Sônia Guedes Chá das Cinco Sônia Guedes Chá das Cinco Adélia Nicolete IMPRENSA OFICIAL São Paulo, 2008 GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO TRABALHANDO POR VOCÊ Governador José Serra Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Diretor-presidente Hubert Alquéres Coleção Aplauso Coordenador Geral Rubens Ewald Filho Coleção Aplauso Coordenador Geral Rubens Ewald Filho Apresentação Segundo o catalão Gaudí, não se deve erguer monumentos aos artistas porque eles já o fizeram com suas obras. De fato, muitos artistas são imortalizados e reverenciados diariamente por meio de suas obras eternas. Mas como reconhecer o trabalho de artistas geniais de outrora, que para exercer seu ofício muniramse simplesmente de suas próprias emoções, de seu próprio corpo? Como manter vivo o nome daqueles que se dedicaram à mais volátil das artes, escrevendo, dirigindo e interpretando obras-primas, que têm a efêmera duração de um ato? Mesmo artistas da TV pós-videoteipe seguem esquecidos, quando os registros de seu trabalho ou se perderam ou são muitas vezes inacessíveis ao grande público. A Coleção Aplauso, de iniciativa da Imprensa Oficial, pretende resgatar um pouco da memória de figuras do Teatro, TV e Cinema que tiveram participação na história recente do País, tanto dentro quanto fora de cena. Ao contar suas histórias pessoais, esses artistas dão-nos a conhecer o meio em que vivia toda uma classe que representa a consciência crítica da sociedade. Suas histórias tratam do contexto social no qual estavam inseridos e seu inevitável reflexo na arte. Falam do seu engajamento político em épocas adversas à livre expressão e as conseqüências disso em suas próprias vidas e no destino da nação. Paralelamente, as histórias de seus familiares se entrelaçam, quase que invariavelmente, à saga dos milhares de imigrantes do começo do século passado no Brasil, vindos das mais variadas origens. Enfim, o mosaico formado pelos depoimentos compõe um quadro que reflete a identidade e a imagem nacional, bem como o processo político e cultural pelo qual passou o país nas últimas décadas. Ao perpetuar a voz daqueles que já foram a própria voz da sociedade, a Coleção Aplauso cumpre um dever de gratidão a esses grandes símbolos da cultura nacional. Publicar suas histórias e personagens, trazendo-os de volta à cena, também cumpre função social, pois garante a preservação de parte de uma memória artística genuinamente brasileira, e constitui mais que justa homenagem àqueles que merecem ser aplaudidos de pé. José Serra Governador do Estado de São Paulo Coleção Aplauso O que lembro, tenho. Guimarães Rosa A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa Oficial, visa a resgatar a memória da cultura nacional, biografando atores, atrizes e diretores que compõem a cena brasileira nas áreas de cinema, teatro e televisão. Foram selecionados escritores com largo currículo em jornalismo cultural para esse trabalho em que a história cênica e audiovisual brasileira vem sendo reconstituída de maneira singular. Em entrevistas e encontros sucessivos estreita-se o contato entre biógrafos e biografados. Arquivos de documentos e imagens são pesquisados, e o universo que se reconstitui a partir do cotidiano e do fazer dessas personalidades permite reconstruir sua trajetória. A decisão sobre o depoimento de cada um na primeira pessoa mantém o aspecto de tradição oral dos relatos, tornando o texto coloquial, como se o biografado falasse diretamente ao leitor. Um aspecto importante da Coleção é que os resultados obtidos ultrapassam simples registros biográficos, revelando ao leitor facetas que também caracterizam o artista e seu ofício. Biógrafo e biografado se colocaram em reflexões que se estenderam sobre a formação intelectual e ideológica do artista, contextualizada na história brasileira, no tempo e espaço da narrativa de cada biografado. São inúmeros os artistas a apontar o importante papel que tiveram os livros e a leitura em sua vida, deixando transparecer a firmeza do pensamento crítico ou denunciando preconceitos seculares que atrasaram e continuam atrasando nosso país. Muitos mostraram a importância para a sua formação terem atuado tanto no teatro quanto no cinema e na televisão, adquirindo, linguagens diferenciadas – analisando-as com suas particularidades. Muitos títulos extrapolam os simples relatos biográficos, explorando – quando o artista permite – seu universo íntimo e psicológico, revelando sua autodeterminação e quase nunca a casualidade por ter se tornado artista – como se carregasse desde sempre, seus princípios, sua vocação, a complexidade dos personagens que abrigou ao longo de sua carreira. São livros que, além de atrair o grande público, interessarão igualmente a nossos estudantes, pois na Coleção Aplauso foi discutido o processo de criação que concerne ao teatro, ao cinema e à televisão. Desenvolveram-se temas como a construção dos personagens interpretados, a análise, a história, a importância e a atualidade de alguns dos personagens vividos pelos biografados. Foram examinados o relacionamento dos artistas com seus pares e diretores, os processos e as possibilidades de correção de erros no exercício do teatro e do cinema, a diferença entre esses veículos e a expressão de suas linguagens. Gostaria de ressaltar o projeto gráfico da Coleção e a opção por seu formato de bolso, a facilidade para ler esses livros em qualquer parte, a clareza de suas fontes, a iconografia farta e o registro cronológico de cada biografado. Se algum fator específico conduziu ao sucesso da Coleção Aplauso – e merece ser destacado –, é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o percurso cultural de seu país. À Imprensa Oficial e sua equipe coube reunir um bom time de jornalistas, organizar com eficácia a pesquisa documental e iconográfica e contar com a disposição e o empenho dos artistas, diretores, dramaturgos e roteiristas. Com a Coleção em curso, configurada e com identidade consolidada, constatamos que os sortilégios que envolvem palco, cenas, coxias, sets de filmagem, textos, imagens e palavras conjugados, e todos esses seres especiais – que nesse universo transitam, transmutam e vivem – também nos tomaram e sensibilizaram. É esse material cultural e de reflexão que pode ser agora compartilhado com os leitores de to-do o Brasil. Hubert Alquéres Diretor-presidente da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo À Kátia, filha amada. Ao Fábio, com ternura. Sônia Guedes Introdução Curiosamente, a Apresentação de um trabalho é feita depois de todo ele escrito. Dessa forma, primeiro temos uma visão geral do conteúdo para, só depois, apresentá-lo com certa propriedade. Concluídas as entrevistas, feitas as pesquisas e terminado o processo de escrita deste livro, componho uma imagem de seu conteúdo, ou seja, de Sônia Guedes, que é feita de pura poesia. Desde o primeiro encontro, no qual ela me ofereceu o famoso chá das cinco, servido em xícaras de porcelana e com direito a bolo, até nossa conversa mais recente, ela foi de uma delicadeza ímpar. Isso não indica, absolutamente, fragilidade. Sônia reúne ao mesmo tempo doçura e força. Nos momentos em que as confissões eram doloridas ou em que a fase na qual se encontrava não era das mais confortáveis, ainda assim era possível identificar o vulcão, o relâmpago, a determinação incansável. Não fosse isso, ela não teria enfrentado um semnúmero de dificuldades físicas e materiais em sua vida. Vive-se com delicadeza e poesia, mas isso não basta. Dona de cultura invejável, ela transita com propriedade por entre os mais diversos assuntos. Leitora voraz, acompanha e discute os últimos lançamentos literários. Pianista e cantora, tem na música erudita e na ópera suas principais referências. E, como cidadã, reflete a todo momento sobre a situação política do País, numa insatisfação permanente, que é ao mesmo tempo freio e motor. Freio porque as injustiças sociais ferem profundamente a artista. Motor porque, instalada a revolta, Sônia não se contenta em reclamar, arregaça as mangas e toma a frente de ações concretas. Sempre foi assim. Portanto, conhecer pessoalmente esta grande atriz foi um privilégio. Comecei a participar da vida teatral do ABC paulista nos anos 80 e, desde o princípio, o nome de Sônia Guedes esteve presente como referência para todos nós. Ela e outros pioneiros foram os responsáveis por elevar os padrões artísticos da região. Se hoje podemos contar com escolas de formação musical, teatral e de artes visuais, muito se deve ao empenho daquelas pessoas que, desde os idos de 1950, buscaram estudo, aperfeiçoamento e desenvolvimento na capital e lutaram por trazêlos às cidades periféricas. Para a compreensão desses fatos e a realização deste perfil contei com o auxílio de dois livros de José Armando Pereira da Silva, pesquisador da arte e da cultura do ABC: Memórias da Cidade III e A Cena Brasileira em Santo André. Neles, o autor traça um panorama do teatro na cidade, o que permitiu também o estudo do contexto de alguns trabalhos de Sônia Guedes. Ela nos convida agora a tomar um chá em sua companhia. Coloca generosamente diante de nós uma gama de sabores e perfumes, por vezes contrastantes, como o são delicadeza e força, paixão e sossego, brisa e furacão. Convida-nos a compartilhar com ela suas lembranças e inquietações mais profundas, traçando conosco, a quatro mãos, os versos mais puros da poesia da vida. Convite Você aceita um chá? São quase cinco horas. A cidade começa a ferver lá fora. Músculos e nervos entram em ebulição; motores esquentam, explodem, e o mundo vira uma ode triunfal de Álvaro de Campos. Aqui dentro estamos todos calmos, só a água ferve. Mais nada. Mentira... Pra que se enganar? Dentro de mim, pelo menos, ainda fervem sonhos, desejos, aflições. Mente quem disser que, com a idade, os sentimentos se acomodam. Placidez? Onde? A água ferve! Passado e presente se misturam, as velhas indignações sobem à superfície! E as paixões, de todos os tipos, ainda podem me acometer. Então venha, tome esse chá comigo. Escolha o sabor que preferir. Há os mais doces, os amargos, os fortes e os suaves. Cada um tem uma origem diferente, cada aroma tem o poder de transportar para um lugar e um tempo outros. Tome esse chá e celebre comigo a vida que ferve lá fora e aqui dentro de nós. Capítulo I English Breakfast Fog londrino. O apito do trem, a estação. Nostalgia de um tempo remoto e feliz. E se não foi tão feliz assim, a criança que habita em nós teima em brincar e se divertir apenas com as lembranças boas. Muito prazer, meu nome é Sônia Oliveira Guedes de Souza, filha de João de Oliveira e Leonor Cazarotto de Oliveira. Sou do dia 22 de novembro -meio sagitário, meio escorpião. Não sei muito bem o que isso significa, mas há quem entenda de Astrologia, e certamente encontrará explicações razoáveis para muitas das coisas que ficará sabendo a meu respeito. Começo anunciando que nasci em Paranapiacaba, uma linda vila do ABC paulista. Acho que esse meu lado de atriz, de fantasia, trouxe daquele lugar. Quem conhece sabe: é uma vila cinematográfica, parece um pequeno presépio incrustado na serra, não parece real. Se ainda hoje é um pouco assim, quando eu morava lá, era mais ainda, por causa da neblina. Paranapiacaba – lugar de onde se avista o mar. E dava pra vê-lo, de verdade, nos dias claros. Subia-se em algum ponto, esticava-se bem o pescoço e lá estava ele, misturado ao céu, quase tão longe quanto ele. Mas nossa vida não era céu, nem mar. Era terra, trilho fincado no chão, caminho preciso preso dormente a dormente, pino a pino. Nossa vila nasceu em função de uma ferrovia. Na primeira metade do século 19, engenheiros ingleses foram chamados a São Paulo para orientar a construção da estrada de ferro São Paulo Railways. Quem vai à Luz, por exemplo, que é a estação mais famosa, pode identificar todo o desenho de uma arquitetura importada da Inglaterra. Imagine que todas as estações vinham de lá e eram montadas no Brasil, peça por peça, como esses joguinhos de encaixe. Com exceção de alguns artefatos do Liceu de Artes e Ofícios, de São Paulo, tudo o mais era inglês: os bancos, as grades, as escadas, os adornos, tudo. De Santos até Jundiaí, ilhotas inglesas, plantadas ao longo da ferrovia, no meio de cidades ainda em formação. Os engenheiros vieram com suas famílias e, durante anos, ficaram responsáveis pela estruturação da malha ferroviária. Como o clima de Paranapiacaba era idêntico ao da Europa, decidiram fixar residência lá. Casas de madeira foram erguidas, verdadeiros palacetes. Uma parte da vila para os ingleses, outra para seus empregados e operários da ferrovia. Não havia mistura. Pelo menos não abertamente. O que irmanava a todos era o clima. Éramos igualmente envolvidos e cegados pela neblina, diariamente regados pela chuva. Chovia todas as tardes. Só não chovia no alto verão. Imagine que as minhas lembranças de lá são todas molhadas! Nós tínhamos uma profusão de guarda-chuvas em casa; várias capas, galochas, vários sapatos. Umidade constante. Quando não era a chuva, era a neblina. Ou as duas juntas. A casa era nosso aconchego, nosso conforto. Guardo lembranças muito boas da infância. Guardo mesmo, apesar da doença. Tive um problema muito sério que me deixou de cama durante anos e anos. Não era bem uma doença, era um defeito físico: nasci com um grave problema em um dos pés. Mas se isso me segurou na cama por muito tempo, graças a meu pai, acabou me despertando o gosto pela leitura! Meu pai era pintor. Ele não tinha podido estudar e por isso pintava casas. Um homem sensível e inteligente, que desenhava muito bem, precisava ver – tinha gosto pela arte. Imagine se tivesse tido melhores chances na vida!... Como eu ficava presa na cama, sem poder andar e com as pernas engessadas, ele ficava muito comovido. Fazia tudo pra me ajudar, pra me dar uma vida mais feliz. Vivia me perguntando: Filha, o que você quer? Quero revistas – eu dizia. Naquele tempo só tinha O Cruzeiro. Então, meu pai ia até a estação – naquele lugar não tinha banca de jornais, era um lugar isolado – e, quando o trem passava, pedia a revista ao jornaleiro, toda semana. Quando não tinha O Cruzeiro, ele comprava a Para Ti, que era uma revista em espanhol – acho que era argentina. Você sabe que eu aprendi castelhano lendo a revista? De tanto ler, comecei a juntar e a descobrir o que eram as palavras. Porque a maioria era conhecida. As diferentes, pelo sentido, eu descobria. Acabei até fazendo um dicionariozinho, quando achava uma palavra diferente. Foi assim que aprendi castelhano, desde pequena. Então eu li muito. N’O Cruzeiro tinha uma sessão periódica – não lembro se mensal ou semanal – onde se editavam críticas de espetáculos teatrais. Tinha uma fotografia do espetáculo e uma crítica. Eu não sei quem é que escrevia, sempre tive curiosidade de saber quem era o autor daquilo tudo, o fato é que eu devorava. Quando, mais tarde, ingressei na Escola de Arte Dramática (EAD), todo espetáculo que o diretor, o doutor Alfredo, citava eu dizia: Sei qual é. Era com tal ator, tal atriz, direção de não sei quem... Ele ficava espantado: Puxa, Sonia, você assistiu muito teatro, hein? Um dia eu cheguei para ele e falei: Doutor Alfredo, eu não vi nada! Não? Não, tudo isso que eu falo pro senhor, eu li. Pela crítica eu fazia uma idéia de como era o espetáculo. Eu tinha só a perspectiva do crítico, o ponto de vista dele, porque eu mesma não tinha assistido ao espetáculo. Só fui assistir teatro em Santo André, com uns dezoito anos! Ah, por falar nisso, até os dezoito anos fui filha única. Quando eu tinha três anos nasceu um irmão, que faleceu logo. Aí, quando eu tinha quinze anos, minha mãe teve uma menina, que faleceu também. Depois de três anos nasceu o Sérgio, meu irmão, que mora em Santo André. Ele é advogado e é ator também – Sérgio de Oliveira. Depois ela teve mais dois: o Silas, que faleceu num acidente, e a Semadar Cecília. Minha mãe está com 95 anos e mora aqui perto de mim, em São Paulo. Por ser filha única por tanto tempo, meus pais puderam cuidar de mim com um pouco mais de atenção. Fiz cirurgias seguidas até os nove anos. Nessa idade houve um erro médico e aí o meu caso ficou muito pior do que era! Aos catorze tive de fazer mais uma cirurgia, dessa vez para corrigir o erro! Depois fiquei bem, andando e tudo. Mas eles tiveram de paralisar o pé para não dar mais problema. Então o meu pé ficou com o tamanho relativo ao de nove anos: o tratamento paralisara o crescimento do pé e da perna. Foi um processo muito penoso. Eu perdia aulas e cheguei a repetir de ano uma vez porque tinha de ficar o tempo todo deitada. Nas outras ocasiões, minhas amigas levavam as lições para mim em casa, de modo que conseguia acompanhar tudo muito bem. Quando não estava de cama, fazia questão de ajudar nas tarefas domésticas. Uma de minhas atribuições era levar a marmita para meu pai. Minha mãe fazia a comida, colocava nas marmitas de alumínio, eu levava para o trem – sempre acompanhada pelo meu cãozinho. O trem ia parando nas estações e, em cada uma, desciam as marmitas para os operários. Não havia restaurantes, como existem hoje, não se comia fora de casa. De modo que, diariamente, meu cachorrinho e eu cumpríamos o mesmo ritual. Uma vez, eu tinha sete anos, ele resolveu se aventurar e, apesar dos meus protestos, se enfiou no meio dos trilhos. Era hora do trem passar. Chorei tanto, fiquei tão triste... Demorei um bom tempo para querer outro animal de estimação. Um outro episódio marcante também aconteceu quando estava ajudando minha mãe. Ela trabalhava como lavadeira dos engenheiros, e eu ficava encarregada de entregar a roupa lavada na casa deles. A roupa era lavada, passada, colocada em toalhas presas com alfinetes. Era muito pesado. Lembro que eu me cansava bastante e que era muito aflitivo também. Imagine que eram umas casas lindas, grandes, de madeira, com jardins belíssimos, e eu entrava sempre pela porta lateral -havia um caminho lateral, com portãozinho. Eu colocava a roupa no chão, batia palmas, e vinha alguém pegar a encomenda. Acontece que os ingleses tinham cães enormes e eu sentia pavor de todos eles. Chegavam a provocar até gagueira em mim. Durante muito tempo gaguejei, foi uma coisa muito difícil perder isso. Porque era uma coisa de susto, de perder o fôlego, de ficar ofegante e as palavras não saírem. Às vezes batia palmas e ninguém ouvia, eu tinha de gritar, chamando alguma empregada. Um dia, uma delas viu que eu estava tão mal por causa dos cachorros, que prendeu todos eles, me pegou pela mão e me deu água. Aí veio a dona da casa, a Mrs. Clay, e mandou que me dessem um pouco de chá e um pãozinho com geléia. Foi assim que comecei a freqüentar a casa e a brincar com as meninas. Elas vinham pouco a Paranapiacaba, porque estudavam no colégio Batista, em São Paulo. Só nas férias ficavam um pouco mais, para logo em seguida viajarem para a Inglaterra, para não perderem o contato com o país natal. Das brincadeiras com as inglesinhas, eu me lembro de alguns trechos de uma música que elas me ensinaram. Elas cantavam e pulavam, como amarelinha. Lembro dos sons das palavras, mas não sei que palavras são. Lembro também de seus livros e dos cadernos de desenho. Elas pintavam muito e, quando sobravam algumas páginas, me davam. Onde estarão aquelas meninas? Será que voltaram para a Inglaterra? Nunca mais tive contato. Tenho só uma amiga dos tempos de criança, a Nora Gomes -de vez em quando vou visitá-la em Santo André. Da infância, às vezes alguém descobre meu telefone e me liga. São flashes, estalos, nada muito profundo. Na verdade nos perdemos uns dos outros e a família, ela também, tornou-se, aos poucos, só lembranças. E um retrato na parede. Em Paranapiacaba morávamos com meus pais, avós e tios. A família da minha mãe era pequena: a mãe, Paulina, e o pai, Vital, que eram italianos, e três filhas. E as três trabalhavam para os ingleses. Minha mãe era lavadeira, uma tia era cozinheira, e a outra, arrumadeira. Conseqüência: alguns costumes da minha casa eram ingleses. Não a comida, que era portuguesa, brasileira e italiana: arroz, feijão, bife, batata, pratos muito simples. Macarrão, então, era só uma vez por semana! Não se comia carne todos os dias, só na quinta-feira ou no domingo. Era uma vida muito restrita. Mas todos os dias, às cinco horas, nós tomávamos chá. Fazia muito frio naquele lugar, de modo que um chazinho caía muito bem! E as geléias? Elas eram o meu xodó! Minha tia Luiza, que gosta muito de cozinhar, faz geléia de morango até hoje! Minhas tias aprenderam a fazer bolo e ensinaram a minha mãe – que lavava a roupa dos ingleses lá em casa mesmo. Hummm, aqueles bolos... eles eram feitos com passas e outras iguarias pouco comuns entre os operários do Brasil daquele tempo. Pra você ter uma idéia, o bolo inglês verdadeiro era muito complicado. Ele não era feito com manteiga, era feito com sebo! Esse é o segredo do bolo inglês legítimo. Minhas tias guardavam o sebo retirado da carne de vaca, de galinha, e depois coavam. Iam guardando de pouquinho em pouquinho na geladeira, pois, diferentemente dos brasileiros, os ingleses tinham geladeira a querosene! Depois de prontos, os bolos eram guardados em latas. Mesmo os bolos de fubá que minha mãe fazia, ela guardava dentro de latas, como os ingleses. Iaparaaescolaepertodascincohoraseuqueriasair correndo, dizia que tinha que voltar para casa para tomar chá. Meus amigos davam muita risada: Tomando chá, Sônia?! Como tínhamos costumes ingleses sem sermos ingleses, as coisas foram mudando. Primeiro, era às cinco em ponto. Depois, foi passando para as quatro e meia, as quatro, as três. Hoje o horário do chá não importa, mas o costume permaneceu. Contrastando com toda essa influência européia, a mãe do meu pai era neta de índios. Então, essa minha avó Antonia, mãe do meu pai, casada com meu avô Alfredo, tinha remédio pra tudo. Ela curou muita gente. Qualquer problema, lá íamos nós recorrer às suas ervas. Algumas eram consumidas em forma de chá, outras eram maceradas e ficavam curtindo na pinga. Só que ninguém marcou, ninguém registrou como se faziam esses remédios. Então eles foram perdidos. Eu lembro apenas que havia muito chá feito com limão. Como em Paranapiacaba fazia frio, tinha muita chuva e era muito úmido, vivíamos resfriados. Sarávamos com o tal chá de limão. Havia também as simpatias. Algumas delas eu descobri que eram de origem judaica -talvez porque meu avô Alfredo fosse um português com todos os traços de judeu. Quando participei da montagem do musical judaico O Violinista no Telhado (1992), começaram a me explicar algumas coisas e eu pensava: na minha casa sempre se fez isso. Por exemplo, quando alguém morre na casa, cobrem-se todos os espelhos. Outro: não se deixa guarda-chuva aberto dentro de casa, de jeito nenhum. Outro costume semelhante era o de enterrar as pessoas com mortalha. Fazíamos um pouco diferente da tradição – se vê que era uma coisa já adaptada. Não era a mortalha branca com que se envolve o corpo, depois de tirar toda a roupa e lavar a pessoa. Não era assim, mas todo mundo era lavado antes de ser enterrado. Uma das minhas tias, a Eduvirges, era a pessoa que cuidava disso. Quando morria alguém na cidade, chamavam-na para lavar o corpo. Ela ia, dizendo que isso era uma obrigação a que a gente não podia se negar. Então, lavado o corpo, punha-se uma roupa limpa e depois se punha a mortalha – um manto de cetim – por cima da roupa. Os homens não, mas as mulheres eram todas enterradas com mantos de cetim que cobriam sua cabeça. As velhas de roxo ; as virgens de azul-claro. Quando era enterro de criança, um anjinho, o tecido era branco. Na beirada do manto eram colocados galões, os mesmos que se punham no caixão. Galões dourados e prateados, vagabundos, coitados! A loja de tecidos de Paranapiacaba vendia esses tecidos e esses galões. Minha avó paterna, Antonia, fez a família prometer que não iria enterrá-la sem o manto! Além dos meus avós e das minhas tias, havia também os tios. Um deles, o tio Jorge, tinha uma profissão especial: era projetista de cinema. Naquele tempo, em Paranapiacaba havia dois cinemas. Tudo muito precário. Pra você ter uma idéia, tinham de interromper a sessão para colocar o segundo rolo do filme. Uma das salas, o Lira Serrana, ficava na parte mais rica, pertencente à comunidade dos ferroviários. A outra ficava no lado mais pobre, no morro, atravessando a ponte. Esse meu tio era o projetista do cinema mais pobre, o Flor da Serra. As latas com as fitas vinham no trem e cada filme ficava dois dias em exibição. Segunda e terça era um; quarta e quinta, outro; sexta, sábado e domingo, outro. Três filmes por semana em cada cinema. Mas não era nada muito organizado, não. Quem fazia a programação eram os projetistas, e eles escolhiam os filmes que bem entendiam. E é claro que não havia ninguém que conhecesse arte, por exemplo, que tivesse algum critério. Então era uma loucura! Você via de faroeste a Macbeth. Tudo em função do título do filme, de algum artista famoso, essas coisas. Iam uma vez por mês a São Paulo, faziam a programação e voltavam. Aí a distribuidora se encarregava de mandar os filmes, de trem, até Paranapiacaba. Eles entregavam e levavam de volta os que já haviam sido exibidos. Então, eu ia na segunda-feira no Flor, e na terça, na Lira. Na quarta ia na Flor, na quinta, na Lira. Na sexta eu ia na Flor, no sábado, na Lira. E no domingo eu escolhia qual ver de novo. Ia todos os dias ao cinema, me criei naquele ambiente. Sete anos seguidos, dos sete aos catorze! A não ser que estivesse doente ou que chovesse demais. E ia sozinha, mesmo à noite, porque não havia perigo algum. Eu lembro do filme Besta Humana, com o Jean Gabin. Tinha uns seis ou sete anos quando assisti. Quando contei pra minha professora que eu tinha visto, ela falou: O que é isso? Menina não pode ver esse filme! Mas eu via de tudo. Papai dizia assim: Deixa ela ver! Ela aprende. O que não interessa, ela não vai entender. Verdade. Olha como ele era adiantado pra época! Quando era relação sexual, que eu não sabia o que era, pensava: por que será isso, por que eles vão deitar? Eu não tinha a menor idéia do que era. Custou pra eu entender do que se tratava. Então não me fazia nenhum mal. O que eu não entendia, passava. E o que eu entendia era maravilhoso: E o Vento Levou, os musicais da Metro! Conhecia todos os faroestes, todos os mocinhos, todos os bandidos. Quando descobri que era tudo mentira, que decepção! Os índios não eram retratados de forma justa, eram sempre maus, horrorosos, e os cowboys, maravilhosos! Onde já se viu? Quando fui estudar a História da América foi que eu vi que os índios eram as vítimas. A mesma coisa aconteceu com os filmes ingleses sobre a colonização da Índia. Eu achava que os ingleses eram os salvadores da pátria! Mas não importa. O cinema me despertou para uma porção de coisas também. Havia muita peça de teatro transformada em filme, por exemplo. Quando comecei a fazer teatro amador em Santo André, já sabia que havia algo melhor sendo feito fora do País. Capítulo II Frutas Silvestres Frutas silvestres. Vermelho intenso. A cor da vida e das descobertas mais marcantes. A cor da juventude. Eu falei do cinema em Paranapiacaba, mas havia também grupos de teatro. Grupos um pouco diferentes, pois eram formados apenas por homens. Na história do teatro não foram poucos os períodos em que apenas os homens encenavam. Mas pensar nesses termos em pleno século XX! Pois era o que acontecia lá. Mulher de respeito não fazia teatro e, quando era necessário contratavam uma atriz, que só aparecia perto do dia de apresentar. Funcionava assim: o grupo escolhia um texto que tivesse só um papel feminino. Eles ensaiavam os papéis masculinos todos e, a certa altura, iam até a Casa Teatral e contratavam uma atriz para fazer o espetáculo. A atriz já sabia todos os textos de cor, porque eram sempre os mesmos! Ia na véspera, ensaiava, e apresentava na noite seguinte. A Casa Teatral era uma casa de aluguel de roupas para teatro. Um dia, já moça, fui até a loja e reconheci a atriz que se apresentara tantas vezes na nossa vila. Chama-se Elvira de Camili. Falei que me lembrava dela de menina, quando ela fazia espetáculos em Paranapiacaba. Acho que a lembrança permaneceu forte porque quando ela se apresentava, ficava hospedada na casa da minha avó. Eles a acomodavam no quarto da atriz, e colocavam lá as melhores coisas. Porém, procuravam não ficar íntimos dela, não, porque não era de respeito. Olha que loucura! E eu me criei com essa história na cabeça. Quando eu dizia pro meu avô: será que eu posso ser atriz? A resposta era sempre a mesma: Não. Na minha família, não. E olha só: as filhas deles, as minhas tias, tinham nomes de atriz: uma se chamava Elvira, por causa da Elvira de Camili, e a outra era a Cremilda, por causa da Cremilda de Oliveira, duas grandes atrizes da época. Em sua homenagem ele pôs o nome nelas, mas as filhas não podiam trabalhar nessa profissão. E quando eu tinha uns quinze anos, fui conversar com um outro grupo de Paranapiacaba, também só de homens, e eles disseram: Não, nós não podemos te aceitar. Quando você crescer mais, vai entender por que. E entendi... Quando fui tirar meu registro profissional, entendi perfeitamente. Tinha acabado de me formar na Escola de Arte Dramática, era atriz profissional, com direito a registro, né? Então eu tinha de ir à Polícia Federal. Fui tirar minha carteira de atriz, que guardo até hoje. Cheguei no balcão, disse o que queria, e alguém falou assim: é no guichê número tal. Fui lá, aquele deserto. Tinha só um sujeito lá no fundo da sala: Ei, o que você quer? Quero tirar a carteira. Trouxe atestado de saúde? Não. Mas como quer tirar a carteira sem trazer o atestado de saúde, menina? Pode ir embora! – Eu fiquei brava e falei: Mas na escola eles não me disseram nada disso! – Ele levantou e falou: Que escola? Escola de Arte Dramática! Ah!... Espera um pouquinho, eu já te atendo. Aí foi lá, fez todos os documentos e me trouxe. E aquele documento que o senhor queria? – perguntei. Esquece. É que esse é o guichê de prostituição, a gente faz o registro das putas e das atrizes! Isso em 1960 e pouco! Você acredita? Imagine quando eu decidi que queria ser atriz, a reação da minha família! Na verdade as coisas foram acontecendo aos poucos. Meu pai, mesmo sendo operário, tinha uma visão de vida impressionante. Uma vez, quando eu ainda era pequena, ele me falou: Sônia, como você tem esse defeito na perna, não vai poder trabalhar como operária. Não pode operar uma máquina, por exemplo. Tem de trabalhar em outra coisa e, para isso, vai ter de estudar. E como eu gostava de estudar, não foi assim nenhum sacrifício. Meus estudos artísticos começaram com a música. Fazia aulas particulares de piano na casa da professora. Uma hora por dia. Meu pai pagava aquilo com muito sacrifício. Um dia comentou: Uma hora de estudo é muito pouco. Você precisa estudar mais! Eu vou comprar um piano para você. Mas com que dinheiro?! Coitado, trabalhava como pintor, vivíamos em condições bastante difíceis. Foi quando o prefeito de Santo André colocou à venda o seu piano de cauda. O instrumento tinha sido atacado por cupins e, quando isso acontece, o valor cai bastante. No caso, não tinha mais cupim, por causa de um tratamento que fizeram, mas o piano estava desvalorizado. Então o prefeito de Santo André vendeu aquele piano por um preço muito baixo. Ofereceram para a professora e, dentre as várias alunas, ela ofereceu para mim. Falei para o meu pai e, é lógico, ele não tinha o dinheiro. Todavia, justamente naquela ocasião, como num passe de mágica, apareceu um prédio para ele pintar. Então ele foi à casa de tintas e fez a seguinte proposta: Peguei um prédio para pintar e não tenho dinheiro para comprar as tintas. Posso te pagar quando acabar de pintar o prédio? É que minha filha está estudando e eu preciso comprar um instrumento para ela. Como ele era um bom freguês da loja, disseram que meu pai poderia pagar aos poucos – naquele tempo ainda não havia crediário. Vai daí que ele retirou a tinta dessa loja, trabalhou aqueles meses todos pintando o prédio e, com o dinheiro da pintura, comprou o piano. Depois, com outro trabalho, pagou as tintas. Tenho o piano até hoje... Fiz o possível para honrar o esforço de meu pai estudando com dedicação. Aquele objeto, para mim, é bem mais que um instrumento. Quando olho para ele vejo o amor, a confiança depositada no meu talento, a vontade apaixonada de que os filhos tivessem um futuro digno. Meu piano está impregnado de muitas histórias. Engraçado que tenho em casa móveis e objetos de várias idades e procedências. Gosto de imaginar a história contida em cada um. Gosto de tomar café nas xicarazinhas de porcelana japonesa, quase transparentes de tão finas. Admirar a beleza de uma bacia de louça que resgatei de um sítio, onde servia de bebedouro para os animais! Meditar contemplando os móveis feitos à mão por meu avô para o seu casamento. Hoje tudo parece descartável, sem importância! As coisas vêm e vão, ao sabor da moda... No entanto o ser humano precisa de âncoras, de lastros para se construir como pessoa. Meu piano, enfim, é um de meus lastros. Plantado na sala como as velhas árvores, me lembra constantemente quem eu sou, de que material fui feita. Com certeza os estudos de instrumento e de canto foram muito importantes para o meu futuro profissional como atriz. Porque eu não sou só atriz, sou professora também! Lembra que meu pai insistia para que eu pensasse no meu futuro? As coisas foram acontecendo mais ou menos assim: até o ginásio, que durou cinco anos, eu ainda morava em Paranapiacaba e pegava o trem para estudar. A linha para Santo André era a Santos – Jundiaí, ex-São Paulo Railways. Eles davam um passe de primeira classe para os quatro ou cinco estudantes que faziam o ginásio na cidade vizinha. Quando terminei o ginásio, em 1950, meu pai se aposentou e nós nos mudamos para Santo André. Mais viagens, pois comecei a estudar em São Paulo. Quer dizer, nunca estudei no mesmo lugar em que morava! Foi muito difícil para mim, senti demais a mudança. Pudera! Antes eu morava no paraíso! Na nova cidade, fomos morar na casa do meu avô, enquanto se construía a casa do meu pai. Ficava na Vila Bastos, perto do centro. Agradável a casa, mas eu não queria me separar da minha gata. Então, quando eu saí de Paranapiacaba, foi um terror, ela fugiu! Nós a colocamos no caminhão, ela se assustou e chegou a rasgar minha mão para fugir. Eu não queria sair, queria ficar lá até que a gata aparecesse. Como nossa família era unida, e as crianças muito bem tratadas, meu tio João Baeta, natural de Campinas, muito carinhoso, se prontificou: Pode ficar sossegada que eu levo a gata para você. Ele passou a freqüentar a casa vazia e a colocar comida para a gata – porque os gatos sempre voltam para casa. Então a gata foi ficando amiga do meu tio, que até mandou construir uma casinha pra ela. Quando ela estava bem acostumada, meu tio a pegou, pôs numa gaiolinha, cobriu com um pano, e veio trazendo no trem. Era proibido levar animais no trem, então ele a escondeu para levar pra mim. Foi aquela felicidade! Quando o bichinho chegou em Santo André, a gente fez uma simpatia. Cortamos a ponta do rabo da gata e colocamos embaixo do pé da mesa. Ela via a pontinha do rabo no pé da mesa e voltava, nunca ia embora, por causa do rabinho! Nós a deixamos fechada em casa por uma semana, só depois abrimos a porta. Ela foi acostumando e nunca mais deu problema! Fomos os terceiros da família a vir de Paranapiacaba para Santo André. Meu avô morava numa rua paralela à avenida Portugal, entrando pela rua da Companhia Telefônica. De vez em quando passamos lá, ainda hoje, para olhar. Tinha tantas árvores! Meu avô era português, de modo que fazia horta, mantinha um pomar, criava porcos, coelhos, galinhas. Ele era pintor e carpinteiro, tinha uma oficina que era uma loucura! Tudo o que você pode imaginar tinha naquela oficina. Uma bancada de madeira com as latas de tinta, os pincéis, pregos e todas as ferramentas. Foi ele quem fez os móveis de que falei. Uma cômoda belíssima, por exemplo. Fez a cômoda, a cama, o guarda-roupa. A parte de entalhes ele mandava fazer em São Paulo. Se você olhar bem, vai ver que não tem nenhum prego, é tudo feito por encaixe de madeira, sem parafusos. Uma obra de arte. Quando nossa casa terminou de ser construída, nova mudança. Era um lugar muito bonito, com um quintal bem grande, também em Santo André. E como eu queria fazer Magistério, fui estudar em São Paulo, Escola Normal Padre Anchieta. Foram três anos de colégio e um ano de aperfeiçoamento. Era difícil,não vounegar. Naqueletemponão havia quase ônibus, como hoje. A gente andava muito a pé e de trem. Havia linha de ônibus para São Paulo, mas parava de funcionar muito cedo. Então a ligação de ônibus com São Paulo estava praticamente cortada à noite. Quando queria ir ao cinema, ia de dia. E quando precisávamos voltar à noite, o último trem saía da Estação da Luz às 23h28! Estudei quatro anos, me formei professora. Tudo isso para poder fazer teatro, que era o que eu realmente gostava de fazer. Ou seja, tive de esperar os 21 anos para poder fazer teatro! Fui a um advogado e perguntei se eu podia seguir a carreira. Ele disse: você já tem 21 anos, pode fazer o que quiser. Na verdade, eu tinha perguntado antes, já sabia que só depois de 21 anos eu poderia me emancipar. Então eu esperei, me formei professora, ganhei cadeira prêmio e comecei a dar aula imediatamente. Naquele tempo um professor ganhava muito bem, não era esse horror de hoje! Pra você ter uma idéia, as professoras andavam bem arrumadas, iam ao cabeleireiro semanalmente, faziam as unhas. Andavam com as bolsas de couro combinando com os sapatos. Era um nível de vida diferente. Não que eu repare ou faça conta disso. Estou citando que é pra gente perceber a decadência que foi tomando conta da educação e, por conseguinte, do prestígio do professor. Pois bem, quando completei 21 anos, esperei que terminássemos o jantar e falei pro meu pai e pra minha mãe: Vou fazer teatro. Minha mãe respondeu: Enquanto eu for viva, não. Não há problema, eu saio de casa – Foi aquela surpresa! Como? Eu vou morar numa pensão, já fui até saber o preço. O que eu ganhava dava pra pagar a pensão e ainda sobrava dinheiro. Imagine se hoje isso se-ria possível! Não daria pra se manter, que dirá pagar pensão! Foi aquela choradeira, aquele escândalo. Aí o meu pai falou assim: E se eu fosse com você aos ensaios? Por mim tudo bem – eu respondi. Eu vou, acompanho os ensaios, não tem problema. A menina gosta de teatro, deixa ela fazer. Ela já se esforçou tanto, fez o magistério, já se formou! Porque quando eu era menina e falava que que-ria fazer teatro, ele me recomendava: Você pode fazer teatro, mas precisa ter uma outra profissão, porque teatro não dá dinheiro, e você vai precisar se manter! Então eu perguntava: O que é que o senhor quer que eu estude? Farmácia. Não! Eu detesto isso! E do que é que você gosta? Gosto só de teatro. Então você pensa numa outra coisa e me diz. Então eu pensei, e vi que o curso normal era o mais rápido: você terminava o ginásio, fazia o tal curso que correspondia ao colegial, atual Ensino Médio, e já saía de lá com uma profissão. Foi o que eu fiz. Em seguida, fui cuidar da minha carreira teatral. O primeiro passo foi procurar o senhor Antonio Chiarelli, diretor da Scasa – Sociedade de Cultura Artística de Santo André. Bem, pra começo de conversa, o teatro da cidade deve muito àquele homem. Ele tinha nascido no Brás, no começo do século 20, e começara a fazer teatro nos anos vinte. A colônia italiana se reunia em vários grupos, chamados filodrammatici, e faziam teatro em sua língua de origem, quase sempre como forma de propagar seus ideais políticos. O senhor Chiarelli chegou a formar um grupo desses lá no Brás. Nos anos 40 mudou-se para Santo André e integrou o Grupo Cênico do Clube Atlético Rhodia, que foi pioneiro na cidade, e, em 1953, fundou, com alguns companheiros, a Scasa. Ou seja, um ano depois de fundada a Sociedade, eu estava trabalhando nela. Minha primeira peça foi Chapeuzinho Vermelho, eu fazia uma fada. Daí pra frente não parei mais. Meu pai, coitadinho, me acompanhava em todos os ensaios. Ficava sentado e tinha vez que até dormia! Ensaiávamos até onze horas, meia-noite, e ele lá. Acabou virando amigo de todos os meus amigos, né? Ele falava que estava tomando conta de mim. Era assim mesmo que se falava naquele tempo: tomar conta. Como se a mulher não fosse capaz de gerir a sua vida. Quando fiquei noiva do Aníbal Guedes, meu futuro marido, meu pai falou: Olha Guedes, agora eu vou passar pra você. Agora você toma conta! Meu noivo também era de teatro. Fazíamos parte da SCASA (Sociedade de Cultura Artística de Santo André). Era um grupo amador, daqueles que zelavam pelos bons costumes. Em seu repertório não havia palavrões, nem nada que pudesse ofender. Eram peças para a família. Não havia nem beijo em cena. Só depois que me casei, aos 27 anos, podíamos fazer cena de beijo – no rosto! Ensaiávamos dois ou três meses e fazíamos poucas apresentações – às vezes uns três ou quatro finais de semana apenas. Não havia temporada de terça a domingo, por exemplo – não havia público para isso. De modo que, quem fazia teatro, não esperava viver daquilo! O combustível principal era a abnegação! Só a persistência e o amor à arte nos mantinham trabalhando, sabe? E levei aquela vida por catorze anos. Atriz, assistente de direção, até ponto eu fui! Queria fazer tudo, saber de tudo, ter noção de cada detalhe. Cheguei a trabalhar em circo com o ator Nino Nello! Aquilo era uma necessidade pra mim. Porque eu queria mais! Fazia parte da Scasa, fazia teatro, tudo bem, mas, lá pelas tantas, comecei a ver que não era possível continuar fazendo teatro com aquelas peças. Eu queria coisas melhores para fazer. Assistia a alguns filmes e pensava: é claro que esse filme é uma peça de teatro adaptada para o cinema! Então deve haver um outro tipo de teatro, diferente desse que estou fazendo. E eu não conhecia nada! Era muito frustrante aquilo. Um dia, eu estava dando aula, apareceu na minha escola um vendedor de livros. Vendia coleções. Comecei a folhear os volumes e, de repente, encontrei um Shakespeare. Como não sabia nada de teatro, pensei: acho que Shakespeare é um autor teatral... Pedi para o vendedor me mostrar toda a coleção. Abri um dos livros e vi que era realmente teatro. Comprei a coleção toda. Ele ficou abismado em saber que alguém queria comprar aquela coleção. Estava encalhada, ninguém nunca se interessara por ela. Comprei todo o Shakespeare e também o Bernard Shaw. Me encantei, foi um mundo que se abriu. Pensava: Como isso é maravilhoso, é isso que eu quero fazer! A oportunidade surgiu quando montamos o espetáculo Colégio Interno. Com ele ganhei o prêmio de atriz coadjuvante e, conseqüentemente, a bolsa para cursar a EAD de São Paulo. Foi assim: a Comissão Estadual de Teatro promoveu o I Festival de Teatro Amador e ofereceu, como prêmio para algumas categorias, uma bolsa de estudos para a EAD. Eu queria muito cursar a Escola, mas não podia, pois estávamos passando por uma situação bastante difícil. Comentei a respeito disso com o Najib Elchmer, o então presidente da Comissão, e ele prometeu que, se sobrasse uma bolsa, me daria. O Luiz Carlos Arutin ganhou como melhor ator e aceitou a bolsa. A Luzia Carmela ganhou como melhor atriz, e também aceitou. Como havia uma bolsa para diretor e o ganhador desistiu, a bolsa ficou para mim! Foi assim que aconteceu minha entrada na EAD. Logo de cara fiz amizade com a Luzia. Ela era do interior, não tinha família em São Paulo, Guedes e eu a convidamos para morar em nossa casa enquanto durasse o curso. Ela foi uma grande companheira. A bolsa que a Escola nos dava era muito pequena, menos que um salário mínimo, portanto não daria, nem de longe, para cobrir um aluguel, comida, transporte. Às vezes ficávamos cinco ou seis meses sem receber, depois recebíamos tudo de uma vez, de modo que não podíamos contar com aquele dinheiro como coisa certa. A Luzia não tinha uma profissão que pudesse garantir o seu sustento, então combinamos que ela nos ajudaria em casa, como contribuição. Não era empregada, era uma amiga. Enquanto eu ia lecionar, ela cuidava da Kátia com carinhos de mãe. Durante três anos levamos essa vida. À noite íamos todos juntos para a escola. Dividíamos o que tínhamos, e o que tínhamos era muito pouco – uma batata, às vezes. Parecia uma tragédia! De vez em quando o Ary Toledo aparecia para almoçar. Ou melhor, para compartilhar a pobreza com a gente! Quando ganhei a bolsa de estudos, propus ao meu marido que fizéssemos o curso nós dois. Dessa forma, voltaríamos para Santo André depois de formados e montaríamos um grupo de teatro para fazer somente peças desse tipo! Ele perguntou: Mas só nós dois? Não, arranjamos outros! Ele se animou, e lá fomos nós estudar na EAD. Nesse meio tempo, a Secretaria de Cultura de São Paulo começou a mandar diretores de teatro para o interior, para ver se melhorava o nível. Sim, porque a gente chegava nos festivais e era um horror! As pessoas faziam teatro de maneira intuitiva e precária. Não sei, era tudo muito tosco, mal feito mesmo, desde a escolha do texto, passando pela interpretação caricata, figurinos mal-ajambrados. Todos, enfim, carentes de orientação. Para Santo André mandaram o diretor Ademar Guerra e ele fez um espetáculo com o Antonio Petrin, a Analy Alvarez, a Rosália Petrin, o Osley Delamo. Conheci todos eles lá, quando fui ver o espetáculo com o Guedes. Nós achamos que tinha sido muito bom, uma peça muito melhor do que aquelas que estávamos acostumados a ver. Melhor do que as que eu mesma fazia. Aí eu falei assim para o Guedes: Vamos convidar essas pessoas para fazer a Escola de Arte Dramática? Você está louca? Então todo mundo tem que fazer a Escola para poder fazer bom teatro? Você vê como a gente aprende, como é diferente. É muito melhor quando se estuda! Terminado o espetáculo, fui lá falar com eles. O Petrin se interessou muito. Naquela época ele já era casado com a Rosália, a Mônica e o Marcos, seus filhos, já eram nascidos também. Mas a gente não sabe nada da escola, como a gente faz? A gente explicou tudo para eles e nos prontificamos a prepará-los, porque era preciso fazer um exame prático para entrar. Então eu dei algumas aulas, falei sobre História, e o Guedes deu aulas de mímica e expressão corporal. Nós os preparamos e eles passaram no exame, o que era raro. Entraram o Petrin e a Analy. Depois o Guedes repetiu de ano e acabou ficando na turma deles. Trabalhávamos durante o dia e tínhamos aula à noite. O Guedes era protético, eu trabalhava como professora, o Petrin era desenhista, e a Rosinha trabalhava na Antarctica. Todos nós tínhamos de manter outro emprego. Cheguei a me aposentar como professora, pra você ter uma idéia. Isso nos garantia o básico. Até hoje é assim, porque tenho duas aposentadorias, uma como professora e outra pelo teatro. É uma segurança, pois garante o condomínio, o telefone... Passado tanto tempo, quanta gente ainda faz teatro e, paralelamente, tem de se manter por meio de outra atividade? Esse foi um período riquíssimo na minha vida. Fazer teatro, finalmente, estudar, me casar e ser mãe. Kátia foi um verdadeiro presente. Uma menina inteligente, esperta, amorosa. Nem os problemas de saúde que também ocorreram com ela foram capazes de impedir o seu desenvolvimento. Veja como o destino é uma coisa curiosa. A mesma enfermidade que eu tivera quando criança acometeu também minha filha. Naquele momento descobrimos que era um defeito congênito e, no caso da menina, ele se manifestara não em um, mas nos dois pés! Foi um caso bem mais difícil que o meu, ela sofreu muito mais. Foi bravíssima, deu uma lição em todos nós! Freqüentou normalmente a escola, não perdeu nenhum ano, nem quando precisava passar por cirurgias. Felizmente a medicina estava mais desenvolvida na sua época, de modo que o resultado foi melhor que o meu. Ela não perdeu os movimentos, só ficou com uma pequena diferença de tamanho nos pés. Naquela época minha vida se dividia entre as aulas que eu ministrava no Estado, os cuidados com a criança, o estudo na EAD, as montagens teatrais, minha casa. Lembrando agora, não sei como conseguia... A própria Kátia, pobrezinha, teve sua cota de sacrifícios: levávamos a menina conosco aos ensaios sempre que precisávamos. Bem, não foi à toa que, mais tarde, ela também seguiu a carreira artística... Capítulo III Assam Assam indiano. Chá preto, forte, mas com um fundo suave e delicado. Parece o artista. Batalhávamos, suávamos a camisa, tínhamos de ser duros para poder agüentar a rotina. E, uma vez nas aulas, nos entregávamos sem reserva, oferecendo nossa parte mais sensível e preciosa, matéria da criação. Antes de fazer a EAD, eu conhecia só aquele tipo de teatro feito no TBC, Teatro Brasileiro de Comédia. Um teatro mais tradicional, com interpretações mais empostadas e uma produção bastante cuidadosa. Esse era o modelo que tínhamos. Todos que faziam teatro naquela época queriam alcançar o resultado de um TBC. Tanto que, mesmo com a criação do Teatro de Arena, muitos de nós continuávamos a almejar o padrão europeu. Eu, por exemplo, achava que o Arena não fazia teatro, porque era uma coisa muito pobre! Só fui ter a verdadeira dimensão da sua proposta quando o ator e dramaturgo Chico de Assis, foi com o CPC (Centro Popular de Cultura) para Santo André, apresentar para os metalúrgicos. Depois de assistir àquilo e acompanhar as discussões, um novo mundo se abriu diante de mim, algo que eu nunca tinha imaginado. Aquilo virou completamente a minha cabeça, tanto que sou uma das fundadoras do CPC de Santo André. Fiquei deslumbrada com as idéias deles, com um teatro de esquerda. Propunham uma reflexão sobre o homem brasileiro, sua história, o entendimento de uma série de fenômenos que estavam ocorrendo e que era preciso que fossem transformados. Desfez-se a aura que envolvia o TBC. Como eu era ingênua... Bem, ingênua sou até hoje. Entro de sola, acredito, sou romântica. Lembro que, quando tive a primeira aula sobre marxismo, cheguei em casa e fiquei muito séria olhando o piano. Falei pro Guedes: A gente vai ter que dar embora o piano que o meu pai me deu. Por quê? Porque se a gente tem de dividir tudo com as pessoas que não têm as coisas, nós temos que dividir o piano com todo mundo. Como faremos? Será que ele vai pro sindicato e cada um estuda uma hora? Será que ele fica aqui e as pessoas vêm estudar? Eu tinha trinta anos, não era tão nova! Acreditava na divisão. Para mim, o comunismo era o cristianismo aplicado. De modo que também não escapei da desconfiança do Estado. Uma noite eu voltava sozinha para casa, empurrando o carrinho da Kátia, vinda de um ensaio da peça Eles Não Usam Black-tie, no CPC, com direção do Chico de Assis. Fui barrada por dois homens. Um terceiro, que eu conhecia, era o guarda-noturno da nossa rua, que só ficou olhando de longe. Mandaram tirar a Kátia, toda engessada, do carrinho, e começaram a jogar suas roupinhas pelo chão. Na certa queriam provas, material subversivo – e eu perguntando o que era, que eu não tinha dinheiro, pensando que eram ladrões! Me olharam muito sérios: Cuidado, dona! Cuidado! – e foram embora. Aí veio o guarda- noturno me consolar, juntar a mamadeira, o leite caindo da lata, as fraldas sujas de terra. E eu aflita: Por que o senhor não me acudiu? Ah, dona, são mais fortes do que eu, são federais! Assim eram aqueles tempos. E era preciso mudálos! Por isso continuamos a fazer teatro com o CPC, trabalhar com o Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André. Foi lá que conheci o Lula e a Mariza, e também sofri algumas vezes com o preconceito. Uma delas foi durante uma excursão para o Rio de Janeiro. Eu fazia Eles Não Usam Black-tie, com o Guedes. Aí já era mais avançado, já tinha abraço, beijo. No ônibus dois ou três metalúrgicos se insinuaram pro meu lado, porque eu era atriz, porque beijava no palco. Achei aquela conversa muito estranha, fiquei séria e fui pra perto do Guedes. Ele me perguntou: O que é que foi? Não sei, eu achei a conversa daqueles dois ali muito esquisita. – Aí meu marido foi lá: Minha esposa falou que achou a conversa de vocês meio estranha, o que foi? – Então eles se surpreenderam: Ela é sua esposa? É, é minha senhora. Ah, desculpe, desculpe, a gente pensou que ela fosse solteira. Veja bem que já estávamos nos anos sessenta e a maneira como uma atriz era encarada não mudara muito desde a minha infância... Fui para a EAD depois de tudo isso. Depois de 14 anos de teatro amador, depois de passar pelo CPC. Minha cabeça já estava mudada quando fui fazer a Escola. Foi quando percebi que era possível unir as coisas. E olha que eu demorei muito pra poder fazer isso no palco. Porque eu fazia aquele teatrão, declamado, com o teatro amador. Depois eu aprendi um teatro muito moderno na Escola, mas ao mesmo tempo muito clássico, com uma voz muito impostada. Então, pra juntar as duas coisas, demorou um tempo ainda. Nossa formação era de tal modo clássica que fazíamos toda a figuração da Comédie- Française, quando vinham ao Brasil. Eu não podia fazer porque os sapatos não me serviam. Fui a única da minha turma que entrou nos vestidos, porque as francesas tinham uma cinturinha assim. Mas não pude participar por causa do defeito. Pedi tanto para o doutor Alfredo: Deixa eu entrar. Eu encho as botinhas de pano, faço qualquer coisa. Ele não deixava, ficava com medo. Então eu ficava só assistindo, ajudava nos bastidores, mas não fui ao palco. Lembro da Cecília, mulher do Umberto Magnani, linda, fazendo figuração em um Molière. Ela era nosso xodó, tinha entrado com 18 anos. O Guedes, o Petrin participaram, também o Alexandre Dressler, todos eles. Falavam uma ou duas falas apenas, porém nos divertíamos muito. Nos divertíamos e estudávamos. E também sofríamos. Eu sofria muito nas aulas de História com o Paulo. O doutor Paulo era sobrinho do doutor Alfredo, ou melhor, casado com uma sobrinha dele. Era um professor muito exigente. Naturalmente ele tinha razão, porque eu não sabia nada e, conseqüentemente, precisava suprir toda aquela defasagem. Mas sofria também durante as aulas, por causa de certos conteúdos. Padeci a vida inteira por causa disso, por causa das injustiças. Como eu sofro com as injustiças! Me descabelo, choro, quero resolver e não é possível. Os processos se repetem na História, são lentos e as pessoas vão aprendendo. E não existem mais mudanças de baixo para cima, elas têm de ser individuais. Eu custei muito para entender isso. O comunismo não vingou, na minha opinião, não pelos ideais que são maravilhosos, mas porque as pessoas são corruptas, são falíveis. As mudanças são individuais, só aí o coletivo pode mudar. Ou seja, o coletivo não consegue mudar o individual. A soma do individual é que vai mudar o coletivo. Então quando o doutor Paulo falava das peças, das injustiças, eu dizia que não podia ser daquele jeito! Lembro de uma vez em que eu e a Gabriela Rabelo tivemos um ataque de choro durante a aula. O professor dizia assim: Meninas burras, chorando por causa de bobagem! Mas não podem fazer isso com as pessoas! Nós continuávamos chorando. Coisas que tinham acontecido na História centenas de anos atrás e ainda não nos conformávamos. Até hoje as injustiças me deixam muito abalada. Acho que é uma ingenuidade que não combina mais com a minha idade. Tenho 73 anos e ainda não aprendi... Lembro que naquelas aulas nós tínhamos de fazer a análise dos textos. Ele dava um título e cada um de nós tinha de levantar os antecedentes, a época, analisar histórica, dramática e dramaturgicamente. Era muito difícil. Eu não tinha base, por isso eu tinha de estudar tanto. Falavam o nome de qualquer personagem da História e eu não sabia quem era! Tive de procurar, estudar para chegar lá e saber do que estavam falando. Meus pais eram pessoas de boa vontade, mas não havia um livro sequer em casa. Os meus foram os primeiros a entrar lá. Meu pai cursou até o segundo ano primário, minha mãe até o terceiro. Portanto, houve uma falha na minha formação. Na escola tinha gente que havia cursado o Rio Branco, por exemplo. Aqueles sabiam tudo. Mas não posso reclamar, quem sabia me ensinava. A Gabriela me ensinava muito, a Dilma de Mello Silva, que era muito minha amiga também e sabia muita coisa, me ajudava o quanto podia. Eu havia lido bastante na juventude, mas por conta própria, nada muito sistematizado, sabe? Lembro de que, na EAD, todos os livros que a turma citava eu dizia assim: eu já li. Outro livro, eu já li. Uma porção deles. Um dia, o ator, crítico e dramaturgo Alberto Guzik, que era da minha turma, virou pra mim e falou: Eu não agüento mais! Porque eu leio, leio, leio e nunca consigo alcançar o tanto que você já leu! Aí eu respondi: Quantos anos você tem? Vinte e três. Pois eu tenho trinta e três. Ou seja, eu tenho dez anos a mais de leitura! Não é que eu leio mais, é que leio há mais tempo! Olhando para trás, posso dizer que foi a fase mais dura da minha vida. Puxa, quanta necessidade o Guedes e eu passamos. O que nos salvou, inúmeras vezes, foi a sopa oferecida pelo doutor Alfredo. As aulas começavam às sete, sete e meia, então não dava tempo de ir para casa e comer. Como grande parte dos alunos saía direto do trabalho e ia para a aula, o doutor Alfredo, preocupado, resolveu servir uma sopa. Então, o que nos sustentava era o sopão e o pãozinho da Escola. Várias vezes fui até sem almoço para lá, na esperança de tomar aquilo como alimento do dia todo. Era uma época muito difícil. Engraçado como nada daquilo atrapalhou o estudo – a gente conseguiu sobreviver. A fome não mata ninguém. A não ser que não se coma nada mes mo. Mas a pouca comida não mata. Nem o peso de trabalho, nem a pouca comida. A fase dos nossos estudos coincidiu com a quase absoluta falta de dinheiro. Além de comer mal, a gente se vestia mal também. Nunca vou me esquecer de um fato que foi muito marcante. Por causa dodefeito,sempreuseibotasortopédicas.Elaseram – e ainda são – muito caras e feitas sob encomenda. Sem dinheiro, como comprar as botas? Os meus sapatosàsvezeseramfurados.Nãotinhajeito,porque não podia chegar numa loja e comprar um sapato barato. Tinha de ser ortopédico. Bem, aí apareceram umas sandalinhas, bem baratas, e eu comecei a andar com elas. Chine-lo vagabundo, mesmo, porque eu não queria perder aula. Um dia, a Gabriela Rabelo, minha grande amiga Gaby, falou assim: Eu não agüento mais te ver com esses sapatos furados! Vou ver se arranjo alguém para comprar um par de botas! Aí ela conversou com a Bri Fiocca, que era namorada do Zanoni Ferrite, e que depois se casou com ele. E foi ela quem salvou a minha pátria, pois mandou fazer um par de botas para mim, que eu fui pagando em suaves prestações. Você imagina a situação! Livros? Nem pensar! Roupa? As mais simples. Tinha uma amiga grega, a Katherine Halkidoy, que me deu vários vestidos, que eram grandes para mim, mas, na falta de outros, eram o meu figurino diário. O Guedes estava desempregado, os salários tinham achatado, e a Kátia estava em tratamento particular. Tudo ao mesmo tempo. Outra pessoa na nossa situação teria parado. Eu era mesmo louca, não admitia parar a Escola de jeito nenhum. Estudava domingo, estudava de manhã, tanto que um dia minha mãe saiu com essa: Sônia, que coisas vocês andam fazendo em casa? Como que coisas? Vocês andam falando umas coisas muito feias... Não, mamãe, o que é isso? Nós temos a menina pequena. O que a senhora acha que nós estamos fazendo? Ela disse: Manda a Kátia falar. Kátia, fala pra mim o que você falou para vovó. – A menina falou: Essa carne muito e muito poluída... Ou seja, a gente estudava, e estudava, e estudava, e ela decorava com a gente! Aquele era um trecho do Hamlet. Imagine! No final das contas, conseguíamos achar graça em muita coisa! Falei das aulas do Paulo. As aulas de voz também eram difíceis. A professora Maria José era muito exigente. Eu tive sorte porque já tinha estudado canto, de modo que, quando fui para a EAD eu já tocava, já tinha o piano, já cantava. Depois chegou a Mylène Pacheco, uma outra professora de voz, também muito boa. A Chinita Ullman era uma professora fabulosa. Foi em suas aulas de Expressão Corporal que eu consegui desenvolver um bocado minha perna. Eu vou dar um jeito, você vai fazer alguns exercícios – ela falou. Punha uma cadeira perto de mim e, quando eu perdia o equilíbrio, segurava na cadeira. Assim fui desenvolvendo. Minha perna melhorou bem depois dos exercícios. Fizemos várias montagens durante o curso. Caiu o Ministério, do França Júnior, por exemplo, é uma de que me lembro com carinho. O doutor Alfredo fazia umas apresentações de cena também, trechos de peças especiais. Fiz muito bem a Lady Macbeth. E fiz também Hamlet, o próprio. Me lembro também d’A Casa de Bernarda Alba, que foi no último ano. Apesar das dificuldades, a EAD foi uma das épocas mais felizes da minha vida. O mundo, o universo inteiro se abriu diante daquela menina ingênua. E ele era bem maior do que eu havia imaginado, muito mais rico, povoado de sonho e magia. Definitivamente, era esse o caminho que eu queria trilhar. E continuei trabalhando como professora, como já disse, para poder viabilizar os projetos em teatro. Da minha turma, mantenho contato com a Gabriela Rabelo e o Alberto Guzik. Faleceram a Luzia Carmela, o Luiz Carlos Arutin, o Zanoni Ferrite. Também o Guedes, meu marido, meu companheiro, faleceu em 1970, aos 38 anos. Enfarto. Foi muito duro. Eu não estava preparada praquilo, simplesmente não sabia viver sem ele. Não conseguia andar na rua, tão abalada fiquei. Guedes fora meu amigo, meu primeiro homem, solidário, cúmplice de todos os meus sonhos. As primeiras experiências teatrais, os estudos que fizemos juntos, a organização de um grupo em Santo André foram algumas das coisas que compartilhamos. De repente o palco ficou vazio. E eu estava sozinha, bem no centrodele, comtodasas luzesacesas sobre mim. O público esperando. Esqueci as falas, perdi a marcação dos movimentos. O que fazer? Por uns bons tempos improvisei. O teatro nos ensina. E infelizmente precisou me ensinar outra vez, anos mais tarde, repetir a mesma situação de perda! Capítulo IV Melissa Tem tido noites insones? Está passando por um momento difícil e delicado, que exige de você muita calma e serenidade? São muitas as atribulações? Eu recomendo melissa. É o tipo de planta que todo mundo deveria ter em casa, num vasinho, pras emergências. Além de perfumar e alegrar o ambiente com suas florzinhas, é um santo remédio! Nos dias que correm, o que não falta é motivo pra sairmos do sério! Deve ter sido um chá muito consumido nos anos 60 e 70. Pelo menos nós, tomávamos aos litros... Quando concluímos o curso da EAD decidimos fundarumgrupodeteatronoABC.Estávamosem1968, vocêimagine.Cercados,pressionadose,paracomplicar ainda mais, querendo fazer um teatro popular, não-conformista, e que, também em sua forma de produção, não repetisse os esquemas tradicionais. Quando soube de nossa intenção, Heleny Guariba, professora da Escola, veio conversar conosco. Ficou entusiasmadíssima e sugeriu uma estrutura, a partir da experiência que tivera na França: Vocês sabem, eu estudei com o Roger Planchon, em Lyon. Coincidentemente, aquela cidade tem características muito semelhantes às de Santo André. Lyon também é uma cidade industrial, longe de Paris. Santo André, mesmo não sendo tão longe, é fora de São Paulo, não deixa de ser uma espécie de subúrbio. Comentou que Planchon havia fundado o Théâtre de la Cité e sugeriu que montássemos um grupo nos mesmos moldes. Daí nasceu o Grupo de Teatro da Cidade. A idéia inicial era que os próprios moradores da cidade mantivessem esse grupo, pagando mensalmente, vamos supor, dez reais. Formariam outro grupo em São Caetano, outro grupo em São Bernardo, fariam casas de cultura, era esse o projeto. Aí, quem pagava dez reais em São Bernardo tinha direito de assistir a espetáculos em Santo André, a mesma coisa com as outras cidades entre si. Haveria um rodízio de espetáculos e as pessoas pagariam só a sua mensalidade, mantendo o seu grupo. Não seria perfeito? Seria, mas acabou não acontecendo, por força das circunstâncias, algumas delas bastante infelizes. A Heleny era um gênio. Estudara na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e acompanhara a efervescência do teatro paulista do período. Ao voltar de Paris, fora contratada pelo doutor Alfredo para trabalhar na Escola. Guariba era o sobrenome do marido, filho de político famoso na época. Era elétrica, um verdadeiro espeto. Muito bonitinha, dava vontade de pegar no colo. Havia trazido de Paris uma coleção de meias finas, que usava com vestidinhos curtos, parecia uma bonequinha, uma colegial, com aquele cabelinho preto, aquela franja, aqueles óculos. Miúda, lembrava um passarinho. Passarinho? Só se fosse na aparência! Heleny era uma onça, um leão! Combativa, destemida, enfrentava o que fosse preciso. Tanto que entraria para a luta armada. Capitaneados pela Heleny e por seu marido, Ulisses, que figurou como produtor, elaboramos um projeto bastante minucioso e apresentamos, primeiro, à Scasa, da qual eu fizera parte nos tempos amadores. Em seguida, o projeto foi encaminhado à Secretaria de Educação e Cultura da Prefeitura Municipal de Santo André, argumentando-se que o Teatro Municipal, em vias de ser inaugurado, mereceria um elenco constituído por atores de Santo André. Havia um número considerável de atores profissionais ou estudantes de teatro a justificar tal iniciativa. Quem sabe isso estimulasse a criação de outros grupos? Além do que, a produção artística da cidade seria vista em outros locais. É preciso dizer que o senhor Antonio Chiarelli, aquele do Scasa, foi um dos articuladores da construção do teatro. Ele é que alertou o prefeito de que o projeto do Paço Municipal carecia de uma casa de espetáculos. Quando a idéia foi aprovada, íamos os dois visitar as obras, acompanhar o andamento dos trabalhos numa ansiedade tão grande! Parecia que nossos olhos eram também operários, que a nossa vontade também acrescentava a sua porção de concreto naquele monumento. Dada a sua experiência, o senhor Chiarelli pediu para ser consultado na hora de se construir o palco. Não o consultaram. Resultado: duas colunas, sólidas, na lateral da cena. O teatro é famoso pelos seus três palcos, o central e os dois laterais. Acontece que, com aquelas duas colunas atravancando o espaço, quando se quer aproveitar a área total, é preciso criar umas árvores, dar alguma função cenográfica para o problema. Bem, o prefeito na época de nosso projeto inicial era o Fioravante Zampol, mas, se conseguimos a subvenção, foi graças ao empenho do diretor do Departamento de Cultura, Muller de Paiva e Silva. A prefeitura bancaria a produção do espetáculo e, em troca, o grupo se disporia a mobilizar setores da sociedade que, até então, praticamente não conheciam teatro. A arte e a cultura deveriam ser oferecidas como um serviço público. Visitaríamos clubes, escolas, sindicatos, sociedades amigos de bairro e tudo o mais, na intenção de trazer a população ao teatro. Como era comum naquela época, faríamos debates e daríamos esclarecimentos depois do espetáculo, promovendo a integração da população com a cultura teatral. Quantos sonhos! Animaríamos atividades culturais, sessões de cinema, de música, exposições de artes plásticas enquanto espetáculo teatral fosse apresentado em outras cidades da região! Tudo muito bonito. As intenções eram as melhores e estávamos realmente dispostos a trabalhar. Não visávamos a lucro, como a maioria das produções comerciais. Não! Considerávamos que a forma de produção convencional estava falida. Na Europa, o teatro privado estava cedendo lugar ao teatro subvencionado. Achávamos que, somente dessa maneira, a cultura poderia ser democratizada e descentralizada. Então, os cruzeiros que conseguimos de subvenção foram usados para cobrir as despesas gerais com material. Elenco e equipe técnica receberam apenas ajuda de custo – dinheiro pra refeição e trans-porte. Nada mais. Fizemos pelo ideal. Guedes e eu, o Petrin, Antonio Natal, Dilma de Mello, Josias de Oliveira e Luzia Carmela, todos da EAD. Sônia Braga, novinha, veio de São Paulo. Entre os amadores recrutados na região estavam Sylvia Borges, Manoel Andrade, Dilma Maximiliano, Flávio Galeazzo, Otto Coelho, Célio Bronjalo e Ademir Rosa. Até o famoso palhaço Estremilique fez uma participação especial. Decidimos que o primeiro espetáculo da companhia seria Jorge Dandin, de Molière. Um de nossos objetivos era a popularização do teatro, a formação de um público na cidade. Sabíamos, desde os tempos de teatro amador, que a maioria da população não demonstrava interesse, talvez por não ter acesso, pelo teatro e pelas artes em geral. Queríamos, então, que as pessoas criassem o hábito de freqüentar o teatro, assistindo a montagens de qualidade. Aos poucos, formaríamos um repertório de obras substanciais, que promovessem a reflexão crítica e não só entretenimento. Consideramos que uma comédia de Molière seria um bom começo. Faríamos uma montagem à altura do que havia de melhor na capital. Queríamos que nosso trabalho refletisse, ainda que de forma sutil, os problemas políticos, sociais e econômicos da realidade brasileira – mesmo sendo subvencionado. Segundo Planchon, o Estado deveria criar e financiar instituições que pudessem se transformar em agentes de críticas ao próprio Estado! Ao mesmo tempo, precisávamos construir algo que fosse acessível a qualquer tipo de platéia e, principalmente, aos adolescentes, maioria dos espectadores potenciais. Estreamos no dia 18 de maio de 1968. Ninguém menos que Flávio Império assinou a cenografia. Sua proposta, sempre visando a uma abordagem crítica, estabelecia um plano superior para os proprietários, nobres, um plano médio para os comerciantes e um plano inferior para os camponeses. Embora Molière não citasse, em nenhum momento, a atuação dos camponeses, de acordo com nossa concepção, eles deveriam fazer parte da cena. Dandin era um lavrador enriquecido, agora proprietário, que vivia da exploração de suas terras, e os camponeses não apareciam? Flávio criou, então, um painel onde figurava um trigal, e a encenação incluiu um grupo de camponeses que, sem nenhuma fala, realizava seu trabalho enquanto o enredo se desenvolvia. Ou seja, enquanto nobreza decadente e burguesia se entretinham com seus problemas particulares, a classe inferior é que fazia a roda do mundo girar... Um dia, aconteceu uma coisa muito engraçada. A Kátia, minha filha, era uma menina quieta, mas aprontava bastante também. Ela era muito amiga da Mônica, filha do Petrin e da Rosinha. As duas andavam sempre juntas, nós as levávamos a todos os ensaios. Uma vez, quando estávamos em plena temporada, eu olho para trás e vejo as duas atravessarem o palco, de mãos dadas, pé ante pé, olhando para a platéia. Quando terminou, fomos perguntar o que tinha acontecido. Eu não tenho culpa, foi a Kátia que quis atravessar. Ela disse que não tinha perigo, que podia atravessar. Você acha que pode? Depois nós rimos muito, mas na hora eu fiquei assustada! Se ela enveredou para o teatro? Não propriamente. Estudou música. Pensando bem, faz teatro, sim, porque é cantora lírica! Bem, voltando ao Jorge Dandin. Em parte havíamos cumprido nossos objetivos. Construímos um espetáculo crítico, desenvolvemos pesquisa de texto e de interpretação, alcançamos apuro visual e técnico. Apresentamos 34 sessões, recorde para a época. Foi um mês de temporada, quando atingimos um público de aproximadamente sete mil pessoas. Heleny ganhou o prêmio de revelação em direção, pela Associação Paulista de Críticos de Arte. Flávio Império, pelo figurino da montagem, levou o Prêmio Governador do Estado. Um ótimo começo. Mas havia ainda muito a conquistar. A maioria dos espectadores era constituída de estudantes. Inauguramos, no Brasil, a ida de escolas ao teatro. Operários, comerciantes, donas- de- casa, moradores da periferia, que tanto gostaríamos de ver freqüentando o teatro, não compareceram. Não porque não quisessem. É que precisariam se deslocar até o centro da cidade, e isso implicava gastar dinheiro e, veja você, se vestir de forma adequada... Ou seja, em nossa primeira montagem fora da escola, já nos deparamos com questões fundamentais para o exercício do nosso trabalho. Principalmente por que nosso objetivo era bastante claro: chegar ao público não habituado ao teatro. Então, concluído o processo do Jorge Dandin, o que fazer? Heleny chegou a cogitar Lorenzaccio. É um texto belíssimo do Alfred Musset, pesado, profundo. Teríamos estofo para tanto? Estou falando de estofo humano e material. Chegamos à conclusão que não. Em seguida, alguém sugeriu uma adaptação de Rocco e seus Irmãos, de Luchino Visconti, sucesso nos cinemas, para o contexto do ABC. Chegamos a pesquisar o assunto. Encontramos muitas semelhanças entre a realidade retratada no filme, que se passa em Milão, e aquela em que vivíamos. Planejávamos, depois da pesquisa e da reflexão, criar coletivamente o texto, libertos do filme. Mas não tínhamos experiência para tanto. Nem tempo disponível. O drama continuava: o que montar agora? Que tal A Ópera dos Três Vinténs, do Brecht, alguém propôs. Novas esperanças. Mudaríamos o nome para Ópera dos Dois mil Réis, adaptando o texto para a nossa realidade. Convidamos Paulo César Peréio para interpretar Mac Navalha, Damiano Cozzela e Rogério Duprat comporiam músicas especialmente para o espetáculo, independente daquelas compostas por Kurt Weill, e teríamos novamente Flávio Império na cenografia e Heleny Guariba na direção. Embora não gostasse particularmente do Brecht, Heleny sabia da importância dessa obra e enxergava nela uma possibilidade de atuar politicamente junto aos espectadores. Faríamos uma montagem inspirada nos programas de auditório – Chacrinha e Sílvio Santos seriam nossos modelos. E como o Teatro Municipal da cidade não ficara pronto à época de Jorge Dandin, ele seria inaugurado em 1969 com a nova montagem do GTC. Alguns ensaios foram realizados, e nova decepção. O teatro não ficaria pronto a tempo e Heleny se afastou do projeto. Não estou bem certa do que realmente aconteceu. Ninguém sabe ou, se sabe, está bem quietinho, dormindo seu sonho cheio de fantasmas. O caso é que Heleny se envolveu na luta armada. Nós, do GTC , não fazíamos idéia disso – acho que, no tempo em que fez Jorge Dandin, ela ainda não estava comprometida. Enfim, um dia ficamos sabendo de seu desaparecimento. Heleny sumira e ninguém conseguia localizá-la. A primeira e maior suspeita recaiu sobre os militares. Só podia ser isso. Nem mesmo o ex-sogro, com toda a sua influência política, foi capaz de saber para onde fora levada. E até hoje ninguém sabe. Parece que há registros de que chegou a ser interrogada e torturada, e há quem diga que foi jogada no mar, como tantos outros. Saberemos algum dia o que realmente aconteceu? Quem foram os responsáveis por tirar a vida de um dos talentos mais promissores de sua geração? Por arrancar uma colega de seu grupo de trabalho; uma filha, uma irmã, de sua família? Alguém ouviu seus gritos? Alguém levou em conta seus motivos? Desapareceram com Heleny e o prejuízo daquele período negro ainda vai levar um bom tempo pra ser saldado. Acho importante falar dessas coisas, até sob o risco de parecer catequese. Vejo com alegria que o número de grupos de teatro tem aumentado bastante nos últimos tempos. É preciso que saibam que fazer teatro é muito prazeroso, mas também muito difícil. Há um constante atrito entre o que se sonha e o que é possível realizar. Há caminhos aparentemente fáceis, mas que implicam concessões éticas, morais, desvalorização do artista. Há também a questão da escolha do repertório, que não pode ser baseada em modismos ou no acaso. O que, de fato, o grupo quer comunicar? Quais as suas idéias? Que tipo de transformação ele pretende para o mundo em que vive? Porque o teatro diverte, sem dúvida, mas tem de ter um potencial transformador, via discussão, via reflexão. Via coletividade! O coletivo de artistas mais o coletivo do público! No nosso caso, havia um grande sonho coletivo, mas Heleny morreu muito antes de podermos concretizá-lo. De certa forma ficamos órfãos. Petrin e eu assumimos a coordenação do grupo e, em seguida, nos unimos ao José Armando Pereira da Silva, à Naná Bevilacqua, que nos ajudaram muito, e à Rosinha, mulher do Petrin. Graças à intervenção do Muller de Paiva e Silva, tivemos subvenção para a montagem d’O Noviço, de Cidade Assassinada, d’A Guerra do Cansa Cavalo e do Aleijadinho Aqui e Agora. No mais das vezes, tivemos de fazer empréstimo em banco para conseguir montar nossos trabalhos. Escrito dessa forma, parece que tudo foi feito de caso pensado, uma coisa depois da outra, tudo certinho. Mas você já deve ter imaginado que não foi bem assim... O ano de 1969 já corria solto e nada de o tal teatro municipal ser concluído. Não havia nenhuma casa de espetáculos na cidade, apenas um auditório bem precário no bairro de Santa Terezinha. Portanto, aquele projeto de transformar Santo André em pólo cultural da região também parecia ter ficado no papel. Seríamos nós, também, um grupo de um espetáculo só? Ficaríamos em compasso de espera? Não. Resolvemos que era importante manter a continuidade de nosso trabalho e resolvemos deixar de lado projetos mais audaciosos. Escolhemos um texto que, sendo mais simples, tivesse apelo junto ao público que pretendíamos alcançar, e decidimos por uma encenação que pudesse se adaptar aos mais variados espaços: salões, pátios, clubes, auditórios, escolas. Nosso esforço resultou na montagem d’O Noviço, de Martins Pena, dirigida pelo Petrin. O espetáculo conquistou o público jovem – Petrin optou por uma encenação moderna, viva, com a inclusão de músicas da época e citações de propagandas, por exemplo. Foi uma prova de fogo, até porque muitos dos componentes originais do grupo haviam se afastado, pela qual passamos de forma honrosa. A certeza de nossa capacidade e de nossa força nos estimulou a escolha de um texto mais complexo. Dessa vez, encenaríamos Cidade Assassinada, de Antonio Callado. Nesse espetáculo, que inaugurou o Teatro Distrital Conchita de Moraes, João Ramalho, fundador de Santo André da Borda do Campo, entrava em conflito com os jesuítas, pois não admitia a prática religiosa como meio para se desenvolver uma civilização. Pare ele, somente o trabalho seria capaz de construir algo de sólido. Estávamos, dessa forma, mostrando um lado dramático da colonização de nossa cidade, justamente em meio às comemorações de seu 417º aniversário de fundação. Daquela vez não trabalhei como atriz. Voltei à cena em 1971, com a montagem do texto Guerra do Cansa-Cavalo, de Osman Lins. O Teatro Municipal finalmente ficara pronto e era preciso um espetáculo para inaugurá-lo. Fizeram fila para se candidatar. Produções com nomes consagrados concorreram conosco pela participação no evento. No final das contas, ganhamos nós – até porque estávamos na fila há mais tempo! O diretor teatral Celso Nunes havia passado uma temporada na Europa e, como acontecera com Heleny, retornara apostando na descentralização do teatro, na procura por um público novo. Aceitou nosso convite para dirigir o novo projeto. Talvez pela novidade do local, talvez pelo nosso trabalho anterior de divulgação, fizemos uma temporada maior que as anteriores. Foram 67 espetáculos assistidos por mais de vinte mil pessoas, estudantes em sua maioria. Apresentamos também para os adultos do Mobral. Para quem não lembra, o Mobral foi um movimento de alfabetização de adultos, famoso nos anos setenta. A maioria de seus alunos vinha de classes bastante carentes, de modo que ir ao teatro era, na verdade um problema: como vou me vestir? Se você pensar bem, as coisas mudaram bastante, mas ainda é um pouco assim. Tem uma faixa do público que encara a ida ao teatro como um evento social. Acho que é uma herança daquele teatro feito para as elites, nos salões dos palácios, nas grandes salas de espetáculo. Mas e o teatro de rua? Esse sempre existiu, ou melhor, resistiu! O teatro feito nas praças, para o grande público, visto com preconceito por ser popular. Hoje, felizmente, parece que está sendo retomado com mais força. Há até festivais e movimentos diretamente ligados a ele. Existem companhias cujo trabalho é voltado especialmente para o teatro popular. Sei disso porque assisto, e porque participo de comissões estaduais e federais de incentivo à cultura. Leio todos os projetos e fico muito feliz quando existem grupos que, como o nosso GTC, apostam num projeto de qualidade e de popularização. Porque ainda há milhões de pessoas que nunca assistiram a peça de teatro... Depois do Guerra do Cansa-Cavalo montamos Mirandolina, do Goldoni, com direção de Emilio di Biasi. Em 1972 participei da montagem, fora do GTC, de Missa Leiga, texto do Chico de Assis, dirigido pelo Ademar Guerra. Em Santo André fizemos Aleijadinho Aqui e Agora, um texto escrito por Lafaiette Galvão. Era uma estrutura musical e foi muito importante contarmos com a experiência do Antonio Pedro, nosso diretor, e do maestro Carlos Castilho, ambos com passagens pelo Arena. A música final, escrita pelo maestro, pintava metaforicamente o quadro político em que vivíamos. A experiência com o Aleijadinho abriu as portas para o nosso próximo projeto: O Evangelho Segundo Zebedeu. Silnei Siqueira foi quem nos indicou o texto de César Vieira, que ele já havia dirigido anteriormente em São Paulo. O texto se inspirava na Guerra de Canudos e na trajetória de Antonio Conselheiro, seu líder. Além do elenco do GTC, contamos com Antonio Fagundes e diversos alunos formados pela EAD e pela Fundação das Artes de São Caetano do Sul. Depois da temporada em Santo André, fomos convidados para abrir o V Festival Latino-Americano de Teatro em Manizales, na Colômbia. Petrin achou aquilo uma loucura. Como? Irmos para a Colômbia naquele momento? Mas eu bati o pé e nós fomos. Levei a ponta de faca e consegui passagens para mais de vinte pessoas. Chega uma hora em que o seu discurso tem de combinar, necessariamente, com a sua ação. Em Cali, para onde fomos a convite de Enrique Buenaventura, ficamos hospedados em casas de atores, gratuitamente. Eu fiquei num salão de beleza e dormia num colchão, após o trabalho. As entradas eram baratíssimas, centavos da moeda colombiana. Ao final das sessões eu, como líder, recebia do Grupo Experimental de Cali um saco de papel cheio de moedinhas. Dava para comprar pão, café e geléia ou queijo para um lanche. Ainda sobrava dinheiro para um grande almoço que a Rosinha Petrin supervisionava com a ajuda da Márcia Queiroz, da Gaby, da Marici, da Ana Lúcia, da Denise, que era casada com o Celso Frateschi, e das demais atrizes. A comida era ótima, fazíamos na cozinha do teatro e todos os dias apareciam convidados do próprio grupo colombiano. Era como o milagre dos pães. A cada dia o almoço era servido para mais gente e nunca faltou! Isso é que é fazer teatro de grupo! Capítulo V Hortelã Existem ervas que são recomendadas para finalidades várias. A hortelã, por exemplo. Ela combate certas dores e elimina determinados vermes, ao mesmo tempo que estimula e tonifica o organismo, e aumenta a produção do leite materno. Pode também ser usada como refresco dos dias quentes e conforto no inverno. O trabalho do ator. Atuação em várias frentes, interpretação (por vezes simultânea) de diferentes personagens. Tônico, refresco, conforto para a alma. Sete anos depois de sua fundação, os objetivos do GTC continuavam muito claros para nós. Buscávamos a formação de novas platéias, a popularização do teatro. Para tanto, insistíamos em falar o mais claramente possível, tão claro quanto permitiam as circunstâncias. O grupo sempre fez questão de se comprometer no debate de idéias relativas à estrutura social, à sua transformação e ao ser humano como agente e paciente destas transformações. Retratamos a ascensão da burguesia francesa com Jorge Dandin, o nascente colonialismo brasileiro, em Cidade Assassinada, o sistema patriarcal do Nordeste brasileiro com A Guerra do Cansa-Cavalo, o misticismo rebelde com O Evangelho Segundo Zebedeu. Até a arte e a política dos inconfidentes nós abordamos. Nossa vontade era dar seqüência a esse tipo de teatro histórico e crítico. Havíamos elaborado, sob a coordenação do dramaturgo Carlos Queiroz Telles, uma verdadeira reportagem sobre a Revolução Constitucionalista de 1932. Estávamos ainda sob forte influência de nossa viagem a Manizales, na Colômbia, queríamos dizer uma porção de coisas e disso nasceu A Heróica Pancada. Nós estávamos com tudo planejado para montar, mas aí veio a censura e proibiu. Então tivemos de escolher outro texto, e acabamos montando o Incidente no 113, que o Petrin dirigiu. O texto, de Nelly Vivas, se passa num elevador de Nova Iorque. Primeiro entram dois homens à procura de emprego. São visivelmente estrangeiros e pretendem chegar ao andar de nº 113. Até chegarem lá, passam por uma série de experiências inusitadas e desconcertantes. Acabam não conseguindo chegar ao destino, embora outros personagens entrem e saiam sem maiores problemas – um casal, uma velhinha americana típica em companhia de seu cãozinho, um casal de hippies, três hells angels, dois cientistas, uma prostituta e até mesmo um anjo. Foi uma resposta à censura. A censura não percebeu nada, e deixou passar. Eles só viram a historinha, não perceberam as entrelinhas. O ano de 1976 foi marcado pela montagem do texto Mumu, a Vaca Metafísica, de autoria de Marcílio de Morais. Em cena, Petrin, eu e mais dois atores de fora. Chamamos o saudoso e talentoso Carlos Augusto Strazzer e a Tânia Alves, então no começo de carreira. Silney Siqueira foi o diretor. Era um texto lindo e bastante pertinente para aquele momento, pois traçava um perfil de uma classe média alienada, massificada pelos meios de comunicação – o perfil da maioria silenciosa, na verdade. Um mundo povoado por escriturários, operários especializados e funcionários públicos de grau inferior, seu cotidiano, seus preconceitos, valores morais e sociais. A peça se desenvolve em dois tempos. No primeiro, há um casal de meia-idade – interpretado por mim e pelo Antonio Petrin – e sua filha. Durante anos a fio, o marido chega em casa depois do expediente, resmunga sua insatisfação, conta para a esposa os pequenos incidentes da repartição em que trabalha. Ela, por sua vez, faz um relatório das intrigas da vizinhança. Todos os dias o mesmo ritual. O ensaio de desaforos que nunca serão ditos, uma indignação que não se concretiza em ação. No segundo tempo, a filha tenta contestar aquele panorama doméstico. Uma saída é o casamento, a busca por um futuro que seja diferente. Mas o que está reservado aos filhos? Infelizmente, a perpetuação do sistema. Numa das falas da peça, minha personagem sentia-se aliviada por ter garantido um cantinho para toda a família no cemitério! Já pensou? Que conformismo, que melancolia! E que chacoalhão! Aquilo tinha realmente a intenção de chocar, de oferecer um espelho, de provocar alguma reação. Era um texto muito denso, linear em certos aspectos, e que usava de repetições, justamente pra reforçar a idéia da massificação, da reprodução de um mesmo comportamento ao longo do tempo. A dificuldade foi superada com a paixão. Nos entregamos de corpo e alma à montagem – e aí estava a sua força. O autor definia Mumu como tragicomédia, mas o diretor e crítico Flávio Rangel identificou nela um equilíbrio entre teatro realista e teatro do absurdo. Segundo ele, a peça falava, acima de tudo, sobre aceitação. Aceitação do conservadorismo, da frase feita e do lugar-comum, da idéia velha. Flávio definiu aquelas personagens como a argila com a qual se constrói o edifício das sociedades estáticas. São usadas, manipuladas; reprimidas. Se ousam levantar a cabeça para contemplar o céu do amanhã, fecham uma janela para impedir o sol de entrar. Mais uma vez abordávamos um tema social, o GTC procurava manter uma coerência com o que havia sido proposto lá no princípio, lá no sonho primeiro. Entre uma montagem e outra do GTC, participávamos de produções no Rio de Janeiro e em São Paulo. Uma delas, em 1974, foi O Homem de La Mancha, que me deu a oportunidade de conviver com Paulo Autran e conhecer seu trabalho. Ele me tratou maravilhosamente, foi de uma paciência extrema comigo! Mesmo sendo um espetáculo episódico em minha carreira, esse contato foi muito importante – tanto que, no ano seguinte, trabalhamos juntos novamente. Equus era o nome da peça. Tinha esse nome, pois um dos personagens tinha uma ligação muito forte com cavalos. O texto, de Peter Shaffer, não era nada fácil. O autor se baseara em fatos reais para criar a história de um rapaz que, num ato de insanidade, mutila uma série de cavalos, ferindo seus olhos. O trabalho de Shaffer foi imaginar a trajetória desse rapaz, suas motivações, sua família, até chegar àquele ato. O resultado foi um texto muito bonito, com recursos narrativos singulares – idas e vindas no tempo, interferências espaciais, cruzamento de cenas. Alan, o rapaz, cometeu o crime e, durante o julgamento, a juíza percebeu que não se tratava de um criminoso qualquer, mas de alguém com problemas psicológicos. Encaminhado a um hospital psiquiátrico, Alan toma contato com o doutor Martin que, analisando sua vida, descobre que seus problemas provêm da infância e, principalmente herdados do tratamento dado pelos pais. Paulo Autran fazia o papel do médico, o jovem Ewerton de Castro interpretava Alan e eu desempenhava Dora Strang, a mãe do rapaz. Foi um papel muito importante para mim, que há muito não representava uma personagem que tinha em si tanta vida. Era uma mulher de educação religiosa muito profunda, possivelmente aristocrata, que, pensando estar fazendo bem ao filho, absorve dele toda a personalidade, transformando-se, com essa atitude, numa das responsáveis pelo ato antisocial que o rapaz cometeu. O tema é fascinante. O que é ser normal e até onde se julga a normalidade? Onde começa o estado patológico? Os pais de Alan podiam muito bem ser vistos como neuróticos. Até o psiquiatra se questionava sobre a própria sanidade! Celso Nunes fez uma ótima direção, elogiadíssima. E eu estava deslumbrada. Pela primeira vez contracenava com um ator famoso. Como eu era tola! Tinha até medo! Paulo Autran era um mito! N’O Homem de La Mancha eu fazia figuração. Ali, não. Contracenava, mesmo. Então pude conhecer o ótimo colega de cena que ele é, e semear uma amizade que durou até sua morte. Fazer teatro me propiciou também viajar. Minha primeira viagem à Europa foi com Missa Leiga. Conheci Portugal e cantei numa casa de fados, acompanhada por Alfredo Marceneiro, que era o orgulhodofado.TambémnaEspanhaconheciPaco de Lucia – que eu nem sabia quem era e com quem também cantei. Se eu soubesse que eles eram tão importantes, talvez nem conseguisse abrir a boca! Também com a Missa Leiga, onde eu era a solista, viajei até a África e tive a oportunidade de, numa noite, visitar uma aldeia onde dancei com as mulheres – o que era fácil, parecia samba. Uma aventura política, onde fui sozinha, com um líder africano. Bem, voltando às amizades de que falei, uma outra, de ouro, surgiu durante o trabalho n’O Homem de La Mancha: Bibi Ferreira. Nosso contato foi intensificado três anos depois, durante a montagem da belíssima Gota d’água, musical do Chico Buarque e do Paulo Pontes. Não sei se você sabe, mas o texto é uma adaptação extremamente poética da tragédia grega Medéia, escrita por Eurípedes. A ação foi transferida para o morro carioca, mas sem perder a força mítica que podemos encontrar no original. Os versos são lindos, soam espontâneos e traduzem de uma tal maneira a experiência humana daquelas criaturas! Para mim, o teatro tem o dever de apontar, de mostrar nitidamente as conseqüências de uma forma de vida. Cenas como aquelas em que Joana, a protagonista, uma mulher pobre, é mandada embora da vila, com seus filhos, presenciei muitas em Paranapiacaba. E quem não entende esse drama? Então, fazer aquele espetáculo era também uma forma de participação social. Na época, eu ainda lecionava. Era professora efetiva da escola Gabriel Oscar, em Santo André, trabalhando da uma às cinco da tarde. Pegava trem, ônibus e, mesmo assim, era a primeira a chegar, todos os dias, no Teatro Aquarius onde a peça estava em cartaz. No único dia de folga no teatro, fazia a produção da nova peça do meu grupo de Santo André. Mas valia a pena. Ainda mais pela honra de trabalhar com Bibi Ferreira. A certa altura da temporada, Bibi, que interpretava a protagonista, sofreu um acidente. Bateu a cabeça no camarim, chegou a abrir a testa. Foi uma coisa feia, mesmo, coitada. Sem condições de levar o espetáculo por um tempo, pediu substituição. E eu, que interpretava a chefe do coro, fui convidada a substitui-la. Imaginem a minha responsabilidade: substituir Bibi Ferreira! Aceitei e procurei fazer o melhor que pude. Assim que se recuperou, Bibi retomou o trabalho e teve um gesto muitíssimo bonito para comigo. Ela me perguntou assim: Sônia, como é que você se sentiu me substituindo? Bibi, me senti mal! Eu sabia que estava fazendo um papel tão maravilhoso, porque você estava doente, porque tinha se machucado. Não gosto de substituir nessas condições. Estava preocupada contigo, então eu nem posso dizer que foi prazeroso... Pois então vai ser prazeroso agora. Você vai fazer o papel várias vezes, sem eu estar doente. Tive um convite do Rio para apresentar um programa na TV, e não podia aceitar por causa da peça. Mas estou sabendo que você fez muito bem, então vou aceitar o papel. Toda semana eu falto um dia e você faz um dia, está bem? Então todos os dias em que ela ia para gravar o programa, eu a substituía. Foi maravilhoso. Há certos trechos que me arrepiam até hoje, só de lembrar. Chico Buarque alcançou o sublime nas canções. Fazem sucesso até hoje! No dia em que estreei, fui aplaudida em cena aberta oito vezes, por causa das músicas. Aquela foi uma fase muito boa na minha carreira. Engraçado como a vida da gente vai tramando os fios. Pelo menos comigo sempre foi assim. Tanto que, depois de Gota d’água, surgiu o convite para uma outra montagem, que veio a me abrir muitas portas, inclusive as da televisão. Me lembro até hoje de quando o Emílio di Biasi me convidou para a montagem de Caixa de Sombras. Era um texto muito bom, de um americano chamado Michael Cristofer, que ganhara os prêmios Pulitzer e Tony. O Emílio, que ia todo ano a Nova Iorque acompanhar a produção teatral, assistira ao espetáculo e ficara impressionado. A peça abordava um tema profundamente existencial – o homem diante de sua única certeza: a morte. E, em decorrência disso, todos os questionamentos, as cobranças, o desespero. O autor selecionou três situações para trabalhar as várias formas de comportamento, a revisão da vida, o medo, a revolta ou a aceitação, os sonhos não realizados. A luta para não morrer era ressaltada na figura de uma senhora idosa e cega. Ela era proveniente do campo e fora morar na cidade com uma de suas duas filhas, pois a outra, de quem gostava mais, havia emigrado para um grande centro e nunca mais voltara. Irritada pelas muitas cirurgias a que se submetera e pela ausência de sua querida filha, a senhora mantinha um péssimo relacionamento com a outra que a acompanhava. Pois bem, o Emílio me chamou para fazer o papel da velha. Quando li o texto, falei assim para ele: Você quer mesmo que eu faça a velha? Eu tenho cinqüenta anos e a velha tem oitenta. Teremos de fazer uma caracterização e provavelmente não fique tão bom... Será? Eu gostei tanto do papel da filha! Me deixa fazer a filha?... Não. A filha é a Yara Amaral quem vai fazer. Você vai fazer a mãe dela. Preciso de uma atriz para fazer a mãe e eu não acho quem faça! Então eu aceitei e comecei a estudar o papel. Estudei muito. Como ela era uma velha cega, ficava treinando em casa, andando e fazendo algumas coisas com os olhos vendados. Os ensaios começaram em março, num colégio semi-abandonado, e só um mês depois foram transferidos para o Teatro Faap. Nos primeiros vinte dias, enquanto o cenário não ficava pronto, o tempo foi todo consumido em debates sobre a peça. Num dos ensaios, comentei com o Emílio sobre meus estudos da personagem e ele disparou: Trabalho perdido! Por quê? Por que você vai fazer a filha. A Yara não pode fazer, e ela falou para eu colocar você. Eu já falei com a Henriqueta Brieba, ela tem 78 anos. Ela faz a velha e você faz a filha. Ah, como eu fiquei feliz! Eu sabia, desde o princípio, que deveria fazer aquele papel. E foi uma maravilha, ganhei muitos prêmios. Havia uma cena em que a minha personagem falava com o entrevistador, que era realmente tocante. Um dia a Tânia Carrero foi assistir e, quando eu acabei de interpretar aquela cena, ela interrompeu a peça, levantou, aplaudiu e falou para a platéia: Aplaudam comigo, por favor! E todo mundo levantou e aplaudiu. Eu fiquei chocada porque nunca havia acontecido isso comigo. E aí começaram a falar dessa cena, a Regina Duarte foi ver e ficou encantada. Na época, estavam começando a produzir o seriado Malu Mulher, na TV Globo e a Regina comentou com o Dênis Carvalho que queria que eu fizesse a mãe da protagonista. Aí eles vieram do Rio de Janeiro e me contrataram. Eu pedi afastamento da escola por dois anos, e fiquei dois anos fazendo o programa. A primeira casa que eu tive na vida, construída por mim, foi com o trabalho na televisão. Até então eu não tinha nada – morava de aluguel, ou com a minha mãe. Fui guardando tudo o que ganhava e, assim que juntei a quantia, fiz uma casa em Santo André. Parece bobagem, né? Mas era um sonho, meu e da minha filha. Toda vez que a gente mandava a Kátia desenhar, ela desenhava uma casinha. Eu sei que toda criança faz casinha, mas ela falava assim: Eu quero que a minha mãe tenha uma casa. Quando fiz a casa, ela se casou e nunca morou lá!... Eu não falo que a vida trama os fios de um jeito curioso? Capítulo VI Maçã, Morango, Pêssego... Fruto maduro e perfumado. O sol, a seiva e o passar do tempo confluem para um sabor concentrado e marcante. Os melhores resultados só se alcançam na espera. Pois foi com espera e paciência que conquistei o papel de Nena na peça Rasga Coração, do Oduvaldo Vianna Filho. Taí uma outra história maluca. Quando eu ouvi dizer que iriam montar aquele texto fiquei louca para fazer. Ai, meu Deus, como queria fazer aquela peça! Eu pensava: faço tantos textos estrangeiros, queria fazer uma peça brasileira, fazer uma mulher brasileira, essa é a terra que eu conheço. Aí o Antonio Petrin foi contratado para um dos papéis. Como era previsto que a peça ia ficar muito tempo em cartaz, a Rosália, mulher dele, teria de ficar em Santo André sozinha. Portanto, ela foi contratada também, como camareira. Puxa vida, estavam todos os meus amigos indo para o Rio de Janeiro! Ai, Petrin, se tiver um papel lá, me avisa. Fala para o diretor!... A produção já ia adiantada e eles não conseguiam achar uma atriz para o papel da Nena, a mulher do protagonista. Acho que umas onze atrizes foram chamadas, fizeram teste. Umas não gostavam do papel, outras não queriam porque na realidade, quando você lê a peça, é um bom papel, mas o melhor papel é o do homem. De todos os outros homens, aliás. E eram atrizes que já tinham uma carreira e se recusavam a fazer papel secundário. Além disso, era preciso cantar, porque era um musical. Depois de onze desistências o diretor, José Renato, não tinha mais a quem recorrer. Foi quando o Petrin falou para ele: Eu conheço uma atriz em Santo André que faz esse papel. Ela canta, inclusive. Não brinca!? Mas tem um problema, ela tem um defeito no pé. Então não dá! Com tanta atriz do Brasil você me recomenda uma com defeito no pé? Petrin insistiu tanto que ele me telefonou. Era um domingo, me lembro até hoje. Nós morávamos na casa da minha mãe, dormíamos em duas camas de solteiro, eu e a Kátia. Eram umas onze horas, eu estava no quarto, lendo, o Zé Renato me telefona: Sônia, aqui é o Zé Renato, diretor do Rasga Coração. O Petrin me falou que você tem vontade de fazer a peça, mas eu não te conheço. Você não leva a mal eu fazer um teste com você? Pode vir até o Rio para eu te conhecer? Eu não posso garantir que o papel é seu, só quero te conhecer. Todo aquele cuidado só podia ser por causa do pé. Eu sabia disso, e falei que tudo bem. Quando ele desligou, comecei a pular em cima da cama. A Kátia ficou entusiasmada também: O que é, mãe? Arranjou um namorado? Muito melhor do que um namorado! Vou fazer um teste para o Rasga Coração! E lá fui eu. Cheguei, cumprimentei todo mudo, e ele propôs fazermos um exercício. Acho que era para ver se eu me mexia, essas coisas. Daí que fizemos tudo. Contracenei com o Ary Fontoura, que é um amor de pessoa, entendeu perfeitamente qual era o meu problema. E aí o José Renato viu que eu andava normalmente, que pulava, dançava, fazia tudo. E me contratou. Acho que foi a minha maior felicidade no teatro. Tenho a impressão de ter sido uma das coisas que eu fiz mais inteira, em que eu entrei de cabeça e de maneira mais completa... Aquele texto vinha ao encontro de todos os ideais que eu tivera na juventude. Nunca fui filiada ao Partido, mas eu vivia entre os comunistas. Ajudava-os, escondia gente, distribuía panfleto, aquelas coisas. Mas por idealismo. Fui fazer logo uma peça que lembrava muito a vida e a luta do Luiz Carlos Prestes! Foi muito bom. Não era só mais um texto proibido que estreava, era um desabafo pelos anos de repressão, pelas dificuldades de se trabalhar com cultura no país. E, infelizmente, o Vianinha não viveu o suficiente para ver sua obra montada. No dia de sua morte, o diretor Flávio Rangel escreveu uma nota a ser lida em todos os teatros cariocas: Vianinha batalhou a vida inteira para manter os teatros abertos. Essa é a razão por que hoje continuamos representando e não cancelaremos o espetáculo. A peça estreou em Curitiba e ficou um ano em cartaz no Rio. Foi um sucesso e a convivência com o grupo era maravilhosa. O Raul Cortez, que fazia o papel do Manguari Pistolão, marido da Nena, era um grande ator. Ele era excepcional, não gostava de fazer um espetáculo sempre da mesma maneira, sempre muda um pouco. E eu gosto dessas experiências, então quando ele mudava, eu modificava junto. No que ele propunha, eu ia. Embora não desvirtuássemos o texto, mudávamos as intenções, as marcas. Dávamos outra vida para a cena. Para mim isso era instigante. Quando o Zé Renato formou os dois elencos, combinamos que eu ficaria no Rio, e o Raul em São Paulo. E não é que ele bateu o pé que não queria contracenar com outra atriz? Pediu ao diretor que eu viesse do Rio para contracenar com ele. Para você ter uma idéia de como ele era incrível, vou contar outro episódio, que aconteceu na mesma montagem. Bem, todos sabiam do meu problema na perna. A esquerda é mais fina que a direita, do joelho pra baixo é bem diferente. E tinha uma cena em que eu ficava sentada numa mesa com a saia levantada. Eu combinei com o Raul assim: Raul, eu quero sentar de maneira que a minha a perna direita fique à mostra, e não a esquerda. Por quê? Tanto faz. Não, pra mim não é tanto faz. Porque eu tenho a perna esquerda defeituosa, se eu levantar o vestido, vai aparecer durante a representação. Em geral, as pessoas que me assistem dizem que não percebem, mas, de repente, eu sentada numa mesa com a saia levantada, poderiam perceber que as duas pernas eram diferentes. Então, eu queria ficar sentada do lado direito. Ele concordou, as marcas foram feitas dessa maneira e, um dia, o Raul me vem com essa: Tudo bem, Sônia, a gente marca do jeito que você quiser, mas eu vou te dizer uma coisa. Se nessa cena, que é uma cena de transa, alguém estiver olhando para a sua perna, é porque nós somos muito maus atores!!! E não é que ele tinha razão? A gente tem de ver a cena no conjunto! Esse tipo de coisa dificilmente a gente aprende na escola – é só a prática, no aprendizado diário de ensaios e temporada. É como se a formação do artista se desse a partir de uma série de vivências – escola, palco, grupo. O grupo, por exemplo, nos dá a oportunidade de entrar em contato com as mais diversas atividades, não só a interpretação. É preciso planejar, promover, administrar, vender, pesquisar, ou seja, pegar no pesado em tarefas das quais muita gente foge quilômetros! Foi justamente isso que aconteceu comigo no começo dos anos 80. Depois de tantos trabalhos, de tanta luta para viabilizar uma produção constante em Santo André e na região, confesso que cansamos um pouco. Parte da equipe do GTC já não estava mais comprometida, não ajudava mais. Esperavam que a gente fizesse tudo: montasse, dirigisse, produzisse – viraram uma espécie de estrela, filhinhos de papai que não queriam se mexer. Então alguns de nós pensamos: se nós fazemos tudo, vamos fundar outra companhia. Foi o que fizemos. Fundamos a Proa, o Petrin, o José Armando, o Walter Portella e eu. É uma produtora que existe até hoje. Montamos vários espetáculos. Naquele tempo revezávamos entre montagens em São Paulo e no Rio de Janeiro e os trabalhos da Proa. Montamos Arquivo Morto, da Maria Adelaide Amaral, por exemplo. Na época, achamos que esse título não chamaria tanta atenção e propusemos que ela mudasse. O espetáculo ficou em cartaz com o nome Ossos do Ofício. O segundo espetáculo foi Gemini, do Albert Inauratto. Emílio di Biasi dirigiu. No ano seguinte – veja que as produções se seguiam - montamos Ganhar ou Ganhar, de Donald L. Coburn, com direção de Celso Nunes. Em cena estávamos Petrin e eu. Nossa produtora viabilizou vários espetáculos. Hoje as produções estão mais espaçadas, nos ocupamos de trabalhos em teatro, cinema e televisão, o que nos toma muito tempo. E, para completar, ficamos mais velhos. Estamos em 2008, isso significa que faz 44 anos que venci aquele concurso e entrei para a EAD. Isso não é pouco. Conheço meus sócios desde essa época. Éramos jovens, aguerridos. Hoje não somos mais jovens, ao menos por fora, mas continuamos obstinados, teimosos, valentes. Temos verdades e opiniões que são fruto da experiência, mas também de todos os vícios e preconceitos que fomos acumulando durante a caminhada. Isso às vezes nos torna inflexíveis uns com os outros, ainda mais por nos conhecermos tão bem. Acontece que o trabalho em conjunto só é possível quando há flexibilidade. Teatro é uma arte coletiva, as pessoas precisam entender isso. É muito comum a gente ver, principalmente entre os jovens, um comportamento individualista. Acho que a mídia reforça um pouco isso. O importante é a imagem, o sucesso, a fama, o prestígio – só depois é que se pensa no trabalho. E como hoje em dia é relativamente fácil sair do anonimato, pronto, o meio artístico está cheio de gente olhando para o próprio umbigo. Repito: teatro é arte coletiva. Precisamos uns dos outros a todo instante, e quando você mostra que é capaz de trabalhar com dedicação, com vontade de aprender e de se aprimorar, é bem possível que o chamem novamente, para um novo projeto! Foi mais ou menos assim que aconteceu comigo e com o dramaturgo Mauro Rasi. Minha convivência com Mauro foi muito frutífera. Eu me dava muito bem com ele porque parecia que a gente tinha nascido na mesma casa. As críticas que ele fazia da família dele, da casa dele, da vida dele, eram iguaizinhas às que eu fazia da minha infância, embora eu fosse bem mais velha que ele. Acho que sou pelo menos uns quinze anos mais velha. Ele era de Bauru, uma cidade completamente diferente de Paranapiacaba, mas as coisas que ele sofria ou que achava engraçadas eram as mesmas que eu achava que tinha passado. Era muito parecido nisso. Os meus pais eram operários e os dele eram comerciantes – estavam numa escala um pouquinho melhor. Por exemplo, eles tiveram um carro, a vida inteira o meu pai nunca teve carro. Tinham geladeira, nós nunca tivemos geladeira, éramos de um nível mais baixo. Mas nas coisas engraçadas que ele contava, eu me identificava. Então as tias que ele escrevia eu não tinha a menor dificuldade de interpretar, porque eram as minhas tias mesmo. Aquelas histórias que elas contavam eram as que eu ouvia as minhas tias narrarem, e que eu já achava engraçado naquela época, quando era pequena. Eu estranhava por que elas falavam tanto, e quando eu ria, minha mãe me mandava ficar quieta. Conheci o Mauro quando ele tinha 14 anos, num festival de teatro, junto com o Abujamra, que o conheceu no mesmo dia que eu. Mauro participou como ator e autor. Era uma loucura aquela peça, todo mundo ficou horrorizado, mas o Abujamra falou para mim: Você percebeu que ele vai longe, não é? A peça não tem nem pé nem cabeça, mas você percebe que ele é um dramaturgo. Muitos anos depois eu fui para o Rio e assisti a uma peça dele. Fui até ele e disse que o conhecia desde o festival de Campinas. É mesmo? É. Eu adoro o seu trabalho e queria fazer uma peça sua. Ele deu risada, porque eu sempre fui conhecida como uma atriz que faz papéis comportados e ele escrevia besteirol. Aí ele escreveu uma peça que o Ulysses Cruz quis montar, chamava-se A Cerimônia do Adeus. Porque o Marcos Frota conhecia o Mauro Rasi e o Ulysses, e falou para o Ulysses me colocar no elenco. Aí o Ulysses quis me apresentar para o Mauro Rasi. Eu fui para o Rio de Janeiro, fomos jantar juntos, eu falei para o Mauro que era aquela atriz que o procurara e que havia conhecido desde os tempos do festival. Ele aprovou logo de cara. Aí ele pediu para que eu fizesse o papel da mãe, mas acontece que eu não conseguia fazer! Nós ensaiamos quase um mês e o papel não rendia o suficiente. Eu comecei a achar que não era atriz. Um dia o Ulysses chegou e disse que tinha uma coisa horrível para dizer para mim. Eu disse que já sabia, que já tinha percebido: Eu não acerto o papel, não é? Ele confirmou e me propôs colocar a Ileana Kwasinski como a mãe e me dar o papel da tia, porque eles ainda não tinham arranjado ninguém para fazer o papel. Como eu lia os dois, ele disse que eu fazia a tia muito bem. O seu salário fica o mesmo, não se preocupe. A crítica não foi boa, mas ganhei um prêmio de atriz coadjuvante. E a Cleyde Yáconis ganhou o papel de melhor atriz. Acontece isso, às vezes. A gente não acerta, não está madura. Depois acende uma luz e a gente vê o que é. A crítica do Rio falou muito bem sobre o meu trabalho na Pérola, na Rainha do Lar e na Cerimônia do Adeus. Nessa peça eu tinha uma cena inesquecível com a Cleyde Yáconis. Um crítico disse que era um momento antológico do teatro brasileiro. Ela fazia maravilhosamente a Simone de Beauvoir. Sou sua fã número um, ela é o meu modelo de atriz. Cheguei a ver a Cacilda em cena. Ela me convidou para fazer uma peça com ela, mas faleceu um pouco depois. Ela pretendia montar A Senhora da Boca do Lixo, do Jorge Andrade. Eu iria fazer um pequeno papel, mas muito marcante. Seria uma mulher que espera um filho, numa sala da polícia. Cada vez que abre a porta, ela levanta para procurar o filho, e ele nunca vem. Um papel de poucas palavras, mas de muito sentimento. Não deu, e eu acabei trabalhando com sua irmã, a Cleyde. Minha referência como atriz era a Cleyde. Eu a respeitava muito. Fui ver Maria Stuart e aquilo ficou gravado na minha retina pra sempre, de modo que contracenar com ela n’A Cerimônia do Adeus foi uma honra. Pois bem, fomos viajar com essa peça e quando voltei para o Rio a Marieta Severo me convidou para fazer A Rainha do Lar, outra peça do Mauro. Aí eu saí de uma peça dele e entrei na outra. Até que veio a terceira: Pérola. Gente, quando li a peça pela primeira vez, o papel já estava pronto. Nunca fiz um papel que eu não precisasse ensaiar. Eles não tinham mandado o texto, eu li pela primeira vez, li lá na hora com eles, e senti que eles se entreolhavam... Sônia, é isso aí, eu não tenho de te falar nada. O papel está pronto. Que coisa, não, que acontece? Mas acho que era de tanto conversar com ele e me identificar com seu universo. Ficamos um ano em cartaz no Rio, ficamos um ano em São Paulo, um ano viajando e depois outro ano no Rio, meio ano no Rio, meio ano em SP, depois tornamos a viajar. Em Belo Horizonte, apareceu a atriz espanhola Carmen Maura. Queria conhecer o texto do Mauro para um futuro filme do Almodóvar, que não aconteceu. Ficamos amigas porque eu falava castelhano, saíamos juntas, almoçávamos, íamos às feiras. Era uma companheira fácil e alegre. Foram quatro anos de temporada. Esse apartamento em que nós estamos é a Pérola. Eu nunca ganhei dinheiro com teatro. A primeira vez que eu ganhei dinheiro, comprei o apartamento em que moro. Capítulo VII Jasmim De olhos fechados caminho à noite, e o jasmineiro florido guia meus passos. Seu cheiro forte e adocicado me atrai, me envolve. Dentro em pouco serei eu o próprio arbusto, espalhando flores e perfume por onde passo. Quando o Teatro Municipal de Santo André completou 30 anos, o José Armando Pereira da Silva lançou um livro. Como parte das comemorações, apresentei um concerto, acompanhada por um pianista. Cantei os trechos de musicais que fiz, todas as árias mais importantes. Usei um vestido cinza básico, longo, e coloquei um cabideiro em cena, onde pendurei doze xales. A cada peça cantada eu trocava de xale, conforme o personagem. Para interpretar a portuguesa, coloquei o xale português; para O Homem de la Mancha, o espanhol; para O Violinista no Telhado, o xale de lã – era uma personagem pobre, e assim por diante. Foi um espetáculo muito bonito, mas difícil de montar novamente, porque precisa ter um piano, um pianista e isso encarece demais. Tanto que houve apenas uma apresentação. Gostaria de cantar mais em meus espetáculos. No Rasga Coração tinha uma cena muito linda em que eu cantava com o Raul. Ele começava e eu continuava. Ele apenas dizia: Os sonhos mais lindos... e depois eu fazia a continuação toda. Tinha orquestra ao vivo acompanhando. Também não sou uma cantora, sou uma atriz que canta. É diferente. A cantora se concentra mais na voz e a atriz mais na interpretação. Foi o que eu fiz na Ópera dos Três Vinténs se bem que nesse espetáculo eu era mais cantora que atriz. Só cantei uma ópera completa em 1998, com o maestro Flávio Florence, da orquestra de Santo André. Estreei O Barbeiro de Sevilha em ótima companhia: Fernando Portari, Paulo Szot, Sílvia Tessuto, Sandro Cristofer. Me salvei porque o papel pedia uma cantora já velhusca – Berta – uma governanta cômica, daí a interpretação compensou a meia-cantora. Quem canta mesmo é minha filha. Quando adolescente, estudou oboé na Fundação das Artes de São Caetano. Passou por aquelas dúvidas cruéis no período de optar pelo vestibular. Eu sempre apoiei. Acredito que o jovem não deva decidir uma carreira levianamente. Em primeiro lugar deve estar o prazer, a verdadeira vocação, não o dinheiro, a tradição familiar, o mercado de trabalho. Primeiro se apaixonou pelo Jornalismo, depois, por dança. Ela não sabia muito bem o que queria ser. Era muito precoce: aprendeu a ler mais ou menos com uns quatro anos, sozinha. Um dia ela tomou a decisão: queria aprofundar os estudos musicais, fazer faculdade de Música. Recebeu novamente meu apoio. Era realmente talentosa e o curso na USP abriu uma série de oportunidades para ela. A ópera surgiu bem mais tarde. E como eu falei lá atrás, com a ópera, ela acabou fazendo teatro também. Atualmente Kátia mora na Alemanha. Vive lá há quase vinte anos. A saudade às vezes é quase insuportável, mas sei que ela está bem. É pósgraduada, professora universitária e continua cantando. Visitei-a recentemente em Berlim e pude assistir ao ensaio geral de um de seus trabalhos. Era um solo de teatro, uma peça francesa em que a orquestra tocava o tempo todo, mas a Kátia fazia cenas muito dramáticas, com falas, inclusive. É uma ópera contemporânea, bem complexa. Em janeiro de 2006 foi a vez dela me ver em cena novamente. Passando as férias no Brasil, ela pôde assistir à minha mais recente montagem: Ismênia. Foi muito importante tê-la na estréia, receber seu apoio, pois se trata de um texto dificílimo. Não é propriamente uma peça teatral, mas um poema cênico, como bem qualificou o diretor, William Pereira. Seu autor, o grego Yannis Ritsos, era até então inédito no Brasil. Ligado a movimentos revolucionários, Ritsos chegou a ser preso, deportado. Suas obras são bandeiras contra a opressão. Ismênia retoma a história da filha de Édipo, cuja trajetória foi registrada por Sófocles. Aimar Labaki fez uma tradução bem cuidada do que seria um monólogo. William dividiu o texto entre três atores, de modo que eu interpreto a Ismênia já velha, relembrando fatos de sua vida e, metaforicamente, da própria História mundial. Adriana Londoño, que nos apresentou o texto, interpreta a Ismênia jovem, e Rubens Caribé faz o narrador e todos os personagens masculinos. É um texto dificílimo porque foge às regras de dramaturgia convencionais. É uma narrativa, na verdade. Um poema narrativo cuja fluência é determinada tão-somente pela memória. E sendo um texto longo, foi um desafio para a memória da atriz! Quantas dúvidas! Será que eu sou capaz? Será que vou conseguir? Será que ainda estou em forma, com setenta anos passados? A resposta do público diz que sim. Todos que assistiram ficavam encantados com a beleza do texto, da encenação, da música, com o talento e o empenho dos jovens atores, e com a minha idade! Como? Na estréia uma moça ficou admirada: Como? Setenta e três anos e decorou esse texto todo? Então eu posso ter esperança de que minha carreira dure por muito tempo! Ismênia é, com certeza, personagem para ser interpretado por uma atriz madura, cuja experiência de vida seja essencial para a construção do papel. Porque dizer um texto, simplesmente, até que é fácil. Basta uma boa memória. Mas rechear esse texto com verdade, ah, isso é bem diferente. Enquanto ensaiava o espetáculo, veio o convite para participar de mais uma novela. Dessa vez foi Cidadão Brasileiro, do Lauro César Muniz. O texto dele é maravilhoso, é brasileiro. Eu acho que as novelas em geral estão muito falsas, e o Lauro sabe trazer a verdade para a novela. Claro que tem sempre um romantismo, uma fantasia, que é o que vende, não é mesmo? E também não sou contra pessoas jovens e bonitas em cena, porque a televisão vive de imagem. Me incomoda quando é muito falso, rasteiro, oba oba. Admiro o Manoel Carlos, seus textos têm um componente real, situações de verdade. Nessa novela, o Lauro conta a história da cidade dele, Guará, que foi onde nasceu. É uma cidade perto de Minas, que não tem nada a ver com Guaratinguetá. Então ele conta aquela vida do interior, e acho que os diretores da novela captaram bem o clima. Tudo é muito puro, ingênuo, como os brasileiros são. Os caipiras. Um Brasil que lembra muito a minha infância e juventude. Hoje em dia, quando se fala em pureza, sempre se remete ao aspecto sexual. Tudo bem, sexo existiu sempre e tem na novela porque faz parte da vida, mas eu estou falando de uma pureza de alma. E acho que o Lauro consegue mostrar bem isso. Minha personagem é um exemplo. É muito leve, engraçada, gostosa de fazer. E entre um trabalho e outro, nos intervalos da gravação ou em qualquer momento livre, posso me dedicar a uma de minhas paixões: a leitura. Sempre mantive a cabeça funcionando. Como falei, desde pequena os livros foram a minha companhia. Leio três ou quatro livros ao mesmo tempo, das mais variadas espécies. Quando criança, não tinha televisão, como eu ia ficar parada na cama? A Kátia já teve televisão. Mas eu não a deixei ficar o dia inteiro na frente da telinha, não acho isso bom. Ela leu bastante, gosta muito de ler ainda hoje. Eu leio tanto, que cheguei a doar seis mil livros que já tinha lido! Dei para várias bibliotecas. Doei para a Escola Livre de Teatro de Santo André tudo o que eu tinha de teatro. Mandei todos os figurinos do GTC para lá também, porque a maioria das peças que nós produzíamos era financiada pela prefeitura e ficavam comigo, pois era eu quem cuidava do guarda-roupa. Quando não pude cuidar mais, foram oito kombis para a escola de teatro. Fizemos uma exposição de tudo quando o Teatro Municipal de Santo André fez 20 anos. O Celso Frateschi era o secretário de Cultura. Leio tudo o que cai nas minhas mãos. Tenho uma biblioteca no meu apartamento e outra no sítio. São milhares de livros, que vou sempre renovando. Quando menina fui bibliotecária da escola, trabalhava algumas horas por semana. As alunas que tinham notas mais altas eram escolhidas como bibliotecárias, era uma honra! Gosto de ler, de fazer palavras cruzadas, de tricotar. Aprendi a fazer tricô porque precisava ficar na cama e tinha de fazer qualquer coisa. Tinha nove anos quando minha mãe me ensinou. Faço tricô até hoje muito bem. Não gosto de permanecer parada, fico aflita! Meu tempo costuma se dividir entre o teatro e as novelas de televisão. Nas horas livres também faço trabalho voluntário. Minha tia Luiza, minha prima Sara, minha amiga Anamaria Barreto e eu trabalhamos juntas nisso. Cada uma tem uma função. Eu recolho livros, roupas, materiais diversos entre os moradores do meu prédio e passo adiante. Os livros mando para um rapaz que faz biblioteca nas favelas. Chegamos a colocar cortinas numa escola inteira, só com doações! Não é possível fechar os olhos! É muito fácil reclamar, lamentar, gritar que o governo precisa tomar providências sobre isso e aquilo. E a nossa parte, quem faz? Sabemos da realidade pela televisão e pelo jornal. A miséria está do nosso lado, quando passamos pela rua, e não damos importância a ela. Não adianta esperar que as mudanças venham de cima! É preciso agir agora, nem que seja sozinho. Eu acredito nas modificações individuais que levam às mudanças coletivas. É claro que precisamos pensar a longo prazo, mas a fome, o frio e a ignorância existem aqui e agora, concretas, palpáveis. Essas pessoas não podem esperar pelas medidas governamentais! Já falei o quanto a injustiça me revolta. Acho que esse buraco na minha alma nunca vai se fechar... Como vivo longe de minha filha, a presença dos amigos me conforta. Novos e velhos, às vezes nos reunimos para tomar um chá, conversar, passar o tempo. Gabriela Rabelo, Anamaria Barreto, Eneida Soler, Eliana Rocha, Nena e Sara Caetano. Tem também a Semadar, minha irmã, a Márcia Vezzá, a Etty Frazer e a Tânia Bondezan. Tem a minha queridinha Cida Bau, a Analy Alvarez, a Ilana Kaplan. As amigas de longa data Elisabeth Hartmann, Inajá Bevilacqua (Naná), Rosinha Petrin, Haydée Portella. Meus amigos Petrin, Zé Armando, Walter Portela, Sergio Mamberti, Ewer-ton de Castro e a Ania. O Yacov Hillel, o Ary Lima, o Chiquinho Medeiros. Tem o William Pereira, o David Caetano e a minha nova família: Ricardo Visconde e Helena, Sandro Visconde e Alê. Depois que meu marido morreu nunca mais me casei. Namorei, me apaixonei, mas nada oficial. Não sei se foi por opção. O trabalho, para mim, ocupou um espaço tão grande que, quando me dei conta, havia conquistado uma independência financeira, mas também uma velhice solitária. Gosto dos homens, sempre gostei. Sua presença nos conforta. Mesmo em silêncio, o amado é capaz de preencher todos os cantos da casa. Quando fala, sua voz nos habita como um mantra, nos eleva, nos transporta. Seus braços, seu calor... Há mulheres e homens que se fecharam para o amor. Acreditam que a velhice deva ser sinônimo de recato, seriedade, enrijecimento, sofrimento. Eu realmente sofro, como querem alguns, mas com o preconceito. Veja você que, há alguns anos, me procurou um jovem ator para que eu o preparasse para os exames numa escola de teatro – estávamos na fila da Livraria Cultura, no lançamento de um livro da Maria Adelaide Amaral. Era um rapaz talentoso, interessado, a quem pude orientar com facilidade. A relação que, a princípio, era de professora e aluno, foi adquirindo contornos de amizade, como se nos conhecêssemos desde sempre, como se a diferença de idade – mais de trinta anos – não existisse. Descobrimos que gostávamos das mesmas coisas, apreciávamos a companhia um do outro, nos completávamos em muitos aspectos. Eu tinha a experiência, mas ele possuía a vontade e o tempo necessários para experimentar também; ele tinha a juventude, mas eu também havia tido uma, que permanecia intacta, dentro do meu peito. Passamos a freqüentar os lugares, juntos. Não havia do que se envergonhar, pensávamos. Nos esquecemos de que nem todos pensam da mesma forma. Comecei a receber olhares de reprovação, até mesmo de meus melhores amigos e de minha família. Alguns amigos dele estranharam também, desconfiaram de que espécie de proveito estaria tirando com a nossa relação. O mesmo pensaram meus familiares, temiam pela minha integridade mental e financeira. Como se nos meus 70 anos de vida tivesse precisado de alguém que me defendesse! Esperava que vibrassem com a minha felicidade. Que me dissessem: Sônia! Nunca te vi tão bem! Como você está feliz! Sônia, você remoçou! Que brilho é esse nos seus olhos? Que energia é essa que, de repente, tomou conta de você? Sônia, eu não sabia, mas é possível amar e ser amada em qualquer idade! À exceção de Marcos Caruso, da Irene Ravache, da Karin Rodrigues, da minha saudosa camareira Neusa e da Maria Adelaide Amaral – queridos amigos – , ninguém mais me apoiou. Ao contrário. E como não é possível que nos encerremos em um castelo, só os dois, isolados da opinião alheia, as circunstâncias acabaram por nos tornar apenas bons amigos. Fábio freqüenta minha casa normalmente, me ajuda quando preciso, conversa, conta novidades, me conforta. Sei apenas que na sua presença rejuvenesço, minhas faces coram, meu riso é constante. Volto a Paranapiacaba, menina, coração palpitante, cheia de sonhos e de certezas: O que você acha que pode ser quando crescer? Quero ser atriz. Você está louca, menina? Uma moça não pode ser atriz. Por que não? Atriz não pode ter perna defeituosa. Pode, sim! Porque teatro é igual como a gente vive. A gente não vive com perna defeituosa? Então no palco também tem que ter gente assim! Não pode, não. No palco é tudo muito bonito, como no cinema, essas coisas não são permitidas! Escolha outra profissão. Já escolhi, quero ser atriz. O médico disse para meu pai: Ela é teimosa, não? Meu pai confirmou. Um dia chamei minha filha de teimosa, ela falou assim: Sorte minha que eu sou teimosa e que você também foi. Porque o lado positivo da teimosia é a persistência. Então eu persisto. Meu amor, minha vida e minha carreira são a prova disso. Persistir naquilo em que acredito. Naquilo que sinto como verdade mais pura da alma. E não esperar por glórias, prêmios, saudações. Esperar que o gozo venha porque se trilhou o caminho do coração. Porque bebemos da vida todos os sabores que ela nos ofereceu. Obrigada por ter desfrutado deste chá comigo. Volte sempre que quiser. Os sabores se renovam e a água a alma o peito fervem. Sempre. Cronologia Teatro 2006 Ismênia Autor: Yannis Ritsos Tradução: Aimar Labaki Direção e cenografia: William Pereira 2005 Canaã Autor: Jarbas Capusso Filho Direção: Carlos Meceni 2004 Senhoras e Senhores Autor: Lionel Goldstein Direção: Alexandre Heinecke 2003 Dia das Mães Autor: Jeff Baron Direção: Paulo Autran 2001 Apresentação de árias famosas, em comemoração aos 30 anos do Teatro Municipal de Santo André, São Paulo 1995/98 Pérola Texto e direção: Mauro Rasi 1994 Ópera dos Três Vinténs Autores: Bertolt Brecht e Kurt Weill Direção: Marcelo Marchioro 1992 O Violinista no Telhado Autor: Joseph Stein Direção: Yacov Hillel 1989 A Estrela do Lar Texto e direção: Mauro Rasi 1988 Cerimônia do Adeus Texto e direção: Mauro Rasi 1987 Gnadiges Fraulein Autor: Tennessee Williams Direção: Steplan Yarian Três Marias e uma Rosa Autor: David Benavente Tradução de Sônia Guedes Direção: Celso Nunes 1986 Morangos com Chantilly Autor: Timochenko Wehbi Direção: Antonio do Valle 1985 Noises Off Autor: Michael Frayn Direção: José Renato 1984 Romulus Magnus Autor: F. Durrenmatt Direção: Sílvio Zilber Os Sete Pecados Capitais Autores: Bertolt Brecht e Kurt Weill Ópera-ballet com direção de cena de Celso Nunes Orquestra Jovem Municipal sob regência de Jamil Maluf 1983 Ganhar ou Ganhar Autor: Donald L. Coburn Direção: Celso Nunes 1982 Gemini Autor: Albert Inauratto Direção: Emílio di Biasi 1981 Ossos do Ofício Autor: Maria Adelaide Amaral Direção: Silney Siqueira 1979/1981 Rasga Coração Autor: Oduvaldo Vianna Filho Direção: José Renato 1978 A Caixa de Sombras Autor: Michael Cristofer Direção: Emílio di Biasi 1977 A Gota d’Água Autores: Paulo Pontes e Chico Buarque Direção: Gianni Ratto 1976 Mumu Autor: Marcílio Moraes Direção: Silney Siqueira 1975 Equus Autor: Peter Shaffer Direção: Celso Nunes 1974 O Homem de La Mancha Autor: Dale Wasserman Direção: Flávio Rangel O Incidente no 113 Autor: Nelly Vivas Direção: Antonio Petrin 1973 O Evangelho Segundo Zebedeu Autor: César Vieira Direção: Silney Siqueira 1972 O Aleijadinho Aqui e Agora Autor: Lafayete Galvão Direção: Antonio Pedro Missa Leiga Autor: Chico de Assis Direção: Ademar Guerra 1971 Mirandolina Autor: Carlo Goldoni Direção: Emílio di Biasi A Guerra do Cansa-Cavalo Autor: Osman Lins Direção de Celso Nunes 1970 Medéia Autor: Eurípides Direção: Silney Siqueira. 1968 George Dandin Autor: Molière Direção: Heleny Guariba. Escola de Arte Dramática 1966 Caiu o Ministério Autor: França Jr. Direção: Alfredo Mesquita A Guerra do Cansa-Cavalo Autor: Osman Lins Direção: Maria José de Carvalho O Veredicto Autor: Mirian San Juan Direção: Alfredo Mesquita Somos Todos do Jardim da Infância Autor: Domingos de Oliveira Direção: Silney Siqueira A Roca de Barberina Autor: Alfred Musset Direção: Maria José de Carvalho O Rosário Direção: Alfredo Mesquita A Casa de Bernarda Alba Autor: Garcia Lorca Direção: Alfredo Mesquita 1965 Auto da Vila de Vitória Autor: José de Anchieta Direção: Alfredo Mesquita Autor da Alma Autor: Gil Vicente Direção: Maria José de Carvalho A Falecida Autor: Nelson Rodrigues Direção: Antunes Filho 1964 Os Meirinhos Autor: Martins Pena Direção: Alfredo Mesquita O Novo Inquilino Autor: Eugène Ionesco Direção: Celso Nunes 1954/63 Atriz em várias montagens amadoras da Scasa Televisão 2008 Amor e Intrigas Novela de Gisele Joras Rede Record 2007 Luz do Sol Novela de Ana Maria Moretzsohn Rede Record 2006 Cidadão Brasileiro Novela de Lauro César Muniz Rede Record 2005 Esmeralda Novela do SBT 2003 Mulheres Apaixonadas Novela de Manoel Carlos TV Globo 2002 Coração de Estudante Novela de Emanoel Jacobina TV Globo 2000 Vidas Cruzadas Novela de Marcos Lazarini Rede Record 1996 Razão de Viver Novela de Analy Alvarez e Zeno Wilde SBT 1994 As Pupilas do Senhor Reitor Novela de Lauro César Muniz SBT 1991 O Fantasma da Ópera Novela de Paulo Afonso de Lima Rede Manchete 1990 Barriga de Aluguel Novela de Glória Perez TV Globo 1986 Procura- se um Papai Noel Especial de Natal da TV Globo 1985 De Quina Pra Lua Novela de Alcides Nogueira TV Globo Teletema Seis microsséries de vários autores TV Globo 1982/83 Tudo por Você Novela do SBT 1979/81 Malu Mulher Seriado de diversos autores TV Globo Cinema 2007 O Corpo Direção: Rossana Foglia e Rubens Rewald 1985 A Hora da Estrela Direção: Suzana Amaral Tradução O Incidente no 113 Texto teatral da colombiana Nelly Vivas D. Pirlimpim com Belisa em seu Jardim Texto teatral do espanhol F. Garcia Lorca Três Marias e uma Rosa Texto teatral do chileno David Benavente Prêmios 1998 Prêmio Apetesp (São Paulo) de melhor atriz em papel coadjuvante, no espetáculo Pérola PrêmioMambembe(RiodeJaneiro)demelhoratriz em papel coadjuvante, no espetáculo Pérola 1990 Prêmio Mambembe (Rio de Janeiro) de melhor atriz em papel coadjuvante, no espetáculo Estrela do Lar 1988 Prêmio Apetesp (São Paulo) de melhor atriz em papel coadjuvante, no espetáculo A Cerimônia do Adeus 1978 Prêmio Governador do Estado (São Paulo) de melhor atriz em papel coadjuvante, no espetáculo Caixa de Sombras Prêmio Ziembinski (Apetesp – São Paulo) de melhor atriz, no espetáculo Caixa de Sombras Prêmio APCA (São Paulo) de melhor atriz, no espetáculo Caixa de Sombras 1964 Prêmio Governador do Estado (São Paulo) de melhor cantora 1963 Prêmio Governador do Estado (São Paulo) de melhor atriz de Teatro Amador Outras Atividades na Área Artística 2004 Participa da comissão de seleção de projetos para o prêmio Funarte de viagens teatrais 1981 Funda, com Antonio Petrin, José Armando Pereira da Silva e Walter Portella, todos da região do ABC paulista, a Proa – Produções Artísticas do ABC Ltda. 1977 Diretora de produção do espetáculo O amor de Dom Perlimplim com Belisa, em Seu Jardim, de F. Garcia Lorca. Direção de Antonio Petrin. Produção: Grupo de Teatro da Cidade, de Santo André 1970 Produtora e preparadora vocal do coro do espetáculo A Cidade Assassinada, de Antonio Callado, que inaugurou o Teatro Distrital Conchita de Moraes, Santo André. Direção de Antonio Petrin 1968 Funda, juntamente com seu marido Aníbal Guedes e o ator Antonio Petrin, o GTC (Grupo de Teatro da Cidade), primeiro grupo profissional fora da capital de São Paulo, no qual participa como atriz e diretora de produção de várias montagens, tanto em Santo André como em São Paulo e outros Estados brasileiros 1967 Estagia durante um ano com o diretor Alfredo Mesquita nos espetáculos A Sonata dos Espectros, de A. Strindberg e O Burguês Fidalgo, de Molière. EAD de São Paulo 1962 Funda, com Chico de Assis (Teatro de Arena) e Aníbal Guedes, o Centro Popular de Cultura do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André. Montam, entre outros espetáculos, Eles não Usam Black-Tie, de Gianfrancesco Guarnieri Índice Apresentação – José Serra 5 Coleção Aplauso – Hubert Alquéres 7 Introdução – Adélia Nicolete 13 Convite 17 English Breakfast 19 Frutas Silvestres 37 Assam 63 Melissa 81 Hortelã 105 Maçã, Morango, Pêssego... 125 Jasmim 151 Cronologia 167 Crédito das Fotografias Alexandre de Oliveira 171 Alirio Jiménez 103 Ana Maria 136, 137 Antonio Guerreiro 12, 166 Carlos W. Weise 23 Christiana F. Carvalho 113 Estúdio Muito Bom 50, 52 Guga Melgar 143, 145, 146, 169 Januário/Reportagem Foto Brasil 79 Jefferson Pancieri 156 Lenise Pinheiro 168 Lívio Campos 148 marKo 129, 130, 178 Norma / Foto Reportagem 56 Staut 183 Studio ABC 78 Vânia Toledo 109, 110 A presente obra conta com diversas fotos, grande parte de autoria identificada e, desta forma, devidamente creditada. Contudo, a despeito dos enormes esforços de pesquisa empreendidos, uma parte das fotografias ora disponibilizadas não é de autoria conhecida de seus organizadores, fazendo parte do acervo pessoal do biografado. Qualquer informação neste sentido será bem-vinda, por meio de contato com a editora desta obra (livros@imprensaoficial.com.br/ Grande São Paulo SAC 11 5013 5108 | 5109 / Demais localidades 0800 0123 401), para que a autoria das fotografias porventura identificadas seja devidamente creditada. Coleção Aplauso Série Cinema Brasil Alain Fresnot – Um Cineasta sem Alma Alain Fresnot O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias Roteiro de Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert e Cao Hamburger Anselmo Duarte – O Homem da Palma de Ouro Luiz Carlos Merten Ary Fernandes – Sua Fascinante História Antônio Leão da Silva Neto Batismo de Sangue Roteiro de Helvécio Ratton e Dani Patarra Bens Confiscados Roteiro comentado pelos seus autores Daniel Chaia e Carlos Reichenbach Braz Chediak – Fragmentos de uma vida Sérgio Rodrigo Reis Cabra-Cega Roteiro de Di Moretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo Kauffman O Caçador de Diamantes Roteiro de Vittorio Capellaro, comentado por Máximo Barro Carlos Coimbra – Um Homem Raro Luiz Carlos Merten Carlos Reichenbach – O Cinema Como Razão de Viver Marcelo Lyra A Cartomante Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis Casa de Meninas Romance original e roteiro de Inácio Araújo O Caso dos Irmãos Naves Roteiro de Jean-Claude Bernardet e Luis Sérgio Person O Céu de Suely Roteiro de Mauricio Zacharias, Karim Aïnouz e Felipe Bragança Chega de Saudade Roteiro de Luiz Bolognesi Cidade dos Homens Roteiro de Paulo Morelli e Elena Soárez Como Fazer um Filme de Amor Roteiro escrito e comentado por Luiz Moura e José Roberto Torero Críticas de Edmar Pereira – Razão e Sensibilidade Org. Luiz Carlos Merten Críticas de Jairo Ferreira – Críticas de Invenção: Os Anos do São Paulo Shimbun Org. Alessandro Gamo Críticas de Luiz Geraldo de Miranda Leão – Analisando Cinema: Críticas de LG Org. Aurora Miranda Leão Críticas de Rubem Biáfora – A Coragem de Ser Org. Carlos M. Motta e José Júlio Spiewak De Passagem Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias Desmundo Roteiro de Alain Fresnot, Anna Muylaert e Sabina Anzuategui Djalma Limongi Batista – Livre Pensador Marcel Nadale Dogma Feijoada: O Cinema Negro Brasileiro Jeferson De Dois Córregos Roteiro de Carlos Reichenbach A Dona da História Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho Os 12 Trabalhos Roteiro de Claudio Yosida e Ricardo Elias Estômago Roteiro de Lusa Silvestre, Marcos Jorge e Cláudia da Natividade Fernando Meirelles – Biografia Prematura Maria do Rosário Caetano Fim da Linha Roteiro de Gustavo Steinberg e Guilherme Werneck; Storyboard de Fabio Moon e Gabriel Bá Fome de Bola – Cinema e Futebol no Brasil Luiz Zanin Oricchio Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta Cinéfilo Luiz Zanin Oricchio Helvécio Ratton – O Cinema Além das Montanhas Pablo Villaça O Homem que Virou Suco Roteiro de João Batista de Andrade, organização de Ariane Abdallah e Newton Cannito João Batista de Andrade – Alguma Solidão e Muitas Histórias Maria do Rosário Caetano Jorge Bodanzky – O Homem com a Câmera Carlos Alberto Mattos José Carlos Burle – Drama na Chanchada Máximo Barro Liberdade de Imprensa – O Cinema de Intervenção Renata Fortes e João Batista de Andrade Luiz Carlos Lacerda – Prazer & Cinema Alfredo Sternheim Maurice Capovilla – A Imagem Crítica Carlos Alberto Mattos Não por Acaso Roteiro de Philippe Barcinski, Fabiana Werneck Barcinski e Eugênio Puppo Narradores de Javé Roteiro de Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu Onde Andará Dulce Veiga Roteiro de Guilherme de Almeida Prado Pedro Jorge de Castro – O Calor da Tela Rogério Menezes Quanto Vale ou É por Quilo Roteiro de Eduardo Benaim, Newton Cannito e Sergio Bianchi Ricardo Pinto e Silva – Rir ou Chorar Rodrigo Capella Rodolfo Nanni – Um Realizador Persistente Neusa Barbosa O Signo da Cidade Roteiro de Bruna Lombardi Ugo Giorgetti – O Sonho Intacto Rosane Pavam Viva-Voz Roteiro de Márcio Alemão Zuzu Angel Roteiro de Marcos Bernstein e Sergio Rezende Série Crônicas Crônicas de Maria Lúcia Dahl – O Quebra-cabeças Maria Lúcia Dahl Série Cinema Bastidores – Um Outro Lado do Cinema Elaine Guerini Série Ciência & Tecnologia Cinema Digital – Um Novo Começo? Luiz Gonzaga Assis de Luca Série Dança Rodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo – Dança Universal Sérgio Rodrigo Reis Série Teatro Brasil Alcides Nogueira – Alma de Cetim Tuna Dwek Antenor Pimenta – Circo e Poesia Danielle Pimenta Cia de Teatro Os Satyros – Um Palco Visceral Alberto Guzik Críticas de Clóvis Garcia – A Crítica Como Oficio Org. Carmelinda Guimarães Críticas de Maria Lucia Candeias – Duas Tábuas e Uma Paixão Org. José Simões de Almeida Júnior João Bethencourt – O Locatário da Comédia Rodrigo Murat Leilah Assumpção – A Consciência da Mulher Eliana Pace Luís Alberto de Abreu – Até a Última Sílaba Adélia Nicolete Maurice Vaneau – Artista Múltiplo Leila Corrêa Renata Palottini – Cumprimenta e Pede Passagem Rita Ribeiro Guimarães Teatro Brasileiro de Comédia – Eu Vivi o TBC Nydia Licia O Teatro de Alcides Nogueira – Trilogia: Ópera Joyce – Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso – Pólvora e Poesia Alcides Nogueira O Teatro de Ivam Cabral – Quatro textos para um teatro veloz: Faz de Conta que tem Sol lá Fora – Os Cantos de Maldoror – De Profundis – A Herança do Teatro Ivam Cabral O Teatro de Noemi Marinho: Fulaninha e Dona Coisa, Homeless, Cor de Chá, Plantonista Vilma Noemi Marinho Teatro de Revista em São Paulo – De Pernas para o Ar Neyde Veneziano O Teatro de Samir Yazbek: A Entrevista – O Fingidor – A Terra Prometida Samir Yazbek Teresa Aguiar e o Grupo Rotunda – Quatro Décadas em Cena Ariane Porto Série Perfil Aracy Balabanian – Nunca Fui Anjo Tania Carvalho Ary Fontoura – Entre Rios e Janeiros Rogério Menezes Bete Mendes – O Cão e a Rosa Rogério Menezes Betty Faria – Rebelde por Natureza Tania Carvalho Carla Camurati – Luz Natural Carlos Alberto Mattos Cleyde Yaconis – Dama Discreta Vilmar Ledesma David Cardoso – Persistência e Paixão Alfredo Sternheim Denise Del Vecchio – Memórias da Lua Tuna Dwek Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida Maria Leticia Etty Fraser – Virada Pra Lua Vilmar Ledesma Gianfrancesco Guarnieri – Um Grito Solto no Ar Sérgio Roveri Glauco Mirko Laurelli – Um Artesão do Cinema Maria Angela de Jesus Ilka Soares – A Bela da Tela Wagner de Assis Irene Ravache – Caçadora de Emoções Tania Carvalho Irene Stefania – Arte e Psicoterapia Germano Pereira John Herbert – Um Gentleman no Palco e na Vida Neusa Barbosa José Dumont – Do Cordel às Telas Klecius Henrique Leonardo Villar – Garra e Paixão Nydia Licia Lília Cabral – Descobrindo Lília Cabral Analu Ribeiro Marcos Caruso – Um Obstinado Eliana Rocha Maria Adelaide Amaral – A Emoção Libertária Tuna Dwek Marisa Prado – A Estrela, o Mistério Luiz Carlos Lisboa Miriam Mehler – Sensibilidade e Paixão Vilmar Ledesma Nicette Bruno e Paulo Goulart – Tudo em Família Elaine Guerrini Niza de Castro Tank – Niza, Apesar das Outras Sara Lopes Paulo Betti – Na Carreira de um Sonhador Teté Ribeiro Paulo José – Memórias Substantivas Tania Carvalho Pedro Paulo Rangel – O Samba e o Fado Tania Carvalho Reginaldo Faria – O Solo de Um Inquieto Wagner de Assis Renata Fronzi – Chorar de Rir Wagner de Assis Renato Borghi – Borghi em Revista Élcio Nogueira Seixas Renato Consorte – Contestador por Índole Eliana Pace Rolando Boldrin – Palco Brasil Ieda de Abreu Rosamaria Murtinho – Simples Magia Tania Carvalho Rubens de Falco – Um Internacional Ator Brasileiro Nydia Licia Ruth de Souza – Estrela Negra Maria Ângela de Jesus Sérgio Hingst – Um Ator de Cinema Máximo Barro Sérgio Viotti – O Cavalheiro das Artes Nilu Lebert Silvio de Abreu – Um Homem de Sorte Vilmar Ledesma Sonia Maria Dorce – A Queridinha do meu Bairro Sonia Maria Dorce Armonia Sonia Oiticica – Uma Atriz Rodrigueana? Maria Thereza Vargas Suely Franco – A Alegria de Representar Alfredo Sternheim Tatiana Belinky – ... E Quem Quiser Que Conte Outra Sérgio Roveri Tony Ramos – No Tempo da Delicadeza Tania Carvalho Vera Holtz – O Gosto da Vera Analu Ribeiro Walderez de Barros – Voz e Silêncios Rogério Menezes Zezé Motta – Muito Prazer Rodrigo Murat Especial Agildo Ribeiro – O Capitão do Riso Wagner de Assis Beatriz Segall – Além das Aparências Nilu Lebert Carlos Zara – Paixão em Quatro Atos Tania Carvalho Cinema da Boca – Dicionário de Diretores Alfredo Sternheim Dina Sfat – Retratos de uma Guerreira Antonio Gilberto Eva Todor – O Teatro de Minha Vida Maria Angela de Jesus Eva Wilma – Arte e Vida Edla van Steen Gloria in Excelsior – Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira Álvaro Moya Lembranças de Hollywood Dulce Damasceno de Britto, organizado por Alfredo Sternheim Maria Della Costa – Seu Teatro, Sua Vida Warde Marx Ney Latorraca – Uma Celebração Tania Carvalho Raul Cortez – Sem Medo de se Expor Nydia Licia Rede Manchete – Aconteceu, Virou História Elmo Francfort Sérgio Cardoso – Imagens de Sua Arte Nydia Licia TV Tupi – Uma Linda História de Amor Vida Alves Victor Berbara – O Homem das Mil Faces Tania Carvalho Formato: 12 x 18 cm Tipologia: Frutiger Papel miolo: Offset LD 90 g/m2 Papel capa: Triplex 250 g/m2 Número de páginas: 208 Editoração, CTP, impressão e acabamento: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo © 2008 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Nicolete, Adélia Sônia Guedes : chá das cinco / Adélia Nicolete. – São Paulo : Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2008. 208p. : il. – (Coleção aplauso. Série perfil / Coordenador geral Rubens Ewald Filho) ISBN 978-85-7060-636-5 1. Atores e atrizes cinematográficos – Brasil – Biografia 2. Atores e Atrizes de teatro – Brasil – Biografia 3. Atores e atrizes de televisão – Brasil – Biografia 4. Guedes, Sônia, 1932 . I. Ewald Filho, Rubens. II. Título. III. Série. CDD 791.092 Índices para catálogo sistemático: 1. Atores brasileiros : Biografia 791.092 Foi feito o depósito legal na Biblioteca Nacional (Lei nº 10.994, de 14/12/2004) Direitos reservados e protegidos pela lei 9610/98 Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Rua da Mooca, 1921 Mooca 03103-902 São Paulo SP www.imprensaoficial.com.br/livraria livros@imprensaoficial.com.br Grande São Paulo SAC 11 5013 5108 | 5109 Demais localidades 0800 0123 401 Coleção Aplauso | em todas as livrarias e no site www.imprensaoficial.com.br/livraria