ela fumou. Me lembro da surra que ela tomou. Eu nunca apanhei. Brigava, discutia, mas nunca levei nem um puxão de orelha. Nada. Já a Fátima... Nossa infância foi muito próxima, nós brincamos juntos, ficamos doentes juntos, quando eu tinha sarampo ela também tinha. Quando eu tive catapora ela teve também, hepatite, pegamos tudo um depois do outro. Dormimos no mesmo quarto até eu sair de casa. Tudo muito naturalmente. Minha mãe dizia que eu era apaixonado por minha irmã, achava ela linda. Temos fotos da Fátima no meu colo... Eu tinha, e tenho, muito carinho por minha irmã. Quase todas as irmãs da minha mãe moravam no Parque Edu Chaves: tia Antonia, tia Maria, tia Mercedes, tia Sinhorinha; só tia Lúcia morava no centro da cidade. Eu gostava de visitar as tias, comer doces de compotas, almoçar... Na casa da tia Sinhorinha, tinha galinheiro, jabuticabeira, mas ela não era tão bem de vida como tia Antonia e tia Mercedes. Tia Maria era muito simples, um doce de pessoa, um amor. Ela costumava ir à nossa casa ajudar mamãe, estava sempre rindo, era gêmea da tia Mercedes. A família do meu pai era mais animada e maior, todos descendentes de italianos. Tia Rosa, que morreu logo, tia Milinda, que foi quem me levou ao teatro pela primeira vez. Ela se casou com um judeu e se converteu ao judaísmo. Depois vinha tia Gioconda, que era muito viva, divertidíssima, fazendo jus ao nome. Ela gostava de nos levar à pizzaria para tomar Coca-Cola, bebia com gosto e dizia: Ah! Coca-Cola faz um bem!. Tia Gioconda era uma alegria. Depois vem minha paixão, tia Bianca. Paixão, paixão, paixão. Ela me amava de maneira irrestrita! Me beijava na boca, o selinho de hoje em dia, ela já me dava. A casa dela era primorosa, tinha sempre flores, palmas, era impecavelmente limpa e organizada. Com a tia Bianca eu conheci muitas das coisas que cultivo hoje, trocávamos livros, discos... Quando não era eu, era ela que emprestava algum LP novo. Tínhamos altos papos. Pena que ela morreu cedo, aos quarenta e poucos anos. Sofria do coração, como se dizia na época. Há, ainda, o tio Antonio, chamado de tio Cheri, apelido que vem do francês, chérie, mas, como eles eram italianos, falavam chiri, sem arrastar o r. Então, tio Antonio era conhecido só como Cheri. Ele era um bon vivant, um playboy do Bexiga, tinha muitas mulheres, gostava de carros conversíveis – tinha uma Baratinha (carro da época) –, se casou com quase 50 anos, e a vida de bon vivant acabou. Capítulo II Infância e Adolescência – Ilusões A dose de ilusão que existe nas fases da infância e adolescência é muito grande. Eu, por exemplo, achava que ia casar! Mas não achava que ia casar como noivo... Eu ia casar como noiva! Embora eu fosse um menino. Um menino de calção, camiseta, um garoto! Eu tinha hábito de, todo sábado, ver casamento na Igreja da Imaculada Conceição, que fica na Brigadeiro Luiz Antônio, esquina com a Cincinato Braga. Chegava lá às 4 da tarde e saía às 8 da noite, quando acabava o último casamento. Eu estudava em um colégio católico, da ordem franciscana, e tinha acesso ao mezanino da igreja, onde ficava o órgão. Eu achava deslumbrante aquela coisa: a noiva entrando e a cauda branca do vestido tomando o tapete vermelho. Sem contar que a Igreja da Imaculada Conceição é muito rococó, não tem meio centímetro que não seja pintado, trabalhado. Hoje em dia já fizeram reformas ali, mas era uma igreja... O teto era o céu do Apocalipse, o dia do Juízo Final. Tinha Deus todo-poderoso, Nossa Senhora, Jesus Cristo, aquela santaiada toda, nuvens e muitos anjinhos. Era um grande cenário, um telão clássico. Embaixo, a noiva e os convidados emperiquitados – chapéus, luvas, casacos... No altar, Nossa Senhora com aquele globo terrestre e a cobra aos seus pés, linda. Em cima o órgão tocando... Um espetáculo! Era algo bem felliniano ou zeffirelliano; o Zeffirelli também gosta disso. Eu também já tinha visto algumas peças de teatro e gostava bastante, mas o que eu adorava mesmo eram os casamentos. Quando penso naquele tempo, vejo que minha cabeça era cheia de mitos, de ilusão. Minha infância foi muito povoada por um conflito entre o catolicismo e o espiritismo. Eu ia à missa do colégio, mas, por outro lado, também frequentava o centro espírita. Mamãe trabalhava como médium em um centro chamado Amor e Caridade, e meu pai era orador e orientador de sessões. Eu acompanhava minha mãe até o centro, no Tucuruvi, pegávamos o ônibus embaixo de sol ou chuva. Às terças tinha a sessão de passagem dos obsessores – espíritos revoltados que, tendo se desligado da matéria de uma forma dramática, ainda vagam nas sombras sem galgar a possibilidade de ver a luz e precisam ser doutrinados. As crianças não eram admitidas no salão da sessão, mas eu ficava na sala ao lado, ouvindo tudo com minha irmã. O prédio era sólido e grande, abrigava mais de duzentas pessoas. Na sala maior havia um praticável com uma mesa enorme, a conhecida mesa branca, que é onde os espíritos se manifestam e o médium se envolve, se transfigura e recebe o espírito: Quem está falando é Eurico Gaspar Dutra... Nas sessões de obsessão, a transfiguração era muito grande: Meu nome é Alberto Ribeiro... Morri queimado! Eu ficava ouvindo aquelas vozes, apavorado e fascinado. Fátima e eu ficávamos na secretaria, de ouvidos e cabelos em pé. Nós olhávamos para aqueles quadros do Bezerra de Menezes, Allan Kardec, e ficávamos meio apavorados. O momento mais assustador era o da parte final da reunião, quando o espírito que encarnava na presidente se despedia. A cena era assim: a presidente colocava as duas mãos na mesa e se levantava para fazer uma louvação a Jesus, todos os médiuns envolvidos também se levantavam... Vinte e tantas cadeiras, ou mais, eram arrastadas, gerando um efeito sonoro assustador, um barulho horripilante! E a louvação começava: Divina Luz... . E os outros repetiam: Divina luz... . De Jesus... . De Jesus... . Iluminai o planeta Terra... . Ainda hoje, depois de adultos, se eu disser divina luz... , minha irmã fica doida: Ah, pelo amor de Deus, Miguel, não faz isso!. Essa é uma brincadeira que eu ainda faço muito com ela. Mas depois nosso medo infantil passava, porque todos no centro eram bastante carinhosos com a gente. Nós éramos crianças bonitas, bem vestidas, bem tratadas, e as pessoas nos adoravam. Às vezes saíamos em caravana para visitar as filiais de outras cidades, íamos de trem, fazíamos uma farra, cantava-se muito: Neste mundo eu choro a dor por uma paixão sem fim. Ninguém conhece a razão porque no mundo choro assim. Quando lá no céu surgir uma pequenina flor, todos irão... Essa música é chamada Saudade de Matão. De quando em quando, havia também as festas do centro, aniversário da presidente do centro, do espírito tal... Tinha bolo, comida e showzinho com os jovens e crianças, e eu sempre estava metido, cantando em dupla com uma coleguinha, toda vez a mesma música, acompanhado por um acordeom: Adeus Sarita. Eu fazia a primeira parte: Adeus Sarita, vou partir para a fronteira, Vou levar essa boiada pra vender lá na feira. Com o dinheiro desta venda, Eu vou comprar mais uma linda fazenda e contigo me casar. No dia do casamento vai ter baile a noite inteira e a sanfona vai tocar... E minha coleguinha respondia: Fom, fom... Saindo da adolescência comecei a ter outros interesses, me afastei e por um longo tempo não tive mais contato com o espiritismo. Eu estava abrindo minha janelinha para a vida real, e o mundo não era o que eu imaginava; eu perdia minha dose de ilusão. Contudo, me entreguei a outro tipo de fantasia, passei a acompanhar mais de perto o que se passava no teatro, nos teatros. Capítulo III Os Teatros que me Cercavam Nasci em São Paulo, na capital, no bairro da Bela Vista, Bexiga. No ano anterior, 1950, a TV havia sido implantada no Brasil. Quando eu tinha 3 para 4 anos, descia sozinho para ver TV num bar que tinha embaixo de casa. As novelas eram ao vivo. O dono do bar, Nelsinho, reservava, diz a mamãe, a primeira cadeira da fila para eu assistir. A transmissão era precária, ficava o maior tempo fora do ar. A Rede Tupi, que era canal 3 ou 4, saía do ar e entrava uma mandala indígena com um tupizão no centro e quatro tupizinhos nas bordas, e ficava ali, parada. Às vezes tinha um fundo musical, talvez uma música de Carlos Gomes... A gente falava assim: Já voltou?. Con-tam os pioneiros da Tupi que eles tinham duas câmeras, uma pra mudança de cenário, outra se dirigia às estantes onde ficavam os anúncios, as cartelas que eles mudavam: Brastemp... . Tchun!, tiravam a cartela e aparecia outra: Apresenta..., tchun!, tiravam a cartela: Laura Cardoso e Lima Duarte em.., Tchun: Ralé. TV de Vanguarda! A Tupi tinha o Grande Teatro Tupi, às segundas, e aos sábados ou domingos, alternadamente, eram o TV de Vanguarda e o TV de Comédia. Numa semana o TV de Vanguarda apresentava, por exemplo, Ralé. Na outra semana, o TV de Comédia, com Grande Hotel! A memória que eu tenho é fabulosa. Minha mãe ficava apavorada porque eu dormia tarde para ver o final das peças. Tinha o Sítio do Pica-pau Amarelo, roteiro de Tatiana Belinky. O Júlio Gouveia apresentava o programa, começava abrindo um livro: Era uma vez... , e a história do Sítio se desenrolava. No final ele voltava à cena, fazia uma conclusão, que emendava com a frase: Mas isso é uma outra história que fica pra uma outra vez. O TV de Comédia, basicamente, era dirigido e escrito pelo Geraldo Vietri. Mas o Benjamin Cattan e a Wanda Cosmo também dirigiram lá, assim como o Cassiano Gabus Mendes e outros também escreveram. O elenco era soberbo: Laura Cardoso, Lima Duarte, Márcia Real, Fernando Balerone, Luís Orioni. A Fernanda Montenegro fazia o Grande Teatro Tupi, mas no Rio de Janeiro. Eles viajavam no domingo à noite, amanheciam no Rio, ensaiavam dois, três dias e apresentavam lá mesmo. Não sei se ela fazia aqui em São Paulo, porque o Grande Teatro Tupi de São Paulo era feito pelos atores de São Paulo: Vida Alves, Marisa Sanches, Dionísio Azevedo, Flora Geny, José Parisi, Wanda Cosmo, Ana Rosa, Turíbio Ruiz, Norah Fontes. Também assistia à TV Record. No auge da Record, todo mundo estava lá. Os programas eram o Fino da Bossa, com a Elis; Bossaudade, com a Elizeth e Ciro Monteiro; Corte Rayol Show, com Renato Corte Real e Agnaldo Rayol; Essa Noite se Improvisa, com Blota Jr. e Sônia Ribeiro; o Show do Dia 7; o programa Jovem Guarda, com o Roberto Carlos... Além dos que eu já falei, ainda apareciam Isaurinha Garcia, Aracy de Almeida, Silvio Caldas, Orlando Silva, Carlos Galhardo, Vicente Celestino, às vezes Odete Amaral e toda a velha guarda. De vez em quando Ângela Maria ia lá cantar Terra Seca: Trabalha, trabalha, trabalha, nego... . Ainda tinha Claudete Soares, Peri Ribeiro, Elza Soares e o Simonal, que depois veio a ter um programa próprio. O Caymmi ia, o Caubi, a Maysa. Essa gente toda vivia ali, na Record, no teatro chamado Record Consolação, que ficava entre o Cine Belas Artes e o cemitério, onde é hoje uma casa de lustres. Dentro da central da Rádio Record havia um auditório que virou o teatro, um lugar muito simpático. O programa da Hebe era lá. Os programas eram gravados dois, três dias antes; mal se editava e já iam ao ar. Era quase como se fossem ao vivo, porque usavam videofitas, como se chamava, e quando começava a gravação, não se podia parar. Não tinha o corta! E não se revisava também, porque para revisar era necessário voltar a fita toda. Nas novelas também era assim. Se fosse preciso refazer alguma cena, tinha que voltar a fita e fazer tudo de novo, tudo. Os programas daquela época eram deliciosos. A TV foi uma revolução. Para uma criança, então, era uma caixinha mágica, um prato cheio para minha imaginação, que ainda sondava os santos e casamentos da Igreja da Imaculada Conceição, os espíritos e o teatro. Morávamos no bairro do Bexiga, e desde criança aprendi a conviver com os teatros que me cercavam. Nossa casa ficava na Rua Treze de Maio, perto de uma oficina mecânica que um dia virou um teatro: o Teatro Treze de Maio, onde é hoje o Café Piu-Piu. O antigo Teatro Santana também não era longe, ficava na Rua 24 de Maio, vizinho do Teatro Municipal, onde agora é uma galeria. A primeira coisa que eu vi no palco não foi uma peça, foi um balé, Copélia, no Teatro Santana. Eu tinha 6 anos... Minha tia Milinda era uma pessoa que se interessava pela vida cultural da cidade, gostava de ópera, dança... Titia se destacava de todos os irmãos, descendentes de imigrantes italianos, por ter essa preocupação em evoluir culturalmente. Ela lia, cantava trechos de óperas, e nos levou, a mim e meu primo Edno, para ver Copélia, um balé lindo, de Leo Delibes. A música é lindíssima, teatralérrima, muito usada como trilha sonora. A lembrança que eu tenho é de que, quando acabou o espetáculo, eu fiquei paralisado na poltrona. Paralisado. Era um costume na época: quando terminava o espetáculo, descia-se uma cortina de ferro, a cortina corta-fogo – agora não sei se estou confundindo sonho com realidade, mas me lembro de atravessar essa grande porta de ferro passando por uma portinha que fazia parte dela. Parece que minha tia, preocupada com minha reação, conseguiu que um funcionário do teatro nos deixasse ir aos bastidores para eu poder desmistificar aquilo tudo, suavizando o impacto do espetáculo. Quando entramos, tia Milinda disse: Olhe, é tudo gente normal, Miguelzinho! A boneca é uma bailarina, a bailarina é uma mulher. O soldadinho de chumbo é um rapaz. O velho é um moço! São todos artistas, pessoas normais. Amanhã, eles vão vestir novamente as mesmas roupas, vão dançar do mesmo jeito e contar a mesma história. Tá vendo, Miguel? É tudo mentira, mas feito por gente de verdade. Eu pisava no palco e via aquelas figuras em atitudes naturais, tirando as roupas, as sapatilhas, se movimentando e conversando normalmente. Isso é muito forte na minha memória. Outro teatro dos arredores – e que eu frequentei muito – foi o Teatro Bela Vista. Nossos vizinhos de quintal eram seu Roque e dona Josefina – um casal sem filhos –, que me viram nascer e gostavam muito de mim. Seu Roque trabalhava como porteiro do Teatro Bela Vista e liberava a minha entrada nos espetáculos. Eu ficava na calçada esperando uma piscadinha dele para passar pela urna escondido. Mas todos sabiam, eu acho, porque não tinha só o porteiro, tinha o administrador do teatro, a bilheteira, o vendedor de programa, o baleiro... Aquela entourage que forma a lojinha chamada Teatro. Quando eu não podia assistir por causa de cenas fortes, seu Roque era o meu censor. Essa você não pode ver. Ele se sentia responsável, porque era amigo dos meus pais. Eu não entrava, mas ganhava o programa. Assim, foi literalmente um porteiro quem abriu as portas do teatro para mim. Depois do impacto de Copélia, e liberado por seu Roque, vi as várias montagens do Teatro Bela Vista. Me lembro de uma tragédia, Castro, de um autor português, António Ferreira. Fiquei tão impressionado com aquela tragédia, Castro! Principalmente porque a personagem principal saía de cena gritando: Aaaaaai!... E morria, lá atrás, nas coxias. Isso, quando eu ainda era garoto. O livro da Maria Della Costa traz a cronologia das peças do Bela Vista – não todas, uma boa parte. O Bela Vista era ocupado pela companhia Nydia Licia. Antes disso, tinha sido um cinema, o antigo Cineteatro Espéria, que o Sérgio Cardoso e a Nydia Licia descobriram e fundaram, ali, o Teatro Bela Vista, já como uma dissidência do TBC. Eles foram para lá em 1956. Eu comecei a frequentar o teatro por volta de 1958, 1959, quando eu tinha 8, 9 anos. O espetáculo inaugural do Bela Vista foi Hamlet; eu não vi. Vi e me impactei com O Tempo e os Conways, do Priestley. A peça começava numa determinada época e, no segundo ato, avançava 10, 15 anos, como se fosse uma antevisão da vida daquelas pessoas. Isso com mudança de cenário, tudo. Trocavam os móveis por outros, marcados e corroídos pela passagem do tempo. Eu assistia, chocado, àqueles personagens depauperados, dramatizados por uma queda de nível financeiro depois de terem vivido tempos tão bons! No terceiro ato, voltava para o tempo do início, era uma continuidade do primeiro ato. Eu fiquei bobo quando começou o terceiro ato; pensava: Meu Deus, eles ainda vão passar por todas as coisas que eu vi? Vão sofrer tudo aquilo? O teatro podia fazer o tempo ir e vir, era uma bola de cristal que me mostrava o futuro de cada um ali. Eu sabia o destino das coisas e pensava nelas; eu imaginava. Como eu imaginava! Eu ainda não tinha idade para sair sozinho e ia ao Bela Vista porque era perto de casa, mas havia pela cidade outras companhias além da de Nydia Licia. Maria Della Costa, por exemplo, tinha o Teatro Popular de Arte, que fundou com seu marido, Sandro Polloni, cuja matriz é o Teatro Maria Della Costa. O TPA tinha na sua direção a dona Itália Fausta Polloni, atriz dramática e tia de Sandro. O repertório de Maria é assustador porque ela não é egressa do TBC, apesar de ter se apresentado lá em 1951, com Ralé. A primeira montagem da companhia foi O Canto da Cotovia, do Jean Anouilh, e Maria convidou o italiano Gianni Ratto para dirigir. Gianni acabou ficando por aqui e passou um tempo na companhia. Ele também interferia na escolha do repertório, que, aliás, era muito rico: A Prostituta Respeitosa, do Sartre; A Rosa Tatuada, o primeiro Tennessee Williams montado aqui; Depois da Queda, de Arthur Miller... Que eu saiba, a primeira companhia da Maria também foi a primeira a montar um texto de Brecht, A Alma Boa de Set-Suan, em 1958. A Maria é um encanto. A Maria é a Maria. O pessoal do Arena também surgia, em 1953, e fizeram O Demorado Adeus, de Tennessee Williams, e Uma Mulher e Três Palhaços, de Marcel Achard, com direção de José Renato. Judas em Sábado de Aleluia, de Martins Pena, foi dirigida por Sérgio Britto, em 1954. Antes de se fixar em um teatro, o Teatro de Arena, na Rua Teodoro Baima, eles se apresentavam em lugares diferentes, em salas, nas fábricas. Eu conheço bem, mas nunca vi nada do Arena. Hoje eu percebo que sempre o teatro me cercou por todos os lados, mesmo quando eu estava distante dele. Passei minha infância e minha adolescência indo muito a Santos, meus padrinhos de batismo moravam lá. Dava 1º de julho eu estava lá! Dava 10 de janeiro, eu estava lá! E eu tinha uma vida assim: praia até certa hora, almoço, depois leitura. Sempre gostei de ler. Naquela época eu lia muito mais do que hoje, lia tudo que me caía na mão, não tinha nenhum critério. Eu tinha a Enciclopédia Delta-Larousse, que falava de teatro numa parte, tinha revistas, pedaços de jornais, coisas que eu ficava fuçando, buscando. Foi assim que Dulcina de Moraes entrou na minha vida. Eu a tinha como uma grande figura que via nos livros. Um dia, eu estava de férias no litoral, fui a uma livraria no Gonzaga – eu já gostava de teatro, mas sem preocupação de ser nada, gostava por gostar, talvez por causa do impacto do Copélia, sei lá –, e dei de cara com um livro de bolso que era uma peça de teatro, A Rosa Tatuada, do Tennessee Williams, uma peça que não bate muito com alguém de 13, 14 anos... Eu li aquele texto e vi como era a estrutura de uma peça, estava tudo ali, impresso: primeiro ato, segundo ato, a divisão das cenas, as rubricas, intenções das falas. Então, eu me arrisquei a escrever – lá em Santos. Escrevi uma peça chamada A Sociedade Proíbe. Era a história de uma moça pobre... Não, não, ao contrário, de uma moça rica. Uma moça rica, muito bem-nascida, que se apaixona por um moço pobre. A família fica contra aquele romance, ela resolve sair de casa para tentar a carreira artística e pede para a avó – que tinha um passado de, digamos, de convivência com artistas – para falar com a grande amiga dela, a atriz Dulcina de Moraes. Vó, a senhora conhece a Dulcina, pede a ela para me colocar na companhia dela! A avó leva a menina até Dulcina e ela é aceita na companhia. Fiz, ainda, uma cena de metateatro em que a avó e a Dulcina ficam na coxia falando: Olha lá, sua neta! Ela tem talento. E a garota acaba sendo bem-sucedida na carreira. A história segue e, um dia, a garota recebe no camarim a visita daquele namorado pobre, e eles reatam. Eu tenho a peça, está lá em casa, escrita com caneta tinteiro e cheia de erros de português. Foi dessa maneira meio estranha que Dulcina foi introduzida na minha caminhada teatral. Depois de me afastar do centro espírita, fui me aproximando cada vez mais do centro da cidade; começava a ter idade para adquirir o direito de ir e vir, sozinho. Meu teatro preferido continuava sendo o Bela Vista, onde assisti à peça Um Elefante no Caos, do Millôr Fernandes, com a Célia Biar. Também vi Mary, Mary, produzida pelo Oscar Ornstein, grande produtor da década de 1960. Ele fez My Fair Lady, Boeing Boeing... Vi Boeing Boeing (1964), vi Hedda Gabler... O cenário era todo revestido de cetim chamalote. A Nydia Licia era muito cuidadosa, eu tenho o maior carinho por ela. Se a vejo, fico emocionado. Embora sabendo, criticamente, que não consideram a carreira dela como parte de um teatro de vanguarda porque ela ficava num outro repertório, mais classudo. Mas Nydia fez Vestido de Noiva, do Nelson Rodrigues, com direção do Sérgio Cardoso; Amir Haddad, que foi diretor da Cia. da Nydia e um dos fundadores do Teatro Oficina, a dirigiu em Camila, ao lado de Rodrigo Santiago, Maria Célia Camargo e Dina Sfat – que era uma mulher muito apaixonada, envolvente, com aqueles olhos imensos. Até hoje guardo o programa impresso de Camila. Às vezes Nydia Licia chamava um diretor para dar um agito no grupo. Nydia fez Marat Sade, com direção do Ademar Guerra. Mais tarde, no Teatro do Assalto, do Zé Vicente – quando eu já estava com 17, 18 anos –, ela fez um texto de Max Frisch. E nem sempre ela fazia o papel principal. Em O Tempo e os Conways, por exemplo, quem fazia o papel principal era a Rosamaria Murtinho. Inclusive nós nos encontramos há pouco tempo numa gravação, e eu disse a ela: Lembra dos Conways?. Ela, então, me contou: Nossa, como eu sofri quando fiz a peça! Estava grávida e passava muito mal porque tinha que chorar demais, gritar demais. Era tanto esforço que eu saía de cena e vomitava. Fiquei tentando encaixar no tempo o que ela disse e pensei: Que coisa... Era assim? Esquisito isso. Não percebi nada quando assisti. O teatro prega tantas peças na gente... Em 1963, Ruth Escobar inaugurou o Teatro Ruth Escobar. A montagem de estreia foi A Ópera dos Três Vinténs, do Brecht. Eu não vi, mas frequentei bastante o Teatro da Ruth. Eu ia a todos os teatros, via de tudo, desde My Fair Lady até Galileu Galilei. My Fair Lady estreou em São Paulo em 1964, no Paramount, que hoje é o Teatro Abril, com Bibi e Paulo Autran nos papéis principais. A montagem obedecia à original americana, com cenário giratório, figurinos, a ordem das cenas, tudo! Eram três palcos giratórios, dois laterais e um central; então, a mudança de cena se dava na frente do público, com a trilha sonora ao fundo. A primeira cena acontecia na porta de um teatro, o público está saindo, ela está vendendo flores na rua e cantando: Tão feliz, tão feliz... . No final da música, a rua era fechada e aparecia o pai, saindo de um bar: Um trocadinho só, um trocadinho só. Com a sorte a meu favor... . Esse espetáculo de agora, que o Jorge Takla montou, já não é totalmente fiel ao original, houve mudanças nas coreografias e tudo acontece em um cenário só. Quem está fazendo o papel do pai é o Francarlos Reis, que está maravilhoso, apaixonante. Quero até ver de novo, várias vezes; as músicas são lindas. Nessa fase eu já via coisas mais densas – as peças do Plínio Marcos, Dois Perdidos Numa Noite Suja, Quando As Máquinas Param, e Navalha na Carne, no Teatro Maria Della Costa, com a Ruthinéa de Moraes, em 1967. Em 1967 mesmo fui com meu colégio ver o Édipo Rei que Paulo Autran montou com Cleyde Yáconis e direção de Flávio Rangel. Eu estava no auge da adolescência e foi um desastre! Nós ríamos muito: Ha, ha, ha. Às vezes um gongo soava: Bum!, e nós gritávamos: Ai, que susto!. E ríamos... Até que o Paulo Autran parou o espetáculo e passou um sabão na gente. De repente, entrava a Cleyde Yáconis fazendo a Jocasta, falava alguma coisa com aquela métrica diferente, palavras que a gente não entendia, e nós: quá, quá, quá, quá... Foi tanta bagunça que depois voltei para ver de novo, sozinho, sem os coleguinhas. Eu me deliciava com todo tipo de teatro, mesmo indo sozinho. A primeira peça que vi no Teatro Oficina foi Galileu Galilei, em 1968, com o Claudio Corrêa e Castro deslumbrante no papel de Galilei. Fiquei encantado. Era um espetáculo maluco: a primeira cena acontecia atrás de grades, como as de uma cadeia, sob a trilha sonora de um rock. Naquela época isso era um choque, ainda mais pra mim que tinha como referência os espetáculos da companhia da Nydia Licia, de cenários muito bem-feitos e direção clássica. Quando vi Galileu Galilei, pensei: Nossa, isso também é teatro!. Eu até me sentia tocado pelo teatro de palco italiano, distante da plateia, mas não como fui tocado pelo teatro de Zé Celso, onde fui tomado, arrebatado. Em 1969, no Teatro Bela Vista, estreou o musical Hair, que depois foi para o Teatro Aquarius. Hair foi interessante, mas não impactante, porque já veio tão decifrado, vendido. Nós já conhecíamos as músicas: Aquarius... Aquarius.... Aliás, a razão da mudança de nome do Teatro Rex para Teatro Aquarius foi o Hair. Sonia Braga fazia, Antonio Fagundes, Aracy Balabanian, Armando Bógus, Laerte Morrone... Era uma peça que não podia fugir do roteiro da Broadway, devia obedecer a cláusulas contratuais que impunham determinado padrão de montagem. No mesmo ano voltei ao Oficina para ver Na Selva das Cidades; era impressionante! O Zé Celso foi desconstruindo, foi descaracterizando o teatro italiano que era o Oficina; fez uma transformação total. A Selva foi o auge da ruptura. Embora Galileu fosse assustador em termos de proposta estética, ainda guardava uma ligação com o que vinha sendo apresentado nas outras companhias, uma ligação leve, mas guardava – a encenação era feita de frente para o espectador, por exemplo. Agora, em Na Selva não tinha isso, era tudo escancarado, a encenação ocupava diferentes espaços do teatro, as cadeiras foram retiradas, o palco foi desmontado e havia um ringue no centro da cena. Um ringue mesmo! No meio ele colocou uns véus, e deixou a luz já muito maluca. Ao longo da peça os atores acabavam com o cenário, iam rasgando, cortando tudo, a sala era totalmente destruída, punham aquilo abaixo. Num certo momento, pegavam um balde com um peixe vivo dentro e esmagavam o bicho num bloco de paralelepípedo... Aquele cheiro de peixe inundava o teatro, pedaços do peixe espirravam na gente. Beirava o Teatro da Agressão, você ficava chocado com aquilo. Isso, além dos nus, a Ítala Nandi nua! Havia um impacto estético, de derrubada de padrões, e mesmo assim permanecia belo, forte, dramático. Acima de tudo dramático, teatral! E o Teatro Oficina lotado, tinha gente até sentada no chão. Era uma coisa maravilhosamente maluca. Atores fantásticos passaram pelo Oficina, Othon Bastos e Renato Borghi trabalhavam lá nessa época. Cheguei a assistir Pequenos Burgueses numa montagem da década de 1970, não era a original. Não vi O Rei Da Vela e não vi Roda Viva, mas Don Juan eu vi, era lindo! Gracias, Señor, assisti em duas noites, era apresentado assim. Demoraaaava. A cada noite eram três ou quatro horas de peça. Eles se drogavam muito, ficavam muito loucos e perdiam um pouco o pé. O Zé sempre foi um provocador. Ele não queria que o público ficasse impávido, ele queria uma reação, de alguma forma, até chegar ao ponto de tocar o público durante a cena. Recentemente mesmo, em Bacantes, despiram o Caetano, e em Cacilda, ele mostrava os meninos de pau duro – aliás, deslumbrantes. Ainda em 1970, no Teatro Cacilda Becker, vi a primeira peça declaradamente gay: Os Rapazes da Banda, dirigida por Maurice Vaneau. O elenco era um absurdo: Raul Cortez, Denis Carvalho, Pereio (Paulo César), Benedito Corsi, John Hebert... Todos fazendo veados. No Teatro Aquarius, antigo Cine Rex, que virou Teatro Olímpia e, depois, Teatro Zaccaro, assisti Hair, Jesus Cristo Superstar... Muitos cinemas foram transformados em teatro. O Cine Arlequim se tornou Teatro Bandeirantes. O Cine Monark, Teatro Brigadeiro, e depois Teatro Jardel Filho. O Cine Paramount é hoje o Teatro Abril. Na Praça das Bandeiras ficava o Teatro de Alumínio, ocupado por companhias como a da Nicette Bruno – companhias de comédias ligeiras –, até virar um teatro mais voltado para as revistas. O Teatro Santana, acho que foi incendiado e nunca foi reformado. Na Avenida São João havia o Teatro Natal, com duas salas: a vermelha e a azul. Para lá iam geralmente as companhias de comédias carrilhadas, rasgadas. Dercy Gonçalves, Oscarito, essa gente toda ia para o Teatro Natal. O Teatro São Pedro foi fechado durante um tempo e reabriu no final da década de 1960, começo dos anos 1970, com o empenho da Beatriz Se-gall, do Maurício Segall. Eles fizeram sociedade com Fernanda Montenegro, Fernando Torres... Lá, assisti à peça Marta Saré, com a Fernanda, a Beatriz e Myrian Muniz. Foi a primeira vez que eu vi a Myrian no palco, ela fazia dois ou três personagens. Há uma história sobre essa peça que é a seguinte: a Myrian achava que a Beatriz era muito chata com ela, e havia uma cena que elas faziam juntas – não sei se a Myrian fazia a dona de uma pensão, mas a Beatriz representava Solange, personagem que tinha sotaque francês. Uma noite, durante a apresentação, em resposta às ordens que recebia da personagem da Beatriz, a Myrian, que tinha o pavio curto, disse, imitando o sotaque francês: Solange, vá à mééérdê...! O público veio abaixo de tanto rir. Dizem que a Beatriz se indignou, foi ao autor, que era o Guarnieri: Ah, Guarnieri, como pode a Myriam me mandar à merda em cena? Isso não tem no texto! E ele disse: Não tem mas vai ter. Eu gostei e o público também. E ela passou a fazer isso todas as noites. Era a lei do absurdo. Além de Marta Saré, vi A Vida Escrachada de Joana Martini e Baby Stompanatto, que era quase uma revista musical, com a Marília Pêra – já estrelando –, Hélio Souto, Marco Nanini, Zezé Mota. Ainda em 1970, veio Fala Baixo Senão Eu Grito, com a Marília, da Leilah Assumpção. Vivíamos tempos em que autores, principalmente brasileiros, como Oduvaldo Vianna Filho, Guarnieri, Leilah, conquistavam espaço e abriam possibilidades para montagens que valorizavam mais o texto do que a encenação dos grandes clássicos. Eu vi muitos clássicos, vi Macbeth, com o Paulo Autran e Tônia Carreiro, direção de Fauzi Arap. Na peça tem aquela floresta que anda, a floresta estava toda projetada nas paredes do TBC. Na minha memória, a força da atuação dos dois atores era o que valia. Outros clássicos que vi: Hedda Gabler, com a companhia da Nydia Licia. Casa de Bonecas, com a Tônia Carreiro. Yerma, vi uma montagem maravilhosa, com Victor Gar-cía e uma atriz espanhola, Nuria Espert. Nossa, que montagem deslumbrante! Há alguns anos se faziam grandes clássicos, tragédias, dramas. Hoje há muitas produções de comédia porque o público quer comédias. Mas ainda há atores que tentam manter os clássicos. A Fernanda fez Fedra, Renata Sorrah fez Medeia... Meu amigo Diogo Vilela, que é um grande ator, tem essa preocupação, ele tem que fazer um clássico. Ele fez Hamlet, O Diário de um Louco, Tio Vânia, pretende fazer o Otelo... Mas eu tenho uma crítica a isso, acho um pouco exagerado. Há atores e atrizes que não precisam desse aval. Por que ter que fazer um clássico? Às vezes, me parece haver uma obstinação que não leva em conta a possibilidade do espetáculo não ficar bom, e algumas montagens acabam ficando canhestras. Geralmente, um grande nome leva o espetáculo e o elenco de suporte é fraco, feito por atores que ainda não têm formação para fazer um clássico. Capítulo IV Vida de Adulto Em 1970 eu nem pensava em fazer teatro, entrei no curso de Letras da Universidade de São Paulo. Me tornava um adulto e descobri Maria Bethânia no show Brasileiro, Profissão Esperança, em que ela cantava músicas da Dolores Duran e do Antonio Maria – havia crônicas dele também –, dividia o palco com Ítalo Rossi e a direção era de Bibi Ferreira. Bethânia surgia, magérrima, cheia de guias, com uma tiara e uma peruca. Aos 20 anos, em 1971, fui pela primeira vez ao show Rosa dos Ventos no Teatro da Praia, entre Ipanema e Copacabana. Eu fiquei maluco! Era um espetáculo deslumbrante, dividido em quatro partes que eram os elementos da natureza – ar, fogo, água e terra. Bethânia era indescritível. Depois o show veio para São Paulo e ficou um tempão no Teatro Maria Della Costa. Eu ia toda semana, guardava um dinheirinho e ia. Eu a conheci em Rosa dos Ventos, naquela época ela recebia todo mundo, a gente ficava ali esperando e quem quisesse falava com ela. No Drama, no Cena Muda, Bethânia sempre recebeu as pessoas. O camarim parecia um congá, cheio de santos, flores, ela sentada numa poltrona, a gente praticamente se ajoelhava para falar com ela, e ela conversava amavelmente. Hoje ela ainda recebe – os convidados –, mas, devido ao assédio do público, não é mais como antes. Eu era muito Bethânia. Eu me lembro de um dia que era aniversário dela, ou do show, e, ao invés de comprar ingresso, o público tinha que levar uma flor. Na porta do Maria Della Costa tinha uma bicharada, um bando de gente segurando uma rosa ou uma margaridinha, tinha muita margarida. Tudo foi jogado para ela. Ela fazia os shows em teatros – e era puro teatro –, não havia as grandes marcas envolvidas, Chevrolet, Credicard... Eu vi tudo que Bethânia fez com Fauzi Arap. Devo a eles a minha entrada no mundo da Clarice Lispector e o mergulho de Fernando Pessoa na minha vida. Pano de Boca, texto do Fauzi, é teatro puro! Na história, pessoas se reúnem numa sala escura e se veem confinadas, rodeadas de espíritos, de fantasmas que nos teatros mais antigos a gente pressente que existem. Esse lado que pode parecer até um pouco mediúnico, o Fauzi aborda na sua obra de autor. Não só no Pano de Boca, mas também no Ponto de Luz, duas peças em que ele fala sobre a capacidade de alguém se envolver com o indizível. Mesmo estando na universidade, eu conseguia ir ao teatro e sempre que podia viajava para o Rio de Janeiro. Foi lá que assisti à Gota D’Água, de Chico Buarque e Paulo Pontes, no Teatro Teresa Raquel, em 1975. Fazia um calor infernal, tinha uns ventiladores de teto que ficavam ligados o tempo todo; aquele palco devassado. A favela onde se passa a história era feita de praticáveis. Eram três ou quatro andares, como se fosse o esqueleto de um prédio, ao fundo, e o palco todo livre. Tudo acontecia ali, era a casa da Joana, a casa do Creonte... Às vezes avançava uma cama ou coisa assim, mas muito pouco. Eu vi muitas vezes Gota D’água. Quem fazia o Creonte, quando eu vi, era o Oswaldo Loureiro; o Jasão era feito pelo Roberto Bonfim. Me lembro que eu estava num lugar superdesconfortável, mas de onde dava pra ver o palco. Quando começava o segundo ato, descia um pano branco, e de onde eu estava dava para ver a Bibi se preparando, repassando as marcas da macumba, era uma cena linda. Gota D’água era muito a Bibi, para mim. Além do texto maravilhoso, com versos belíssimos, músicas lindas, uma porrada! Bibi estava deslumbrante, pouco se mexia, não sei se pela direção, mas gesticulava pouco, deixava tudo na fala e na máscara, fabulosa! O cabelo na testa, uma roupa preta, bem simples, sem manga, com um chinelinho baixo, preto também, e aquela boca se mexendo: Tudo está na natureza encadeado e em movimento – cuspe, veneno, tristeza, carne, moinho, lamento, ódio, dor, cebola e coentro. Fabulosa! Depois a peça veio a São Paulo e ficou no Teatro Aquarius, que era grande, devia ter uns 800, 900 lugares. Naquela época os teatros não costumavam ser tão grandes: o Arena era pequeno, o Oficina e o TBC também, mas mesmo aquele teatrão, eles enchiam. Bibi já tinha feito My Fair Lady, tinha sua companhia desde 1944, ela era bastante conhecida do público. Essas pessoas se tornaram astros com muito pouco tempo de carreira. O Paulo Autran com dois anos de carreira já era o Paulo Autran. No Gota D’água, Bibi já era Bibi. Naquele ano, 1975, outra peça que me lembro de ter visto foi Salva, dirigida por Ademar Guerra, o primeiro texto de Edward Bond montado no Brasil. Era um espetáculo contundente, levado pela companhia da Miriam Mehler. Eu ainda estava na Faculdade de Letras, fazendo português e italiano – naquele tempo não havia prazo para terminar o curso, valiam os créditos –, mas eu achava muito fraco o curso de italiano, a cadeira era composta por professores velhinhos, todos muito lentos, e eu pensei: Nossa, não vou aprender nada dessa língua linda!. Eu já tinha tido contato com a língua pela família do meu pai e, mais ainda, porque eu era muito amigo da filha de um casal de italianos, chamada Luccia. Conheci Luccia no quarto ano primário e somos amigos até hoje, embora ela esteja morando em Angola. Na casa dela se falava portunhano (português com italiano): Sente, sente, ragazzo. Vai un poco de vino? O italiano era muito próximo e, percebendo que na faculdade não iria adiante com aquilo, fui fazer um curso paralelo na Casa de Dante, no Instituto Italiano de Cultura, na Rua Frei Caneca com a Matias Aires, perto de onde meu pai tinha uma loja. O instituto era em uma casa bonita, um palacete; existe até hoje. Fiquei uns dois anos fazendo o curso junto com a faculdade e trabalhando meio período em um setor de editoria da Secretaria do Estado. Depois do trabalho, eu ia para o Instituto Casa de Dante, saía de lá umas seis e meia, pegava o ônibus Cidade Universitária, na Augusta, e ia pra faculdade. De repente, eu estou lá na faculdade e percebo um rapazinho, que eu já tinha visto um dia em frente ao Dante, olhando para mim! Ele era um garotinho, muito bonitinho, moreno-jambo, de olhos amendoados... Pensei: Esse menino está em todas? Por que ele olha tanto pra mim? E está aqui nos barracões de Letras e Ciências Sociais fazendo o quê?. Eu me achava um senhor, apesar de ter só 24, 25 anos. Encurtando a história: esse garoto não era garoto, ele tinha três ou quatro anos a menos que eu, apesar de aparentar menos, era estudante de Ciências Sociais, e nós começamos a namorar. Seu nome era Antonio, um rapaz muito culto, inteligente e que se apaixonou por mim. Eu também me apaixonei, me sentia valorizado, para cima. Minha vida mudou. Antonio era fanático, tarado pela Elis Regina, e fomos ver Falso Brilhante, no Teatro Bandeirantes, um teatro muito grande – que foi o Cine Arlequim da minha infância e hoje é uma igreja da Universal. Era deslumbrante! Ninguém ficava imune ao espetáculo, ainda mais um jovem cheio de paixão e totalmente aberto às novidades do mundo. A direção da Myrian Muniz era despudorada. A Elis cantava Fascinação – se não me falha a memória –, sentada em um balanço bem simples, com as cordas enfeitadas de flores; o que podia ser cafona era lindo! Era muito pertinente. Eu vi esse show umas seis vezes. De uma passarela no meio da plateia, Elis vinha: Ah, essas fontes murmurantes... , fazendo uma Carmen Miranda. Os figurinos e o cenário do Naum (Alves de Souza) formavam um grande circo. O espetáculo ficava entre o sublime e o ridículo o tempo todo, propositalmente. A Elis estava fascinante! Não sei como ela aguentava ficar em cartaz de quarta a domingo, cantando coisas absurdas durante quase duas horas e meia, e com coreografia! Eu provocava muito o Antonio porque eu era mais Bethânia e Nana (Caymmi) – que estava entrando no circuito –, mas também participava da tietagem com a Elis. Não havia muito o que discutir: musicalmente ela era perfeita, voz cristalina, afinação impecável, quase uma Ângela Maria no seu auge. Eu digo quase porque eu sou totalmente Ângela Maria. Se você pega os primeiros discos, Poema de Amor, O Bem do Amor, Samba – Eu Canto Assim, remetem muito à Ângela. Na gravação de Bom Dia, Tristeza Elis canta com o Adoniran Barbosa: Bom dia, tristeza. Que tarde, tristeza. Você veio hoje me ver. Já estava ficando até meio triste De estar tanto tempo longe de você... Nessa música tem um ponto em que se a gente fecha os olhos e só ouve, é a Ângela! Em Bom–dia, Tristeza, Elis soltou a Ângela Maria que tinha nela. Assim como a voz da Ângela no começo da carreira se assemelhava à de Dalva de Oliveira. Elas também carregaram as influências dos ídolos – Elis nunca escondeu que era fã da Ângela – e levaram um tempo até perder essas referências. Já Elizeth (Cardoso) não se bicava com Elis. Havia certa rivalidade na escolha do repertório e dos músicos. O Zimbo Trio, por exemplo, acompanhava as duas, o que gerava certo ciúme entre elas. Acho que a Elizeth se incomodava com aquela menina que surgia no cenário musical e que chamava a atenção de Edu Lobo, Dorival Caymmi, Chico Buarque, Gilberto Gil, compositores renomados... Mas isso são rusgas de bastidores. Ouvi uma história muito bonita que diz que quando a Elizeth já estava bem doente, ela teve que vir a São Paulo e fez questão de visitar o túmulo da Elis: Quero ir lá. Quero ir. Quero ir!. Foi e cantou, à capela, no túmulo, talvez, querendo dizer: Me perdoa. Mas, rusgas à parte, eu seguia meu romance com o mocinho de olhos amendoados. Nas nossas conversas ele sempre me falava que tinha um grupo de trabalho. Quando eu fazia um convite: Vamos assistir a um filme do Bertolucci?, ele dizia: Desculpe, mas não posso, tenho uma reunião com meu grupo. – Que grupo é esse? – Ah, um dia eu te conto. Toda vez que se falava nesse grupo, ele dizia um dia eu te conto. Fiquei desconfiado: Meu Deus, esse menino faz Ciências Sociais, faz reuniões com um grupo de trabalho... Ele é comunista!. Mas não era. Era artista. Capítulo V Teatro Orgânico Aldebarã O grupo do rapazinho era o Teatro Orgânico Aldebarã, onde há algum tempo – um ano e meio, talvez –, eles haviam elaborado um espetáculo dirigido ao público infantojuvenil, Cidade dos Artesãos. O texto, baseado em uma lenda belga, era traduzido e adaptado pela Tatiana Belinky. Eles desenvolveram esse espetáculo durante muito tempo. Teatro Orgânico Aldebarã significava o seguinte: o Orgânico vinha das teorias de Gramsci, que dividia os intelectuais em orgânicos e não orgânicos. Os orgânicos transformavam pensamento em algo concreto, em trabalho. E os não orgânicos só ficavam na masturbação intelectual, pensando... Aldebarã era o nome da estrela mais brilhante da constelação de Touro, o signo do meu namorado – só depois nós descobrimos que Aldebarã era uma estrela maligna. O grupo Aldebarã – formado por 16, 18 pessoas – foi criado por Antonio Fernando da Costa Aguiar Negrini, Beatriz Cassis, Natália Miranda e a Denise Yuri Yamamoto. O Antonio, a Natália e a Denise eram das Ciências Sociais-USP, aquela linha que vai chegar até FHC. Um dia, em 1976, quando a convivência com Antonio já abria espaço às implicâncias, nos desentendemos e ficamos estremecidos. Para espairecer, fui assistir à Mahagony – A Cidade dos Prazeres, direção do Ademar Guerra, no Teatro Treze de Maio, e, no dia seguinte, viajei para o Rio de Janeiro, onde fiquei por alguns dias. Lá, eu vi uma matéria no Jornal do Brasil sobre a Cacilda Becker. Eu sabia que o pessoal do Aldebarã cultuava a Cacilda Becker. Toda vez que eles iam ensaiar, acendiam uma vela para Cacilda. Ela já era morta, claro. Eu nunca vi Cacilda no teatro, vi no teleteatro, fazendo Neil Simon. A Cacilda tem importância para mim, mas não tanto quanto Dulcina ou Nydia Licia ou Myrian Muniz ou Fernanda Montenegro. Recortei a matéria do jornal e, quando voltei para São Paulo, fiquei sabendo que o pessoal do Aldebarã estava estreando uma peça no Teatro da Fábrica – hoje Sesc Pompeia –, A Cidade dos Artesãos. Fui ver e levei o recorte sobre Cacilda. Antonio e eu reatamos ,e comecei a frequentar as sessões do espetáculo sem parar. Fiquei encantado, ia em todas as apresentações! Um dia, um dos integrantes do grupo resolveu sair do espetáculo e voltar para sua cidade natal, que era, realmente, Natal, no Rio Grande do Norte. Ele fazia um guarda, uma figuração com fala. Tudo aconteceu muito rápido, o pessoal do grupo já tinha espetáculos vendidos e começou aquela discussão: E agora? Quem faz? Quem faz? Quem faz? O Miguel! O Mi faz! Falei: Tudo bem, eu faço! O cara não tem que fazer nada mesmo, é só ficar andando de um lado pro outro como soldado... Tem só duas falas. Podem contar comigo!. Começamos a ensaiar e as dificuldades apareceram. Fala mais alto!, alguém mandava. Eu dizia: O máximo que eu consigo é isso. – Mas tem que falar alto! – Eu não consigo! Deixa que no dia eu faço. Na estreia eu achava que já estava um pouquinho melhor e, ingenuamente, convidei todo mundo! Foram minha mãe, minha irmã e quase todos os meus amigos. A cantora Marília Medalha, que naquela época era minha amiga, e a Myrian Muniz, também estavam na plateia. Quando vi aquelas pessoas, pensei: Vou fugir. Vou embora, estou louco. Entrei em cena e me deu uma coisa, fiquei entusiasmadíssimo! Fiz tudo que eu não fazia nos ensaios, reagia ao que acontecia na cena, falei altíssimo, impostei, chamei a atenção. Um péssimo começo profissional. Péssimo porque eu reagia além da conta. Tanto que incomodou um dos integrantes que fazia um papel importante, porque, de repente, eu entrei e roubei o foco dele. O espetáculo foi muito premiado, era tudo artesanal, o grupo fazia tudo, os cenários, figurinos, maquiagem... Eles eram muito requintados. Passado um tempo, houve uma reunião com a Myrian Muniz. O grupo era fascinado por ela e Fauzi, bebiam o que eles falavam, eram seus discípulos, e chamaram Myrian para saber o que ela tinha achado da peça. Ela elogiou o elenco e falou da figuração: A figuração tem que ser mais ativa, mais participativa. Precisa ser mais integrada na história... . O ator que estava incomodado comigo perguntou: Você acha que o guarda deveria ser mais discreto?. E ela respondeu: Não!, pelo amor de Deus, o guarda está ótimo! Deixe ele como está!. Então eu fiquei feliz: Poxa, essa mulher está falando bem de mim??? Isso foi um aval. Foi por esse tempo que nós começamos a nos aproximar. A primeira vez que fui à casa da Myrian eu estava com o pessoal do grupo, queriam visitá-la, ela estava doente, gripada. Fiquei passado: Nossa, a gente vai na casa da Myrian?!. Entramos, ela estava no quarto – a luz era baixa, bem teatral –, deitada no meio da cama, com uma camisola, coberta com um cobertor, colcha, lençol, tudo combinando e limpinho. Ficamos um tempo conversando e, quando íamos embora, ela me disse: Olhe, estou muuuito feliz que você veio me visitar. Vou te dar um presente... , levantou, foi na estante, pegou um livro e me deu. O livro era Femmes de Paris, tinha fotos de mulheres em Paris; lindo! Era um livro de capa dura, mas a lateral tinha caído: Você não repara, né? Gosto muito de você e queria te dar essa lembrancinha. Peguei o livro, agradeci e saí. Quando cheguei no carro, mostrei para os garotos, e o menino que me levou disse: Fui eu quem deu esse livro pra ela!. Primeiro achei estranho, mas, depois de mais tempo convivendo com ela, vi que essa era uma praxe da Myrian. Fiquei no Aldebarã uns sete anos, e fui me transformando em um verdadeiro ser de teatro. Seguia a moda hippie, usava as mesmas roupas, que tinham aquele estilo dos Tropicalistas; em geral, camiseta, de preferência branca, umbigo aparecendo um pouco, calças de boca larga – uma delas era feita de remendos –, um tamanco de tira amarela, da Cash Box, e uma malha preta imensa que eu botava na cabeça para fazer de peruca ou punha na barriga, como uma grávida. Vivia com aquela malha na cintura. Era comum a gente se vestir assim. A boca de sino demorou um tempão para sair de moda. Eu também comprava as miçangas, fio de náilon, e fazia umas guias de santo. E tinha uma bolsa a tiracolo, que parecia um saco, feita de algodão cru bem clarinho, a alça era um pouco colombiana, tinha uma franja abóbora e o símbolo hippie, que eu vivia escondendo para não dar bandeira. Os baianos Gil, Gal, Caetano e Bethânia estavam no auge. E eu, que tinha fascinação por Bethânia e Clarice Lispector, passei a me questionar mais intensamente sobre esses assuntos do mundo invisível; entrei em contato com a umbanda e o candomblé. Cheguei a frequentar, com meus amigos, alguns terreiros de umbanda. As mães de santo nos mandavam fazer trabalhos: Meu filho, você precisa fazer comida pro teu santo.... A umbanda nasceu do sincretismo com a religião católica, que os negros escravos diziam cultuar para se proteger da perseguição dos seus senhores. Eles usavam imagens de Nossa Senhora da Conceição, Santa Bárbara, São Jorge, enquanto rezavam para Oxum, Iansã, Ogum. Gostei mais do candomblé, achei mais coerente, mais autêntico, porque tenta traduzir a mitologia africana representada pelos orixás, e a incorporação não é identificada pela oralidade, mas, sim, pela dança, pelos gestos e pelo batuque. Os atabaques reproduzem o ponto, o ritmo que identifica o santo. A batida usada nas músicas de santo sempre me atraiu. Eu era tão fascinado que fui fazer dança afro com o Júlio Vilan. Depois de ter feito o personagem do guarda, o pessoal do grupo me deu para fazer outros papéis, melhores. Em uma peça tive como parceiro de cena o Ricardo de Almeida e, com a convivência nos ensaios, fomos nos conhecendo melhor. O grande ponto que tínhamos em comum eram as leituras. Líamos muito, gostávamos dos mesmos autores, recitávamos trechos de Cecília Meireles, Fernando Pessoa, Clarisse Lispector... Com essa enorme identificação, nos aproximamos cada vez mais e viramos mais que grandes amigos, nos tornamos parceiros de teatro, com toda a força que essa expressão tem. Foi uma parceria que não experimentei com mais ninguém na vida. Era uma relação muito forte, não era desse mundo. Em 1976, fui convidado para trabalhar com um grupo chamado Pompa e Circunstância, liderado pelo Marcio Aurelio, que encenou a primeira peça do Alcides Nogueira, A Farsa da Noiva Bombardeada. O ponto de partida da peça é o final da cena do casamento que há em O Casamento do Pequeno Burguês, do Brecht, seguido pela noite de núpcias, a lua de mel, do casal. A noiva – que quem fazia era a Cida Moreira – está num hotel que é bombardeado, e ela vai parar no céu, no gabinete do Dr. Caligari, onde é recebida por uma ativista francesa e por uma enfermeira alemã, Güerda, que eu fazia, louca, nazista, que maltrata a noiva e lhe dá umas drogas. Num certo ponto, a noiva se revolta, vira uma valquíria, e todos vão para julgamento. Até o Brecht está em cena, sentado em uma privada, na plateia. Ele vai contestando a ação da peça. Depois, a noiva vai parar num bordel chinês; eu também fazia a dona do bordel, uma chinesa que não era chinesa, mas inglesa. Ela recebe a noiva como chinesa e, de repente, ela vira uma inglesa com um sotaque forte; dobrávamos papéis. O espetáculo era uma loucura, mas era muito bonito; foi um cult. A plateia era mais maluca que os personagens. Estreamos no Teatro Cenarte, na Rua Treze de Maio, um teatro humilde, perto da pizzaria Speranza, quase chegando na Avenida Brigadeiro. E o grupo me convidou para fazer mais um espetáculo, Tide Moreira e sua Banda de Najas, com Cida Moreira e o Carlos Couto. O texto era novamente do Alcides, e a direção de Marcio Aurelio, que já tinha uma veia, digamos assim, germânica, mas conseguia transcender isso fazendo emocionar também pela beleza. Marcio tem uma visão equilibradíssima do espetáculo, é limpo, conhece os recursos de luz e usa isso muito bem, fazendo iluminações lindas. Seu conhecimento musical bastante refinado, ele usa para permear o espetáculo de maneira muito pertinente. Eu quase segui a carreira com o Marcio, mas como o trabalho do grupo Aldebarã exigia muito, eu não pude mais me dedicar a outros projetos. Mesmo assim, Marcio Aurelio se tornou grande amigo meu e seguiu uma trajetória que fez dele um esteta absoluto do teatro. Nessa época, 1977, 1978, Alcides, Marcio e eu fomos a Paris, onde Elis estava apresentando o embrião de Transversal do Tempo, no Olympia, praticamente para os exilados – gente que estava ali querendo voltar para o Brasil. Era um show politicamente muito forte. A direção era do Adhemar Guerra. Elis usava um macacão, e no repertório tinha Rancho da Goiabada, Deus lhe Pague, Construção. Na plateia, cerca de 800 brasileiros cantavam junto com ela, emocionadíssimos. Foi uma coisa linda. Depois do show fomos falar com ela. Ela foi muito simples, falava com o pessoal da técnica: Isso não é aí, não. Bota naquele baú.. Depois, ela trouxe Transversal para São Paulo, no Teatro Jardel Filho, que ainda se chamava Teatro Brigadeiro. Claro que fui novamente com os meninos do Aldebarã, e íamos sempre ao camarim depois das apresentações. Uma vez eles estavam passando um livro de ouro e levaram para ela, que assinou e deu dinheiro. Elis era um encanto. Eram tempos em que eu dormia muito pouco. Ainda se fazia teatro de terça a domingo, eram oito espetáculos por semana. Então, durante um tempo, eu saía do meu trabalho na Secretaria, de um período de oito horas batidas, ia para o teatro e, muitas vezes, ensaiava outra coisa com o Aldebarã. O panorama significante do teatro daqueles meados dos anos 1970 era formado de trabalhos de grupo. O Asdrúbal Trouxe o Trombone tinha surgido no Rio, em 1974. Em São Paulo estavam o Pessoal do Victor, com Na Carrera do Divino, do Soffredini, com Paulo Betti, Eliane Giardini e Adilson Barros. O Antunes formou o grupo Pau-Brasil, que fez Macunaíma, em 1978, no Teatro São Pedro. Outro grupo que aparecia como a ponta de um iceberg era o Teatro do Ornitorrinco. Ricardo era muito amigo do Luís Roberto Galizia, idealizador do grupo. Ele era um ator muito bom, assustadoramente inteligente, vivo, perspicaz, culto e tinha uma cabeça incrível, pena ter morrido tão cedo. O Teatro do Ornitorrinco se apresentava nos porões do Teatro Oficina e, no começo, era composto pelo Luís Roberto, Cacá Rosset, Maria Alice Vergueiro, Cida Moreira e o Luís Antônio Martinez Corrêa. Faziam espetáculo udi, udi-grude, muito mais que underground. Em 1977 eles montaram dois espetáculos, Os Mais Fortes, que era muito contundente, e Ornitorrinco Canta Brecht e Weill, onde a Cida Moreira cantava. A gente entrava no Oficina e descia, descia, descia as escadas lá para baixo, uma placa assinalava: Ornitorrinco Canta Brecht e Weill. Não tinha nada a ver com o estilo que consolidou o Ornitorrinco depois, com o Cacá Rosset; o Galizia era totalmente avesso ao vedetismo que o Cacá propõe. Ele não tinha a ânsia de ser estrela que o Cacá tem. Havia um segmento do meio teatral que representava o Brecht, formado por pessoas provocadoras, instigantes, inteligentes. Cláudio Mamberti também fez muitas coisas nesse tempo. Nós íamos ao teatro pela propaganda de boca a boca, filipetas ou por algo que saía no jornal. As novidades se espalhavam rapidamente. Há trinta anos, nós, do teatro, éramos poucos, a vida era outra. Por incrível que pareça. Já o meu grupo, Aldebarã, estava montando o segundo espetáculo: Do Outro Lado do Espelho. O texto era uma adaptação minha, do Ricardo e da Celuta Machado, em cima de um romance do Lewis Caroll, Alice Através do Espelho. O espetáculo tomou um volume tão absurdo que tivemos que alugar o teatro full time para apresentações ao público infantojuvenil. Com essa peça eu ganhei meu primeiro troféu Mambembe como autor. Capítulo VI Do Outro Lado do Espelho Do Outro Lado do Espelho entrou em cartaz em 1978, num teatro que eu vou falar o nome, mas tenho que bater três vezes na tábua da mesa: Teatro Alfredo Mesquita (bate na mesa), que ficava na Rua Santa Madalena, em uma travessa da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, no final da Rua Pedroso, onde foi o Teatro do Bexiga e hoje é o Teatro Ágora. Pois foi no Alfredo Mesquita (batidas na mesa) que eu ganhei meu primeiro Mambembe. Os espetáculos do Aldebarã eram muito premiados, as críticas foram sempre ótimas, mas Do Outro Lado do Espelho era pesado, complexo. Além de a adaptação do Lewis Carroll não ser nada fácil – porque lida com um surrealismo mais que fantástico –, os meninos resolveram colocar pensamentos de Jung e Freud na peça. Fizeram um embasamento intelectual, crítico, calcado num livro chamado A Lógica do Sentido, de Gilles Deleuze, que é complicadíssimo. Deleuze foi um filósofo francês que usou conceitos linguísticos, semânticos, para analisar a lógica. No seu livro, A Lógica do Sentido, há um capítulo só sobre Lewis Carroll. Isso tudo complicava a cabeça da gente; tínhamos vinte e poucos anos, ainda éramos efervescentes; então, nos intervalos dos ensaios fazíamos umas brincadeiras para desanuviar o clima. Num período tal, Ricardo e eu ganhamos do pai dele, o novelista, autor, poeta, Manoel Carlos, As Mil e Umas Vidas de Leopoldo Fróes, livro de autoria de Raimundo Magalhães Jr. Nós começamos a ler e nos encantamos por aquele teatro do fim do século 19, começo do século 20, com a figura do ponto, aquela pessoa que fica num local escondido do palco indicando baixinho o que os atores devem fazer ou falar. O ponto foi o embrião dos primeiros quadros do Itália Fausta. Nesses intervalos de relaxamento do grupo, começamos a apresentar uns quadrinhos, uns esquetes usando o tal ponto. O primeiro que mostramos chamava-se Helena Fechou a Porta. Helena era uma atriz desmemoriada que necessitava do ponto, que ficava relativamente atrás dela e ia soprando o texto. O grupo se esborrachava de rir, e começaram a pedir mais. Ah, faz a Helena! Faz! Faz!. Então, pensamos: Vamos inventar outra cena? E inventamos! Sem ensaiar, só improvisando. A gente combinava uma trama: O que vai ser? Vamos fazer então... Aracy Caiu na Poça! Agora, Camila Vai ao Baile!. Como é que é?. É a história de uma menina que quer ir ao baile e, de repente, fica menstruada... e blá-blá-blá-blá-blá e tal. Assim fomos criando coisas, eram cenas meio vaudeville, cheias de segundas intenções, meio Dercy Gonçalves. Mary I, a Rainha Boba, por exemplo, era a paródia de uma tragédia, e fazíamos um leve sotaque português. E essas histórias foram crescendo junto com o entusiasmo da plateia: Ah, faz Helena! Ah, não, faz Aracy! Agora Camila!. Nessa época, o grupo Aldebarã fez uma parceria com uma produtora chamada Difusão Cultural. O produtor era o Henrique Suster, que estava entusiasmado com o teatro e produzia espetáculos políticos como Um Grito Parado no Ar, com Othon Bastos, Marta Overbeck e Esther Góes. O grupo Aldebarã foi contratado por esse produtor e nós começamos a ganhar um dinheirinho – o grupo, porque eu nunca vi a cor do dinheirinho, nem de bilheteria. Nós éramos muito mal administrados, os gastos eram grandes, as produções tinham figurinos, cenário, tudo! O grupo era considerado, mas também fomos bastante criticados pela classe, que nos classificava como intelectuais: Ih, fazem Ciências Sociais, são todos universitários.... Nosso trabalho não batia muito com o das pessoas que faziam teatro infantil. Do Outro Lado do Espelho foi um fracasso de bilheteria. Quando apresentado à noite, então, só iam os malucos, umas pessoas que tomavam ácido, puxavam fumo... Tinha muita gente drogada na plateia, porque o espetáculo era delirante! O cenário era muito bonito, feito com módulos de espelhos de 2 metros e meio de altura, formando uma estrela de seis pontas! Quando nos apresentamos no Teatro Municipal pudemos perceber a grandiosidade daquilo. Lá de cima, no balcão, via-se formar a estrela de espelhos como um caleidoscópio! E os figurinos, todos, eram muuuuito bonitos, compostos por um jogo cromático em preto, branco e vermelho, e cores intermediárias, cinza, rosa, máscaras deslumbrantes feitas por nós e agregados. Tínhamos uma senhora costureira, dona Elina Faccio, que havia trabalhado para o TBC na época áurea. A gente falava: Dona Elina, como é que nós vamos fazer o Humpty Dumpty?. O personagem Humpty Dumpty é um gordo, e nós não tínhamos o Jô Soares no elenco. Não tínhamos ninguém gordo. Então, ela fez uma estrutura de espuma revestida pelo tecido do figurino e ficou lindo! Lindo, lindo, lindo. Toda essa produção atraía os malucos que já eram fascinados pelo Lewis Carroll e sabiam que aquele espetáculo tinha um tchan a mais. Em 1979, o grupo quase foi à bancarrota porque Do Outro Lado do Espelho acabou com as nossas finanças. Tivemos que nos desligar da Difusão Cultural Produções, que não quis mais bancar a peça. Pensamos: Vamos fazer um projeto econômico?. E os meninos resolveram remontar um texto, feito pelo Roberto Lage, chamado Sousalândia, adaptação do Julio Cortázar, feita por Augusto Francisco. O espetáculo foi criado para ser levado aos colégios, com uma produção simples e de bom gosto. O cenário feito com biombos era altamente prático. Durante a temporada de Do Outro Lado do Espelho, apresentamos alguns quadros de Itália Fausta, mas num formato ainda caseiro, para arrecadar fundos. Capítulo VII Quem Tem Medo de Itália Fausta? São Paulo – 1979 No mesmo ano, como parte do projeto econômico, levamos, corajosamente, Itália Fausta ao cartaz, já com acabamento de espetáculo. Passamos o chapéu, pedimos figurino aqui, figurino ali – o Marcio Aurelio nos ajudou muito, cedeu algumas coisas do espetáculo Pompa e Circunstância – e estreamos Quem Tem Medo de Itália Fausta?, no Teatro do Bexiga, de 130 lugares. Era uma temporada em caráter experimental, pensada para ficar um mês; ficamos sete meses, de quarta a domingo! Virou um cult, muita gente ia ver. A classe artística comparecia em peso e adorava! Fizemos uma apresentação para a classe numa sexta-feira, à meia-noite, que foi uma noite estelar. Na plateia estavam: Fernanda Montenegro e Fernando Torres, Antonio Fagundes, Marilena Ansaldi, Eva Wilma com Carlos Zara, Bruna Lombardi e Carlos Alberto Riccelli, Yolanda Cardoso, enfim, a classe teatral em peso. Depois do espetáculo, Fernanda veio falar com a gente: Ainda teremos muito que conversar. A estrutura de Itália Fausta agradou muito. Toda a peça era feita dos quadros que tínhamos in ventado e foi organizada da seguinte maneira – impressa no programa original do espetáculo: I – Exercícios para atriz e ponto: Mary I, a Rainha Boba – Tragédia patética Camila Vai ao Baile – Vaudeville Helena Fechou a Porta – Drama de costumes Dona Walderez, Professora de Inglês – Fantasia psicológica Milena Abriu seu Diário – Delírio romântico Anita Enfrenta o Fórum – Drama carcerário Aracy Caiu na Poça – Farsa metafísica II – Pausa literária Conferência: A Importância dos Monossílabos e Interjeições Átonas do Dialeto Javanês na Literatura Dramática da Ilha de Java, nos Últimos Quinze Dias do Século XII a. C. III – Montagens históricas a) Vissalaia Vassillis, a Mãe de Todos b) Convite à Dança (Ticket to Ball) c) Candidato n° 38 Ricardo e eu fomos indicados como atores e autores com Quem Tem Medo de Itália Fausta? Ao todo foram oito indicações para o prêmio Mambembe, mas não ganhamos nada. Também tivemos um ótimo retorno dos críticos. Ilka Maria Zanoto, que era do Estadão, escreveu nossa melhor crítica de todas as temporadas. Alberto Guzik, que estava na revista IstoÉ, também escreveu. Sábato Magaldi fez uma crítica em cima do muro, criticava, mas, ao mesmo tempo, mostrava certo deslumbre pelas coisas – eu tenho essas críticas guardadas. Ricardo e eu nos projetamos muito com Itália Fausta. Isso causou ressentimento dentro do grupo Aldebarã, as pessoas que ficavam atrás fazendo produção, contrarregragem, iluminação, sustentando a peça em cartaz, se ressentiram porque éramos eu e Ricardo a brilhar, a repercussão era toda em cima de nós dois. Nosso primeiro elogio público veio de uma coluna de Telmo Martino, que escrevia no Jornal da Tarde – o que provocou durante certo tempo um ciúme ao melhor estilo Bette Davis e Joan Crawford, por parte do restante do grupo. Então é assim: Miguel Magno é um ator que não se deve impressionar com o número de pontos em um tapete oriental. O todo de sua comédia também é feito de minúcias bem tecidas. Ele tem a coragem de lotar o teatro local relembrando, implacável e hilariante, seus ridículos. Se quiser continuar dentro deste material, nunca lhe faltará assunto, mas nunca atingirá uma plateia que fugiu do teatro por causa desses ridículos que ela denuncia. Isso gerou uma indisposição entre nós, o sucesso tinha subido à nossa cabeça, principalmente à minha – Ricardo era mais ponderado; eu fiquei totalmente deslumbrado, comecei a botar as asinhas de fora, contestava tudo –, e começaram as brigas, os bate-bocas. Assim, saímos do Aldebarã, e montamos nossa própria companhia, a Cia. de Repertório Fanta Maria & Pandora. No grupo Aldebarã, nós não tínhamos camareira. No Itália Fausta, o grupo mesmo fazia essa parte, cansamos de lavar e passar roupa. Mas quando formamos a nossa companhia, contratamos um amigo, o Neneco, que era um bonequeiro, maquiador, um multitalento que fazia as vezes de camareiro, de contrarregra e o que fosse. O Neneco era amigo do coração e foi o primeiro cara que me deu força para sair vestido de mulher na rua, em festas, boates. Havia uma boate gay em São Paulo, chamada Medieval, que tinha a tal da festa da Broadway, onde as bichas iam todas montadas. Havia poucas boates gays em São Paulo, e tudo escuso, tínhamos medo da polícia, mas na Medieval era mais seguro, acho que tinham um acordo com a polícia, sei lá. Era do lado do Center Três, na parte que dá para a Rua Augusta, num casarão imenso. Uma noite eu resolvi: Neneco, eu vou de mulher. Peguei uma camisola bonita da minha mãe, de tecido azul-marinho, com cintinho azul-claro. Coloquei uma bota que eu tinha, com um salto imenso, uma meia-calça, o Neneco me maquiou e eu fui! Me lembro de sair da boate de manhã. Desci a Augusta, vestido daquele jeito, para ir mudar de roupa no Neneco e voltar para casa normal. Hoje, esse menino, Jorge Espírito Santo, é a reencarnação do Neneco, apesar de o Neneco não ter morrido ainda, mas quase. Um dia, ele sofreu um acidente em frente à sua casa. Foi atropelado por um carro que o jogou longe, ele voou para o outro lado da rua e caiu em frente à igreja da Achiropita. Mas acabou tudo bem, ele teve que botar pino nas pernas e até hoje usa bengala; dos males o menor... Neneco é muito querido, inteligente e divertido, uma pessoa avant-garde, à frente do seu tempo. Por um acaso, foi em uma em uma boate gay, na Marquês de Itu, chamada Homo Sapiens, HS, que conheci Aracy Balabanian, mas desta vez estávamos lá a trabalho. Um travesti, Mayse, entrevistava atores durante seus shows e, naquela noite, Ricardo e eu seríamos entrevistados junto com a Aracy. Eu já tinha visto Aracy fazendo a peça O Caso Araceli, teatro-depoimento, drama policial em cima de um fato verídico; e em Boa Noite, Mãe, com a Nicette Bruno. O Ricardo sabia de Aracy por causa do irmão dele, o Manequinho, casado com Regina Helena, que era da divulgação da Globo e amiga de Aracy. Quando nos cruzamos no camarim, já bateu. Mesmo assim, eu nem imaginava que ela se tornaria minha amiga para sempre. Aproveitei a saída do Aldebarã e cometi mais um rompimento: saí da casa de meus pais para morar sozinho. Passei a ter o meu quarto, podia ouvir meus pontos de macumba, acender um defumador espiritual que tomava a casa inteira e comecei a fazer nichos de coisinhas que até hoje tenho em casa: presentes de amigos, algumas imagens, conchas, pedras, fotos... Até hoje minha escrivaninha parece um congado. O trabalho não me permitia mais ir tanto ao teatro, mas via o que era possível ver. Um dos espetáculos que assisti naquele ano foi Eva Perón, dirigido por Iakov Hillel, com a Esther Góes, Paulo Herculano e Myrian Muniz, que fazia a sogra da Eva. Era muito bom. Ficou em cartaz no Teatro da Biblioteca Municipal Mário de Andrade, um auditório muito legal, bonito, mas simples. A direção do Iakov era primorosa. Embora tivéssemos saído do grupo Aldebarã, ainda escrevemos para eles a peça Pirlim, adaptada de um conto do Guimarães Rosa, Pirlimpsiquice, por sugestão de Regina Casé. Eu havia conhecido Regina há pouco tempo, quando Ricardo e eu fomos convidados para levar Aracy Caiu na Poça e Helena Fechou a Porta num multievento com música, teatro e poesia, no Teatro Cacilda Becker, no Rio de Janeiro. A Regina estava na plateia; ela sempre foi bastante entusiasmada – hoje em dia menos, porque já é uma senhora –, era uma garota magra, espevitada, radiante. No final do espetáculo, ela foi ao camarim nos conhecer: Gostei da peça, adorei, quero ficar amiga de vocês!. E nós ficamos muito amigos, a ponto até de eu morar com ela e o Zerbini, no Rio; e ela comigo, em São Paulo. Isso foi mais um aval para mim; ela ainda não era o que é hoje, mas já tinha ganhado o prêmio Molière e era uma atriz considerada. Me lembro que o Molière vivia pelo chão da casa dela, ela usava como peso para segurar a porta, os papéis... Regina e eu tínhamos coisas em comum. Todo pessoal do Asdrúbal tinha visto Do Outro Lado do Espelho porque iam entrar em cartaz em São Paulo no mesmo teatro que a gente, o... (bate três vezes na madeira) Teatro Alfredo Mesquita, com Aquela Coisa Toda, que veio depois do Trate-Me Leão. Quando a Regina viu Do Outro Lado do Espelho, falou: Nossa, tem um conto do Guimarães Rosa que eu acho que vocês fariam muito bem. Então, nós nos empenhamos e fizemos. Eu só adaptei, não atuei. Pirlim tinha muito a ver com a estrutura do Trate-Me Leão; um despojamento de linguagem, de figurino, de estrutura cênica, embora o Aldebarã não tivesse conseguido segurar esse despojamento por muito tempo. Na virada da história de Pirlim, abria-se um painel enorme, onde estava pintado um céu azul deslumbrante que virava circo. O formato da peça era grandioso, tanto que a representação teve de ser feita no Tuca para caber tudo. A coisa mais linda foi a chegada da Regina na estreia. Quando ela soube, no Rio, que nós estávamos estreando em São Paulo – naquela época ela vivia com o dinheiro apertado –, veio! De repente, Regina estava lá no Tuca, assistindo à nossa estreia. Essas coisas são muito ricas, muito bonitas. Houve uma coincidência que não é desse mundo entre o meu trabalho e o da Regina. O grupo Aldebarã fez de Pirlim um espetáculo deslumbrante, que recebeu críticas maravilhosas. Já Ricardo e eu demos sequência ao filão Itália Fausta: produzimos e montamos Os Filhos de Dulcina, em 1980. Capítulo VIII Os Filhos de Dulcina Nunca tínhamos escrito o texto do Itália Fausta, só quando tivemos que entrar em cartaz é que datilografamos para entregar à SBAT e à censura. Agora, o Dulcina foi pensado, foram dias de trabalho até a estreia no Teatro Eugênio Kusnet. A direção foi feita pelo Antônio Fernando, do Aldebarã, e tivemos um desentendimento de ordem estética, sei lá; houve uma briga irreconciliável entre nós. Confusões de nossas vidas. Durante a temporada dos Filhos de Dulcina, o Abujamra – que conhecia o Ricardo da TV Cultura, porque o Ricardo tinha toda essa herança do pai – nos convidou para apresentar a peça no TBC, na sala que estava sendo inaugurada, o Assobradado. Fomos para lá fazer Dulcina e foi uma temporada horrível! Chovia muito em São Paulo, era inverno, terrível, em junho ou julho de 1981. Não fizemos nem 30 espetáculos. Capítulo IX O Hamlet Para mim foi uma surpresa quando Abujamra nos convidou para trabalhar com ele em O Hamlet. Até hoje ele fala: Lembra quando chamei vocês para fazer o Hamlet? Já estávamos ensaiando, vocês pararam o ensaio, pediram uns dias para pensar e voltaram perguntando: Por que você escolheu a gente?, e eu falei: Por causa do talento de vocês. Abujamra vinha nos tentando com o texto chamado, no original, L’ambleto, escrito pelo italiano Giovanni Testori, em dialeto lombardo, do norte da Itália, que tem sons sibilantes esgarçados, exagerados, cheio de shhhhh. Na versão do Abu, o espetáculo teve o nome de O Hamlet, paródia do original de Shakespeare. Essa tradução era do Mario Cacciaglia e Ana Maria Seabra. A peça era sobre uma companhia de teatro que estava tentando levar Hamlet a qualquer custo, mas estava desfalcada e não tinha tantos atores para apresentar o personagem principal. Assim, a mesma atriz que fazia a rainha Gertrudes também fazia a Ofélia, e vários personagens eram resumidos em um só, o Estrangeiro. A peça era pura escatologia, muito porca mesmo! O Hamlet trepava com a Gertrudes, comia a própria mãe. Na versão do Abujamra, tudo isso ficou muito forte. Minha mãe achou um horror, um escândalo! Foi a única peça da minha carreira que ela só viu uma vez, não voltou mais. Tinha muito palavrão, era uma exaltação dos sentidos, uma subversão da ordem. O elenco era fabuloso! O Emílio Di Biasi interpretava o rei Cláudio maravilhosamente bem. A Denise Stoklos fazia a corifeia – se é que pode chamar assim –, a chefe do coro, e abria a cena com um texto de um psiquiatra sul-africano, David Cooper. Era um espetáculo revolucionário! Foi feito na sala grande do TBC. Eu considero O Hamlet o trabalho mais forte que fiz; talvez o meu melhor trabalho – na minha cabeça, não sei se é mesmo assim. Algumas críticas foram maravilhosas, outras, indignadas. O texto foi trabalhado pelo Abu, que vai dilacerando o texto. Se ele não gosta, arranca dez, quinze páginas. Além disso, o espetáculo tinha um elenco principal só de homens. Eu fazia a Ofélia, Ricardo fazia o Hamlet; o Emílio, o rei Cláudio; Thales Pan Chacon era o Estrangeiro; o falecido Armando Azzari fazia o Polônio. Estavam conosco, ainda, o Armando Tiraboschi, o Paulo Yutaka, a Zenaide – que é uma bailarina negra maravilhosa –, a Ieta Hansein; Fernanda Abujamra e a Kátia, uma menina que o Abu trouxe da TV Bandeirantes. Vale a pena citar uma figura que levantou a produção e fez algo de primeira qualidade: Márcia de Windsor. Por ser muito amiga do Abujamra, Márcia sempre aparecia no TBC para ver nossos ensaios; também nos conhecia de Os Filhos de Dulcina e virou fã. Ela acompanhou todo o processo de ensaio e levantou a produção! Ela era a Juíza Nota 10 do programa do Flávio Cavalcanti, atriz, linda, elegantérrima, totalmente Chanel, Yves Saint Laurent. Márcia chegava em São Paulo num carro da TV Bandeirantes – atrás, vinha uma Kombi com a bagagem dela, não sei quantas malas, caixas de chapéus –, e se hospedava num hotel chique. Como ela era muito elegante, tudo combinava. Se estava de preto e branco, tuuudo era preto e branco: o sapato preto e branco, blusa preta e branca, luvas, bolsa... Era uma coisa! Nós nos apaixonamos por ela, e ela por nós. Às vésperas da estreia, quando saímos da sala de ensaio e fomos para o palco, ficou nítida a pobreza da produção. Eu ia para o ensaio com minhas roupas de dança, uma malha, um corpete e uns panos que eu enrolava no corpo. Ricardo usava uma roupa preta para lembrar o Hamlet, mas era tudo roupa de ensaio. Acho que ela viu aquilo e pensou: Como é que vai ser isso? Como é que vai se vestir essa gente? Então, chamaram um conceituado figurinista, mais habituado a trabalhar com televisão, o Domingos Fuschini, que usava muito o recurso de fazer emendas, ou seja, roupas não costuradas, ele ia amarrando, alfinetando, emendava os tecidos, e ficava uma coisa linda! Dona Márcia conseguiu todos os panos numa tecelagem. Vie-ram sedas, jutas trabalhadas, panos de tapeçarias, peles, pelicas... Baixou um material fantástico no TBC, para diversão do Domingos, que fez nosso figurino em cima disso. Depois de acertar os figurinos, a Márcia de repente invocou: Abujamra, não podemos estrear com esse chão! Está um horror, todo escalavrado, cheio de buracos! O Abujamra, com aquele jeito docemente irônico, mandava ela tomar no cu: Márcia, vai tomar no seu cu. Vai se foder. Imagine se nós temos dinheiro para revestir o palco?. Ela saía, dava um telefonema, ligava para a Paviflex: Boa tarde!... Aqui é Márcia de Windsor. Eu estou querendo conversar com o diretor comercial, encontrei com ele outro dia, é o senhor... . A telefonista tremia: Dona Márcia de Windsor?! A senhora quer falar com o senhor Ademir? – Isso mesmo, minha filha. Será que daria para eu falar com senhor Ademir?. A telefonista caía na conversa dela e punha a Márcia na linha com o homem: Boa tarde, seu Ademir. – Olá, dona Márcia de Windsor... Claro, dona Márcia, claro. E pá! Num passe de mágica, os pisos vinham. O palco do TBC foi todo revestido com Paviflex negro marmóreo que deu um up, levantou aquele chão. Com o novo chão, ficaram evidentes os veludos das pernas da coxia e das rotundas. Lá foi a Márcia: Mas, Abujamra, esse veludo está um horror, manchado, rasgado! – Ah, vai tomar no seu cu. Para com isso, ele falava. Vai dona Márcia para a lista telefônica: Veludos Velnac? Não sei se era Velnac mesmo. Sei que ela ligou lá nos veludos e deu o mesmo golpe: Boa tarde!... Aqui é Márcia de Windsor. Eu estou querendo conversar com diretor comercial, encontrei com ele outro dia, é o senhor... . Conseguiu todo o veludo! Revestiu toda a caixa do TBC com tecido novo. A coisa chegou a um ponto de loucura que o apoiador dos veludos não tinha a metragem de que nós precisávamos – a gente precisava de 300 metros, eles tinham em estoque 120 metros. O que eles fizeram? Recompraram dos clientes deles! É uma coisa inacreditável. E, no dia da estreia, ainda mandaram uma corbeille de flores para ela! Uma corbeille de tamanho natural, do tamanho dela! Eram outros tempos. Isso foi entre 1981 e 1982. Me lembro da Márcia me maquiando, antes de eu subir para o palco, ela me disse: Espera aí. Essa rainha não pode ser tão pálida, ela tem sangue! Tirou um batom da bolsa, um batom Yves Saint Laurent, chiquérrimo, e me faz umas bochechinhas. Márcia era mineira, tinha fazendas, mas vivia do salário dela, dos canais de TV em que trabalhava. Além de jurada, ela fez muitas novelas também. Ela morreu em agosto de 1982, no Hotel San Raphael; fumou a vida inteira. Era uma mulher muito bonita, tinha uma voz deslumbrante, aveludada e charmosérrima. Então, houve essa luz, essa estrela, essa deusa que colaborou imensamente. A estreia de O Hamlet foi um escândalo em todos os sentidos. Os personagens masculinos, por exemplo, num certo momento, embichavam. Era um ataque de veadagem: Ah, estou louca! Louca! O rei, o Hamlet, o Estrangeiro, o Laércio, o Polônio, todos viravam umas bichas loucas. Dançavam... Nesse momento eu vinha de rainha lá do fundo, passava pelo centro do palco, caminhava até a boca de cena e gritava: Basta! Isso aqui é um espetáculo ou coisa nenhuma? Porque, se for coisa nenhuma, vão todos tomar no olho do cu!. Na cara do público! Era chocante. O Thales entrava nu, com aquele corpo deslumbrante que ele tinha. Era outro escândalo. Tinha um pedaço da peça em que a rainha, perseguindo Hamlet, gritava: Lamileto! Amilete! Omelete! Hamlet!. Era muito forte, um escracho total. Praticamente não havia cenário, só o revestimento feito com os veludos da Márcia, um banquinho preto de madeira, umas bandeiras confeccionadas com os tecidos da tecelagem que nos apoiou, que o pessoal do coro usava em uma coreografia. No TBC, tivemos um público muito legal, estreamos em fevereiro de 1982, ficamos março e abril. Em abril mesmo, fomos para o Teatro Guairinha, em Curitiba, depois, voltamos a São Paulo. Naquele tempo havia o Mês Teatral, então, fizemos temporadas populares no Teatro João Caetano, no Martins Pena, na Penha. O Hamlet na Penha foi uma coisa absurda, porque o Teatro Martins Pena ficava no Largo do Rosário, e quem passava por lá e via o cartaz falava: Olha, tá passando o Hamlet aqui!. Entravam e viam aquela coisa escatológica, diferente do Hamlet esperado. Mas foi o melhor público que tivemos, riam de tudo, achavam uma beleza aquele monte de palavrão, de merda na cara do público. Nessa temporada popular, a Denise Stoklos assumiu o papel do rei Cláudio, o Emílio Di Biasi saiu do espetáculo depois de Curitiba. Era a subversão da subversão, eu fazendo a rainha e a Denise o rei. A Denise tinha textos fortes. O texto de apresentação do rei era assim: Boceta e poder. Boceta e poder. Entre boceta e poder, poder! Poder, poder... Com a Denise falando, ficava bem contundente, ela já tinha aquela figura de quando voltou transformada de Londres Quando conheci Denise – alguns anos antes, fazendo Um Ponto de Luz, texto de Fauzi Arap –, ela ainda tinha cabelos pretos, era uma atriz intensa, de voz forte. Depois de um tempo, ela foi para Londres – ela mesma conta –, entrou num lugar para cortar os cabelos e a mulher falou assim: Eu vou mudar seu visual. Fique quieta, feche os olhos que eu vou fazer umas coisinhas. Ela confiou na mulher, que cortou e descoloriu seus cabelos de um jeito parecido com o que é hoje – atualmente ainda está mais mesclado, mas na época era totalmente branco. Quando ela, Denise, levantou da cadeira e se viu no espelho, diz ela – pode ser até um excesso de poesia –, sabia que ia trilhar outro caminho. Ainda em Londres, ela fez um curso de mímica e apresentou Denise Stoklos: One Woman Show, espetáculo de sua autoria. Quando voltou pro Brasil, levou a mesma peça para a Sala Assobradado, do TBC, e depois fez O Hamlet com a gente. O novo layout da Denise causava um estranhamento bem apropriado ao nosso espetáculo. No final de 1981, ainda estávamos ensaiando O Hamlet e na assistência de direção estava a Patrícia Figueiredo, filha de Abelardo Figueiredo, grande homem da noite, diretor de shows. Patrícia estava totalmente envolvida com a gente, especialmente com o Thales porque ele era apaixonante, sedutor, então, todo mundo queria comer o Thales. E a Patrícia ofereceu a ele uma visita à casa de Elis Regina. No ano anterior, ela tinha feito Saudades do Brasil e acabava de fazer o show Trem Azul. E nós fomos visitá-la no mesmo apartamento onde ela viveu até morrer. Ela nos recebeu na porta, estava com uma calça legging preta e um blusão de mangas japonesas, todinho forrado de lantejoulas, com as cores do arco-íris. Deslumbrante. Mandou a gente entrar: Fiquem à vontade. O apartamento era simples, funcional, tinha umas fotos na estante... Às vezes ela entrava lá para dentro com os músicos, e nós aproveitávamos para ficar fuçando. Abrimos a geladeira, e nos assustamos porque não tinha quase nada, só um pirex grande com gelatina e umas coisinhas. Depois os músicos foram embora e nós ficamos lá conversando. Ela era muito engraçada, debochada, boca suja, falava uns palavrões bem colocados. Certa hora, a Patrícia entregou: Olha, o Thales é apaixonado por você. Ela levantou, foi na estante, abriu um potinho, de onde tirou uma gargantilha e deu para o Thales. Ele usou essa gargantilha durante muito tempo. Passados uns dois, três meses, ela morreu. Foi um choque enorme pra gente. Logo cedo, falavam no rádio, na TV, e o Thales me ligou, chorando, gritando muito, repetindo uma fala da peça: Estar preparado é tudo! Mas eu não estava preparado para isso!. Eu corri até a casa dele, fomos ao velório, eu coloquei uma rosa no caixão, e choramos muito, muito. Porque quando nós fomos embora, naquela noite, ela queria que a gente ficasse mais e nos acompanhou até o elevador, com aquela roupa radiante e disse: E agora, o que faço com todo esse brilho?. Eu, ingenuamente, achei que ela falava da blusa, mas não era. A última imagem que eu tenho da Elis é dela com aqueles braços abertos segurando a porta do elevador, dizendo o que disse. Capítulo X Quem Tem Medo de Itália Fausta? Rio de Janeiro – 1983 No começo de 1983, Fernanda Montenegro estava apresentando As Lágrimas Amargas de Petra Von Kant, de Fassbinder, no Teatro dos Quatro, em horário alternativo. Não sabiam se a peça seria sucesso – era muito forte ver Fernanda beijando na boca a Renata Sorrah –, mas virou um grande sucesso! Então, resolveram passar o espetáculo para o horário nobre, deixando vago o horário alternativo. A Mimina Roveda, que era dona do Teatro dos Quatro, junto com o Sérgio Britto e o Paulo Mamede, pensou: E agora, Fernanda, quem eu vou colocar aqui no teatro? Nós ficamos sem pauta!. A Fernanda falou: Olha, existe um espetáculo em São Paulo, feito por uns meninos maravilhosos, chamado Quem Tem Medo De Itália Fausta?, que eu acho que iria muito bem aqui. Vamos trazer os meninos!. A Mimina confiou nela e veio para São Paulo nos conhecer. Quando Mimina nos viu, se assustou: Mas a Fernanda falou que eram uns meninos e são uns cavalões? Uns homens imensos!. Fomos para o Rio, ficamos em cartaz de segunda a sábado, numa sessão às 5 horas da tarde, e fomos muito bem recebidos. A estreia no Rio foi outra noite estelar; na plateia estava quase toda a classe teatral: Nathália Timberg, Marieta Severo, Nicette Bruno, Paulo Goulart, Tony Ramos... Quem você imaginar, estava. Foi uma coisa assustadora. Todo mundo ia nos ver, afinal, a madrinha era Fernanda Montenegro! Ganhamos uma projeção nos jornais que virou referência para as pessoas. Tivemos críticas do Flávio Marinho, que escrevia em O Globo; do Macksen Luiz, do Jornal do Brasil; do Marcos Ribas de Farias, da Tribuna da Imprensa; da Tânia Brandão, do Última Hora... Todas as críticas foram deslumbrantes, maravilhosas! Além de Fernanda ter sido nossa madrinha na ida ao Rio, tornou-se nossa companheira, eu ficava muito com ela. Como Itália Fausta estava no horário alternativo e Lágrimas Amargas no nobre, nos víamos todos os dias. A sessão alternativa era às 5, a nobre às 9, então, eu ficava por lá, dava uma volta no Shopping da Gávea e assistia à peça dela. Perdi o número de vezes que assisti As Lágrimas Amargas de Petra Von Kant. Eu sabia trechos! Quando Fernanda dançava com a Renata Sorrah, por exemplo, acho que um pouco antes do beijo, no auge do espetáculo, ela dizia: São os discos da minha juventude. Me deixam muito alegre ou muito triste, depende... A montagem do Rio tinha sido feita para um espetáculo alternativo, o cenário e os figurinos foram meio improvisados. Me lembro bem de uma cena em que ela estava tentando seduzir a Karen (personagem de Renata Sorrah); Petra servia um jantar num carrinho de chá antiiiiigo, aqueles espelhados, que deve ter sido catado em algum antiquário! Tinha um lustre vagabundo, quase uma arandela francesa, feita de tecido, com franja. Num canto ficavam uns manequins, um recammier , uma espécie de divã, forrado com um veludo quase puído, e uma janela falsa. O texto do Fassbinder falava daquelas lésbicas alemãs, modernas... Quando eu via aquelas senhorinhas do Shopping da Gávea segurando suas sacolinhas plásticas, que fazem barulho na plateia, pensava: Meu Deus, o que será que elas vão achar? No Rio, Fernanda foi meu esteio, minha estrela guia; nas horas de maior aperto, de dúvidas, eu sempre recorria a ela. Itália Fausta ficou no Rio em uma temporada de 40 dias, porque nós tínhamos compromissos profissionais em São Paulo. Eu ainda estava na Secretaria, o Ricardo trabalhava na Saldiva e Associados, uma agência de publicidade. De qualquer maneira, fiquei muito tempo longe de São Paulo, o que contribuiu para minha demissão. Capítulo XI Band-age Em 1983, eu fui demitido da Secretaria de Economia e Planejamento do Estado. Um dia, a Masé Crescente, uma grande amiga, e minha professora de dança e ginástica, falou: Olha, está tendo teste para um musical, Band-Age, ali no Teatro Cultura Artística. A direção é do Possi, a Cida Moreira também está, vai fazer a direção musical junto com o Zé Rodrix. Estão fazendo testes... Vamos lá? – Ah, tenha dó, Masé! Eu não sei dançar, não sei cantar... O que eu vou fazer lá? – Eu também não sei. – Claro que você sabe! Você é professora. – Vamos fazer o seguinte: você me ajuda na parte de interpretação e eu te ajudo na coreografia. Topa?. Eu disse: Tá bom. Vamos!. Falei com o Caio Ferraz, que é meu amigo há mais de 40 anos, e ele me preparou para cantar. Ensaiamos My Way, do Paul Anka, que o Frank Sinatra gravou: And now the end is near. And so I face the final curtain. My friend, I’ll say it clear, I’ll state my case of which I’m certain. I’ve lived a life that’s full. I traveled each and every highway. And more, much more than this, I did it my way. Essa música é muito melodiosa, dava bem para enganar. Então, eu fiz o teste e, com a ajuda do Caio e da Masé, enganei na música e na coreografia, passei no teste e fui contratado. Band-Age era um musical grandioso, acabei ganhando o mesmo salário que eu ganhava na Secretaria, que era muito bom. A Masé também passou no teste e fez a peça. O Thales (Pan Chacon) também, a Tânia Bondezan... Estreamos em maio e ficamos em cartaz até o segundo semestre de 1983, de quarta a domingo. Não foi bem de público, embora fosse um espetáculo grandioso e a produção caríssima, feita pelo Odilon e a Valéria Wagner – eles eram espíritas, mas eu nunca falava sobre isso com eles. Com essas duas pessoas eu viria, mais tarde, a criar fortes laços, muito além do teatro. Capítulo XII Um Orgasmo Adulto Escapa do Zoológico Acabada a temporada de Band-Age, o Abujamra me chamou para trabalhar de novo com ele, num espetáculo em cima de textos do Dario Fo e da Franca Rame, que acabou levando o título de Um Orgasmo Adulto Escapa do Zoológico, com a Denise Stoklos estrelando; ela fazia quatro monólogos e eu fazia um. Eu a apresentava, vinha com uma plaquinha, usando uma roupa meio de clown, de circo, e anunciava: Uma mulher sozinha. Uma mulher sozinha. A Denise entrava e fazia seu monólogo. No final da cena, eu voltava e a apresentava novamente: Certo domingo. Certo domingo. Ela vinha e eu sumia. No intervalo, era Denise que me apresentava: Uma prostituta no manicômio. Uma prostituta no manicômio. Quando a luz subia, eu estava sentado em um banquinho, com uma roupa que tomava todo o espaço cênico, junto com outras coisas do cenário do Serroni, e fazia meu monólogo: a história de uma moça de vida fácil, uma prostituta que é contratada por cinco executivos que a levam para uma orgia. Durante a orgia ela é vítima de muitos maus-tratos, cagam e mijam em cima dela, fazem dupla penetração, pela boceta, pelo cu, chegam a enfiar dois paus no cu dela. É uma história escabrosa. Ela fica louca por causa dessa noite com os executivos, arma um plano de vingança, mata todos eles, e vai presa como louca em um manicômio onde ela narra essa história para uma terapeuta invisível. Depois, vinha mais um monólogo da Denise seguido por uma coda, que era o resumo do espetáculo, onde eu fazia os monólogos da Denise e a Denise fazia o meu. Nós dois ainda fazíamos mais alguns monólogos, mas não entraram na peça. Isso aconteceu no final de 1983. Em 1984, fui convidado pelo Augusto Francisco a fazer um texto infantil do Carlos Queiroz Telles, ali mesmo, no Assobradado, chamado A Revolta dos Perus. Eu fazia o papel de Deus. Fui indicado para vários prêmios também. Fiquei bastante tempo nas salas do TBC. Fiz Os Filhos de Dulcina, em 1981; O Hamlet, em 1982; em 1983, quando voltamos do Rio, fizemos uma pequena temporada do Itália Fausta no Teatro de Arte do TBC. Ainda em 1983, fizemos o Orgasmo Adulto, e, em 1984, A Revolta dos Perus. Depois de A Revolta, fui fazer O Purgatório, do Mário Prata, com direção do Roberto Lage. No elenco estavam Odilon Wagner, Tânia Bondezan, Ileana Kwasinski, Roney Facchini, Mauro de Almeida, Ana Lúcia Barroso, eu... O Purgatório reinaugurou a Sala Rubens Sverner, mais conhecida como Culturinha, do Teatro Cultura Artística. A Rubens Sverner tinha estado fechada durante anos, quando o Cultura Artística era ocupado pela TV Excelsior. Ficamos uns três ou quatro meses no Culturinha. Coincidentemente, na sala grande do Cultura Artística, Fernanda com Lágrimas Amargas. Retomamos o contato. Ela chegava e dizia: Meu querido! Meu amor! Vamos? Aí, eu botava meu figurino e corria lá pra cima pra ficar conversando com ela no camarim, ria muito. Fernanda é uma pessoa inspirada, muito engraçada, bem-humorada, vê as coisas sob um prisma articulado, espirituoso. Eu ficava aos pés dela, ouvindo, enlevado. Eu assisti às encenações de Fernanda desde criança, no teleteatro da Tupi, depois fui acompanhando sua carreira. A primeira vez que a vi de perto foi, aos 15 anos, no Teatro Bela Vista, em O Homem do Princípio ao Fim (1966), texto de Millôr Fernandes, direção de Fernando Torres. Quando ela fez o drama de Maria Farrar do Brecht, eu fiquei impressionado! Eu olhava aquela mulher se livrando de um feto no banheiro e pensava: O que é isso? Que atriz é essa?! Vi Marta Saré (1968), de Gianfrancesco Guarnieri, com direção do Fernando Torres. Seria Cômico... Se Não Fosse Sério (1972), de Friedrich Düerrenmatt e direção de Celso Nunes; esse, sim, era um espetáculo! Quase tudo que Fernanda fez, eu vi. Quem diria que um dia eu estaria sentado em seu camarim, ouvindo suas histórias... O Cultura Artística é um teatro muito respeitável, de plateia seleta, e a produção de Petra Von Kant deu um acabamento melhor nos figurinos e no cenário para a temporada em São Paulo. Botaram uma cortina de voal que tomava os 17 metros de boca de cena daquele teatro imenso, e o Celso Nunes (diretor) colocou a Juliana Carneiro da Cunha, com coreografia própria, abrindo essa cortina. Juliana, ainda mais naquela época, tem uma desenvoltura corporal e plástica lindíssima. Num certo ponto, ela tropeçava, Fernanda acordava e dizia: Marlene, mais delicadeza, por favor! Depois continuava: Me espreme umas laranjas. A Juliana fazia uma espécie de ama, uma empregada muda, durante toda a peça não abria a boca. Foi um privilégio ter visto As Lágrimas Amargas de Petra Von Kant. Falar da Fernanda é muito prazeroso. É uma pena nunca termos trabalhado juntos. Ainda! Se Deus quiser, um dia terei esse prazer. Enquanto eu fazia O Purgatório no Culturinha, Ricardo (de Almeida) foi me substituir em Orgasmo Adulto, mas não aguentou fazer a substituição, saiu, e eu voltei a fazer em 1984. Capítulo XIII O Homem e o Cavalo 1984... Nessa época Ricardo e eu estávamos em alta e fomos convidados pelo Zé Celso (Martinez) a participar da leitura dramática de O Homem e o Cavalo, do Oswald de Andrade. Fazíamos os cavalos: o cavalo branco e o cavalo preto. Foi um absurdo! Fizemos uma noite só e no Teatro Sérgio Cardoso estavam em cena a Maria Gladys, Elke Maravilha... Nossa entrada era por trás do teatro, e descíamos a escadaria cantando: Meu cavalo tá cansado, meu cavalo quer voar... Meu cavalo tá cansado, meu cavalo quer voar... Voar, voar... Quando eu fiz isso, fiquei todo arrepiado, da cabeça aos pés. Fiquei tomado. Tinha uma batida meio ritualística, o público imediatamente levantou e aplaudiu. Tinha até cavalo vivo em cena. Uma noite só. Era uma leitura dramática, fizemos com o texto na mão. Antes o Zé tinha feito uma leitura com o elenco, marcou e estreamos. Foi um delírio. É engraçado que me lembro da nossa preocupação: Ai, as nossas bolsas no camarim!. Zé Celso é maravilhoso. Acredito que ele seja o grande diretor da segunda metade do século passado até hoje. Não vejo quem possa superar o Zé em termos de capacidade de montar, do nada, um espetáculo deslumbrante. Ele tem a arte de fazer teatro nas mãos, no corpo, na cabeça. É uma medusa maravilhosa, um ser abrangente, que faz com que a gente se sinta realmente tocado. Você não sai indiferente de um espetáculo do Zé Celso. Você pode até sair puto da vida, mas jamais indiferente. Eu não vejo em nenhum outro diretor brasileiro a teatralidade que o Zé consegue expressar nos seus espetáculos, não há parâmetro de comparação. Capítulo XIV Torch Song Trilogy – A Louca Trilogia Em 1985, fiz a assistência de direção de um espetáculo que já tinha sido feito no Rio, e que o Abujamra remontou em São Paulo, em cima de um texto americano de um dos maiores autores gays, Harvey Forbes Fierstein, chamado Torch Song Trilogy – A Louca Trilogia. O Abu trouxe esse texto para São Paulo, readaptou e redirigiu com o nome de A Trilogia da Louca. Abujamra sempre me dizia que eu é que deveria ter feito essa peça, mas quem fez foi o Ricardo, cujo personagem era um travesti. A Nicette Bruno fazia a mãe dele, só que, durante a temporada, foi chamada para fazer Tenda dos Milagres, na Rede Globo, e pediu para sair. O Abujamra, então, falou: Meu Deus, e agora, quem vai fazer o papel?. Tentaram todas as atrizes disponíveis, Célia Biar, Rosita Thomaz Lopes, Márcia Real, ninguém podia; foi quando a própria Nicette falou: Será que o Miguel não pode fazer?. Abujamra, que não é nada são da cabeça, topou: Ótimo! Ele faz!. Eu argumentei: Mas como faz, Abujamra? É uma peça realista, como é que eu vou fazer a mãe de um travesti?. E o Abu: É o seguinte: ele é um ator que faz um papel feminino. Impossível!, eu disse. E ele: Confia em mim, Miguel! Assim, ensaiamos e fiz a mãe. Na primeira noite foi dada a deixa: Mamãe vai chegar. Mamãe está vindo! Entrei em cena vestido de mulher, mas fazendo uma personagem realista. A peça não era um drama, era, digamos, uma comédia atípica. Na primeira noite a plateia ficou meio estranha; não deu certo. Na segunda noite tivemos que mudar tudo. Eu falei para o Abujamra: Ninguém ri de nada!. E ele disse: Então vamos fazer o seguinte, ele diz que o pai vai chegar, e você entra travestido. – Mas, Abujamra, é de um preconceito violento! Pai e filho travestis? É o quê? Uma herança? Nós fizemos e, de fato, ele tinha razão, era uma gargalhada a minha entrada. Mas era a única, não tinha mais nenhuma. As pessoas perdiam o fio da meada! A peça perdia a credibilidade. Na terceira noite, resolveu-se que eu faria o pai vestido de homem, com terno, gravata e os cabelos pintados de branco, porque eu tinha quase a mesma idade do Rick. Passei pó de giz na cabeça e entrei. Resultou. Não comprometeu, mas foi um grande sofrimento. Uma noite, Esther Góes e José Possi Neto foram nos ver. Ao final, falaram comigo e com o Thales, e nos convidaram para fazer Santa Joana, do Bernard Shaw. Eu fui, fiz o papel do rei Carlos Magno. Estreamos no Auditório Elis Regina, ao lado do Anhembi. Era uma produção grande, com cenário do Serroni... Esther montava num cavalo, do lado de fora do teatro. Foi uma temporada difícil. Capítulo XV Itália Fausta pela Terceira Vez – 1986 Em 1986, o Ricardo teve a ideia de nós voltarmos com Quem Tem Medo De Itália Fausta? pela terceira vez. Voltamos ao cartaz em São Paulo, no Assobradado do TBC. Dessa vez havia certo requinte na montagem, tínhamos um cartaz com fotos da Vânia Toledo, e foi nossa temporada de maior sucesso; o que não se explica. Entrava muito dinheiro, diferentemente das outras temporadas, que tinham sido mais alternativas. Estreamos em julho e ficamos até dezembro, de quarta a domingo. Em janeiro de 1987, estreamos novamente no Rio, no Teatro Cândido Mendes, o templo do teatro besteirol. Se apresentavam lá também o Pedro Cardoso e o Felipe Pinheiro, o Miguel Falabella, o Guilherme Karan... Ficamos sete meses em cartaz com o Itália Fausta, fazendo oito sessões por semana. Tínhamos muito público! Viramos estrelas, com toda a fugacidade desse termo – estrelas. Éramos a onda do verão, como se dizia, o que nos afetava um tanto. Tivemos um ótimo público, tanto em São Paulo quanto no Rio. Fomos, de novo, indicados para prêmios; tudo de novo! Está tudo documentado. Os mesmos críticos foram nos ver novamente: Guzik, João Cândido Galvão... O Telmo Martino, do Estadão, escreveu: Quando Itália Fausta estreou em 1979, os críticos elogiaram, mas a época era de cobrança. Houve até crítico que reclamou achando que fazer rir não bastava. Nessa remontagem, Miguel pode fazer rir tranquilamente. Ele não tem medo de Itália Fausta. Ele não tem medo de ninguém. Mas sua inventividade cômica, capaz de revelar o conhecimento de todas as frivolidades e artifícios do teatro, o ridículo de qualquer atriz, Miguel Magno já inspira medo. Diz ele: Myrian Muniz já confessou que tem medo de mim. Myrian Muniz sabe o que diz. Em sua primeira encenação, Itália Fausta ficou em cartaz e foi indicada para sete Mambembes. Em sua reencenação, Itália Fausta merece novamente todos os prêmios, embora Miguel Magno não tenha lugar pra mais nada nos francesismos de seu apartamento paulistano, diz ele: Meu problema não é de limpeza, é de contrarregragem. Nós mesmos nos produzíamos, o Ricardo tinha a capacidade de levantar a produção por telefone! Talvez pela experiência dele com publicidade, não sei. Também ajudou o fato de termos guardado tudo. Na casa da minha mãe, na Bela Vista, havia uma garagem muito grande – aquela que tinha o quartinho em cima – e lá nós guardávamos as coisas em uns baús de madeira: panos, perucas, os figurinos... que não eram nada demais. A estrutura do Itália, segundo o nosso pensamento, era para caber numa Kombi; esse era o espírito das companhias de repertório, porque para montar era fácil. Nessa temporada de 1986, Carlos Eduardo Andrade, o cenógrafo, refez alguns panos, repintou e tal. Estreamos e foi maravilhoso. No mesmo ano, 1986, papai morreu. Foi uma surpresa, ele entrou na UTI na segunda e morreu na sexta. Foi pá-pum. Eu tive a felicidade de ter a companhia do Ricardo enquanto eram feitos os trâmites para o velório. Na funerária, o atendente perguntou: Como era seu pai? Gordo ou magro? Cabe neste caixão ou naquele? Para mim, a morte tratada como coisa era muito difícil de encarar. Então, Ricardo vestiu o corpo, comprou o caixão, escolheu flores e passou a noite no velório; em tudo ele ajudou, era muito expedito para as coisas práticas. Na hora de fechar o caixão, eu pensei: Papai nunca abandonou o espiritismo... Quem poderia falar as palavras finais sobre ele? Conversei com o Odilon Wagner, que já desenvolvia seu belo trabalho espírita com Valéria. Ele foi lá, fez uma oração, um discurso lindo, e nós fomos embora; mamãe estava muito triste e cansada. Quem enterrou papai foi o Ricardo. Capítulo XVI Excursão pelo Brasil – a Queda na Poça Em 1987, lá por agosto, inventamos, até por sugestão da Fernandona, uma excursão pelo Brasil com Itália Fausta, o que ferrou com a gente. Na viagem, nós pegamos o primeiro Plano Cruzado, aquelas tentativas de reduzir a inflação e congelar preços, e perdemos tudo que nós tínhamos ganhado no Rio de Janeiro. Fizemos Juiz de Fora, foi um fracasso total. Em Belo Horizonte fomos muito bem. Já em Goiânia não foi bem. Aconteceram várias pequenas tragédias durante a excursão. Estreamos em Goiânia na mesma semana do acidente com o césio, aquele produto radioativo que uns catadores de lixo, sem querer, espalharam pela cidade quando tentavam reciclar uma máquina de radioterapia que tinham achado num terreno. A contaminação foi de ordem nuclear. Uma tragédia mesmo. Os jornais alertavam: Pode acontecer tudo, menos chover. Se chover, o césio pode se espalhar pela terra e todos ficarão contaminados. Então, houve pânico geral, porque, se o solo fosse contaminado, a água também seria contaminada. As pessoas da nossa companhia nem tomavam banho! Só se tomava água engarrafada, sentíamos medo de tomar café! Pânico total. No dia da estreia, em que podia acontecer tudo menos chover, estávamos indo, num fim de tarde lindo, vendo os grandes descampados do horizonte de Goiânia, e vislumbramos ao longe umas nuvens negras crescendo de tamanho. Parecia desenho animado, quando as nuvens se enrolam, se entrelaçam... Caiu um temporal! Na frente do Teatro Municipal, onde íamos nos apresentar, tinha sido colocada uma faixa do espetáculo na avenida. A faixa voou tão longe que nunca mais a encontramos; parecia uma asa-delta. Apesar da tempestade, umas duzentas e poucas pessoas foram nos assistir, o que estava ótimo! Mas foi um terror. Terror dos terrores! Já em Brasília, fomos muito bem. Tivemos mais de setecentas pessoas por noite. Ainda por cima, pudemos conversar com Dulcina, na Fundação Nacional de Teatro; foi um brinde. Ela prometeu que ia nos ver, mas não foi. Acho que ela já tinha ficado sabendo que nós fazíamos Os Filhos de Dulcina, e algumas pessoas contaram para ela que nós acabávamos com a classe teatral na peça. Dona Lélia Abramo se encarregava de fazer essa propaganda negativa – ela tinha horror a nós. De Brasília, a estúpida pauta da turnê seguia para Porto Alegre. A Transbrasil desistiu de nos apoiar e ficamos sem patrocínio para viajar. O que fizemos? Bancamos as passagens. Lá sei foi parte do que ganhamos em Brasília. Todo o dinheiro estava indo embora. Chegamos a Porto Alegre, era novembro de 1987, semana da pátria, feriado local não sei do quê, enfim, era uma sequência de feriados. Não havia ninguém em Porto Alegre. Mais uma tragédia: fomos tomados como cópia de um espetáculo que estava em cartaz no mesmo período, Passagem para Java – a Ilana Kaplan fazia –, que era uma adaptação do Itália Fausta. Pior: nós mesmos tínhamos autorizado. Um amigo nosso, mais meu que do Ricky, tinha pedido para fazer uma adaptação da nossa peça. Quando as pessoas viram nosso release e as críticas, rotularam como cópia! Quase ninguém foi nos ver. Nós íamos fazer duas semanas no Teatro São Pedro, falamos com dona Eva, ela foi maravilhosa e nos liberou da segunda semana. E ainda tivemos que ir a Pelotas, que foi um inferno de Dante! Não fosse um espetáculo vendido que fizemos, não teríamos conseguido fazer caixa para bancar a saída do Sul e voltarmos para São Paulo de um modo civilizado, não no lombo de um burro, mas de avião. Em 1987, fiz a novela Helena, na Manchete. Aracy Balabanian também fazia. Foi lá que ela ficou muito amiga do Thales Pan Chacon. A amizade nasceu quando eles estavam gravando umas cenas externas em uma cidadezinha do Rio de Janeiro. Chovia muito, chovia, chovia... A Aracy estava chegando no carro da produção quando desceu e caiu numa poça! O Thales estava parado na frente do hotel vendo tudo e falou para ela – eles ainda nem se conheciam –: Aracy caiu na poça!. Ela começou a rir, rir, rir muito, e os dois ficaram amigos até o eterno. Foi mais um laço. Capítulo XVII Ricardo – Memórias, Sonhos e Reflexões Em 1988, eu fui convidado pelo Hamilton Vaz Pereira para fazer uma peça dele, Ataliba, a Gata Safira, substituindo o Pedro Cardoso. No elenco estavam Débora Bloch, Lena Brito, o próprio Hamilton... Era uma comédia musical, com músicos em cena; o Péricles Cavalcante ajudou a fazer as músicas e acho que chegou até a tocar com a gente. Eu fiquei em cartaz no Rio, substituindo o Pedro, por uns 15 dias, no Teatro da Cidade. Me lembro que na minha estreia lá estavam, novamente, Fernando (Torres) e minha estrela guia, Fernanda (Montenegro), que me levou um livro de presente do Jung, Memórias, Sonhos e Reflexões, com uma dedicatória muito significativa: Miguel, qualquer coisa, consulte o querido velhinho. Beijos... Sucessos eternos... Em março de 1988, estreamos A Gata Safira em São Paulo e ficamos em cartaz até agosto, lotando o Teatro Mambembe. Era um espetáculo de sucesso. No mesmo ano, o Ricardo adoeceu e, em agosto, morreu. Foi rapidíssimo, naquela época só havia o AZT. Ricardo e eu fomos parceiros de trabalho e amigos durante muito tempo, era natural que as pessoas achassem que éramos namorados, mas nós não éramos. Eu comecei a perceber que as pessoas procuravam sinais da doença em mim, olhando meu corpo, me avaliando. Novamente Odilon e Valéria se aproximaram de mim como dois anjos, querendo me apoiar, me proteger, e voltei a entrar em contato com o espiritismo, passei a frequentar o centro deles, que na época pertencia ao Grupo Socorrista Maria de Magdala, uma organização muito sólida e bem organizada. Lá eu fiz um tratamento, me dei muitíssimo bem, me acalmei, e comecei a fazer o básico, o pré-primário da Escola de Aprendizes do Evangelho. A partir de 1988, começou a existir na minha vida uma mudança de postura quanto aos valores da alma e do trabalho no teatro. A morte do Ricardo me separou da pessoa que me estimulava a fazer tudo o que fizemos juntos e até mesmo o que eu fazia por iniciativa própria. Além dos trabalhos do Aldebarã, fizemos Filhos de Dulcina, Pirlim, Orgasmo Adulto, O Hamlet, A Trilogia Louca, voltamos com Itália Fausta em São Paulo, fomos ao Rio – o que deu um upgrade na nossa carreira. Viajamos pelo Brasil, lotamos teatros, abrimos sessões extras, ganhamos muito dinheiro, perdemos tudo... De repente, Ricardo morre. Eu entendi que a partir dali teria de me virar sozinho. Capítulo XVIII Ópera Joyce – Que Neblina é Essa? Por ajuda do destino as coisas foram acontecendo. Imagino que quando as pessoas me viam, de certa forma, separado do meu par, me escolhiam para fazer certas coisas. Espontaneamente. Do Ataliba fui parar em Ópera Joyce, peça de Alcides Nogueira, dirigida pelo Marcio Aurelio, no ano de 1989, depois de 20 anos sem trabalhar com eles. Comigo estavam no elenco Vera Holtz e o João Carlos Couto, vulgo Janjão. Também era um musical e um cult. Música do Hélio Ziskind e do Paulo Tati, que hoje são pessoas reconhecidas no mundo da música contemporânea paulistana. A peça começava com um hino: ...Cantando, cantando, cantando partiremos. E essa estrada vai dar no mar... La-ra-la-ra-ri-la-ra-ra-ra... Soava quase como um hino religioso. A trilha era muito bonita. O espetáculo era grandiloquente, tinha um tom épico. O Marcio tem essa tendência, ele é muito brechtiano, é teatro alemão. Tanto que ele volta, de quando em quando, à Alemanha. Nós estreamos em São Paulo, no Teatro Off , do Celso Curi. O Off era um templo do teatro alternativo, pequeno, com uns 70 lugares... Lotava! Não tinha ar-condicionado, eu suava em bicas! Depois eu voltei para o Assobradado do TBC, tinha duzentos e poucos lugares. Fizemos uma temporada lá, ganhamos dinheiro, e fomos para o Rio. Aí aconteceu um fato pitoresco. Nós estreamos em um teatro que é uma igreja hoje em dia, no Rio, na Avenida Sernambetiba, 54.830, enfim, um número altíssimo da Avenida Sernambetiba, no fim do Rio, que se chamava Teatro da Barra. O Paulo Autran tinha inaugurado o teatro, e a segunda pauta éramos nós, Ópera Joyce, um espetáculo alternativo. Na encenação usava-se a tal da fumacinha, que eu ainda não sabia bem para quê. Hoje vejo que se usa para dar um efeito especial, para colaborar com a iluminação, conforme eu percebi pelos desenhos mais arrojados, em espetáculos que usam esse recurso. E a fumaça participava muito. O elenco era Vera Holtz, Miguel Magno, João Carlos Couto e a fumacinha. Quando o Marcio Aurelio ia, ele pegava aquela maquininha e enlouquecia! Enchia o teatro de fumaça até a gente não se ver mais em cena. A peça começava com nós três, tal qual estátuas no palco, parados embaixo do pin beam, que é uma luz pequenininha de foco fechado – a Cibele Forjaz que inventou essas coisas, junto com o Bonfante e o Marcio. Era um espetáculo em que tínhamos de estar sempre atentos, um milímetro, um espirro, e saíamos fora da luz. Então, na primeira semana depois da estreia, o Marcio Aurelio voltou ao Rio. Eu pensei: Ih, lá vem ele encher o teatro de fumaça... . Dito e feito. Ele encheu o teatro de fumaça, encheu, encheu, encheu! Não enxergávamos nada! Entra o público. Duas senhoras, carioquíssimas, sentam-se numa das primeiras filas. Umas delas fala: Mirtes, que neblina é esta? – Ah, não sei, Adalgisa, mas tem um cheirinho de bananada Biki. Nós, no palco, tremíamos de tanto rir. E esse virou nosso bordão da temporada, naquele carioquês todo articulado: Mirrrtishhh, que neblina é eshta? Do Teatro da Barra nós fomos para o Teatro Laura Alvim, em Ipanema, numa salinha de cento e poucos lugares que hoje virou cinema. Aquela temporada foi sofrida em termos de público, iam uns aficionados, era quase o mesmo público de Do Outro lado do Espelho, umas pessoas cabeça, de teatro experimental. O texto do Alcides era em cima das cartas trocadas entre James Joyce e Nora Barnacle Joyce, mulher dele. Eram cartas escatológicas, escandalosas, sexualmente falando. Eu falava muito boceta. Lembro da Márcia Real indo nos cumprimentar no camarim e dizer: Nossa, você fala boceta com tanto gosto! Era tão chocante falar aquelas coisas, que certos pontos da peça resultavam em comédia. O Alcides escreveu o Pólvora e Poesia, e aqueles espetáculos que eu fiz no começo da minha carreira: Tide Moreyra e sua Banda de Najas; A Farsa da Noiva Bombardeada. Tanto o Tide (apelido de Alcides Nogueira) quanto o Marcio tinham muito essa preocupação de intelectualizar os espetáculos. O texto era pretensamente – não há crítica no que estou falando – intelectualizado, porque lidava com informações de um público mais refinado, o próprio tema era refinado. Havia muitas citações de Fernando Pessoa, Nietzsche... O Tide é muito inteligente, fez Direito na São Francisco. Também levamos a peça a Belo Horizonte. Lá ficamos no Teatro Marília, um teatro da prefeitura, muito simpático, existe até hoje. Ópera Joyce nos deu muito prazer. E foi realmente um grande prazer conhecer a Vera Holtz. Capítulo XIX Televisão – Top Model Depois que acabou a temporada no Rio, fui chamado para fazer a primeira novela na Globo, Top Model, no mesmo ano de 1989. Quando me ligaram do Rio aqui em São Paulo, pensei: Devo ter esquecido alguma coisa no hotel... Fui fazer Top Model. No meio das gravações da novela apareceu um convite para levarmos Ópera Joyce na abertura do Festival de Inverno de Canela, onde fomos muito bem recebidos e encerramos a temporada com um público de quatrocentas pessoas. Era o típico público de festival. Eles urravam! Viam um espetáculo todo pinbeamzado e enfumaçado. A Vera tinha acabado de fazer a novela Que Rei Sou Eu – ela fazia a Fanny, secretária do Ravengar (Antonio Abujamra) – e eu estava no ar com a novela. Top Model me projetou muito, e tinha personagens malucos: John Lennon, Elvis Presley... Eu era o Marvin, Marvin Gaye, o estilista. Na realidade eu era o gerente de uma loja, mas o personagem foi crescendo e acabei entrando na trama principal. Isso aconteceu comigo, com a Zezé (Polessa), com a Drica Morais e Evandro Mesquita. Nós tínhamos personagens periféricos, que entraram na trama do casal central – Malu Mader e Taumaturgo Ferreira – porque éramos engraçados, carne nova. A novela tinha atores consagrados: Eva Todor, Maria Zilda, Cecil Thiré... Ih, tanta gente. O Nuno Leal Maia e a Malu estavam no auge da fama. Fiquei no Rio e me deslumbrei com aquilo tudo. A novela chegou a ter picos de quase 80 pontos de audiência! No dia seguinte ao primeiro capítulo, eu já estava famoso! Eu morava num hotel cinco estrelas, no Bairro Peixoto, num pedaço efervescente da Rua Figueredo de Magalhães, mas que era uma ilha naquele mar de balas perdidas, na subida da ladeira Tabajara, um bochichão! Um dia depois da estreia da novela, eu fui ao supermercado ao lado do hotel e as pessoas já vinham falar comigo: Oi!, te vi ontem! Foi um período de muito assédio. Eu não tinha carro, pegava táxi para ir ao alto do bairro Tijuca, onde era gravada a novela, na Herbert Richers. Às vezes eu pegava de carona com a Cissa (Guimarães) e voltávamos por dentro da floresta da Tijuca... Aquelas coisas lindas do Rio de Janeiro. E no caminho de volta as pessoas me assediavam: Ei, como é que é? A Malu Mader vai casar com alguém? E você, vai ficar como?. Eu passava o tempo todo respondendo perguntas. Então, eu pensava: Vou ter que ir na casa da Casé, lá na Gávea. Para isso tenho que pegar o ônibus na Nossa Senhora de Copacaba na... Normalmente eu levaria uns 20, 30 minutos. Contando os assédios, era melhor sair uma hora antes. Sempre fui educado, nunca tratei mal o público que me abordava com perguntas. Nas horas de folga, também gostava de me encontrar com Aracy (Balabanian). Com o passar do tempo nossos laços foram se estreitando e ela estava sempre por perto. Íamos muito jantar no Degrau, no Leblon, e, geralmente, acabávamos a noite cantando músicas do nosso repertório. Fazíamos serestas nas despedidas das noitadas. O deslumbre que sentia fazendo uma novela de sucesso como Top Model fez com que eu me perdesse do caminho que havia começado a traçar no centro do Odilon e da Valéria, depois da morte de Ricardo. Ensandeci, fiquei louco, abandonei tudo que podia: família, o Abujamra, meu apartamento, caí, chafurdei na onda da fama. Eu já tinha tido algum reconhecimento como artista, mas nunca havia atingido a popularidade que uma novela traz. Capítulo XX Governo Collor Top Model acabou. Estávamos no governo Collor. E eu, que tinha uma mania de sempre reivindicar, reivindicar, reivindicar, um dia percebi que eu tinha sido usado pelo merchandising da novela para fazer propaganda de uma marca internacional, uma cadeia de lojas tipo Zara, C&A... Foi quando eu acordei para aquele sistema: Nossa, televisão é um horror! É pior do que eu imaginava. É que meu personagem trabalhava numa loja chamada Covery, e eu falava Covery o tempo todo: Alô, Covery, boa tarde. Um belo dia, sem querer, alguém deu um fora e descobri que outros atores – Maria Zilda, Cecil Thiré e a própria Eva Todor – ganhavam cada vez que falavam Covery. Naquela época o departamento de merchandising não era rigoroso como é agora. Hoje a Globo é muito rígida com todas essas questões trabalhistas: FGTS, férias, décimo terceiro, reprises, mesmo sendo dois reais e sessenta e nove centavos, eles pagam. Com a cara e a coragem, eu, operária explorada, fui ao departamento de merchandising falar com o responsável. Ele me disse: Oh, imagine, essa marca é fantasia... Eu disse: Não é fantasia coisa nenhuma! É uma marca internacional. Foram 210 capítulos, eu apareci em quase todos, devo ter falado pelo menos umas 180 vezes Covery. – Tudo bem, tudo bem. Se você tiver como provar pra gente... porque nós não temos como provar.. Eu falei: Ok, eu tenho os capítulos em casa. Mentira, eu não tinha, mas eu sabia quem tinha. Fui, peguei todos os capítulos, uma pilha, uma batelada, levei para casa, decupei, e deu cento e poucas ações de merchandising. Ganhei uma bolada, que foi depositada no banco. Dava uns dez salários meus, sei lá, por volta de uns R$ 70 mil nos dias de hoje. Dois, três dias depois? Plano Zélia! Comeram todo o meu dinheiro! Durante a novela eu fiz bastante teatro. Terminei a temporada de Ópera Joyce e fiz um infantil, O Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda, texto e direção de Celso Lemos. Foi um sucesso de público, mas dava pouco dinheiro porque o ingresso era barato. Ficamos no Teatro Experimental Cacilda Becker, no Catete, um teatro muito bonitinho, elisabetano, ainda existe, é do governo. Também estreei uma peça no Cândido Mendes chamada Gertrudes, de um autor americano, Martin Epstein. Quem fez a produção foi a Scarlet Moon e o Lulu Santos; os dois estavam casados. O texto era americano até não poder mais, não fez sucesso nenhum. E eu só com aqueles cinquentinha na conta. Mesmo assim, não voltei para São Paulo, fiquei no Rio. Pedro Cardoso ia fazer Tambores na Noite, inaugurando a sala do Centro Cultural do Banco do Brasil, e me apresentou o diretor, Luiz Fernando Lobo. Disse ele quando me viu: Nossa, que maravilha! Eu já quis trabalhar com você e o Ricardo, no Olho Azul da Falecida!. Era um texto do Joe Orton. O Luiz é um diretor que prima pelo teatro brechtiano, épico. Durante um período dos ensaios, ele foi se transformando no Brecht. Primeiro usou colete, depois o chapéu e culminou com o charuto. Em Tambores, eu fazia o Murk, que foi o personagem mais dramático da minha carreira. Recebia praticamente o mesmo salário que ganhava na novela, o que me segurou e me fez sobreviver ao golpe baixo de Zélia e Collor. Isso aconteceu em 1990. Capítulo XXI Da Globo para a Manchete – Raios e Trovões Em 1990, fui contratado pela Manchete, que foi outro assalto do destino. Eu estava indo à SBAT para discutir os direitos de Itália Fausta – que ia para o Uruguai, não sei – quando encontrei o Luiz Maçãs, ator que já faleceu, e ele me enfiou na Manchete: Vai lá que tem um papel para você. Eu fui. Entrei na Manchete, peguei o elevador, desci no sexto andar, atravessei o corredor, dei de cara com o Jaime Monjardim, Marcos Caruso, Rita Buzzar e a Márcia Ítalo, a produtora de elenco. E lá fui eu: Olha, o Luiz Maçãs disse que tem papel para mim... . O Caruso, rapidamente, respondeu: Poxa, tem mesmo! Ele pode fazer o Billy. O Jaime disse: Mas o Billy tem 60 anos! O Miguel está com quanto? Quarenta?. E o Caruso: Não, eu mudo tudo. Se ele fizer eu mudo tudo.. Esse foi meu primeiro contato com Caruso, por isso eu falo que ele está sempre me dando emprego. Eu fiz a novela da Manchete, A História de Ana Raio e Zé Trovão, durante um ano, e fui reempossado na minha condição de estrela. Foi quando eu me desvirtuei de vez, me entreguei de vez àquela ilusão, chafurdei na embriaguês do sucesso e da grapa. Tomei muita grapa, o que afetou demais minha cabeça! Para simplificar a história: enveredei por caminhos nebulosos, de falsos prazeres. Eu até tentava ler uns livrinhos espíritas, mas a verdade é que eu não estava mais nem aí para isso, a fama e o delírio tinham me dominado. Um dia, durante as gravações, recebi um telefonema dizendo que o Antonio Fernando (ex-namorado e membro do grupo Aldebarã) havia falecido. Levei um susto grande, nem sabia que ele estava doente. Fiquei muito abalado com a notícia, mas o choque, de certa maneira, me acordou do desvario em que eu me encontrava. Hoje, acredito que o que aconteceu comigo foi uma tentativa forçada de superar a morte do Ricardo. Na época, eu achava que estava vivendo o must do verão, a minha onda de sucesso, mas não era, era uma onda de ilusão. Miguel Magno havia sido arrebatado pelos malefícios do deslumbramento. Contudo, vivi isso tudo como tinha que ser. Ainda fazendo Ana Raio, fui procurado pelo Ítalo Granato, produtor da Globo, que a pedido de Manoel Carlos queria me convidar para fazer a novela Felicidade, que marcava o retorno de Manoel Carlos à Rede Globo. Ele tinha saído da Globo em 1983, 1984, e voltaria, em 1991, com Felicidade. Maneco escreveu um personagem para mim, que já começava bem, tinha cenário, família, e eu contracenava direto com a protagonista, Maitê Proença. Porém, como de certa forma eu havia traído a Rede Globo indo para a Manchete, havia também aquele caso do merchandising, minha volta não era muito bem vista. Atendia-se, então, apenas ao pedido de Manoel Carlos. Antigamente as pessoas tinham medo de reivindicações e me diziam: Não faz isso que você vai ficar malvisto. Eu devo ter ficado mesmo, porque não consegui fechar o salário com o Granato. Me ofereceram menos do que eu ganhava na Manchete, que era um bom valor, e eu não consegui negociar um salário suficiente para bancar um apartamento no Rio, mais minha casa em São Paulo. Eu não podia me desfazer da minha casa aqui, e morar no Rio sem nada não dava. Falei: Tchau, tchau. No dia 1º de setembro de 1991, eu voltei para São Paulo. Capítulo XXII Volta a São Paulo – Porca Miséria Choviiiia a cântaros! Coincidentemente, à minha volta, A Bofetada estava em cartaz e no auge do sucesso. A Bofetada era uma Itália Fausta na versão baiana, feita pela Companhia Baiana de Patifaria. Oitenta por cento do texto deles era do Itália Fausta e mais 20% de Pedra, a Tragédia, de Mauro Rasi. Com os direitos autorais, eu recebia muito bem. Não tinha com que me preocupar em termos financeiros, conseguia pagar minhas contas e ainda levava uma vida tranquila. Em final de 1992 comecei a ensaiar Porca Miséria, texto de Jandira Martini e Marcos Caruso, com direção de Gianni Ratto. Eu já tinha grande admiração pelo Gianni, outro monstro do teatro, um grandioso homem do palco, sabia tudo, tudo. Gianni tinha domínio pleno para discutir sobre luz, cenário, figurino, música... Quando ele falava de teatro, exalava emoção, amor; o teatro foi a vida de Gianni Ratto. Estamos em 1993, ano em que prestei uma homenagem ao Ricardo de Almeida, e fiz a primeira leitura pública de um texto que ele deixou, Monstros Sagrados, no Teatro Crowne Plaza. Em Porca Miséria vivi um tempo de paixão – tan-to que demorei para conseguir entrar no meu papel – , no período dos ensaios, minha atenção ficava toda voltada para Renato Consorte, Gianni e Myrian. Eu olhava para eles apaixonado! Contracenar com Myrian Muniz – minha primeira madrinha, a primeira pessoa que avaliou bem o meu trabalho – foi prazer, um deleite, era um verdadeiro espetáculo todo dia. Ela era muito querida, muuuuito querida. Porca Miséria foi um grande sucesso, ficamos em cartaz, lotando o teatro, durante 1993, 1994 e 1995. Toda semana Myrian vinha com um presentinho, uma bobagem que fosse: Isso eu trouxe pra você, Miguel, o que me fazia lembrar do episódio em que ela me deu o primeiro presente, o livro Femmes de Paris. Além de uma atriz fantástica, Myrian foi uma pessoa deslumbrante! Ela gostava de ficar comigo e sempre me convidava para ir à sua casa: Olha, nego, você vem pra cá, almoça e depois fica aqui conversando... Nós nos reuníamos, ela fazia uma ambientação esotérica, defumava o ambiente, falava coisas absurdas e lindas, coisas do Altíssimo. Foram tardes memoráveis. Na casa dela tinha coisas do Flávio Império por todo canto, eles foram muito amigos. Flávio foi um artista único, lidava de maneira muito original com tecidos para fazer seus cenários, se expressava plasticamente, traduzia seus sentimentos e sensações nas telas, e a Myrian era um prato cheio para ele. Para ele e para muitos outros, como Fauzi Arap, também grande companheiro de Myrian. Ela gostava de contar uma história muito divertida sobre ele: Nego, você acredita que o Fauzi veio em casa outra noite e eu não tinha Coca-Cola, então, ele foi embora porque não tinha Coca-Cola?! Ríamos muito. Eu nunca vi Fauzi atuando, mas dizem que ele é um ator maravilhoso. De fato, ele é encantador, mas é um ser humano complexo. Uma vez, eu e Thales queríamos montar um texto dele chamado Palhaços. Nós telefonamos, marcamos e fomos lá. Ele trouxe os textos, explicou umas coisas e nós começamos a ler. De repente, ele se invocou e tirou o texto da minha mão: Não, não, você não vai ler mais. E começou a ler! Eu fiquei ali, quieto, porque não ia contrariá-lo. Acredito que na sua cabeça existia uma melodia, um jeito de interpretar aquilo. O fato é que nunca mais pudemos fazer um texto dele. Ele é extraordinário. A palavra que, talvez, possa defini-lo é mesmo extraordinário, fora do padrão. Fauzi sempre foi muito dedicado à astrologia, antigamente acho que era mais. A gente encontrava o Fauzi e dizia: Ai, que bom que eu te encontrei, virou o ano. Como será esse ano pra mim?. Ele, então, tirava do paletó uma tabela e perguntava: Em que ano mesmo você nasceu?, fazia uns cálculos e dizia mais ou menos como seria seu ano astral. Esse é o lado místico dele, que não se separa da sua obra e do diretor que ele é. Fauzi Arap é adorável, eu beijo as suas mãos. Ele é um bruxo que caiu na minha vida, que me fez querer fazer teatro, que me deu a certeza das coisas eu gosto: Clarice Lispector e todos os autores que vagam pelo inconsciente em busca de uma razão para nossa existência. Clarice me levou, e leva, a altos questionamentos. Na crônica dela Perdoando Deus, ela começa andando pela Nossa Senhora de Copacabana, toda alegrinha, quando, de repente, ela pisa em um rato morto. Esse mote desencadeia nela um questionamento à divindade. Ela estava caminhando tranquilamente, apreciando as coisas belas da vida, feliz, e Deus coloca uma ratazana no seu caminho? O que isso quer dizer?! Clarice também me instigou a questionar a vida, e além dela também. Clarice, Adélia Prado, Santa Teresa D’Ávila... Há um romance epistolar chamado Cartas Portuguesas – história de uma freira portuguesa, Mariana Alcoforado, que se sente atraída por um militar e escreve cartas para ele –, que também me inspira bastante. Tentei investigar o I Ching e não fui adiante. É tudo muito abstrato, sem base científica. A entrada na espiritualidade tem a ver com a fé. Se você tiver fé, você chafurda, bate no peito, caiu, etc. Agora, se a pessoa não tem fé, aquilo passa a ter um interesse mais folclórico, nada mais. Eu sinto que tenho uma fé grande, falo Vai com Deus, que Deus te proteja. Quando eu digo essas coisas – que arrepiam as pessoas mais céticas –, é com naturalidade, convivi com isso a vida inteira. Nem 90 anos de análise tirariam essas coisas de mim. Eu tenho fé mesmo. Quando vou fazer qualquer coisa, no teatro, por exemplo, há sempre um momento em que eu tenho que me separar do grupo, tenho que me ligar com o divino. Respeito muito essa maneira de encarar meu ofício, e me identifico com as pessoas que passeiam pelas margens do invisível, como Fauzi, Myrian... Isso tudo foi reativado em mim a partir do trabalho em Porca Miséria. Myrian acordou meus bons fantasmas e acendeu em mim a vontade de retomar minha espiritualidade. Com ela eu reativei o Sagrado. Capítulo XXIII 5 X Comédia Em 1995, eu ainda fazia Porca Miséria quando Débora Bloch me indicou para compor o elenco de 5 X Comédia, com o pessoal que era a minha turma: a Débora, Diogo Vilela, Fernanda Torres, Luiz Fernando Guimarães; a direção era do Hamilton (Vaz Pereira). Estreamos em Porto Alegre, no Teatro São Pedro, agendado para três apresentações que se esgotaram, e fomos abrindo sessões extras, fizemos seis espetáculos. O dobro do que esperávamos. O 5 X Comédia já nasceu com essa estrela abissal. Ficamos um ano em cartaz, lotando lugares enormes. Em São Paulo foram três apresentações no Palace, mais um fim de semana no Teatro Cultura Artística, o Culturão. No Rio, fizemos uma temporada de quase três meses no Canecão! Depois começamos a viajar de novo: Salvador, Belo Horizonte, Curitiba e as grandes capitais. Na primeira montagem de 5 X Comédia, eu fazia três esquetes tirados do Itália Fausta, três histórias sobre o ponto. Quem fazia os pontos eram o Hamilton e o Diogo, tentando suprir a vaga do Ricardo. O Itália era um espetáculo alternativo, feito para lugares pequenos, o maior número de público que tivemos foi em Brasília. Nosso ideal era não ultrapassar os 300 espectadores, porque exigia muito nos momentos de interatividade, principalmente a Conferência, que era o cume do espetáculo, o auge da interação e do delírio. A plateia começava participando como alunos e virava uma enorme bagunça, era uma catarse. A gente sentia que a plateia estava totalmente integrada ao espetáculo. Os três esquetes que escolhi para o 5 X Comédia não dependiam de interação, mas eram bastante minimalistas, o que me fez exagerar em tudo; isso, talvez, te nha sido um pecado. Apresentar em lugares tão grandes, tal qual casas de show, é um exercício profundo onde se aprende a dosar. Para renovar o figurino original feito por mim e Ricardo, entrou um figurinista que era um excelente profissional, porém, neste caso, ele extrapolou, fez um figurino enorme. A rainha era enorme, tinha uma peruca enorme, uma gola enorme, uma capa enorme, a maquiagem era toda aberta... Enorme! Eu abria o espetáculo com o esquete Helena Fechou a Porta; a peruca era tão exagerada que chegava a ter um pau de macarrão, só porque era uma dona de casa. Minha última entrada era com Aracy Caiu na Poça, em que, por uma luta minha, eu usava o figurino original. Era o quadro que mais resultava, mas já era meu último esquete e eu não tinha conquistado e/ou dobrado a plateia nos anteriores... Às vezes, depois de um tempo, vinham me dizer: Eu vi 5 X Comédia, adorei Aracy Caiu na Poça!. Isso me gratificava bastante, porque eu achava Aracy o quadro menos entendido, o menos aceito. Nesse espetáculo eu aprendi demais a dosar minha comunicação com o público que nos assistia. Em quantos megawatts eu mando essa piada? Como torno isso expressivo para mais de duas mil pessoas?. Era necessário usar outro timing, outro tempo de ação. O elenco de 5 X Comédia era formado por artistas muito mais famosos que eu. A Nanda (Fernanda Torres) já fazia cinema, televisão; a Débora era conhecida pelas peças, e, também, novelas e filmes; os meninos estavam na rabeira do TV Pirata. No Canecão era raro o dia que tínhamos menos de duas mil pessoas. Mas poderia ter todos esses atores e não ser sucesso. Foi um enorme sucesso! O 5 X nasceu com uma carga de demanda maior do que a tradição dos espetáculos teatrais da época, tanto que o espetáculo quase chegou a ser classificado como um show de humor, apesar de na estrutura da montagem haver uma intenção de unidade. Na primeira temporada, o tema que alinhavava a peça eram as Olimpíadas. O Luiz Fernando terminava a peça com um quadro, escrito pelo Hamilton, onde todos entravam vestidos de atletas. O cenário também era encaminhado para essa imagem, com umas colunas gregas que, aos poucos, revelavam uns aparelhos de ginástica. Mas se o espectador tentasse buscar uma linha entre os quadros, não acharia, porque não há. Os meus textos eram do Itália Fausta. A Fernanda fazia um texto do Hamilton também, mas que não tinha a ver com o tema. O Diogo fazia um comissário de bordo, num texto do Vicente Pereira, outro autor identificado pelo besteirol. A Débora era uma mulher ensandecida na busca do aprendizado do inglês. E o Luiz representava um atleta. Apenas o texto dele justificava o tijolinho, o cartaz e o cenário criados com base nas Olimpíadas que estavam rolando. Estreamos em setembro de 1995 e acabamos em setembro de 1996. Capítulo XXIV AIDS Em 1995, ainda fazendo 5 X Comédia, eu estava em Brasília quando comecei a sentir os primeiros sinais de contaminação pelo vírus da Aids. Fui vítima de uma diarreia violenta. Suava e me desfazia em fezes. Tudo que eu comia saía! Fiquei assustadíssimo e quis saber o que estava acontecendo comigo. Por conselho dos colegas e do médico, fiz todos os exames. Foi constatado que eu havia sido contaminado pelo vírus HIV e meu corpo havia entrado em contato com uma giárdia – protozoário que acaba com a flora intestinal –, que pegou a primeira porta aberta na minha imunodeficiência e fez o que fez comigo. A partir daí apareceu a dermatite seborreica e todos aqueles sinais leves da doença. Na avaliação do sistema imunológico é feita uma contagem de produção de células contendo moléculas CD4 e CD8. O que interessa são as CD4, que fazem com que tua imunidade suba; quanto mais alta essa taxa, mais alta a imunidade. Quanto mais baixa a CD4, mais baixa a imunidade e maior a vulnerabilidade às doenças oportunistas – porque Aids não é uma doença, é uma síndrome que abre portas para doenças. O HIV não te destrói, mas se alimenta das tuas células, se elas começam a diminuir, a imunidade fatalmente cai. Fraco, o paciente que tiver qualquer moléstia... pifa. Hoje em dia nem tanto, porque o coquetel combate o vírus e não permite isso, mas naquele tempo ainda era assim. A médica que leu o resultado do meu primeiro exame disse que minha taxa de CD4 era 13! O ideal é que seja acima de 200, o ideal. Maravilhoso é que seja acima de 400, 500... O meu era 13. Ela ligou no laboratório Fleury, falou com o médico responsável, confabularam sobre a taxa: Eu estou aqui diante do paciente, ele parece clinicamente muito bem... Vamos refazer o exame?. Eu refiz o exame e quando ela leu, falou: Você é uma bomba, está prestes a explodir, e eu não quero estar perto! Então, amor, vou te dar uma carta, você vai na casa da Aids.... Achei o fim da picada receber a notícia daquele jeito! Fiquei tão desnorteado – o consultório era na Teodoro Sampaio – que, quando saí, eu não sabia se a rua subia ou descia. Me senti pisando em areia movediça, os pés não firmavam no chão. Eu pensava: Meu Deus, não acredito!. Na Casa da Aids, que ficava na Rua Cardeal Arcoverde, me cadastrei, fui notificado para o Ministério da Saúde e até hoje recebo todos os remédios de graça – por isso, meu voto é do Serra, além dos céus. E comecei a não querer explodir. Logo iniciei o tratamento com o AZT – na época era o que havia –, mas estava deprimido, fiquei com um comportamento apagado. Eu atendia aos compromissos profissionais, mas um lado meu ficou nublado, escurecido, esquecido. Capítulo XXV Idas e Vindas Voltei para São Paulo em 1996. O Thales (Pan Chacon), que também havia sido infectado pelo HIV, tinha se separado da Carla (Camurati) e me convidou para morarmos juntos no seu apartamento – eles ainda não sabiam que eu também estava doente. No dia em que eu cheguei lá, quem me recebeu foi a própria Carla, ela me disse: Ah, que bom que você veio aqui ficar com o Thales, porque agora não tem mais como, ele vai ter que fazer um tratamento sério. Até então ele não tomava nada. E olhei para ela e mandei a manchete: Eu também vou ter que fazer um tratamento sério. Ela teve certo impacto, mas não demonstrou grande surpresa. Eu morei uns três, quatro meses com o Thales. Isso agravou a minha tristeza, o apartamento era pesado, e nossa relação entrou por um caminho triste. Duas pessoas que passaram a vida se amando sem nunca realizar esse amor sexualmente agora estavam juntas, doentes, fracas e com o humor em altos e baixos. Era uma convivência dura. Um dia, tivemos uma conversa: Olha, Thales, acho que vou procurar o centro espírita da Valéria e do Odilon (Wagner). Você não quer ir? E ele disse: É, Mi, tem que se tentar de tudo, mas você sabe que eu não tenho essa capacidade de entender a importância de uma religião. Acabei não indo procurar o centro. No mesmo ano fui chamado para fazer uma novela, Dona Anja, produção independente vendida para o SBT, adaptada do romance do Josué Guimarães e direção do Roberto Talma, com quem eu havia trabalhado em Top Model. Também fui convidado para dirigir um espetáculo chamado Desvairadas Anônimas, do G. Petean, no Crowne Plaza. Em 1997, comecei a gravar outra novela, Direito de Nascer – mais uma produção independente vendida para o SBT, mas que só foi veiculada em 2001 –, e veio o convite para voltar ao Porca Miséria, que continuava em cartaz. A TV me liberou – o pa-pel que eu fazia não tinha muita relação com a trama central e não gravava muito –, eu fui. O elenco de Porca Miséria tinha se modificado algumas vezes. Myrian Muniz, Regina Galdino e a Wilma Aguiar não estavam mais. Do elenco original havia Caruso, Jandira, José Scavazini e Carlos Mariano. Neusa Maria Faro e Simone Boer faziam parte do novo elenco. Eliana Rocha e Etty Fraser também chegaram a fazer. Eu fiz Porca Miséria durante uns cinco anos. Capítulo XXVI Amai, Orai e Vigiai Quase dois anos depois de ser notificado como soropositivo, voltei a procurar o centro espírita do Odilon e da Valéria, onde aquela nebulosa, aquela tristeza que havia se abatido sobre mim foi afastada. Eu fui, fiz a entrevista de orientação – para que eles saibam o que você busca – e me encaminharam para uns tratamentos especialíssimos. Tenho certeza de que, se não fossem esses tratamentos, eu não estaria aqui hoje. Vi que podia contar com os auxiliares de Jesus, os veneráveis mensageiros celestes para sobreviver trabalhando. Eu recebi, e recebo, muitas coisas do espiritismo, sinto uma felicidade incrível quando atravesso o portão daquela casa mágica em que o centro está, e trabalhamos para que ela seja cada vez mais poderosa. Quando eu comecei a frequentar as sessões, em uma noite animada, a média de assistidos chegava a cem. Hoje em dia cresceu muito, chega a mais de 300! Eu vi a casa crescer, ajudei como pude e acredito muito no trabalho que se faz ali, é um trabalho seriíssimo. Não tem divina luz, não tem incorporação – a não ser um tratamento mais específico que é o P3E, o qual, se permitido for, você recebe uma mensagem. Algum dos médiuns que estão vibrando de mãos dadas de repente sente um envolvimento e, conscientemente, recebe uma mensagem. Eu já recebi mensagens lindíssimas, muita coisa dirigida a mim, eu sentia a marca das pessoas: essa aqui é minha tia Bianca... Essa parece a dra. Holda. É sempre muito bonito, tenho um prazer imenso em ir ao centro. Sei que seguir o espiritismo é um passo adiante na minha busca de entendimento do que seja a espiritualidade, mas às vezes eu fujo, porque, na verdade, eu sou um espírito de porco, um espírita de porco. Penso: Ah, vou é curtir a vida... Nada a ver com drogas, são afastamentos decorrentes da falta de tempo e de certa loucura pessoal. Escrevi muitas coisas que vieram a mim de uma maneira inexplicável. Hoje em dia isso acontece menos porque o teatro acaba absorvendo essa sensibilidade. Quando escrevia, me sentia, não digo em transe, mas num grau muito alto de inspiração. As frases se encaixavam, as palavras se seguiam umas às outras, era como se eu ouvisse o que tinha que ser escrito. Há textos meus que são quase como a relação que Clarice (Lispector) teve com o Ovo e a Galinha; quando eu leio meus textos penso: Mas eu escrevi isso? Eu tenho esse estilo? Algumas coisas, reconheço, batem com a minha forma de expressão, outras, não entendo como surgem. Mas não delego isso a uma capacidade mediúnica, não. Tentei fazer escolas de médiuns, só que os horários não bateram. Consegui fazer apenas a escola de Aprendiz do Evangelho, onde eu me verguei muito sobre meus defeitos; tive que me ver. A escola leva a isso, é uma ponte para você se modificar. A intenção da escola é que se pratique uma reforma íntima, mas eu estou muito longe disso, acho que eu tenho muitas recaídas, caio em pecado o tempo todo. Mas não me penitencio, faço minhas orações e, mesmo com os erros, percebo que há um terceiro olho aberto em mim, principalmente quanto a mim mesmo, não com referência aos outros ou ao mundo. Isso acontece por influência da doutrina. Se uma coisa não deu certo, você insiste, e pensa: Por que isso aconteceu comigo? E, fazendo uma análise retroativa, você vê que aquilo foi impulsionado pelo orgulho, pela predisposição à inveja, por sentimentos negativos que temos, distantes das palavras de Jesus: Amai, orai e vigiai. Esse amai é irrestrito. Uma vez, ainda no centro que mamãe frequentava, conversava com a dra. Holda – que é uma luz na minha vida – sobre meus conflitos de opção sexual, e ela me disse: Meu filho, Deus disse: amai-vos uns aos outros. Não determinou o sexo! Então, fique à vontade. Portanto, praticar esse amor irrestrito também cabe nos extremos. Ame, ame, ame. Acima de tudo: ame! Amar é aceitar o outro sem restrição. Saber tolerar o outro, compreender. Orai é se ligar ao divino de alguma forma. Não precisa saber o Pai-Nosso, Ave-Maria, Salve Rainha, nada disso, é só você ligar um botãozinho. Agora, o vigiai é muito importante. Vigiai é observar sua conduta: Estou no caminho da luz? Estou praticando o bem? Estou aceitando meu próximo como a mim mesmo?. É uma dificuldade absoluta. Você acha que está acertando e, de repente, top, top, top (gesto), se ferra. É importante não cair na ira, na intolerância, na inveja, na ansiedade, no egoísmo. O egoísmo é um horror! O orgulho, então! Esses sentimentos te fazem se imaginar num patamar que não existe, enquanto nós não somos nada! Se a gente atravessar a rua e não olhar direito, pum, morreu! Triglicerídeos chegam a 980, arritmia cardíaca dispara, hemorroidas brotam, furúnculos pipocam... Vários caminhos levam a um só: a morte. Não adianta, isso aqui é uma passagem. Apesar de, como diz a mamãe, nunca ninguém ter vindo de lá para contar como é. Justamente porque não sabemos como é o invisível, devemos levar a vida como aquele lema francês: Viver e deixar viver. Para isso acontecer, de fato, temos que nos vigiar constantemente. Paradoxalmente, em O Hamlet, a rainha Gertrudes – condenando o comportamento do filho, que namorava despudoradamente a filha do Estrangeiro – se dirigia ao Polônio e dizia: Que tempos difíceis estamos vivendo. Nem mesmo a sodomia é sinal de fraqueza e devassidão. Vigiai, Polônio, vigiai. E saía de cena. Capítulo XXVII 5 X Comédia: Todo Prazer Quer Eternidade Em 1999 começaram a produzir o segundo 5 X Comédia: Todo Prazer Quer Eternidade, novo espetáculo que tinha esse subtítulo. É uma frase do Nietzsche que o Hamilton curte muito. Se o tema do primeiro 5 X Comédia se baseou nas Olimpíadas, o segundo foi em cima dos astronautas, da busca de vida em outros planetas, a entrada no século 21, a mudança de relação do ser humano com o universo, mas não passava isso. O cenário era todo feito de crateras de um planeta de outra esfera, com um fundo cósmico. Eu fazia um texto do Felipe Pinheiro sobre um ex-viciado em nicotina, um ex-fumante, que vinha a público dar seu testemunho de superação do vício, mas que, na verdade, não tinha superado nada. Ele toda hora pedia um cigarro para a plateia: Parei de fumar. Hoje faz 325 dias e tantas horas que não ponho um cigarro na minha boca! Comecei a fumar muito cedo. Aos 2 anos de idade troquei a chupeta pelo cigarro. Fernanda Torres fazia um texto viajandão do Hamilton. Diogo e Débora bisavam os textos da primeira montagem, e o Luiz Fernando terminava com um texto muito engraçado, do Mauro Rasi, sobre um striper. Esse segundo espetáculo foi mais tachado como caça-níquel: Lá vêm eles ganhar dinheiro. Eu, particularmente, acho naturalíssimo, não vejo pecado nenhum em ganhar dinheiro. Estreamos no Rio, no Metropolitan, uma casa de 4 mil lugares. O elenco era o mesmo. Esse espetáculo ficou quase dois anos em cartaz, e começaram a acontecer várias substituições. Fernandinha estreou grávida, saiu e entrou Cláudia Raia, fazendo um texto do Miguel Falabella, mas, no final da temporada, ela também teve que sair e entrou a Totia Meirelles. Diogo saiu porque ia fazer Metralha, se não me engano, entrou Evandro Mesquita, depois o Pedro Cardoso. Débora Bloch saiu, acho que até antes do Diogo, e entrou a Patrícia Travassos. Eu e Luiz (Fernando Guimarães) fizemos a temporada inteira – eu abria e ele fechava o espetáculo –, nunca fomos substituídos, mas o miolo teve muitas variações. Nem chegava a ser uma substituição, porque quem entrava podia vir com outro texto. Era um ator à parte, um diretor à parte, um texto à parte. Ficamos de 1999 até o final de 2000, um ano e meio em cartaz. Acho que o 5 X Comédia teve o mérito de abrir a possibilidade de trazer grande número de espectadores para o teatro. Inclusive, quando Fernanda Montenegro ia nos visitar, por causa da Nanda, eu percebia que ela ficava com os olhinhos brilhando ao ver aquele monte de espectadores, porque em uma casa de show não é necessário ficar um ano em cartaz, em três meses já se tem um retorno de investimento mais do que suficiente. É Brasília! Capítulo XXVIII Síndromes e Amigos Houve um período de 2001 em que fiquei hospitalizado para fazer um tratamento e a Aracy (Balabanian) foi uma presença muito marcante naquela ocasião, ligava todos os dias para saber como eu estava. Quando houve aquele incêndio em seu apartamento, ficamos ainda mais próximos, e quando fiz Porca Miséria no Rio também convivemos bastante. Quando terminei o tratamento e fiquei bem, Aracy procurou a Denise Saraceni, que é sua grande amiga e ia dirigir a próxima novela das seis, da Globo: Denise, nós temos que botar o Miguel na novela para ele esquecer o que ele passou. E a Denise disse: Tudo bem, mas eu não tenho papel para ele. Como vou fazer? Só se você convencer a Ana Maria (Moretzsohn) a criar um papel para ele. Aracy foi até Ana Maria, que era a autora, pediu para ela escrever algo para mim, e ela escreveu. Minha relação com Aracy foi se tornando cada vez mais preciosa. Hoje somos amigos de alma e coração. Aracy é uma grande atriz, uma pessoa que entende do métier, sabe o que é interpretar. Além do seu talento nato, ela vem de uma das turmas mais bem formadas da EAD, foi aluna do dr. Alfredo Mesquita e, ainda na escola, fez papéis muito fortes, como Lady Macbeth. Aracy entrou no teatro já com a estrela de grande atriz, foi para o TBC, fez Os Ossos do Barão, Marat Sade, Hair... Era uma das atrizes preferidas de Adhemar Guerra. Ela nasceu em Campo Grande, Mato Grosso do Sul – onde fica o Teatro Aracy Balabanian – e ingressou muito cedo na televisão. Ela foi para a Tupi com dois ou três anos de teatro profissional e rapidamente galgou o status de primeira atriz. Ela dividia o estrelato com Juca de Oliveira, em Nino, o Italianinho, e com Sérgio Cardoso, em Antonio Maria. Foram novelas de muito sucesso, que a projetaram tal qual aquelas atrizes consideradas divas: Glória Menezes, Regina Duarte, Yoná Magalhães... Depois ela foi para o Rio fazer novela na Globo e por lá ficou. Em minha opinião, Aracy levou para a televisão uma preocupação que você só verifica em grandes atores. Vamos pegar um exemplo: Dona Armênia foi um estrondo! Percebe-se que houve um trabalho minucioso de composição, a gente não consegue achar pontos falhos no personagem: Olha, perdeu o sotaque ali... , não! É tão bem construído, alicerçado, tem tanta base na arte de interpretar, que vira um ícone, um grande arquétipo. Algumas pessoas têm essa felicidade de armazenar um material por meio do qual elas podem se entregar, se doar: Vou usar tudo que eu sei para construir um arquétipo, uma figura mítica. Vou fazer um mito!. Existe um material que, quando pode contar com o talento do ator, da atriz, transcende. Acho que a Aracy tem esse dom. A Renata Sorrah, em Senhora do Destino, revelou a mesma coisa. Fernanda Montenegro expressa isso também quando tem material interessante para trabalhar, caso de Belíssima, quando ela fez uma vilã, e acho que nem ela acreditava na possibilidade de elaboração da personagem com tanta riqueza de criação como acabou resultando. Em 2002 fiz outra novela das seis, Sabor da Paixão, também na Globo, com a mesma equipe, Ana Maria, Denise... E fiz um espetáculo, a convite do Diogo Vilela, chamado Elis – Estrela do Brasil; eu era o pai da Elis. Douglas Dwight e Fátima Valença escreveram o roteiro, e a direção era do Diogo. Eu ficava indo e vindo do Rio para São Paulo. Em 2003 começamos a levantar Síndromes, Loucos Como Nós, texto de Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa; direção de Miguel Falabella. No elenco: Zezé Polessa, Luciana Braga e eu. Estreamos no Rio de Janeiro e terminamos a temporada no Tom Brasil, em São Paulo, em 2004. Fizemos algumas viagens também, fomos a Brasília, Goiânia, Porto Alegre, Curitiba... A Lu ciana teve que sair e entrou a Patrícia Travassos. Síndromes não era um estouro de boiada, mas foi bem, dava para a gente se manter. Quando acabamos, eu voltei para São Paulo. No mesmo ano, o Abujamra me chamou para fazer O Que Leva Bofetadas, texto de um dramaturgo russo, Leonid Andreiev, no Teatro Popular do Sesi, na Avenida Paulista. O espetáculo foi um prazer, um presente que eu vinha pedindo a Deus; pedi muito: Deus, quero trabalhar de novo com o Abujamra... E quero trabalhar no Sesi! Parece brincadeira, mas, não, eu pedia mesmo. Quero fazer teatro, ter carteira assinada, pegar minha linha metrô – pego a linha azul –, fazer traslado na verde, e descer na estação que sai dentro do teatro! Não há coisa mais civilizada! Deus me ouviu e consegui. Abujamra me chamou. Capítulo XXIX Antonio Abujamra – um Presente de Deus Foi uma delícia fazer esta peça porque eu voltei a trabalhar com o Abujamra, que, para variar, me deu total carta-branca. Sempre me estimulando a fazer mais e mais, enchendo a minha bola. Tive a oportunidade de trabalhar com uma garotada efervescente, além de linda. O salário não era lá essas coisas. (Eu tenho sempre que falar do salário...? Louca por dinheiro!) A verdade é que fiz aquele trabalho com enorme prazer, do começo ao fim, um presentaço! Foi maravilhoso. O papel era ótimo e, modéstia à parte, acho que fiz bem, e devo isso ao Abujamra. Em O Que Leva Bofetadas, tive uma experiência muito rica, na qual ele demonstrou quanto me admira. Não sei se ele diz isso para todo mundo, mas falou na frente de todos que eu sou um dos maiores comediantes do país. Ele sempre me diz isso. Pode ser que diga isso para trezentas pessoas, mas fala para mim também, e vindo de uma pessoa como ele é doutoramento. No processo de ensaio todo mundo ouviu horrores, eu não. Ele nunca me disse nada ofensivo, destrutivo, contraditório ao processo, ele só me estimulou, me enlouqueceu: Migui, suba em cima da mesa, abra as pernas e caia de novo. Vê se você consegue, mas não vá se machucar. Me dá muita emoção falar nisso. Ele me apoiava. Ao mesmo tempo em que ele me deixava solto, era uma grande rede! Eu sabia que ele não iria me expor ao ridículo, pelo contrário, ele ia me exaltar. O Abu sempre comprou a minha forma de ser como ator, porque eu não sou um ator acadêmico, não tenho formação nenhuma. A formação que eu tenho, se é que ela existe, é na busca de uma expressão corporal. Eu nunca pensei: Vou ser ator. Quero ser ator. Nunca tive esse momento; as coisas aconteceram. O contato com o Abu foi a minha faculdade. O primário e o colegial fiz na garra, por ter um talento histriônico nato, a verve de imitar pessoas, ou de pegar o espírito das pessoas e tornar isso de certa forma engraçado, sei lá. O Abujamra pega isso ainda bruto – apesar do reconhecimento que tivemos com Itália Fausta e Filhos de Dulcina – e me oferece uma orientação mais refinada até então, o que seria a minha faculdade. Ele me ensinou a gostar de mim, a gostar da minha voz, em ser como eu sou, como artista e pessoa. O estímulo que ele sempre me deu foi o de botar para fora essa chama interior de criar e interpretar; ele nunca me recriminou. Talvez tenha debochado de alguma coisa, com seu humor cáustico e inteligente, sua grande cultura, mas sempre foi de um carinho total comigo. Quando ele tinha que dizer qual o caminho que eu deveria percorrer, ele vinha no meu ouvido e dizia: Marcel Proust disse... o tempo é uma pomba-rola, sei lá, qualquer coisa assim. Brincadeira. É que ele tem o hábito de fazer citações. Ele gostava de dizer no meu ouvido uma frase de um valor intelectual superior para que eu refletisse, e finalizava dizendo: Pense nisso. . Funcionava demais, era como consultar um oráculo e receber aquele enigma: Atrás de cada árvore tem um boi zebu. E você tenta ver o que está por trás daquilo e incorporar no seu trabalho. Ele sempre fez isso comigo. No meu nada modesto modo de ver, quando fiz a rainha Gertrudes, a Ofélia, a prostituta do Orgasmo Adulto e O Que Leva Bofetadas, eu fui guiado de uma maneira sutil e operística à riqueza da composição. Abujamra me estimula a procurar em qualquer fonte material para o meu trabalho, seja em Clarice Lispector, Maria Callas, Electra, Lady Macbeth... Ele me abre os horizontes para a composição, me leva a enlouquecer. Acho que essa é uma virtude do diretor, perceber que ali tem vontade de expansão, de doação artística, e jogar mais lenha na fogueira. Eu vejo o Abu sempre tentando jogar mais lenha na minha fogueira. Não sei se ele tem essa sensibilidade por também ser ator... Aliás, tenho uma foto muito bonita dele com Dulcina de Morais, Lilian Lemmertz e Luiz Carlos Maciel, em A Margem da Vida. Dulcina o dirigiu nessa peça, ele fazia o Tom, que é um papel maravilhoso. No começo de sua carreira, Abujamra trabalhou em Porto Alegre e conheceu sua mulher, Belinha, que é do Sul. Ele começou a dirigir depois; dirigiu a Cacilda em Raízes. Abujamra é um estandarte do teatro, está no patamar do Zé Celso, Antunes Filho, Amir Haddad, Flávio Rangel... São todos gigantes de uma mesma geração. Capítulo XXX Gigantes Flávio Rangel era a academia em pessoa, fez espetáculos irretocáveis, com produções primorosas, emocionantes. Ele era muito sensível, era um homem de teatro, capacitado, culto. Mas não inovava tanto quanto o Zé. Todos esses diretores rompiam com a tradição que veio do TBC, que, de certa forma, também foi um rompimento, porque propôs uma qualidade de espetáculos que até então não se tinha. O que havia era um teatro popular mesmo, quase um teatro de revista, das companhias dos grandes atores, Procópio, Jaime Costa, Dulcina... E o TBC veio com uma estética europeia. O Flávio trabalhou no TBC, fez O Pagador de Promessas, A Morte de um Caixeiro-Viajante. Eu não vi nada disso, mas sei. Agora, eu vi Abelardo e Heloísa, no Teatro Paiol, era um graaaande espetáculo. Antunes Filho, apesar de um grande diretor, não me parece tão generoso como os outros que já citei. Vi coisas dele ainda na fase pré-CPT (Centro de Pesquisas Teatrais). Peer Gynt (1971), de Ibsen, eu vi no Teatro São Pedro, o mesmo que está lá hoje, mas ainda não reformado. No Teatro Itália assisti Bodas de Sangue (1973), de García Lorca, que seguia uma estrutura mais acadêmica, mas já meio à moda Pina Bausch, tinha muita cadeira. Pouco cenário e muita cadeira. Os atores: Maria Della Costa, Ney Latorraca, Jonas Mello e Márcia Real, que fazia muito bem a mãe. Aliás, ela é um dos meus ídolos, adoro a Márcia. Bonitinha, mas Ordinária (1974), com a Cia. Miriam Mehler, no Teatro Paiol, era muito bom, já se formava o embrião dos Nelsons (Rodrigues) que viriam depois. Esperando Godot (1977), com a Lélia Abramo, Eva Wilma e Lilian Lemmertz, foi no Teatro Faap. Quem tem Medo de Virgínia Wolf (1978), de Edward Albee, já no Sesc Anchieta, tinha características bem realistas, até porque não havia muito como fugir da estrutura do texto, que pedia uma sala, e a sala existia. A virtude do diretor residia em tirar o máximo daqueles intérpretes, e o papel da Martha (personagem central) é fabuloso! Entrando no período CPT, veio Macunaíma (1984), que foi aquela coisa impressionante, um acontecimento. A peça tinha uma estética alemã, europeia, influência do que Antunes bebeu na Europa. Vi, ainda, Romeu e Julieta, Macbeth, todos os Nelson Rodrigues. Geralmente os trabalhos do Antunes são muito marcados, coreografados, na base do chicote. E dá para sentir esse chicote nas apresentações, dá para ver que os atores estão presos a um capataz. Já o Amir Haddad é um deslumbre! Um louco. Ele não faz concessões; hoje em dia menos. No Rio, ele fez o teatro de rua. Nesse ponto ele se iguala, num certo sentido, ao Zé Celso, com quem fundou o Teatro Oficina. Ele tem um jeito quase litúrgico de reverenciar os seres míticos, a mitologia grega, o candomblé, a umbanda. Vamos chamar os deuses e respeitá-los: Evoé!. Tanto que há atores que veem no Amir Haddad um guru. Tudo que fazem, chamam o Amir para ver. Ele acaba dando uns toques, faz uma espécie de supervisão. Há pessoas que o seguem até hoje, são os filhos de Amir. Ele era bastante carinhoso comigo e Ricardo, ia sempre ver nossos trabalhos. Tenho uma lembrança muito presente do respeito que Amir Haddad tem pelas pessoas que são da rua, mendigos, os maltrapilhos que quase se confundem com a arquitetura urbana. Ele acredita que nós temos que reverenciar essas figuras, o povo da rua. Quando eles vêm te pedir uma coisa, você tem que dar. Às vezes eu lembro muito disso, eu dou. Vem uma preta velha: Ô, meu filho, me dá um... . Pum, eu já dou o dinheiro! Para ela limpar e abrir os meus caminhos. Foi o Amir que me falou isso um dia. Capítulo XXXI Dona Roma – Mais um Presentaço Depois do deleite de fazer O Que Leva Bofetadas, fui parar em Dona Roma, em A Lua me Disse, outra novela do Miguel Falabella. Foi o meu retorno às raias da popularidade. Voltei a ser consumido em alta escala. O papel foi difícil, mas me deu muitas alegrias também, mais um presentaço. Dona Roma era crossdresser. Pelo que entendo, crossdresser é uma pessoa que tem prazer em se vestir como o sexo oposto ao seu, por um tempo, e depois volta ao estilo original: se é homem, volta a ser homem, se é mulher, volta a ser mulher. Acontece que a personagem da novela superou essa figura e se tornou uma figura quase mítica: um saci-pererê, ou a mula sem cabeça. Apesar da personagem da Aracy Balabanian falar Encontrei aquele travesti enorme lá na vila!, o público não a via como um travesti, todos viam Dona Roma quase como um anjo, ou seja, sem sexo. Acho que acreditaram e aceitaram a personagem, que acabou sendo vista como uma mulher mesmo. A mãe de um amigo meu falava para ele quando me via: Ai, eu não consigo lembrar o nome dessa atriz... . Isso se parece bastante com o que fazemos no teatro. Uma das maravilhas do teatro é fazer com que as pessoas acreditem no que elas não acreditam. No teatro, é necessário acreditar no jogo que se propõe. Há muito tempo, em uma novela chamada O Bofe, o Ziembinski fez a Celestina. No começo da Lua me Disse cheguei a ouvir: Depois do Ziembinski, tinha que ser você, Miguel! Após a novela, esse filão se espalhou e vieram outras com o mesmo tema. De Dona Roma parti para Operação Abafa, de Marcos Caruso e Jandira Martini. Desde 2004 eu estou envolvido com a dança, tentando fazer uma direção teatral de espetáculos de dança do Studio 3 Cia. de Dança, da qual faz parte minha amiga Vera Lafer. Direção teatral na dança é bem interessante, você tem que ajudar os bailarinos a pensar, a dar um enredo para que eles se expressem. É um embasamento de intenções. Capítulo XXXII Prêmio Oscarito No dia 20 de março deste ano, 2007, eu fui ao Rio de Janeiro receber o Prêmio Oscarito, dentro da 18ª Mostra Carioca de Humor, que homenageava o besteirol, no Centro Cultural Laura Alvim. Foi uma noite linda, muitas amigas minhas estavam lá: Zezé Polessa, Aracy, Débora Bloch, Ana Maria Magalhães, Luciana Braga, Jacqueline Laurence... Quem me entregou o prêmio foi nossa madrinha, minha em especial, Fernanda Montenegro, que disse coisas muito bonitas sobre o movimento do besteirol. Falou sobre a mudança que essa linguagem gerou na maneira de fazer comédia no teatro brasileiro, com descontração, inteligência, criatividade e, no fundo, propondo uma revisão do que sempre existiu, por exemplo, no teatro de revista. Foram apresentados quatro monólogos nossos: Aracy Caiu na Poça; Mary I, a Rainha Boba; Helena Fechou a Porta; Valderez, a Professora de Inglês; com o Eduardo Martins, Marcos de Oliveira e o Luís Carlos Tourinho. O Flávio Marinho também foi premiado pelo livro que escreveu sobre o besteirol: Quem Tem Medo de Besteirol. Foi uma noite linda. Só o fato de estar ao lado de Fernanda Montenegro se dirigindo a nós, em uma homenagem pública, foi uma enorme emoção. Fernanda é uma figura apaixonante. Em 1993, quando o Thales fez Gilda, texto de Noel Coward, dirigido pelo José Possi Neto, com a Fernanda encabeçando o elenco, que também tinha Eliana Rocha e Herson Capri, eu sempre ia visitá-los no teatro. A Fernanda produzia a peça, já com o suporte de um patrocínio, porque antes não havia esses patrocínios que há hoje. Se a pessoa quisesse montar uma peça, arriscava-se muito. O artista ia ao Banco Nacional, ao Banco Real, sei lá, o banco que havia, assinava os papagaios, que eram os papéis, os compromissos, como se dizia, e se endividava com o banco. Com o empréstimo, montava-se o espetáculo que, aos poucos, saldava as dívidas. Houve uma geração, onde se enquadram Fernanda, Paulo Autran, a própria Cacilda, Maria Della Costa, que viveu esses tempos e, por isso, tinha uma preocupação muito grande com o retorno da bilheteria. Ruth Escobar já foi por outro caminho, com seu jogo de cintura cavou dinheiro aqui e ali para montar seus espetáculos. Admiro demais a Ruth por tudo que ela realizou. Porém, essa geração ficou com certa fama de sovina, por controlar o dinheiro. Eles eram duros na queda em termos de negociação. A Fernanda é uma das artistas que ficou com esse estigma. Uma vez um amigo nosso a descreveu como uma portuguesa atrás de um balcão. É verdade, ela é uma negociante, e faz isso muito bem. Hoje em dia Fernanda não faz mais tantos projetos de teatro, acredito que seja pelas dificuldades de produzir. Mas eu vi coisas deslumbrantes dela, e muitas vezes. Suburbano Coração (1989) eu cansei de ver: A casa está bonita... A moça está demais... A última visita quanto tempo faz...? A coisa porque eu mais ansiava nessa recente entrega do Prêmio Oscarito era mesmo rever meus amigos e me encontrar com Fernanda. Como sempre, ela foi muito carinhosa, chegou bem antes, querendo saber onde ficaria e tal. Sentou-se com sua amiga Jacqueline Laurence e, vencendo os problemas pessoais (problemas de saúde de Fernando Torres), foi nos homenagear. Hamilton (Vaz Pereira) ligou, mas não conseguiu ir. Diogo estava doente. Luiz Fernando estava viajando, mas se manifestou com carinho e muito amor. Felipe Martins também esteve lá, Flávio Marinho, Thais Portinho... Ingrid Guimarães e Heloísa Perrissé foram mestres de cerimônia. Foi mesmo lindo. Inesquecível. Há muitas coisas e pessoas inesquecíveis na minha vida. O Prêmio Oscarito me fez relembrar de momentos dos quais, coincidentemente, venho falando aqui, nessa história que parece não ter fim. Apesar do muito que contei, ainda faltam tantas pessoas, tantos teatros, tantas músicas, tantas saudades... E para me despedir: Bandeira branca, amor... Não posso mais. Pela saudade que me invade... Eu peço paz. Cronologia Completa Formação Acadêmica 1974 • Bacharelado e Licenciatura em Português e Italiano pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo – USP. Teatro 2006 • Operação Abafa, de Jandira Martini e Marcos Caruso. Direção e figurinos: Elias Andreato. Com Marcos Caruso, Jandira Martini, Francarlos Reis, Tânia Bondezan, Noemi Marino e Diego Leiva. Cenografia: Ulisses Cohen. Iluminação: Mario Martini. Teatro Vivo. 2004 • O Que Leva Bofetadas, de Leonid Andreiev. Direção geral, tradução e adaptação livre: Antônio Abujamra. Assistente de tradução: Tatiana Belinky. Codireção: Hugo Rodas. Com Kito Junqueira, Paulo Herculano, Luiz Amorim, Miguel Hernandez, Natalia Correa, Duda Mamberti, André Correa, Eduardo Leão, Janaína Peresan, Ivan Abujamra, Paula Melo, Camila Vaz, Paola Crosara, Carine Quadros, Bruno Santos, Thiago Luciano, Adriano Moura, Leonardo Colen, Valdir da Silva. Atriz convidada: Clarisse Abujamra. Participações especiais: Adriano Stuart e Miguel Magno. Cenário: Renato Scripilliti. Figurinos, adereços e visagismo: Chico Spinosa. Iluminação: Wagner Freire. Música original e DVD: André Abujamra. Coreografia: Mariana Muniz. Direção de produção: João Roberto Simões.Teatro Popular do Sesi. 2003 • Síndromes, Loucos Como Nós, de Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa. Direção: Miguel Falabella. Com Zezé Polessa e Luciana Braga. Teatro do Leblon, Sala Fernanda Montenegro. Rio de Janeiro. 2002 • Elis – Estrela do Brasil, de Douglas Dwight e Fátima Valença. Direção: Diogo Vilela. Direção musical: Cristóvão Bastos. Com Inez Viana, Jandir Ferrari, Cláudio Lins, Ângela Rebello, Bebel Lobo e Maurício Xavier. Centro Cultural Banco do Brasil. Rio de Janeiro. 1999 • 5 X Comédia: Todo Prazer Quer Eternidade. O Vencedor, de Felipe Pinheiro, com Miguel Magno e Não se Fuma em Cingapura, de Vicente Pereira e Marcus Alvisi, com Diogo Vilela, ambos com direção de Marcus Alvisi; Oh, que Delícia de Língua, autoria e direção de Mauro Rasi, com Débora Bloch; Questões Culturais Autênticas, texto e direção de Hamilton Vaz Pereira, com Fernanda Torres; O Império do Velcro, texto e direção de Mauro Rasi, com Luiz Fernando Guimarães. Direção geral: Hamilton Vaz Pereira. 1995 • 5 X Comédia. Exercícios para ponto e atriz: Mary I, a Rainha Boba, Helena Fechou a Porta e Aracy Caiu na Poça!, de Quem Tem Medo de Itália Fausta?, de Miguel Magno e Ricardo de Almeida, com direção de Miguel Magno, que divide a cena com Luiz Fernando Guimarães, Diogo Vilela e Hamilton Vaz Pereira; Leblon, escrito e dirigido por Hamilton Vaz Pereira, com Fernanda Torres; Não se Fuma em Cingapura, de Vicente Pereira e Marcus Alvisi, dirigido por Marcus Alvisi, com Diogo Vilela; Oh, que Delícia de Língua, texto e direção de Mauro Rasi, com Débora Bloch; e Peloponeso, texto e direção de Hamilton Vaz Pereira, com Luiz Fernando Guimarães. Cenário: Gringo Cardia. Iluminação: Maneco Quinderé. Direção geral: Hamilton Vaz Pereira. Estreia nacional em Porto Alegre. Canecão no Rio de Janeiro. Teatro Cultura Artística e Palace em São Paulo. 1993 • Porca Miséria, de Jandira Martini e Marcos Caruso. Direção: Gianni Ratto. Myrian Muniz, Renato Consorte, Jandira Martini, Marcos Caruso, Wilma de Aguiar, Regina Galdino, Carlos Mariano e José Scavazini. Cenário e figurinos: Renato Scripilliti. Teatro Bibi Ferreira. 1992 • O Pesadelo do Ator, de Chistopher Durang. Tradução e direção: Márcia Abujamra. Com Carlos Moreno, Élida Marques, Ney Piacentini, Mariana Suzá. Cenário: Luís Frugoli. Iluminação: Guilherme Bonfante. Música: André Abujamra. Jornada Sesc de Teatro / Em Cena: Textos Curtos. Sesc Vila Nova. 1990 • Tambores na Noite, de Bertolt Brecht. Tradução de Fernando Peixoto. Direção: Luiz Fernando Lobo. Com Rodrigo Santiago, Clarisse Derzié, Hélio Ary, Rosita Thomas Lopes, Oswaldo Louzada, Camilo Bevilacqua, Arthur Costa Filho, Emília Rey, Cláudia Netto, Maria Dulce Saldanha, João Batista, Thomas Bakk, Roberto Guimarães e os músicos Marcello Milhomem e Queca Vieira. Cenário: Cláudio Moura. Figurinos: Doris Rollemberg. Iluminação: Aurélio de Simoni. Direção musical, letras e música: Cláudio Botelho. Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro. 1989 • Gertrudes, de Martin Epstein. Tradução: Flávio Marinho. Direção: Milton Dobbin. Com Scarlet Moon, Luiz Carlos Tourinho, Marcelo Saback e os músicos: Sacha Amback, Marcelo Costa, Marcos Amma e Lulu Santos. Trilha musical e temas: Lulu Santos. Concepção cenográfica: Pedro Augusto. Figurinos: Pedro Sayad. Iluminação: Samuel Betts. Teatro Cândido Mendes, Rio de Janeiro. • O Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda, texto e direção de Celso Lemos. Com Luciana Braga e Emília Rey. Iluminação: Hugo Secco. Indicação como Melhor Ator para o Prêmio Coca-Cola de Teatro Infantil. Prêmio Fundacen, Melhor Espetáculo Infantil. Melhor Ator Prêmio MINC – Troféu Mambembe. Teatro Experimental Cacilda Becker no Rio de Janeiro. 1988 • Ataliba, a Gata Safira, de Hamilton Vaz Pereira e Fausto Fawcett. Direção: Hamilton Vaz Pereira. Com Débora Bloch, Lena Brito, Hamilton Vaz Pereira e os músicos Beto Rezende, Ronald Valle, Péricles Cavalcanti. Cenários: Cláudio Torres. Figurinos: Rita Murtinho. Luz: Maneco Quinderé. Teatro da Cidade, Rio de Janeiro e Teatro Mambembe, São Paulo. • Ópera Joyce, de Alcides Nogueira. Direção e cenário: Marcio Aurelio. Com Vera Holtz e João Carlos Couto. Light design: Marcio Aurelio e Cibele Forjaz. Supervisão vocal: Caio Ferraz. Trilha sonora: Hélio Zinkind e Paulo Tatit. Figurino: Leda Senise. Espaço Off, São Paulo e Teatro da Barra, Rio de Janeiro. 1987 • Guerras do Alecrim & Manjerona, de António José da Silva, o Judeu. Adaptação de Fátima Saadi. Direção: Bia Lessa. Música e direção musical: Luís Antônio Barcos. Cenário: Fernando M. da Costa. Figurino: Maria Carmen. Com Guilherme Karan, Luiz Fernando Guimarães, Regina Casé, Renato Borghi, Ricardo de Almeida, Stella Freitas, Suely Franco e Zezé Polessa. Paço Imperial – Praça XV, Rio de Janeiro. 1986 • Quem Tem Medo de Itália Fausta?, autoria, interpretação e direção em parceria com Ricardo de Almeida, com Bronie e Renata Melo. Cia de Repertório Fanta Maria & Pandora. Cenários e figurinos: Carlos Eduardo Andrade. Trilha sonora: Mana Kfouri. Iluminação: Aurélio de Simoni e Neném. Indicação para o Prêmio Mambembe de Melhor Ator SP. Assobradado TBC em São Paulo e 1987, com Fernanda Abujamra e Silvana Licco. Rio de Janeiro, Teatro Cândido Mendes. Turnê pelo Brasil. 1985 • O Homem e o Cavalo, de Oswald de Andrade. Leitura dramática. Direção: José Celso Martinez Corrêa. Com Elke Maravilha, Maria Gladys, Dionísio Azevedo, Célia Helena, Jô Soares, Sérgio Mamberti, Nelson Xavier, Cláudia Alencar, Carlos Augusto Strazzer, Raul Cortez, Cláudia Wonder, Ricardo de Almeida, Magali Biff, Escola de Samba Vai-Vai, Penha e Coro de Crianças da 13 de Maio, Marcelo Roverso, Antônio Araújo. Encerramento do Projeto Balanço Geral. Teatro Sérgio Cardoso. • Trilogia da Louca, de Harvey Fierstein. Tradução de Roberto de Cleto e Geraldo Queiroz. Direção: Antonio Abujamra. Cenários: Cláudio Moura. Figurinos: Madeleine Saad. Com Ricardo de Almeida, Zecarlos de Andrade, Thales Pan Chacon, Jorge Julião e Bronie. TBC – Teatro Brasileiro de Comédia. • Santa Joana, de Bernard Shaw. Tradução: Flávio Rangel. Direção: José Possi Neto. Cenografia: J.C. Serroni. Trilha sonora: Arrigo Barnabé. Figurinos: Jaqueline Terpins e Miko Hashimoto. Coreografia: Mazé Crescenti. Com Esther Góes, Odilon Wagner, Cláudio Mamberti, L. Pariz, Zecarlos Machado, Thales Pan Chacon, Marcos Oliveira, Carlos Moreno, Roney Facchini, Cacá Ribeiro, Celso Giunti, Claúdio Faria, Guilherme Cavallari, Paulo Borges e Roberto Ippolito. Auditório Elis Regina. 1984 • Purgatório (Uma Comédia Divina), de Mário Prata. Direção: Roberto Lage. Cenário e figurinos: José de Anchieta. Com Odilon Wagner, Ileana Kwasinski, Marina Helou, Tânia Bondezan, Roney Facchini, Ana Lúcia Barroso e Mauro de Almeida. Teatro Cultura Artística, Sala Rubens Sverner. • A Revolta dos Perus, infantil de Carlos Queiroz Telles. Direção, cenário e figurino de Augusto Francisco. Música: Oswaldo Sperandio. Coreografia: Cristina Brandini. Com Françoise Furton, Nelson Escobar, Tânia Bondezan, Antônio Herculano e Fernanda Abujamra. Assobradado TBC. 1983 • Band-Age!, de Zé Rodrix e Miguel Paiva. Direção: José Possi Neto. Com Thales Pan Chacon, Tânia Bondezan, Fernando Wellington, Roseli Silva, Mazé Crescenti, Carlo Briani, Sônia Cesar, Paulo Contier, Beatriz Barros. Direção musical: Zé Rodrix. Cenografia: Felipe Crescenti. Coreografia: Sônia Motta. Produção: Circus 7 Odilon Wagner e Valéria S. Wagner. Teatro Cultura Artística. • Quem Tem Medo de Itália Fausta?, autoria, interpretação e direção em parceria com Ricardo de Almeida, com Angélica Chaves e Patrícia Figueiredo. Cia de Repertório Fanta Maria & Pandora. Cenário: Carlos Eduardo Andrade. Trilha sonora: Mana Kfouri. Iluminação: Aurélio de Simoni e Neném. Teatro dos 4, Rio de Janeiro e Assobradado TBC, São Paulo. • Um Orgasmo Adulto Escapa do Zoológico, de Dario Fo e Franca Rame. Tradução de Zilda Daeier. Direção: Antonio Abujamra. Com Denise Stoklos. Cenário: J.C. Serroni. Luz: Francisco Medeiros. Assobradado TBC. 1982 • O Hamlet, de Giovanni Testori, baseado no original de Willian Shakespeare. Tradução: Mario Cacciaglia e Ana Maria Seabra. Direção: Antonio Abujamra. Com Emílio Di Biasi, Ricardo de Almeida, Armando Tiraboschi, Armando Azzari, Thales Pan Chacon, Denise Stoklos, Yeta Hansen, Zenaide, Kátia Suman, Fernanda Abujamra e Paulo Yutaka. Direção musical: maestro Júlio Medaglia. Figurino: Domingos Fuschini. Produção: Márcia de Windsor. TBC. 1980 • Os Filhos de Dulcina, coautoria com Ricardo de Almeida. Direção: Antonio Fernando da Costa Aguiar Negrini. Com os autores. Aldebarã Produções Artísticas / Fanta Maria & Pandora Diversões. Teatro Experimental Eugênio Kusnet. 1979 • Quem Tem Medo de Itália Fausta?, autoria, interpretação e direção em parceria com Ricardo de Almeida, com Denise Yamamoto e Guiomar Ramos. Teatro Orgânico Aldebarã /Cia de Repertório Fanta Maria & Pandora. Teatro do Bixiga. 1978 • Souzalândia, de Augusto Francisco, inspirado na obra de Julio Cortázar. Direção de Roberto Lage. • Do Outro Lado do Espelho, coautoria e tradução com Ricardo de Almeida e Celuta Machado do romance Alice Através do Espelho, de Lewis Caroll. Teatro Orgânico Aldebarã. Com Silvana Licco, Bia Cassis, Marici Bonafé, Plínio Moherdaui, Caio Ferraz, Gazu Mendes, Luiza Amaral, José Rubens Hirsch, Fernando Jorge, Guiomar Ramos, José Camilo Gimenez, Denise Yamamoto, Angélica Chaves, Ricardo de Almeida, Carlos Barbosa, Lúcia Bavarezko, Celuta Machado, Carlos Barbosa. Coordenação musical: Caio Ferraz e Luiza Amaral. Teatro Alfredo Mesquita. • Dona Walderez, Professora de Inglês, Helena Fechou a Porta e Aracy Caiu na Poça, autoria e interpretação em parceria com Ricardo de Almeida. Arte Aberta I e II. Teatro Ruth Escobar, Sala Gil Vicente. 1977 • A Farsa da Noiva Bombardeada, de Alcides Nogueira. Direção de Marcio Aurelio. Com Cida Moreira, Tide Moreira, Celuta Machado, Zilah Crisóstomo, Marcelo Almada, Guilherme Marback e Eliana Gagliardi. Coreografia: Reginaldo de Poly (dos Dzi Croquettes). Cenários: Zilah Crisóstomo. Figurinos: Zilah Crisóstomo e Rosento Martins. Grupo Pompa & Circunstância. Teatro Cenarte. • Tide Moreyra e sua Banda de Najas, de Alcides Nogueira. Direção de Marcio Aurelio, com Armando Tirabosqui, Maria Lúcia Pereira, Claúdia de Alencar, Berenice Raulino, Eliana Gagliardi, Marcelo Almada, Rosa Pamplona, Zilah Crisóstemo, Flávio Fonseca, Guilherme Marcack, Mena Di Stasio, Cida Moreira, Deco D’Antonio e João Carlos Couto. Grupo Pompa & Circunstância. Teatro Cenarte. 1976 • A Cidade dos Artesãos, de T. Gabbo. Tradução e adaptação de Tatiana Belinky. Teatro Orgânico Aldebarã. Figurinos, cenário, atuação e direção de Antonio Fernando da Costa Aguiar Negrini, Bia Cassis, Carlos Colonnese, Denise Lucchesi, Fernando Jorge, Guilherme Marback, Guiomar Pessoa Ramos, Jorge Eduardo de Aguiar, Luiza Amaral, Marcos Noronha, Marieta Magaldi, Natália Miranda, Paulo Breitenvieser, Plínio Moherdaui, Ricardo de Almeida, Silvana Licco, Yurie Yamamoto, Cilmara Bedaque e Elza Hat-tori. Teatro TAIB. Homenagem 2007 • Prêmio Oscarito, 18ª Mostra Carioca de Humor. Homenagem ao teatro besteirol. Centro Cultural Laura Alvim. Rio de Janeiro. Autor 1981 • Pirlim, coautoria com Ricardo de Almeida, adaptação inspirada no conto Pirlimpsiquice de Guimarães Rosa. 1980 • Os Filhos de Dulcina, coautoria com Ricardo de Almeida. 1979 • Quem Tem Medo de Itália Fausta?, coautoria com Ricardo de Almeida. O texto teve várias montagens: em Salvador, BA, com o nome de A Bofetada, em Belo Horizonte, MG, como Quem Tem Medo de Itália Fausta, Uai?; e em Montevidéu, Uruguai, com o título ¿Quien Le Teme a Itália Fausta?, com algumas apresentações na Argentina, no Chile e na Espanha. 1978 • Do Outro Lado do Espelho, coautoria e tradução com Ricardo de Almeida e Celuta Machado do romance Alice Através do Espelho, de Lewis Caroll. Prêmio MEC – Troféu Mambembe – Teatro Infantil, Categoria Especial SP, do SNT – Serviço Nacional de Teatro. Diretor 2004/09 • Studio 3 Cia de Dança, fundada por Vera Lafer. Coreografias: Dalida, Valsa, España, Rapshody in Blue, Sedução, Bolero e Para Todo o Sempre. Direção artística: Anselmo Zolla e Ivonice Satie. Direção geral de Evelyn Baruque e Liliane Benevento. 1998 • Quem Tem Medo de Itália Fausta?, de Miguel Magno e Ricardo de Almeida. Direção e participação: Miguel Magno. Com Luís Carlos Tourinho, Kika Freire e Eduardo Martini. Teatro Cândido Mendes, Rio de Janeiro. 1995 • Desvairadas Anônimas, de G. Petean. Com Marcos Oliveira, Pedro Paulo Bogossian, Robson Loddo e G. Petean. Cabaré Atlântico. Figurino: Pazzetto. Cenário: Sidnei Caria. Teatro Crowne Plaza. 1993 • Quem Tem Medo de Itália Fausta?, de Miguel Magno e Ricardo de Almeida. Com Pedro Cordeiro, Quim Cordeiro, Teca Pereira e Glória Reis. Teatro em Domicílio e Espaço Cultural Petit Comitê. 1992 • Quem Tem Medo de Itália Fausta?, de Miguel Magno e Ricardo de Almeida. Com Ílvio Amaral, Maurício Canguçu, Rosana Meneghini e Pedro Paulo Borba. Cangaral Produções Artísticas. Sala Ceschiatti, Belo Horizonte. Televisão 2008/2009 • Toma Lá, Dá Cá (Dra. Perci). Seriado-sitcom de Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa. Direção geral: Cininha de Paula. Direção de núcleo: Roberto Talma. Com Adriana Esteves, Miguel Falabella, Marisa Orth, Diogo Vilela, Fernanda Souza, Stella Miranda, Arlette Salles, Daniel Torres, Alessandra Maestrini, George Sauma e Norma Bengell. Rede Globo. Seu último trabalho foi com a personagem Dra. Perci no episódio Répondez S’il Vous Plaît. 2005 • A Lua me Disse (Dona Roma). Telenovela de Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa, com colaboração de Antônia Pellegrino. Direção de Roberto Talma, Rogério Gomes e André Felipe Binder. Com Adriana Esteves, Wagner Moura, Zezé Polessa, Marcos Pasquim, Aracy Balabanian, Débora Bloch, Arlete Salles, Monique Alfradique, Maurício Mattar, Patrícia Travassos, Otávio Augusto, Pepita Rodrigues, Bete Coelho, Paulo Vilhena, Fernanda Rodrigues, Zezeh Barbosa, Mary Sheyla, Natália Lage, Cláudio Marzo, Stella Miranda, Bia Nunes, Giuseppe Oristânio, Elizângela, Luís Salem, Luiz Guilherme, Diva Pacheco, Isabel Fillardis, Juliana Baroni, Mário Gomes, Pedro Neschling, Maria Zilda Bethlem, Maria Gladys, Jaqueline Laurance, Cassio Scapin, José D’Artagnan Jr, Sylvia Massari, Carol Machado, Chica Xavier, Thelma Reston, Guilhermina Guinle, Hugo Gross, Ivan Cândido, João Velho, Raoni Carneiro, Rafael Paiva, Bumba, Jorge de Sá, Jorge Maya, Sandro Christopher, Simone Soares, Vergniaud, Mariana Vaz, Renata Pascoal Edna, Maitê Proença, Guilherme Vieira e Daniel Torres. Rede Globo. 2002 • Sabor da Paixão (Aloísio). Telenovela de Ana Maria Moretzsohn. Direção: Denise Saraceni. Com Letícia Spiller, Luigi Baricelli, Arlete Salles, Cássia Kiss, Pedro Paulo Rangel, Lília Cabral, Sérgio Mamberti, Marcelo Serrado, Maria João, Floriano Peixoto, Tuca Andrada, Suely Franco, Edney Giovenazzi, Daniel Dantas, Fernanda Rodrigues, Liliana Castro, Vanessa Lóes, Guga Coelho, Débora Lamm, Cláudio Lins, Elisa Lisboa, Duarte Guimarães, Luiza Curvo, Karine Carvalho, Ada Chaseliov, Cássia Linhares, Pablo Padilha, Mila Moreira, Paula Burlamaqui, Gustavo Melo, Vanessa Pascale, Bruno Ferrari, Arlindo Lopes, Eduardo Reis, Alexandre Barbalho, Luís Henrique Nogueira, Adrielle Isidorio, Marcela Barrozo, Claslay Delfino, Lima Duarte, Aracy Balabanian, Edson Celulari e Carolina Ferraz. Rede Globo. 2001 • O Direito de Nascer (Comendador). Telenovela de Félix Caignet. Adaptação de Aziz Bajur e Jayme Camargo. Direção: Roberto Talma. Com Guilhermina Guinle, Dhu Moraes, Jorge Pontual, Ana Cecília Costa, Luiz Guilherme, Elaine Cristina, Fernando Eiras, João Vitti, Ana Kutner, Dênis Derkian, Angelina Muniz, Esther Góes, Vera Zimmerman, Marcelo Mansfield, Antônio Petrin, Fernando Alves Pinto, Gustavo Haddad, Imara Reis, Sônia Lima, Márcia Maria, Ariel Moshe, Olivetti Herrera, Cynthia Benini, Paulo Ivo, Bruna Marcotti, Bruna Teddy, Jerusa Franco, Lavínia Pannunzio, Lui Strassburg, Milhen Cortaz, Octávio Mendes, Osmar de Pieri, Sofia Papo, Tabata Queirós, Kaíto Ribeiro, Renato Borghi e Geórgia Gomide. Produção independente veiculada no SBT. Produção JPO. • Estrela-Guia (Romeu). Telenovela de Ana Maria Moretzsohn e Patrícia Moretzsohn. Direção: Denise Saraceni. Com Sandy, Guilherme Fontes, Carolina Ferraz, Lília Cabral, Rodrigo Santoro, Rosamaria Murtinho, Sérgio Mamberti, Nelson Xavier, Floriano Peixoto, Isabela Garcia, Evandro Mesquita, Gabriel Braga Nunes, Mônica Torres, Tarcísio Filho, Fernanda Rodrigues, Thaís Fersoza, Christine Fernandes, Lucinha Lins, Maurício Gonçalves, Cida Moreira, Maria Pompeu, Ana Carbatti, Flávia Bonato, Graziella Moreto, Junior Lima, Thiago Fragoso, Sérgio Marone, Oberdan Júnior, Nizo Neto, Natália Barreto, Marcelo de Freitas, Alexandre Barbalho, Thiago de Los Reyes, Renata Bravin, Netinho Alves, Marcos Winter, Maitê Proença, Cláudia Ohana, Ana Beatriz Nogueira, Marcos Pasquim, Lucy Mafra e Diego Roberto da Luz. Rede Globo. 1996 • Dona Anja (Neca). Telenovela adaptada do romance do Josué Guimarães. Escrita por Yoya Wursch e Cristiane Fridman. Direção geral: Roberto Talma. Direção de Luís Antônio Piá, Caco Coelho e José Paulo Vallone. Com Lucélia Santos, Jonas Mello, Luiz Guilherme, Angelina Muniz, Sérgio Mamberti, Jandir Ferrari, Vera Zimmermann, Danton Mello, Taumaturgo Ferreira, Giuseppe Oristânio, Manoela Dias, Sônia Lima, Antônio Petrin, Ângela Figueiredo, Patrícia Lucchesi, Pedro Vasconcelos, Lyliá Virna, Cláudio Mamberti, Rosaly Papadopol, Neco Villa-Lobos, Gustavo Haddad, Maurício Branco, José Rubens Chachá, Núbia Ólive e Paola Bettega. Produção independente veiculada no SBT. Produção JPO. 1990 • A História de Ana Raio e Zé Trovão (Billy). Telenovela de Marcos Caruso e Rita Buzzar, com colaboração de Jandira Martini. Ideia original, direção e supervisão geral: Jaime Monjardim. Direção de Roberto Naar e Marcos Schehtman. Com Ingra Liberato, Almir Sater, Nelson Xavier, Tamara Taxman, Giuseppe Oristânio, Micaela Góes, Yara Lins, Gisela Reimann, Roberto Bon-tempo, Edmundo Félix, Eduardo Silva, Antônio Pitanga, Denis Feldman, Demian Feldman, Xandó Batista, Luciano Viana, Antônio Nóbrega, Carlos Gregório, Celma, Célia, Geisa Gama, Sérgio Britto, Irving São Paulo, Lolita Rodrigues, Iaçanã Martins, Helena Ranaldi, Evandro Mesquita, Antônio Petrin, Andréa Cavalcanti, Andréa Labatte, Antônio Gonzalez, Antônio Pompeo, Aracy Cardoso, Ângela Leal, Betina Vianny, Camilo Bevilacqua, Carina Mello, Carlos Cambraia, Catarina Abdala, Charle Myara, Charles Moeller, Cícero Bernardes, Daniel Ávila, Diva Pirante, Elizabeth Hartmann, Ernesto Piccolo, Fernando Vieira, Gésio Amadeu, Giovanna Gold, Guilherme Corrêa, Haroldo Costa, Henrique César, Henrique Martins, Hélio Souto, Luiz Maçãs e José Dumont. Rede Manchete. 1989 • Top Model (Marvin). Telenovela de Walther Negrão e Antônio Calmon. Direção: Roberto Talma, Mário Márcio Bandarra e Fred Confalonieri. Com Malu Mader, Nuno Leal Maia, Taumaturgo Ferreira, Eva Todor, Felipe Carone, Marília Pêra, Maria Zilda, Cecil Thiré, Zezé Polessa, Drica Morais, Evandro Mesquita, Alexandre Frota, Denise Del Vecchio, Jonas Bloch, Jacqueline Laurence, Luís Carlos Arutin, Ana Maria Magalhães, Cissa Guimarães, Suzy Rêgo, Jonas Torres, Adriana Esteves, Suzana Faini, Chiquinho Brandão, Fábio Pillar, Marcelo Novaes, Márcia Couto, Diana Burle, Flávia Alessandra, Rita Mallot, Gabriela Duarte, Marcelo Faria, Carol Machado, Rodrigo Penna, Igor Roberto Lage e Henrique Farias. Rede Globo. 1987 • Helena (Rodolfo). Telenovela de Mário Prata, Dagomir Marquezi e Reinaldo Moraes. Adaptação do romance homônimo de Machado de Assis. Direção de Denise Saraceni e Luiz Fernando Carvalho. Com Luciana Braga, Aracy Balabanian, Thales Pan Chacon, Gianfrancesco Guarnieri, Gésio Amadeu, Zezé Motta, Mayara Magri, Yara Amaral, Othon Bastos, Isabel Ribeiro, Sérgio Mamberti, Paulo Villaça, Cláudio Mamberti, Ivan de Albuquerque, Elias Andreatto, Eliane Giardini, Thelma Reston, Buza Ferraz, Mônica Torres, Luiz Maçãs, Christiane Couto, Chiquinho Brandão, Zé Fernandes de Lira, Juliana Carneiro da Cunha, Walter Forster, Marcos Breda, Léa Garcia, Cláudia Borioni, Roberto Bomfim, Iléa Ferraz, Cosme dos Santos, Jacira Silva, Marcus Vinícius, Marcelo dos Santos, Veluma, Mariah da Penha, Geórgia Goldfard, Pedro Veras, Mauro Russo, Carmen Monegal, Rosita Thomaz Lopes, Fernando Amaral, Sandro Solviatti, Catalina Bonaki, Vera Brito, Christvam Netto, George Otto, Domingos de Oliveira, Marcelo Picchi e Norma Suely. Rede Manchete. Cinema 2006 • Irma Vap – O Retorno. Roteiro: Adriana Falcão, Carla Camurati e Melanie Dimantas, baseado em peça teatral de Charles Ludlam. Direção: Carla Camurati. Com Marco Nanini, Ney Latorraca, Thiago Fragoso, Marcos Caruso e Fernando Caruso. 2004 • Como Fazer um Filme de Amor. Roteiro e direção: José Roberto Torero. Com Denise Fraga, Cássio Gabus Mendes, Marisa Orth, André Abujamra, Paulo José, Ana Lúcia Torre, Abrahão Farc, José Rubens Chachá, Ilana Kaplan, Carlos Mariano e Maria Manoela. 2002 • Lara. Roteiro: Rita Buzzar e Ana Maria Magalhães. Direção: Ana Maria Magalhães. Com Christine Fernandes, Camilo Bevilacqua, Ana Beatriz Nogueira, Tuca Andrada, Gilberto Gawronski. Índice No Passado Está a História do Futuro – Alberto Goldman 5 Coleção Aplauso – Hubert Alquéres 7 Introdução – Andréa Bassitt 13 Família 19 Infância e Adolescência – Ilusões 31 Os Teatros que me Cercavam 37 Vida de Adulto 59 Teatro Orgânico Aldebarã 69 Do Outro Lado do Espelho 81 Quem Tem Medo de Itália Fausta? São Paulo – 1979 87 Os Filhos de Dulcina 103 O Hamlet 105 Quem Tem Medo de Itália Fausta? Rio de Janeiro – 1983 117 Band-age 123 Um Orgasmo Adulto Escapa do Zoológico 125 O Homem e o Cavalo 131 Torch Song Trilogy – A Louca Trilogia 123 Itália Fausta pela Terceira Vez – 1986 135 Excursão pelo Brasil – a Queda na Poça 139 Ricardo – Memórias, Sonhos e Reflexões 143 Ópera Joyce – Que Neblina é Essa? 147 Televisão – Top Model 151 Governo Collor 155 Da Globo para a Manchete – Raios e Trovões 159 Volta a São Paulo – Porca Miséria 163 5 X Comédia 169 AIDS 175 Idas e Vindas 179 Amai, Orai e Vigiai 181 5 X Comédia: Todo Prazer Quer Eternidade 187 Síndromes e Amigos 191 Antonio Abujamra – um Presente de Deus 197 Gigantes 203 Dona Roma – Mais um Presentaço 207 Prêmio Oscarito 209 Cronologia Completa 217 Crédito das Fotografias Guga Melgar 121, 122, 174, 194 João Caldas 196, 198, 201, 208, 213 Leonardo Aversa / O Globo 209 Patrícia Alegria 165 As demais fotos pertencem ao acervo de Miguel Magno A despeito dos esforços de pesquisa empreendidos pela Editora para identificar a autoria das fotos expostas nesta obra, parte delas não é de autoria conhecida de seus organizadores. Agradecemos o envio ou comunicação de toda informação relativa à autoria e/ou a outros dados que porventura estejam incompletos, para que sejam devidamente creditados. Coleção Aplauso Série Cinema Brasil Alain Fresnot – Um Cineasta sem Alma Alain Fresnot Agostinho Martins Pereira – Um Idealista Máximo Barro Alfredo Sternheim – Um Insólito Destino Alfredo Sternheim O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias Roteiro de Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert e Cao Hamburger Anselmo Duarte – O Homem da Palma de Ouro Luiz Carlos Merten Antonio Carlos da Fontoura – Espelho da Alma Rodrigo Murat Ary Fernandes – Sua Fascinante História Antônio Leão da Silva Neto O Bandido da Luz Vermelha Roteiro de Rogério Sganzerla Batismo de Sangue Roteiro de Dani Patarra e Helvécio Ratton Bens Confiscados Roteiro comentado pelos seus autores Daniel Chaia e Carlos Reichenbach Braz Chediak – Fragmentos de uma Vida Sérgio Rodrigo Reis Cabra-Cega Roteiro de Di Moretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo Kauffman O Caçador de Diamantes Roteiro de Vittorio Capellaro, comentado por Máximo Barro Carlos Coimbra – Um Homem Raro Luiz Carlos Merten Carlos Reichenbach – O Cinema Como Razão de Viver Marcelo Lyra A Cartomante Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis Casa de Meninas Romance original e roteiro de Inácio Araújo O Caso dos Irmãos Naves Roteiro de Jean-Claude Bernardet e Luis Sérgio Person O Céu de Suely Roteiro de Karim Aïnouz, Felipe Bragança e Maurício Zacharias Chega de Saudade Roteiro de Luiz Bolognesi Cidade dos Homens Roteiro de Elena Soárez Como Fazer um Filme de Amor Roteiro escrito e comentado por Luiz Moura e José Roberto Torero O Contador de Histórias Roteiro de Luiz Villaça, Mariana Veríssimo, Maurício Arruda e José Roberto Torero Críticas de B.J. Duarte – Paixão, Polêmica e Generosidade Luiz Antonio Souza Lima de Macedo Críticas de Edmar Pereira – Razão e Sensibilidade Org. Luiz Carlos Merten Críticas de Jairo Ferreira – Críticas de invenção: Os Anos do São Paulo Shimbun Org. Alessandro Gamo Críticas de Luiz Geraldo de Miranda Leão – Analisando Cinema: Críticas de LG Org. Aurora Miranda Leão Críticas de Ruben Biáfora – A Coragem de Ser Org. Carlos M. Motta e José Júlio Spiewak De Passagem Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias Desmundo Roteiro de Alain Fresnot, Anna Muylaert e Sabina Anzuategui Djalma Limongi Batista – Livre Pensador Marcel Nadale Dogma Feijoada: O Cinema Negro Brasileiro Jeferson De Dois Córregos Roteiro de Carlos Reichenbach A Dona da História Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho Os 12 Trabalhos Roteiro de Cláudio Yosida e Ricardo Elias Estômago Roteiro de Lusa Silvestre, Marcos Jorge e Cláudia da Natividade Feliz Natal Roteiro de Selton Mello e Marcelo Vindicatto Fernando Meirelles – Biografia Prematura Maria do Rosário Caetano Fim da Linha Roteiro de Gustavo Steinberg e Guilherme Werneck; Storyboards de Fábio Moon e Gabriel Bá Fome de Bola – Cinema e Futebol no Brasil Luiz Zanin Oricchio Francisco Ramalho Jr. – Éramos Apenas Paulistas Celso Sabadin Geraldo Moraes – O Cineasta do Interior Klecius Henrique Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta Cinéfilo Luiz Zanin Oricchio Helvécio Ratton – O Cinema Além das Montanhas Pablo Villaça O Homem que Virou Suco Roteiro de João Batista de Andrade, organização de Ariane Abdallah e Newton Cannito Ivan Cardoso – O Mestre do Terrir Remier João Batista de Andrade – Alguma Solidão e Muitas Histórias Maria do Rosário Caetano Jorge Bodanzky – O Homem com a Câmera Carlos Alberto Mattos José Antonio Garcia – Em Busca da Alma Feminina Marcel Nadale José Carlos Burle – Drama na Chanchada Máximo Barro Liberdade de Imprensa – O Cinema de Intervenção Renata Fortes e João Batista de Andrade Luiz Carlos Lacerda – Prazer & Cinema Alfredo Sternheim Maurice Capovilla – A Imagem Crítica Carlos Alberto Mattos Mauro Alice – Um Operário do Filme Sheila Schvarzman Máximo Barro – Talento e Altruísmo Alfredo Sternheim Miguel Borges – Um Lobisomem Sai da Sombra Antônio Leão da Silva Neto Não por Acaso Roteiro de Philippe Barcinski, Fabiana Werneck Barcinski e Eugênio Puppo Narradores de Javé Roteiro de Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu Olhos Azuis Argumento de José Joffily e Jorge Duran Roteiro de Jorge Duran e Melanie Dimantas Onde Andará Dulce Veiga Roteiro de Guilherme de Almeida Prado Orlando Senna – O Homem da Montanha Hermes Leal Pedro Jorge de Castro – O Calor da Tela Rogério Menezes Quanto Vale ou É por Quilo Roteiro de Eduardo Benaim, Newton Cannito e Sergio Bianchi Ricardo Pinto e Silva – Rir ou Chorar Rodrigo Capella Rodolfo Nanni – Um Realizador Persistente Neusa Barbosa Salve Geral Roteiro de Sergio Rezende e Patrícia Andrade O Signo da Cidade Roteiro de Bruna Lombardi Ugo Giorgetti – O Sonho Intacto Rosane Pavam Viva-Voz Roteiro de Márcio Alemão Vladimir Carvalho – Pedras na Lua e Pelejas no Planalto Carlos Alberto Mattos Vlado – 30 Anos Depois Roteiro de João Batista de Andrade Zuzu Angel Roteiro de Marcos Bernstein e Sergio Rezende Série Cinema Bastidores – Um Outro Lado do Cinema Elaine Guerini Série Ciência & Tecnologia Cinema Digital – Um Novo Começo? Luiz Gonzaga Assis de Luca A Hora do Cinema Digital – Democratização e Globalização do Audiovisual Luiz Gonzaga Assis De Luca Série Crônicas Crônicas de Maria Lúcia Dahl – O Quebra-cabeças Maria Lúcia Dahl Série Dança Rodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo – Dança Universal Sérgio Rodrigo Reis Série Música Maestro Diogo Pacheco – Um Maestro para Todos Alfredo Sternheim Rogério Duprat – Ecletismo Musical Máximo Barro Sérgio Ricardo – Canto Vadio Eliana Pace Wagner Tiso – Som, Imagem, Ação Beatriz Coelho Silva Série Teatro Brasil Alcides Nogueira – Alma de Cetim Tuna Dwek Antenor Pimenta – Circo e Poesia Danielle Pimenta Cia de Teatro Os Satyros – Um Palco Visceral Alberto Guzik Críticas de Clóvis Garcia – A Crítica Como Oficio Org. Carmelinda Guimarães Críticas de Maria Lucia Candeias – Duas Tábuas e Uma Paixão Org. José Simões de Almeida Júnior Federico Garcia Lorca – Pequeno Poema Infinito Antonio Gilberto e José Mauro Brant Ilo Krugli – Poesia Rasgada Ieda de Abreu João Bethencourt – O Locatário da Comédia Rodrigo Murat José Renato – Energia Eterna Hersch Basbaum Leilah Assumpção – A Consciência da Mulher Eliana Pace Luís Alberto de Abreu – Até a Última Sílaba Adélia Nicolete Maurice Vaneau – Artista Múltiplo Leila Corrêa Renata Palottini – Cumprimenta e Pede Passagem Rita Ribeiro Guimarães Teatro Brasileiro de Comédia – Eu Vivi o TBC Nydia Licia O Teatro de Abílio Pereira de Almeida Abílio Pereira de Almeida O Teatro de Aimar Labaki Aimar Labaki O Teatro de Alberto Guzik Alberto Guzik O Teatro de Antonio Rocco Antonio Rocco O Teatro de Cordel de Chico de Assis Chico de Assis O Teatro de Emílio Boechat Emílio Boechat O Teatro de Germano Pereira – Reescrevendo Clássicos Germano Pereira O Teatro de José Saffioti Filho José Saffioti Filho O Teatro de Alcides Nogueira – Trilogia: Ópera Joyce – Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso – Pólvora e Poesia Alcides Nogueira O Teatro de Ivam Cabral – Quatro textos para um teatro veloz: Faz de Conta que tem Sol lá Fora – Os Cantos de Maldoror – De Profundis – A Herança do Teatro Ivam Cabral O Teatro de Noemi Marinho: Fulaninha e Dona Coisa, Homeless, Cor de Chá, Plantonista Vilma Noemi Marinho Teatro de Revista em São Paulo – De Pernas para o Ar Neyde Veneziano O Teatro de Samir Yazbek: A Entrevista – O Fingidor – A Terra Prometida Samir Yazbek O Teatro de Sérgio Roveri Sérgio Roveri Teresa Aguiar e o Grupo Rotunda – Quatro Décadas em Cena Ariane Porto Série Perfil Analy Alvarez – De Corpo e Alma Nicolau Radamés Creti Aracy Balabanian – Nunca Fui Anjo Tania Carvalho Arllete Montenegro – Fé, Amor e Emoção Alfredo Sternheim Ary Fontoura – Entre Rios e Janeiros Rogério Menezes Berta Zemel – A Alma das Pedras Rodrigo Antunes Corrêa Bete Mendes – O Cão e a Rosa Rogério Menezes Betty Faria – Rebelde por Natureza Tania Carvalho Carla Camurati – Luz Natural Carlos Alberto Mattos Cecil Thiré – Mestre do seu Ofício Tania Carvalho Celso Nunes – Sem Amarras Eliana Rocha Cleyde Yaconis – Dama Discreta Vilmar Ledesma David Cardoso – Persistência e Paixão Alfredo Sternheim Débora Duarte – Filha da Televisão Laura Malin Denise Del Vecchio – Memórias da Lua Tuna Dwek Elisabeth Hartmann – A Sarah dos Pampas Reinaldo Braga Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida Maria Leticia Emilio Di Biasi – O Tempo e a Vida de um Aprendiz Erika Riedel Etty Fraser – Virada Pra Lua Vilmar Ledesma Ewerton de Castro – Minha Vida na Arte: Memória e Poética Reni Cardoso Fernanda Montenegro – A Defesa do Mistério Neusa Barbosa Fernando Peixoto – Em Cena Aberta Marília Balbi Geórgia Gomide – Uma Atriz Brasileira Eliana Pace Gianfrancesco Guarnieri – Um Grito Solto no Ar Sérgio Roveri Glauco Mirko Laurelli – Um Artesão do Cinema Maria Angela de Jesus Ilka Soares – A Bela da Tela Wagner de Assis Irene Ravache – Caçadora de Emoções Tania Carvalho Irene Stefania – Arte e Psicoterapia Germano Pereira Isabel Ribeiro – Iluminada Luis Sergio Lima e Silva Isolda Cresta – Zozô Vulcão Luis Sérgio Lima e Silva Joana Fomm – Momento de Decisão Vilmar Ledesma John Herbert – Um Gentleman no Palco e na Vida Neusa Barbosa Jonas Bloch – O Ofício de uma Paixão Nilu Lebert Jorge Loredo – O Perigote do Brasil Cláudio Fragata José Dumont – Do Cordel às Telas Klecius Henrique Leonardo Villar – Garra e Paixão Nydia Licia Lília Cabral – Descobrindo Lília Cabral Analu Ribeiro Lolita Rodrigues – De Carne e Osso Eliana Castro Louise Cardoso – A Mulher do Barbosa Vilmar Ledesma Marcos Caruso – Um Obstinado Eliana Rocha Maria Adelaide Amaral – A Emoção Libertária Tuna Dwek Marisa Prado – A Estrela, O Mistério Luiz Carlos Lisboa Mauro Mendonça – Em Busca da Perfeição Renato Sérgio Miriam Mehler – Sensibilidade e Paixão Vilmar Ledesma Naum Alves de Souza: Imagem, Cena, Palavra Alberto Guzik Nicette Bruno e Paulo Goulart – Tudo em Família Elaine Guerrini Nívea Maria – Uma Atriz Real Mauro Alencar e Eliana Pace Niza de Castro Tank – Niza, Apesar das Outras Sara Lopes Paulo Betti – Na Carreira de um Sonhador Teté Ribeiro Paulo José – Memórias Substantivas Tania Carvalho Paulo Hesse – A Vida Fez de Mim um Livro e Eu Não Sei Ler Eliana Pace Pedro Paulo Rangel – O Samba e o Fado Tania Carvalho Regina Braga – Talento é um Aprendizado Marta Góes Reginaldo Faria – O Solo de Um Inquieto Wagner de Assis Renata Fronzi – Chorar de Rir Wagner de Assis Renato Borghi – Borghi em Revista Élcio Nogueira Seixas Renato Consorte – Contestador por Índole Eliana Pace Rolando Boldrin – Palco Brasil Ieda de Abreu Rosamaria Murtinho – Simples Magia Tania Carvalho Rubens de Falco – Um Internacional Ator Brasileiro Nydia Licia Ruth de Souza – Estrela Negra Maria Ângela de Jesus Sérgio Hingst – Um Ator de Cinema Máximo Barro Sérgio Viotti – O Cavalheiro das Artes Nilu Lebert Silnei Siqueira – A Palavra em Cena Ieda de Abreu Silvio de Abreu – Um Homem de Sorte Vilmar Ledesma Sônia Guedes – Chá das Cinco Adélia Nicolete Sonia Maria Dorce – A Queridinha do meu Bairro Sonia Maria Dorce Armonia Sonia Oiticica – Uma Atriz Rodriguiana? Maria Thereza Vargas Stênio Garcia – Força da Natureza Wagner Assis Suely Franco – A Alegria de Representar Alfredo Sternheim Tatiana Belinky – ... E Quem Quiser Que Conte Outra Sérgio Roveri Theresa Amayo – Ficção e Realidade Theresa Amayo Tony Ramos – No Tempo da Delicadeza Tania Carvalho Umberto Magnani – Um Rio de Memórias Adélia Nicolete Vera Holtz – O Gosto da Vera Analu Ribeiro Vera Nunes – Raro Talento Eliana Pace Walderez de Barros – Voz e Silêncios Rogério Menezes Walter George Durst – Doce Guerreiro Nilu Lebert Zezé Motta – Muito Prazer Rodrigo Murat Especial Agildo Ribeiro – O Capitão do Riso Wagner de Assis Av. Paulista, 900 – a História da TV Gazeta Elmo Francfort Beatriz Segall – Além das Aparências Nilu Lebert Carlos Zara – Paixão em Quatro Atos Tania Carvalho Célia Helena – Uma Atriz Visceral Nydia Licia Charles Möeller e Claudio Botelho – Os Reis dos Musicais Tania Carvalho Cinema da Boca – Dicionário de Diretores Alfredo Sternheim Dina Sfat – Retratos de uma Guerreira Antonio Gilberto Eva Todor – O Teatro de Minha Vida Maria Angela de Jesus Eva Wilma – Arte e Vida Edla van Steen Gloria in Excelsior – Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira Álvaro Moya Lembranças de Hollywood Dulce Damasceno de Britto, organizado por Alfredo Sternheim Maria Della Costa – Seu Teatro, Sua Vida Warde Marx Mazzaropi – Uma Antologia de Risos Paulo Duarte Ney Latorraca – Uma Celebração Tania Carvalho Odorico Paraguaçu: O Bem-amado de Dias Gomes – História de um Personagem Larapista e Maquiavelento José Dias Raul Cortez – Sem Medo de se Expor Nydia Licia Rede Manchete – Aconteceu, Virou História Elmo Francfort Sérgio Cardoso – Imagens de Sua Arte Nydia Licia Tônia Carrero – Movida pela Paixão Tania Carvalho TV Tupi – Uma Linda História de Amor Vida Alves Victor Berbara – O Homem das Mil Faces Tania Carvalho Walmor Chagas – Ensaio Aberto para Um Homem Indignado Djalma Limongi Batista © 2010 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Bassit, Andréa Miguel Magno: o pregador de peças / Andréa Bassit – São Paulo : Imprensa Oficial do Estado de São Paulo , 2010. 264p. :il. – (Coleção aplauso. Série perfil / Coordenador geral Rubens Ewald Filho) ISBN 978-85-7060-884-0. 1. Atores e atrizes de cinema – Biografia 2. Atores e atrizes de teatro – Biografia 3. Atores e atrizes de televisão – Biografia 4. Magno, Miguel, 1951-2009 I. Ewald Filho, Rubens. II. Título. III. Série. CDD 791.092 Índice para catálogo sistemático: 1. Atores e atrizes brasileiros : Biografia : Representações públicas : Artes 791.092 Proibida reprodução total ou parcial sem autorização prévia do autor ou dos editores Lei nº 9.610 de 19/02/1998 Foi feito o depósito legal Lei nº 10.994, de 14/12/2004 Impresso no Brasil / 2010 Todos os direitos reservados. 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