Zezé Motta Muito Prazer GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO RESPEITO POR VOCÊ Governador Geraldo Alckmin Secretário Chefe da Casa Civil Arnaldo Madeira Imprensa Oficial do Estado de São Paulo   Diretor-presidente Hubert Alquéres Diretor Vice-presidente Luiz Carlos Frigerio Diretor Industrial Teiji Tomioka Diretora Financeira e Administrativa Nodette Mameri Peano Chefe de Gabinete Emerson Bento Pereira   Núcleo de Projetos Institucionais Vera Lucia Wey Cultura Fundação padre Anchieta Presidente Marcos Mendonça Projetos Especiais Adélia Lombardi Diretor de Programação Rita Okamura Coleção Aplauso Perfil   Coordenador Geral Rubens Ewald Filho Coordenador Operacional e Pesquisa Iconográfica Marcelo Pestana Projeto Gráfico  e Editoração Carlos Cirne Assistente Operacional Andressa Veronesi Tratamento de Imagens José Carlos da Silva Zezé Motta Muito Prazer por Rodrigo Murat CULTURA FUNDAÇÃO PADRE ANCHIETA IMPRENSA OFICIAL SÃO PAULO – 2005 IMPRENSA OFICIAL 2005 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação elaborados pela Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Murat, Rodrigo. Zezé Motta : muito prazer / por Rodrigo Murat. – São Paulo : Imprensa Oficial do Estado de São Paulo : Cultura – Fundação Padre Anchieta, 2005. 208p. : Il. – (Coleção aplauso. Série perfil/ coordenador geral Rubens Ewald Filho). ISBN 85-7060-233-2 (Obra completa) (Imprensa Oficial) ISBN 85-7060-412-2 (Imprensa Oficial) 1. Atores e atrizes cinematográficos – Brasil - Biografia 2. Atores e atrizes de teatro - Biografia 3. Motta, Zezé I. Ewaldo Filho, Rubens. II. Título. III. Série. CDD 791.092 Índices para catálogo sistemático: 1. Atores brasileiros : Biografia : Representações públicas : Artes 791.092 Foi feito o depósito legal na Biblioteca Nacional (Lei nº 1.825, de 20/12/1907). Direitos reservados e protegidos pela lei 9610/98 Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Rua da Mooca, 1921 - Mooca 03103-902 - São Paulo - SP - Brasil Tel.: (0xx11) 6099-9800 Fax: (0xx11) 6099-9674 www.imprensaoficial.com.br e-mail: livros@imprensaoficial.com.br SAC 0800-123401 Apresentação “O que lembro, tenho.” Guimarães Rosa A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa Oficial, tem como atributo principal reabilitar e resgatar a memória da cultura nacional, biografando atores, atrizes e diretores que compõem a cena brasileira nas áreas do cinema, do teatro e da televisão. Essa importante historiografia cênica e audiovisual brasileiras vem sendo reconstituída de maneira singular. O coordenador de nossa coleção, o crítico Rubens Ewald Filho, selecionou, criteriosamente, um conjunto de jornalistas especializados para realizar esse trabalho de aproximação junto a nossos biografados. Em entrevistas e encontros sucessivos foi-se estreitando o contato com todos. Preciosos arquivos de documentos e imagens foram abertos e, na maioria dos casos, deu-se a conhecer o universo que compõe seus cotidianos. A decisão em trazer o relato de cada um para a primeira pessoa permitiu manter o aspecto de tradição oral dos fatos, fazendo com que a memória e toda a sua conotação idiossincrásica aflorasse de maneira coloquial, como se o biografado estivesse falando diretamente ao leitor. Gostaria de ressaltar, no entanto, um fator importante na Coleção, pois os resultados obtidos ultrapassam simples registros biográficos, revelando ao leitor facetas que caracterizam também o artista e seu ofício. Tantas vezes o biógrafo e o biografado foram tomados desse envolvimento, cúmplices dessa simbiose, que essas condições dotaram os livros de novos instrumentos. Assim, ambos se colocaram em sendas onde a reflexão se estendeu sobre a formação intelectual e ideológica do artista e, supostamente, continuada naquilo que caracterizava o meio, o ambiente e a história brasileira naquele contexto e momento. Muitos discutiram o importante papel que tiveram os livros e a leitura em sua vida. Deixaram transparecer a firmeza do pensamento crítico, denunciaram preconceitos seculares que atrasaram e continuam atrasando o nosso país, mostraram o que representou a formação de cada biografado e sua atuação em ofícios de linguagens diferenciadas como o teatro, o cinema e a televisão – e o que cada um desses veículos lhes exigiu ou lhes deu. Foram analisadas as distintas linguagens desses ofícios. Cada obra extrapola, portanto, os simples relatos biográficos, explorando o universo íntimo e psicológico do artista, revelando sua autodeterminação e quase nunca a casualidade em ter se tornado artista, seus princípios, a formação de sua personalidade, a persona e a complexidade de seus personagens. São livros que irão atrair o grande público, mas que – certamente – interessarão igualmente aos nossos estudantes, pois na Coleção Aplauso foi discutido o intrincado processo de criação que envolve as linguagens do teatro e do cinema. Foram desenvolvidos temas como a construção dos personagens interpretados, bem como a análise, a história, a importância e a atualidade de alguns dos personagens vividos pelos biografados. Foram examinados o relacionamento dos artistas com seus pares e diretores, os processos e as possibilidades de correção de erros no exercício do teatro e do cinema, a diferenciação fundamental desses dois veículos e a expressão de suas linguagens. A amplitude desses recursos de recuperação da memória por meio dos títulos da Coleção Aplauso, aliada à possibilidade de discussão de instrumentos profissionais, fez com que a Imprensa Oficial passasse a distribuir em todas as bibliotecas importantes do país, bem como em bibliotecas especializadas, esses livros, de gratificante aceitação. Gostaria de ressaltar seu adequado projeto gráfico, em formato de bolso, documentado com iconografia farta e registro cronológico completo para cada biografado, em cada setor de sua atuação. A Coleção Aplauso, que tende a ultrapassar os cem títulos, se afirma progressivamente, e espera contemplar o público de língua portuguesa com o espectro mais completo possível dos artistas, atores e diretores, que escreveram a rica e diversificada história do cinema, do teatro e da televisão em nosso país, mesmo sujeitos a percalços de naturezas várias, mas com seus protagonistas sempre reagindo com criatividade, mesmo nos anos mais obscuros pelos quais passamos. Além dos perfis biográficos, que são a marca da Coleção Aplauso, ela inclui ainda outras séries: Projetos Especiais, com formatos e características distintos, em que já foram publicadas excepcionais pesquisas iconográficas, que se originaram de teses universitárias ou de arquivos documentais pré-existentes que sugeriram sua edição em outro formato. Temos a série constituída de roteiros cinematográficos, denominada Cinema Brasil, que publicou o roteiro histórico de O Caçador de Diamantes, de Vittorio Capellaro, de 1933, considerado o primeiro roteiro completo escrito no Brasil com a intenção de ser efetivamente filmado. Paralelamente, roteiros mais recentes, como o clássico O Caso dos Irmãos Naves, de Luis Sérgio Person, Dois Córregos, de Carlos Reichenbach, Narradores de Javé, de Eliane Caffé, e Como Fazer um Filme de Amor, de José Roberto Torero, que deverão se tornar bibliografia básica obrigatória para as escolas de cinema, ao mesmo tempo em que documentam essa importante produção da cinematografia nacional. Gostaria de destacar a obra Gloria in Excelsior, da série TV Brasil, sobre a ascensão, o apogeu e a queda da TV Excelsior, que inovou os procedimentos e formas de se fazer televisão no Brasil. Muitos leitores se surpreenderão ao descobrirem que vários diretores, autores e atores, que na década de 70 promoveram o crescimento da TV Globo, foram forjados nos estúdios da TV Excelsior, que sucumbiu juntamente com o Grupo Simonsen, perseguido pelo regime militar. Se algum fator de sucesso da Coleção Aplauso merece ser mais destacado do que outros, é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o percurso cultural de seu país. De nossa parte coube reunir um bom time de jornalistas, organizar com eficácia a pesquisa documental e iconográfica, contar com a boa vontade, o entusiasmo e a generosidade de nossos artistas, diretores e roteiristas. Depois, apenas, com igual entusiasmo, colocar à disposição todas essas informações, atraentes e acessíveis, em um projeto bem cuidado. Também a nós sensibilizaram as questões sobre nossa cultura que a Coleção Aplauso suscita e apresenta – os sortilégios que envolvem palco, cena, coxias, set de filmagens, cenários, câmeras – e, com referência a esses seres especiais que ali transitam e se transmutam, é deles que todo esse material de vida e reflexão poderá ser extraído e disseminado como interesse que magnetizará o leitor. A Imprensa Oficial se sente orgulhosa de ter criado a Coleção Aplauso, pois tem consciência de que nossa história cultural não pode ser negligenciada, e é a partir dela que se forja e se constrói a identidade brasileira. Hubert Alquéres Diretor-presidente da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Introdução   Zezé não pára. Entre uma ida a Gramado, onde foi jurada do Festival de Cinema, um pulo a São Paulo para palestrar sobre “Igualdade” a funcionários de uma instituição financeira e duas viagens ao exterior, a Angola – para show com Luiz Melodia – e a Cabo Verde – para filmar com Francisco Manso –, ela sentou-se diante do gravador para contar sua história. Era uma vez... Não, a história de Zezé não combina muito com era uma vez, embora tenha seu toque de fadas. A menina nascida em Campos, trazida pequena para o Rio de Janeiro arquetípico dos anos 40, trocou a abóbora pela carruagem no dia em que colocou o pezinho no palco e pensou: “Ai, que delícia!” (risos) A rubrica (risos) poderia acompanhar todo o corpo do texto de sua biografia, ao final de cada parágrafo. Porque Zezé é assim: um parágrafo e um riso, um parágrafo e um riso. Em estilos diversos: graves, agudos, jocosos, meigos, cúmplices, revigorantes.   Os amigos de Zezé garantem que seu sorriso emite ondas de tranqüilidade. Quem faz a tal da zezeterapia, mantém-se adepto. Não à toa, Guto Graça Mello e Naila Scorpio compuseram a música Vitamina Z: Não duvide bula / agite antes de usar / eu fui feita pra você / sou sua vitamina Z.   Canceriana mística, Zezé atribui sua força a Oxum. Prosear com ela é reencontrar Xica, Dandara, Lulu Kelly, Titina, Paula, Dorinha, Nossa Senhora, Condessa de Almaviva, Crioula, tantas e tantas personas que a nossa cantoratriz encarnou ao longo de uma carreira que ainda promete dar o que falar.   Agora mesmo está pré-indicada ao Nobel. De mil mulheres a quem o prêmio resolveu prestar homenagem, 33 são do Brasil e Zezé está entre elas. Onde ela vai parar, ninguém sabe. Como diz a canção Pecado Original, de Caetano: A gente nunca sabe mesmo / o que é que quer uma mulher.   Zezé afirma buscar personagens nas músicas que canta. É incrível a história acerca da interpretação de Postal de Amor, assim como um episódio do filme El Mestizo, rodado na Venezuela.   As histórias de Zezé impressionam, ora pela carga de normalidade ora pelo quê de inusitado. Pois Zezé é assim: uma diva espontânea, complexamente simples, iluminada pela própria natureza e não por artifícios exteriores.   Vocês podem pensar que eu estou puxando brasa para a sardinha do livro, ou rasgando seda para a minha entrevistada, mas uma coisa é certa: o aplauso para Zezé nasce puro, como um refluxo da alma.   Com vocês, no palco da Coleção Aplauso, Zezé Motta. Capítulo I Eu tenho fama de ser maluquete / ninguém me engana nem joga confete / mas pra quem gosta de amor e segredo / eu sou um prato cheio / eu quero dar uma colher / é, eu sou Zezé (Muito Prazer Zezé, Rita Lee e Roberto de Carvalho) Meu nome é Maria José Motta. Por alguma razão, o Oliveira da família de meu pai Luiz não entrou. Minha mãe é Maria Elasir. Durante anos, fui chamada de Maria. Na minha estréia em teatro profissional assinava Maria José Motta. Marília Pêra, que considero minha madrinha artística, foi quem sugeriu Zezé.   Nasci em Usina Barcelos, interior de Campos, em 27 de junho de 1944. Vim para o Rio pequena, com menos de três anos. Meus pais quiseram tentar a sorte na cidade grande. Ele era músico e ela costurava. Uma coisa assim meio o feijão e o sonho. Não que ele não tivesse os pés no chão. Era um músico erudito que tinha um grupo regional para sobreviver. Tocava no Bola Preta, na Estudantina e em outros lugares badalados da época. Dava aulas de violão durante o dia e ainda era sócio de um ônibus escolar que servia ao Sacré-Coeur de Marie. Ou seja, se virava para dar à gente uma vida confortável.   Meu avô era dono de canavial em Campos. Quando adolescente, eu passava férias lá e a minha querida amiga Maria Bethânia, em parceria com Rosinha de Valença, chegou a compor para mim a música Cana Caiana: Meu rumo foi traçado / na palma de uma palmeira / na beira do Paraíba / eu sou ouro negro de Campos / dona dos canaviais / pele macia / cor de canela / cintura fina / cor de canela.   Era para eu ter ficado com meus pais e meu meio-irmão por parte de mãe – Romilton - no morro do Cantagalo. (Meus outros irmãos são por parte de pai: Lúcia, Manoel e Evaldo, já falecido.)   Acontece que, no dia em que eles fecharam negócio com o barraco, souberam que uma menor havia sido violentada na vizinhança. Ficaram em pânico e acharam mais seguro eu ficar com um tio, porteiro, no Leblon.   Quem morava no prédio era a Marieta Severo e nós brincávamos juntas. Anos depois, quando eu estreei profissionalmente nos palcos, ela estava no elenco e a mãe dela ao me ver, da platéia, disse: Aquela não é a Maria José?   Fiquei com esse tio e mais quatro primos até os seis anos, quando, então, fui para o colégio interno – o Asilo Espírita João Evangelista, em Botafogo. Era um internato só para meninas e assim mantém-se até hoje.   Foi muito importante para mim a experiência. Eles adotavam o kardecismo e, mesmo sem participar diretamente das sessões espíritas, que aconteciam às terças e sextas, a gente sabia o que acontecia: que se tomava passe, que se recebia santo, que Mãe Áurea, fundadora do colégio, às vezes baixava na sessão e nos trazia recados. Claro que tinha o lado repressor. Afinal, estamos falando de um internato para moças de 1950. Nós não podíamos receber visita de homem que não fosse parente e éramos obrigadas a tomar banho metidas em camisolões. Mostrar o corpo era tabu mesmo entre nós, meninas. Hoje isso mudou. Ainda vou lá, mantenho contato com pessoas como tia Lúcia, minha querida professora.   Desde cedo, tinha meu lado espevitado, de gostar de me exibir. Declamava poemas nas festinhas relacionadas a datas históricas e escrevia poesia.   Era para eu ter ficado até os 16, mas acabei saindo aos 12 porque a situação financeira dos meus pais melhorou e eles não achavam justo que eu ocupasse a vaga de uma menina necessitada.   A essa altura, eles já não moravam mais no Cantagalo e tinham se mudado para um apartamento no Leblon, na Rua Humberto de Campos. Minha mãe teve um ateliê de costura em casa durante 30 anos. Aprendi a costurar e quando o trabalho apertava ajudava também meu irmão a fazer as entregas.   Minha casa era um hospício. Era mamãe na máquina de costura o dia inteiro, papai no violão praticando, e o rádio eternamente ligado. Descobri o fascínio pela música ouvindo Ângela Maria, Nora Ney, Cauby Peixoto, Marlene, Emilinha, Jorge Goulart, Ellen de Lima – os reis da voz. Papai chegava da rua e eu ia correndo cantar uma melodia nova que tinha aprendido. Ele se impressionava: Menina, quantas vezes você ouviu essa música? E não tinha sido mais que duas. Ele percebeu que eu tinha bom ouvido – o que é fundamental para se cantar – e afinação.   Comecei a trabalhar fora depois que meus pais se separaram. Minha mãe andou adoentada e a gente ficou meio apertada de dinheiro. Sabe como é costura. Tem épocas melhores, outras piores. Então, descolei um emprego como acondicionadora de produtos no laboratório Moura Brasil, na Gávea, enquanto voltava aos estudos para concluir o ginásio.   Tive a felicidade de freqüentar uma instituição fundada por dom Hélder Câmara, um colégio que existe até hoje na Cruzada São Sebastião. Na época, chamava-se Santos Anjos.   A Cruzada foi uma obra de dom Hélder para os ex-favelados da Praia do Pinto. Eu não tinha direito de ser aluna porque o colégio era exclusivo para os moradores. Mas o meu irmão namorava uma menina de lá e eu dei o endereço dela como sendo o meu. O velho e bom jeitinho brasileiro.   Foi fundamental na minha formação. A partir do contato com as idéias de dom Hélder, adquiri consciência política e me tornei uma pessoa de esquerda. Comecei a me dar conta de toda a injustiça social. Como ele era perseguido pela direita, acabou se exilando, mas os professores do Santos Anjos seguiam a sua filosofia. Dentre eles, o queridíssimo Jader de Brito, filósofo, que é meu amigo até hoje.   Foi por incentivo dele que comecei a me interessar por arte. Ele levava a gente aos Concertos da Juventude do Theatro Municipal; ao Museu de Raimundo Castro Maia, no Alto da Boa Vista, para conhecer as gravuras de Rugendas e Debret do Rio antigo; ao Largo do Boticário para assistir Memórias de um Sargento de Milícias, com Milton Gonçalves no elenco; ao Teatro Opinião para assistir Liberdade, Liberdade. Era o auge da ditadura, mas tínhamos esse paizão cultural.   Comecei a fazer teatro participando do grêmio recreativo. Adorava. Era tão dedicada que trocava tudo para estar lá. Nos finais de semana, não queria saber de praia, festinha, nada. Só queria ensaiar.   A gente mesmo produzia os espetáculos e apresentava para os moradores da comunidade. Eram textos engajados como Terror e Miséria do Terceiro Reich, de Brecht, Diário de Anne Frank e trechos do Liberdade, Liberdade. Eu cantava a Marcha da Quarta-feira de Cinzas: A tristeza que a gente tem / qualquer dia vai se acabar...   Cheguei a vivenciar uma experiência curiosa ligada à questão racial. Quando montamos Os Viajantes, auto de Natal da Maria Clara Machado, quase fomos apedrejados pelo público. Fizemos a apresentação entre os pilotis, no vão central dos edifícios, e quando os moradores deram com uma Virgem Maria negra, feita por mim, e um José crioulo, interpretado pelo meu saudoso Zaqueu, já falecido, começaram a atirar ovos e a vaiar. Tivemos que interromper e continuar a sessão no pátio do colégio. Para você ver que o preconceito está enraizado mesmo entre negros e pobres.   Depois o Jader, percebendo meu profundo interesse por teatro, conseguiu para mim uma bolsa no Tablado, onde tive o privilégio de ser aluna da Maria Clara Machado. Ou seja, colei grau em dezembro de 1966 e dias depois já estava começando meu curso de verão.   Mas como não se acreditava que se pudesse sobreviver de teatro, eu que não era boba nem nada e tinha aprendido com os meus pais o valor e o sentido do trabalho, entrei para o curso de Contabilidade, onde me formei, e não abandonei meu emprego de laboratorista.   Quando uma vizinha soube que eu estava no Tablado, maldou: Ué, não sabia que para fazer papel de empregada precisava de curso. Quer dizer, volta e meia eu esbarrava nessa historinha de preconceito.   Até porque na maior parte dos lugares que eu freqüentava – o curso de inglês, o Tablado, o prédio onde eu morava – eu era a única negra. E você sabe como é adolescente. As meninas não deixavam por menos. Diziam que eu tinha cabelo ruim, nariz chato, bunda grande. Quer dizer, eu queria ser branca, ter nariz afilado, cabelo liso. Achava que só sendo branca eu seria aceita. Levou algum tempo até eu sair dessa “alienação” e me aceitar. Capítulo II   Vê se te enxerga, seu galego de uma figa / se eu quisesse vida fácil / punha casa no Estácio / pra barão e senador / mas não vendo meu amor / isso é que não (Rita Baiana, John Neschling e Geraldo Carneiro)   Foi numa apresentação de fim de curso no Tablado, num musical da Maria Clara, Miss Brasil, em que eu cantava I´am Rita of America / how do you do / merci beaucoup / onde passo tem sururu / sou negra internacional / sem complexo racial, que surgiu a oportunidade de saltar para o teatro profissional.   Flávio São Tiago, ator, veio assistir ao espetáculo e ficou muito bem impressionado com a minha performance. Veio falar comigo nos bastidores e disse que estava no elenco de uma peça que o Chico Buarque tinha escrito e que o José Celso Martinez Corrêa ia dirigir: Roda Viva. Ia haver testes para a seleção do coro e talvez eu tivesse chance. Não tive dúvida. Na segunda-feira já estava fazendo teste; dez dias depois já estava ensaiando. Zé Celso adorou a idéia de ter negros no coro, do qual faziam parte, entre outros atores estreantes, o Pedro Paulo Rangel e o André Valli.   Veja a minha situação: eu tinha 21 anos, era noiva e virgem. Às vésperas da estréia, meu noivo, talvez pressionado pela família, mandou que eu escolhesse: o teatro ou ele. A paixão pela carreira falou mais alto e eu fiquei com o teatro.   A peça tinha muito palavrão e até eu ficava chocada. O personagem do Pereio dizia coisas do tipo um brinde ao c. da mãe! Quando meus pais foram assistir, implorei ao Zé Celso que me deixasse de fora das cenas mais picantes. Ele me deu uma sova: Ô menina, vê se você decide o que você quer: se é enxoval ou se é teatro!   Os tempos políticos eram pesados e a temporada foi turbulenta. A maioria adorava, mas o povo de direita reclamava nos jornais, taxava o espetáculo de pornográfico, aviltante à moral e aos bons costumes, e a censura não largava do nosso pé.   A montagem era anárquica mesmo, não deixava pedra sobre pedra e além dos palavrões, fazia uma crítica avassaladora ao star system e à ditadura, convocando o público a sair da passividade. Era o papel do teatro de vanguarda do qual o grupo do Zé Celso, o Oficina, é porta-voz até hoje: cutucar o espectador com vara curta.   Tanto fizeram que a peça foi proibida. Aí fomos para a rua protestar e conseguimos liberar. Afinal, nós tínhamos o certificado de liberação prévio impetrado pelo próprio Serviço de Censura.   Em São Paulo, o bochicho aumentou. Algumas pessoas achavam absurdo que uma peça daquelas estivesse em cartaz. Então aconteceu o famoso episódio de espancamento após uma sessão no Teatro Ruth Escobar. O público estava acabando de sair, eu conversava com alguém, quando vi uns caras fortões subindo furiosamente as escadas que davam acesso aos bastidores munidos de cassetetes.   Tentei correr até o meu camarim, mas acabei entrando na primeira porta. Era o camarim do Rodrigo Santiago, que em São Paulo substituiu o Heleno Prestes no papel protagonista e que estava conversando com um casal de amigos.   Os brutamontes chegaram e empurraram a porta. Fizemos barreira, mas eles foram mais fortes e conseguiram entrar. Levei umas cacetadas, fiquei com dores, mas nada grave. Com outros atores e técnicos, a coisa foi pior. Teve gente que chegou a ser internada, uma atriz surtou, ficava batendo a cabeça na parede.   Depois ficamos sabendo que a quadrilha era composta por um grupo de extrema-direita de universitários do Mackenzie – o famoso CCC (Comando de Caça aos Comunistas). Como reação à barbárie, estudantes de esquerda passaram a nos proteger, fazendo um cinturão em torno do palco enquanto apresentávamos a peça.   Lembro da Marília Pêra no meio de um número musical, quando um espectador botou a mão no bolso para pegar um lenço. Ela parou de cantar no ato. Qualquer gesto suspeito era motivo de pânico.   Em Porto Alegre, foi pior. Estreamos com a ameaça de que a peça seria censurada. No dia seguinte à estréia, chegamos ao Teatro Leopoldina e as paredes estavam todas pichadas: ABAIXO A PORNOGRAFIA, além de frases do tipo, e havia guardas com metralhadoras.   A gerência do hotel em que a gente estava hospedada implorava para que fôssemos embora, pois havia ameaça de bomba. Acabamos indo para a casa de um ator do elenco, que tinha família lá, e ficamos escondidos. Descobriram onde estávamos e faziam ameaças. Foi terrível. A gente não sabia se ia sair vivo de lá. Uma parte da equipe foi até a Rodoviária, mas não conseguiu passagem para todos. Enquanto isso, o grupo que nos perseguia invadiu o hotel e espancou quatro pessoas. Pegaram a Elizabeth Gasper, que estava substituindo a Marília no sul, e o Zenão, um dos músicos, e ficaram horas rodando com eles de carro, fazendo terrorismo, mandando que ela tirasse a roupa como fazia em cena.   Estávamos em outubro de 1968, o Brasil vivendo seus anos de chumbo e eu num momento profissional delicado: de volta a São Paulo, sem trabalho, pensando seriamente em desistir de tudo e voltar para o Rio. Capítulo III   Mas devo dizer / que não vou lhe dar / o enorme prazer de me ver chorar / nem vou lhe cobrar pelo seu estrago / meu peito tão dilacerado (Trocando em Miúdos, Francis Hime e Chico Buarque)   A Marília Pêra entrou no elenco de Roda Viva na temporada de São Paulo substituindo a Marieta Severo, que não pode viajar por causa do trabalho na televisão.   Ficamos muito amigas. Durante a temporada, o André Valli e eu fomos morar com ela. Eu a secretariava quando preciso: levava o filho dela, Ricardo, no colégio, resolvia algum pepino do dia-a-dia, ajudava aqui e ali. Ela já era produtora e quis levantar um espetáculo onde pudesse empregar os colegas que estavam desempregados.   Enquanto estava em cartaz com Roda Viva, saía do Teatro e fazia shows na madrugada em boates como Telecoteco e Balacobaco, onde “esquentava” o público para a atração principal da noite, que fazia duas entradas triunfais e passava novamente a bola para nós, que não éramos estrelas. Cheguei a abrir para Clementina de Jesus. Uma honra.   Tinha o desejo de ser cantora e achava que, como crooner, pudesse ser vista por algum produtor e convidada a gravar um disco. Mas só quem aparecia eram os amigos, que faziam a maior torcida e pediam bis.   Conversando com outras cantoras da noite, vi que elas tinham 10, 15 anos de estrada e não tinham gravado sequer um compacto. Descobri que o buraco era mais embaixo e parei. Até porque era muito cansativo. Eu ia dormir com o sol nascendo e ainda recebia um mísero cachê de 80 cruzeiros. Não dava. Fora que começaram a surgir outros trabalhos como atriz – comerciais, por exemplo –, e eu não podia me dar ao luxo de trocar a noite pelo dia.   Conheci o Bráulio Pedroso e ele me chamou para integrar o elenco de Beto Rockfeller, na Tupi. Ele me disse: Olha, eu estou te convidando para fazer uma doméstica, mas não é para servir cafezinho e abrir porta, não. Você vai se divertir muito. Realmente me diverti fazendo a Zezé, empregada dos personagens da Maria Della Costa e do Walter Foster. Ela era ousada: namorava o mordomo, usava as roupas da patroa e ainda dava festas quando ficava só em casa. Foi a minha estréia na TV.   Fiz também A Patota, da Maria Clara Machado, na Globo, em que eu fazia uma estudante que gostava de cantar e paquerava o Reinaldo Gonzaga. Sempre que a gente ia gravar, o Reinaldo Boury, diretor, dizia: Lá vem o casal black and white. Mais tarde, novamente me foi oferecido papel de empregada em Supermanoela, mas o Walter Negrão, o autor, me garantiu que era uma personagem com participação na trama. Tudo ia muito bem até que a censura implicou porque a Doralice se metia demais na vida dos patrões. Ou seja, o Negrão foi obrigado a podar minhas asas e eu passei o resto do tempo servindo cafezinho e abrindo porta.   No teatro, fui fazer A Moreninha com a Marília, a mãe da Marília – Dinorah – e a avó da Marília – Antônia. Eu fazia a Paula, a babá da moreninha.   Era um musical adaptado do romance do Joaquim Manuel de Macedo e, num certo momento, eu fazia cafuné na dona Antônia cantando cafuné, cafuné / é de são / são tomé / veio lá das luandas / tem cheirinho de zimbanda. Foi a primeira música que eu gravei na vida, num compacto. O fato é que a avó da Marília já estava idosa e tinha dias em que ela dormia nessa cena. Eu tinha que dar uma catucada quando acabava de cantar porque era a deixa para ela chamar a moreninha: Carolina!   Teve um dia que eu catuquei, catuquei e nada dela acordar. Eu não podia dar bandeira para o público e continuei catucando. Ela só dormindo. Aí a própria Marília, que tinha o mesmo timbre, bem fininho, se chamou da coxia: Carolina! Ela, então, acordou, assustada!...   Com a Marília, fiz também A Vida Escrachada de Joana Martini e Baby Stompanato, do Bráulio Pedroso. Era uma sátira ao teatro de revista, onde acontecia de tudo. Eu era do coro e tinha uma parte da coreografia em que nós tínhamos que dar três passinhos para trás e cantar escorrega, escorrega, escorrega e cai. Pois, um dia, eu caí, em cheio, no fosso da orquestra, com um pé na tuba e outro no músico.   Aí eu lembrei da lição que tanto a Maria Clara Machado quanto o Zé Celso tinham me ensinado: se você errar, incorpore o erro. Foi o que eu fiz. Cantei a música todinha com um pé na tuba e outro no músico. O pior é que o cara nem tinha acabado de pagar a tuba!   A peça também enfrentou problemas com a censura na temporada do Teatro Ipanema, no Rio. A Marília, que era produtora, ficou desesperada, pois tinha que pagar a equipe e não podia abrir o pano. Até porque ela tinha um certificado da censura que garantia a exibição do espetáculo em todo o território nacional por cinco anos. Foi para os jornais, botou a boca no trombone e a peça acabou sendo liberada.   Em 1969, viajei aos Estados Unidos com o grupo do Augusto Boal para encenar Arena Conta Bolívar e Arena Conta Zumbi. Ficamos três meses na estrada. Fomos também ao México e ao Peru. Eu tinha comprado uma peruca lisa chanel e representava com ela. Quando nos apresentamos no Harlem, um grupo de militantes negros ficou chocado com o fato de eu usar peruca. Era o auge do black is beautiful, e a gente tinha que manter as características originais da raça. O Boal ainda me defendeu, disse que eu era engajada e tudo o mais.   Nesse dia, voltei para o hotel, tomei um banho demorado e deixei meu cabelo voltar ao natural. É que, além da peruca, eu fazia alisamento com pente quente. Ali eu comecei a me aceitar como negra. Saía nas ruas do Harlem e reparava que os negros americanos andavam de cabeça erguida. Não tinha essa postura subserviente que eu sentia no Brasil e em mim mesma. Essa viagem teve essa importância de fazer com que eu enxergasse meu país de fora.   No grupo de atores estavam o Lima Duarte, a Isabel Ribeiro, o Hélio Ary, o Renato Consorte, o Fernando Peixoto e eu. A gente se apresentava em espaços alternativos, universidades, centros acadêmicos. As críticas eram as melhores possíveis. O New York Times rasgou elogios à minha voz e à minha atuação. Aproveitei para visitar Carmem Costa em New Jersey e dei uma canja no seu show. Cheguei a receber proposta para ficar lá cantando, mas recusei. Preferi voltar ao Brasil. E cheguei pensando: Agora ninguém me segura! Capítulo IV   Muito rica e invejada / temida e odiada / pois com as suas perucas / cada uma de uma cor / jóias, roupas exóticas / das Índias, Lisboa e Paris / a negra era obrigada a ser recebida / como uma grande senhora na corte do Rei Luiz (Xica da Silva, Jorge Ben)   De volta ao Rio, morei numa comunidade na Fonte da Saudade com Wolf Maya, Lucélia Santos, Marco Nanini, Sandra Pêra, Ney Matogrosso, Ronaldo Resedá. Inclusive o Ronaldo tirou o nome artístico do nosso endereço: Rua Resedá.   Não era todo mundo junto, rolava um revezamento. Quando eu filmei em Diamantina, por exemplo, o Ney, recém-chegado ao Rio e procurando apartamento, ficou no meu quarto.   Quando soube que ia rolar o Xica da Silva, liguei para a produção e me ofereci para fazer um teste. O Cacá Diegues ficou sabendo de mim através de amigos em comum. Pessoas como Nelson Motta, Marieta Severo, Chico Buarque, que chegavam para ele e diziam: Chama a Zezé! Ele não me conhecia porque eu vinha de uma temporada de quase cinco anos em São Paulo e ele também morara um tempo fora.   Eu estava com um visual arrojado, meio andrógino, criado pelo Carlinhos Prieto para o filme do Antonio Carlos Fontoura, Rainha Diaba, onde eu só apareço numa cena, e o produtor do Xica, Jarbas Barbosa, irmão do Chacrinha, não curtiu muito. Acho que ele queria uma atriz mais na linha mulata do Sargentelli...   Mas o Cacá insistiu e fez o teste comigo. Fiz a cena em que a Xica tenta entrar na igreja dos brancos e é impedida. Dei o melhor de mim, mas não tive certeza de ter me saído bem.   Fiz minhas malas e fui para Salvador filmar A Força de Xangô, do Iberê Cavalcanti. Todo dia ligava para o Rio a fim de saber o resultado do teste e nada. Saíam notinhas nos jornais dizendo que a Xica ia ser essa e aquela atriz. Uma boataria só. Até que, um dia, estou eu almoçando, já de volta da Bahia, toca o telefone e eu atendo: Boa tarde, Xica da Silva. Era o produtor-executivo, Oleosi. Quase desmaiei. Saí ligando para todos os amigos. Os jornalistas me telefonando para saber e o meu telefone só dando ocupado. Uma loucura.   Não tinha idéia da mudança que Xica da Silva acarretaria em minha vida. Só sabia que seria protagonista de um filme. Nem acertei um cachê tão alto. Afinal, eu era uma atriz em relativo início de carreira. No cinema, só tinha feito pequenos papéis. Mas o que filme me trouxe em termos de desdobramentos profissionais valeu mais que qualquer salário.   Passei Natal, réveillon e carnaval em Diamantina. A equipe tinha alguns dias de folga e o Cacá liberava para que todos passassem esses dias em casa, menos eu. Ele achava que eu iria me dispersar, perder o tom. Então, fiquei todo o tempo sem me afastar das locações, concentrada só no personagem.   Ele percebeu que eu tinha dificuldade de lidar com a minha agressividade. E para Xica eu precisava liberar essa carga emotiva que a gente, em geral, põe pra dentro, engole. Então, em alguns momentos, o Cacá usou de pequenas torturas.   Na cena da igreja, por exemplo, a que eu fiz no teste e que é exemplar na luta da Xica contra o preconceito que impede alguém de entrar num templo que deveria ser de todos. Estava muito quente, era uma externa; eu fazia, fazia, repetia e não dava a raiva que o Cacá queria. Aí eu pedia um copo d´água, ele falava: Daqui a pouco; pedia café e ele: Já vem. Depois eu soube que foi uma atitude calculada para me irritar. Funcionou!   Ele estava sempre de olho. Uma noite, passou e me viu jogando carta com alguém da equipe. Disse: É, a cena de amanhã não é fácil, não! Na mesma hora, parei o jogo, corri para o quarto e fui estudar a cena. Era assim que a coisa funcionava.   Na cena em que a Xica se despede do João Fernandes, ele disse: Zezé, eu não faço questão de lágrimas. Mas você tem que passar para o público que você está muito mal. Enquanto eles preparavam o set, fiquei dentro do Museu da Cidade, onde a Xica realmente viveu, com uma garrafa d´água, café e uma pessoa me fazendo companhia. Para entrar no estado de espírito de tristeza que a cena pedia, pensei na Adriana Prieto, irmã do Carlinhos, que tinha acabado de falecer e era muito minha amiga. Usei a tal da memória afetiva e acho que fiz direitinho. A Xica viveu em 1700 com uma mentalidade à frente do seu tempo. Ela não se reprimia em matéria de sexo. Dava prazer aos homens a ponto de fazê-los gritar. Isso acabou virando uma das marcas do personagem. Nas entrevistas coletivas e nas ruas, todo mundo queria saber qual era, afinal, o borogodó da Xica...   Ganhei todos os prêmios: Air France, Festival de Brasília, festivais internacionais. Viajei muito por causa do filme. Fiz, inclusive, shows nos Estados Unidos, onde eles punham no cartaz: Show com Zezé Motta, atriz do filme Xica da Silva. Quando o filme estourou, eu estava fazendo uma comédia com a Eva Todor, Rendez-Vous, no Teatro Maison de France. Era um papel minúsculo. De empregada, claro. Tirava o pó dos móveis e provocava o patrão, naquela tradição de mucama que dá mole pro senhor. Entrava muda, saía calada. Antes do filme, as pessoas iam ao teatro para ver a Eva. Depois, passaram a ir para me ver também. A Eva, então, aumentou meu nome no cartaz. Adorei trabalhar com ela. Aprendi muito. Aí as pessoas me perguntavam: E agora, Zezé? E eu respondia: Agora eu quero cantar! Capítulo V   Feiticeira / bem que eu queria ser / feiticeira / pra enfeitiçar você / com encanto e sedução / lhe atrairia pro meu canto / e lhe faria amor amor amor / até que o pranto / lhe fizesse o coração tão duro amolecer (Feiticeira, Gilberto Gil)   Já tinha feito pequenas incursões no mercado fonográfico. Dois compactos com músicas que eu cantava em espetáculos teatrais e um LP – Trem Noturno - em parceria com o Gerson Conrad.   O Secos & Molhados, grupo do qual o Gerson fazia parte, se desfizera e o repertório que ele tinha composto para o Ney Matogrosso estava sem intérprete. Como ele se considerava mais compositor que cantor, resolveu buscar alguém.   Ao me ver no Godspell, ficou impressionado. Eu cantava Day by Day e realmente era um escândalo. Começava cantando bem grave e terminava com uma nota super-aguda. Era aplaudida em cena aberta todo dia e uma vez chegaram a pedir bis. Mas o disco não aconteceu. Ele falou mal da gravadora Som Livre na imprensa, e o disco foi mal comercializado. Empacou. Dancei de tabela, mas tudo bem.   Como eu dava várias entrevistas por dia na época do estouro do Xica da Silva, sempre reafirmando a minha vontade de ser cantora, o Guilherme Araújo me procurou e se ofereceu para ser meu empresário.   Só que eu não tinha intimidade com o pessoal de música. Naquela época, as tribos não se misturavam muito. Tinha o pessoal do cinema, o pessoal da música, a turma do teatro. Hoje, eu acho que está mais misturado. Caetano compõe música para balé, Milton faz trilha de cinema, as áreas estão mais interligadas.   Então, o Guilherme decidiu promover um jantar com o crème de la crème da MPB: Rita Lee, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Luiz Melodia, Moraes Moreira. Todos comparecem e me prometeram músicas. Dessa safra, vieram Crioula, do Moraes; Dores de Amores, que eu gravei em dueto com o Melodia; Rita Baiana, do John Neschling e Geraldo Carneiro, da trilha da peça Lola Moreno; Pecado Original, do Caetano, da trilha do filme A Dama do Lotação, entre outras.   A Rita Lee, que não sabia nada de mim, leu minhas entrevistas e fez, com o Roberto de Carvalho, o Muito Prazer Zezé, que é a minha cara. Antes mesmo de o LP ficar pronto, fiz um show com esse repertório no Museu de Arte Moderna / MAM, do Rio de Janeiro, que depois seguiu carreira no Teatro Ipanema, com ótima repercussão de público e crítica. Serviu para mostrar que eu tinha talento como cantora e que não estava querendo pegar carona no sucesso do Xica da Silva para me promover.   Dividi o palco com o Mar Revolto, um grupo que o Guilherme conhecia da Bahia e trouxe ao Rio para trabalhar comigo, formado pelos músicos Luiz Brasil (guitarra), Otávio Américo (baixo), Geraldo Benjamim (guitarra), Raul dos Santos (bateria) e Jorge Vicente (percussão). As gravadoras ficaram de olho e nós fechamos com a Warner. Fiquei lá quatro anos e gravei três LPs.   Desde o começo, a Warner queria que eu gravasse samba. Mas eu não queria ser rotulada de sambista. Nada contra, mas eu queria ser livre para cantar vários gêneros. E era também uma atitude política por perceber que queriam me pregar esse rótulo pelo fato de eu ser negra. Eu estava numa fase de militância mais radical e criei essa resistência. Mas para o segundo LP, que foi o Negritude, realmente me convenceram de que eu estava vendendo abaixo do esperado e que seria interessante tentar o caminho sugerido por eles. Aí já era uma questão de mercado, eu não podia botar a militante à frente da artista e topei fazer um disco de sambas.   Então foi a vez da gravadora promover uma feijoada na casa do Sérgio Amaral para o pessoal do samba. Compareceram: Martinho da Vila, Monarco, Padeirinho, João Bosco, Manacéa, Wilson Moreira, Ney Lopes. Uma turma de bambas. Agora, estou novamente arregimentando um time de bambas para gravar meu novo disco.   Já cantei com gente do melhor gabarito. Só pelo Projeto Pixinguinha, fiz dois shows maravilhosos. Um, dividindo o palco com Johnny Alf, outro com Marina e Luiz Melodia. Quando Marina e eu cantávamos Mania de Você (Meu bem / você me dá / água na boca), da Rita Lee, dávamos um selinho e o público vinha abaixo. Viajamos três meses pelas principais capitais do País. Em Salvador, lotamos o Teatro Castro Alves, tivemos que fazer sessão extra. Em Paris, fiz no Olympia um recital com Paulo Moura, fruto do CD Quarteto Negro – Paulo, Jorge Degas, Djalma Corrêa e eu –, gravado pela Kuarup em homenagem aos 100 anos da Abolição. Neste trabalho, tem uma canção minha em parceria com o Degas chamada Semba. Eu não sou uma compositora fértil, mas gosto de escrever e já compus em parceria com Marina (Quero Porque Quero), Paulo Feital (Cais Escuro), Irinéa Maria (Ousadia), gravada pelo Cauby Peixoto, e fiz a letra, com o Luiz Antônio Carvalho, para uma melodia do Luiz Bonfá, uma canção da trilha do filme O Prisioneiro do Rio. Fui a Cuba, onde participei do Carifiesta, que celebra o aniversário da revolução, num evento que reuniu vários artistas brasileiros ao longo de uma semana, entre eles, Chico Buarque e Simone. Cantei também na Argentina, Chile, Senegal, Uruguai, Paraguai, Alemanha, Jamaica, Uruguai e Canadá. Mês que vem, vou para Angola fazer show com Luiz Melodia e até o fim do ano entro em estúdio para gravar meu novo disco. Como você vê, eu não paro quieta! Capítulo VI Escravizaram assim um pobre coração / é necessária nova abolição / para trazer de volta a minha liberdade / se eu pudesse gritaria amor / se eu pudesse brigaria amor / não vou, não quero (Autonomia, Cartola)   Quando terminei Xica da Silva, recebi um convite para ir à Globo pegar o roteiro do Caso Especial Festa de Aniversário, adaptado da obra de Clarice Lispector. Fiquei eufórica porque eu adoro a Clarice. Achei que estavam me convidando para um papel incrível. Só que quando eu cheguei lá, vi que era para servir doces. Uma figuração. Fiquei muito indignada e disse: Não, obrigada.   Então o Ziembinski, que era diretor do programa, me ligou, preocupado, e me aconselhou que eu não fechasse essa porta. Que no Brasil os atores precisam da TV e que, apesar do fato de Xica da Silva ter sido um sucesso, a vida continuava. Ele não falou por maldade. Fez para me proteger. Só que na época eu estava tão determinada que mantive minha posição: Empregadas, nunca mais! Aí a imprensa alardeou, os diretores pararam de me convidar e eu fiquei um tempo sem fazer televisão. Quer dizer, sem fazer teledramaturgia. Porque a TV-E abriu espaço para eu ser apresentadora. Fiquei lá um tempo e fiz um programa chamado Calendário, que era uma espécie de revista jornalística.   Anos depois, quando fui convidada para fazer Transas e Caretas, do Lauro César Muniz, e aceitei, as pessoas me cobraram: Ué, você não disse que não topava mais papel de empregada? Acontece que a Dorinha fazia parte da trama. Era faxineira de dois irmãos – Reginaldo Faria e José Wilker – e tinha caso com ambos. Quer dizer, o problema não era ser empregada. O problema era entrar muda e sair calada. Isso eu já tinha feito e não precisava mais.   Fiz tantas empregadas na minha vida que quando fui enredo da escola de samba Arrastão de Cascadura, do grupo 1-B, com o enredo Zezé, um Canto de Amor à Raça, do carnavalesco João de Deus, havia uma ala só de domésticas, representando as empregadas que eu fiz ao longo da minha carreira.   Não foi só em Supermanoela e Transas e Caretas que eu namorei o galã. Em Corpo a Corpo, que foi uma novela revolucionária, o Gilberto Braga tocou em vários temas tabus, entre eles, o do relacionamento inter-racial. O casal formado pelo Marcos Paulo e por mim causou um rebuliço danado.   Os telespectadores que participavam dos grupos de discussão da novela achincalhavam. Vinham com as visões mais preconceituosas. Uma nordestina dizia que mudava de canal porque não podia acreditar que um gato como o Marcos Paulo pudesse ser apaixonado por uma mulher horrorosa. Outro achava que o Marcos Paulo devia estar precisando muito de dinheiro para se humilhar a esse ponto. Aí eu lembrava da Lélia Gonzales, que eu conheci num curso de cultura negra no Parque Lage, dizendo que não se pode sofrer com esses comentários e que é preciso manter a cabeça erguida. Porque ficar de vítima reclamando é muito fácil. Fácil, chato e contraproducente.   A Lélia foi uma pessoa muito importante na minha formação. Ela era antropóloga, professora universitária, e quando eu soube que ia ter esse curso, me matriculei. Na época da Xica, eu dava média de três entrevistas por dia, e as pessoas sempre perguntavam sobre ser atriz, mulher e negra. Senti que eu precisava aprimorar o meu discurso. Nisso, a Lélia me ajudou. Lembro que na aula inaugural ela disse: Não temos mais tempo para lamúrias. Temos que arregaçar as mangas e virar esse jogo.   Até então só tinha feito parte do MNU (Movimento Negro Unificado). Ia ao Clube Renascença, em Vila Isabel, para dançar soul music. Era um clube freqüentado por negros, que agora voltou a ser revitalizado. O Moacyr Luz organiza umas rodas de samba às segundas-feiras. Vive lotado. Mesmo lá esbarrava em preconceito. Nessa época estava casada com o Marcos Palma, um arquiteto branco, e os radicais achavam que negro só podia namorar negro. Imagina, isso nunca entrou na minha cabeça. Namorei brancos e pretos não porque fossem brancos ou pretos, e sim porque eram pessoas interessantes. Imagina se Zózimo Bulbul era preto ou branco! Zózimo Bulbul era Zózimo Bulbul!   Outro aspecto da minha vida que incomodava era o fato de eu ser símbolo sexual. Eles achavam que meu reconhecimento artístico não podia se dar por aí. Mas eu não investia nisso, era uma circunstância natural eu estar sempre nua no cinema.   Isso quem dizia era o Domingos de Oliveira: Zezé, mesmo quando eu te vejo vestida, tenho a sensação de que você está nua. O Nelson Motta, que é meu compadre – sou madrinha da filha dele com a Marília, a Nina Morena - diz que os diretores não pediam para eu tirar a roupa, eu que já ia tirando. Batia a claquete, eu baixava a alça do sutiã!... A verdade é que eu sempre tive uma relação tranqüila com a nudez, apesar de ter estudado em colégio interno onde o corpo era tabu. Tanto que a primeira coisa que fiz quando saí de lá foi tirar a roupa. Calma, eu explico.   É que o apartamento que meus pais foram morar, no Leblon, era no último andar e no verão aquilo virava um forno. Quer dizer, eu ficava costurando com a minha mãe só de calcinha. Aí, quando o meu irmão estava para chegar, ela mandava eu me vestir. Eu dizia: Ué, basta ele me olhar com olhos de irmão! Capítulo VII Tá na hora de acordar, sinhazinha / tem muito o que fazer / tem cabeça pra tratar / tem que ler Caderno B / hora no homeopata / fita no videoclube / tá na hora de acordar / tem a vida pra viver / tem convite pra dançar / telefone pra você / namorado pra brigar / vinho branco pra esquecer (Sinhazinha, Chico Buarque)   Sou muito preocupada com justiça. Eu sempre digo que mesmo que eu não fosse negra, faria parte do movimento.   Um fruto prático desse meu envolvimento visceral foi a criação do Cidan (Centro de Informação e Documentação do Artista Negro), em 1984. Eu estava preocupada com a invisibilidade do ator negro. Vários dos meus colegas não estavam na mídia e resolvi criar um banco de dados. Todo ator negro que eu encontrava ou que eu tinha o telefone, eu pedia: Traz foto e currículo. Eu estava casada com Jacques d´Adesky, um pesquisador afro-belga, professor universitário, com experiência nesse tipo de levantamento, e ele me orientou a profissionalizar o banco, que começou de maneira bem improvisada.   Conseguimos um patrocínio com a Fundação Ford na intenção de editar um catálogo completo, começando com Grande Otelo e indo até atores negros mais jovens, mas o orçamento estourou e a gente não pôde ir até o fim. Era muita despesa com passagem, hospedagem, diária. Imagina, a intenção era fazer um mapeamento de todo o Brasil!   Ficamos com material, em forma de slides, de 150 atores. O produtor de elenco interessado vinha aqui em casa e a gente fazia a projeção. Hoje, 21 anos depois, o Cidan cresceu e já temos CD-ROM e uma página na Internet onde o próprio ator negro pode se cadastrar.   Não se faz televisão, teatro ou cinema envolvendo ator negro sem que se consulte a página do Cidan. É uma vitória não só minha, mas do Jacques d´Adesky, do Antônio Pitanga, da Benedita da Silva, da Léa Garcia, do Antônio Pompeo, do Luiz Antônio Pilar, da Iléa Ferraz, entre outros profissionais envolvidos direta ou indiretamente com o Cidan.   O Cidan também organiza um curso de teatro chamado “A Arte de Representar Dignidade”, que está parado há dois anos, mas se Deus quiser vai ser retomado em 2006. É um curso itinerante, ministrado em comunidades carentes por vários professores. A minha matéria é “Cidadania”. Falo em auto-estima e levo para passear, assistir a exposições, balés, palestras. De interpretação, não sei dar aula, não!... Como eu fui Conselheira dos Direitos Humanos durante quase três anos na gestão do Fernando Henrique Cardoso, tive que pensar e ler muito a respeito de cidadania. Então, para mim, tornou-se mais fácil falar do assunto.   Outra batalha minha é a Socinpro. É uma sociedade ligada ao Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), que protege direitos conexos autorais de compositores e intérpretes. Há oito anos eu sou uma das diretoras de comunicação. Uma vez por semana dou plantão. Vou lá, tomo cafezinho com associado, bato papo, faço de psicóloga. Porque nós temos desde medalhões da MPB – Maria Bethânia, Roberto Carlos, Dudu Nobre, Martinho da Vila – até aquele compositor mais duro que vai à sociedade pegar vale para tirar o violão do penhor. Tem situações dramáticas. Capítulo VIII Oxum senhora bonita / Xangô não resistiu / Oxum senhora bendita / meu encanto de fé / por seu encanto sentiu / eu estava na cachoeira / e o sol logo refletiu / e em pingos resplandecentes / de ouro seu leque surgiu (Oxum, Johnny Alf) Eu sou Oxum-Apará, filha de Oxum com Iansã. Mas a minha ligação com candomblé começou depois. A minha primeira religião foi o kardecismo por causa do colégio interno. Em casa, a minha mãe era da umbanda e meu pai, kardecista.   Na minissérie Mãe de Santo, representei uma ialorixá. Foi um mergulho interno, um reaprendizado das minhas crenças. Sempre senti necessidade de estar ligada a alguma religião.   Quando saí do internato, aos 12 anos, quis fazer primeira comunhão porque todas as minhas amigas estavam fazendo. Comecei a freqüentar a Igreja Católica, entrei para o catecismo, mas, no meio do caminho, desisti. Me grilei com essa história de céu e inferno. Achei aquilo tão esquisito! Preferi ficar com a idéia de reencarnação do espiritismo.   Nesse ínterim, minha mãe entrou para as Testemunhas de Jeová. Como eu era muito nova e só saía com ela, acabava que ia com ela nos cultos do Salão do Reino de Jeová, em Copacabana. Com 15 anos, me batizei lá. Mas o que eu gostava mesmo era dos cânticos.   A diferença das religiões está na interpretação da Bíblia. Testemunhas de Jeová interpreta bem ao pé da letra. Então, eles não fazem transfusão de sangue, não servem o Exército, não festejam o Natal e só podem namorar pessoas do mesmo credo.   Foi aí que o negócio pegou. Dos 15 aos 18 anos, eu andei paquerando os rapazes do Salão. Era essa a minha expectativa quando ia aos congressos. Eu queria conhecer e casar com alguém de lá. Cheguei a ter um namorico ou outro, mas não engrenei com nenhum. Acabei namorando um rapaz do colégio, que era católico e não quis se converter. Aos poucos, fui me afastando. Mas eu só fui oficialmente dessassociada quando apareci nua na revista A Pomba...   Anos depois, por intermédio da Lélia Gonzales e do curso de cultura negra, descobri o candomblé. Era curioso porque eu morria de medo do ritual, receber santo, essas coisas, mas fez parte do curso ir a um terreiro. E achei bonito. Fiquei curiosa por se tratar de um ritual que vem da África.   No presente momento, estou voltando a me interessar pelo kardecismo. Depois dessas voltas todas que eu dei, é a ideologia que bate no meu coração. Eu me identifico completamente. O kardecista não olha para o próprio umbigo 24 horas por dia. Ele tem uma visão humanista e isso me interessa. Mas nunca vou conseguir ser uma coisa só. Até hoje, quando vou à Bahia, bato cabeça para Mãe Estela, uma ialorixá que eu considero a minha mãe de santo. Ela é uma rainha, uma sábia. Faz um trabalho incrível no terreiro dela, tem uma creche lá dentro, auxilia as mães que trabalham com ela.   Eu acho que a gente tem que ter uma religião e não procurar ajuda só quando está em apuros. Um tempo atrás, eu estava meio assim. O sapato apertava, lá ia eu procurar a Mãe Estela, ou então um pai-de-santo de Madureira que eu conheço. Acho isso uma pouca-vergonha. Quero levar alguma coisa a sério!   Tive, trabalhando, pelo menos dois momentos que considero experiências místicas. Uma delas foi um filme que eu fiz numa aldeia caribenha a três horas de Caracas, El Mestizo. Fiquei tomada pela personagem, Cruz Guaregua. Uma figura muito forte.   A história dela é muito louca. Virgem, filha de pescadores, foi escolhida por um político poderoso da região para ser sua mulher. Toda noite era obrigada a transar com ele. Após engravidar e ter o filho do homem que não desejava, passa a inventar que tem casos com outros homens da região para afastar o carrasco. Ele, então, de vingança, seqüestra a criança, retirando-a de seus braços e acusando-a de não ter moral para ser mãe.   Passamos a noite refilmando várias vezes esta cena – a do roubo da criança – e eu fui ficando exausta. A criança chorava, aí repete o tapa, aí põe de novo glicerina com não-sei-quê pra escorrer sangue da testa, aí aquele gosto, aquela coisa toda, era uma cena difícil, a gente ficou muito tempo fazendo. E quando acabava a cena, ela não chorava. Só dizia para os pescadores: Vamos trabalhar! Eu estava tão possuída que os barcos que deveriam ser empurrados pela equipe, eu pus sozinha no mar.   Depois, no camarim – uma tenda improvisada na praia –, dei de cara com o ator, e avancei no pescoço dele: Devolve meu filho, seu cretino! Na equipe, tinha uma maquiadora chilena que era espírita, que chegou em mim e sacou. Começou a mandar o espírito da Cruz Guaregua subir. Quando eu ouvi ela me chamando de Cruz, caí em mim e vi que tinha alguma coisa errada. Aí voltei do transe.   A outra experiência foi com uma música do Fagner e do Fausto Nilo, Postal de Amor, que fazia parte do repertório do meu primeiro show e que serviu de abertura para o piloto do Ciranda, Cirandinha, exibido em 1977 na TV Globo com o título Os Jardins Suspensos da Babilônia.   Com essa mania que eu tenho de inventar personagens para as músicas que interpreto, para essa música eu lembrava da história de uma tia que morreu de amor. Ela era irmã da minha mãe e eu não cheguei a conhecê-la pessoalmente. Chamava-se Elza. A história dela é incrível. Ela teve um único amor na vida, o marido, que conheceu aos 13 anos. Um belo dia, esse homem a trocou por uma vizinha. Ela foi ao desespero. Parou de comer, dormir, não tinha ânimo para nada. Um dia, viu os dois juntos. Dali, foi para um hospício e morreu. Aconteceu uma coisa doida porque eu fui na casa do Fausto Nilo por algum motivo de trabalho e, do apartamento dele, dava para ver a Ladeira dos Tabajaras, onde essa minha tia morava. Aí eu virei pra ele e falei: Sabe aquela música Postal de Amor? Eu dedicava aquela música a uma tia que morava aqui. Aí ele virou e disse que compôs a música olhando para aquele morro. Fiquei impressionada e mudei de assunto.   O refrão da música era louca / louca / muito louca. A coisa ia num crescendo e o Guilherme Araújo, que me dirigiu, propôs que eu fizesse 16 compassos do refrão, para incendiar a platéia mesmo.   Só que teve um dia que eu não parava mais de repetir. Das 16 vezes sugerida por ele, eu devo ter feito umas 30. De repente, olhei para os músicos e percebi que estavam todos muito assustados. Pensei: Opa, tem alguma coisa errada!   Aí lembrei da lição da minha mestra Maria Clara Machado, me concentrei e fiz respiração de ioga. Capítulo IX Você sorriu pra mim / depois sumiu na multidão / será que foi miragem de carnaval / ou o amor me mandou seu sinal? / misturo meus carnavais / e não distingo mais / fatos de ilusões / são melodias demais / é preciso ter mais / de mil corações (Miragem de Carnaval, Caetano Veloso) Tive três abortos espontâneos e resolvi investigar a causa. Descobri que, para que não se repetisse o problema, eu teria que ficar os três primeiros meses de gestação de cama. Só que era uma época de muito trabalho e eu não podia me dar a esse luxo.   A maternidade era o meu segundo sonho, depois da carreira de atriz. Acabou que eu nunca tive filhos naturais, mas a vida me deu cinco filhas. Eu não as adotei legalmente, são minhas filhas de coração. Cada uma, uma bela história de amor. Luciana Fiz um show beneficente no Parque Laje para a Casa da Criança, que funcionava na Rua Alice, em Laranjeiras. Um dos fundadores, Carlos Veiga, foi a meu camarim e disse que estava com uma menina na platéia que queria muito falar comigo. Ela tinha 4 anos e era minha fã.   Eu estava em início de carreira. Só tinha feito uma ponta ou outra em novela, mas mesmo assim ela me idolatrava a ponto de ter foto minha colada na parede. Na verdade, uma foto minúscula, porque eu ainda não era famosa.   Avisei ao Carlos que a trouxesse a meu camarim. Ela veio toda desembaraçada, conversadeira. Ficamos amigas, trocamos telefone e, volta e meia, ela me ligava. Hoje é aniversário da Maria, a senhora vem? Quando eu atendia o chamado dela e ia nas festas que a Casa da Criança organizava, percebia que ela tentava me monopolizar. Ela me elegeu e isto ficava cada vez mais evidente.   Então eu a adotei, mas como madrinha. Era responsável pelas suas despesas: roupa, sapato, material escolar, tudo o que ela precisava era comigo. Ela foi ganhando espaço na minha vida e, se no início, vinha passar finais de semana comigo, de repente, estava vindo passar férias. Quando filmei Quilombo, ela foi comigo para Xerém e ficou o tempo das filmagens lá, convivendo com as filhas do pessoal da equipe, como a Camila Pitanga, filha do Antônio, que estava no elenco.   Até que teve um momento em que a Marli, uma psicóloga da Casa da Criança, me procurou para dizer que achava que a cabeça da Luciana estava ficando confusa com essa vivência de dois mundos antagônicos. Ela me propôs que eu ficasse com a Luciana de vez. Eu estava recém-casada com o Jacques e dividi o problema com ele. A princípio, ele foi contra porque, entre outras coisas, percebia que a Luciana era muito ciumenta. Além disso, eu viajava muito e não poderia levá-la sempre comigo. Só que, com 16 anos, ela veio passar o fim de semana com uma mala maior e disse que tinha vindo para ficar. Aí, não teve jeito. Resolvemos tentar e deu certo. Tão certo que quando eu me separei do Jacques, ela parou de falar comigo! Porque eu era a que puxava orelha, a que proibia, enquanto o Jacques fazia as vontades: assistia a filme de suspense com ela, comprava pipoca, era o autêntico paizão.   Hoje ela está casada e mora em São Paulo.   Nadine e Sirlene Minhas primas de terceiro grau. São irmãs. Quando adolescentes, tiveram um problema em família, ficaram mal e entraram em depressão. É que os pais, militares, tinham sido transferidos para Manaus e elas não se adaptaram. Nascidas e criadas na Zona Norte do Rio de Janeiro, queriam voltar de qualquer jeito.   A Nadine ficou tão mal que a mãe delas me ligou e contou que o cabelo dela estava caindo. Quando soube, propus que ela viesse morar comigo. A Sirlene, que era mais conformada, ficou em Manaus com os pais e os outros irmãos. Só que nas férias ficou com saudades da irmã e veio passar um tempo. Acabou ficando.   Hoje não moramos mais juntas, mas somos muito ligadas. Nos falamos todo dia, elas ligam pra mim, pedem a bênção. É uma linda relação. Carla Estava um dia caminhando na praia, passei por uma menina de bicicleta, aos prantos. Apressei o passo para alcançá-la, ela tentou fugir, mas eu insisti: O que que você tem? Ela tremia dos pés à cabeça, não queria falar com ninguém e pedia para que eu a deixasse. Com muito custo, convenci que viesse até minha casa. Ela veio, tomou um suco de maracujá e, mais calma, acabou contando que, naquele dia, fazia um ano que a mãe dela tinha morrido. Ela tinha 11 anos, morava em Bangu e estava na casa de uma madrinha em Copacabana. Aí eu telefonei para a madrinha e expliquei a situação, que já tinha anoitecido e que ela tinha pego no sono. Ela então achou melhor não acordar e a Carla acabou passando a noite em casa.   No dia seguinte, ao ir embora, perguntou se podia me chamar de mãe. Eu disse: Claro. Que eu saiba, ela nunca mais chorou por essa perda.   Cíntia Ela eu conheci no meu curso de teatro. Subimos o morro da Mangueira para anunciar que haveria o curso na Uerj para adolescentes de baixa renda. Um dos professores, Ivan Alves, tinha feito um trabalho para a Prefeitura, em abrigos, e sugeriu que a gente também convocasse crianças de lá. A Cíntia estava num desses abrigos e se interessou pelo curso. Mais tarde, eu percebi que ela se interessou só para ter uma desculpa de sair do abrigo. Ela tinha 12 anos. Na aula inaugural, bati o olho nela e pensei: Que menina linda, que menina triste! Ela tinha um olhar muito triste. Volta e meia, ela sumia. A psicóloga ia no abrigo e a trazia de volta. Até que nós montamos Evangelho Segundo Jesus Cristo, do José Saramago, com direção do Maurício Abud. Nós a escolhemos para fazer uma das Marias da peça, que se revezavam no elenco, e ela ficou em pânico porque tinha muita dificuldade de decorar. Aí ela fugiu de vez.   Fiquei um tempo sem ter notícia até que ligou uma mulher para a minha casa dizendo que ela estava muito doente e precisava de dinheiro para comprar remédio. Ela era mãe de um garoto que a Cíntia estava namorando e, ao fugir do abrigo, foi morar nessa casa.   Da segunda vez que ela telefonou, eu pedi para a Cíntia vir pessoalmente porque eu estava com saudades. Aí a Cíntia veio e eu não deixei ela voltar. Morou dez anos comigo. Saiu de casa ano passado.   Tenho muito orgulho porque ela veio cheia de carências e virou uma princesa. Ela teve algumas dificuldades de se adaptar porque a realidade dela era muito dura. Ela fez análise com uma psicóloga estagiária da Santa Úrsula, o que ajudou muito.   A minha família é universal. Zezé / Amigos & Parceiros   Gianni Ratto Tive o privilégio de participar de vários momentos revolucionários no teatro, na música, no cinema, na televisão, e de trabalhar com pessoas de relevo, como José Celso Martinez Corrêa (no teatro), Bráulio Pedroso (na TV) e Cacá Diegues (no cinema). E não tem como não incluir nesta lista gloriosa o nome de Gianni Ratto, com quem, inclusive, tive um lindo relacionamento amoroso. Ele era muitos anos mais velho que eu e nos demos muito bem. Fizemos juntos Fígaro ou Um Dia Muito Louco, em parceria com Beatriz Segall, que era dona do Teatro São Pedro e produtora. A grande inovação da montagem é que o Gianni decidiu inverter os papéis centrais femininos. Ou seja, a condessa passou a ser negra e a serviçal, branca. A Beatriz pintou o cabelo de louro para contrastar bem no papel da Suzana e eu, quando entrava em cena, após quase 20 minutos de espetáculo, em que já se tinha falado à beça da minha personagem, a condessa de Almaviva, o público levava um choque. Nos debates que promovíamos após a sessão, o bicho pegava. Tinha gente que caía de pau, criticando a opção da direção e dizendo não acreditar na farsa de uma condessa negra e de uma serviçal loura. Mas não vieram só pedras. Na crítica do Sábato Magaldi (Jornal da Tarde de 10 de maio de 1972), veio o comentário: Zezé Motta está no ponto alto de sua carreira, vivendo com grande segurança e domínio a condessa. Realmente, era como eu me sentia. Com cinco anos de estrada, eu estava apta a alçar vôos cada vez mais altos. Luiz Bonfá Meu pai era fã do Luiz Bonfá e eu tive a oportunidade de me tornar parceira dele. Foi no filme O Prisioneiro do Rio, produção polonesa, que conta a trajetória de Ronald Biggs no Brasil. Eu faço uma prostituta que de fato existiu e foi um amor que ele teve. Ele passou um tempo escondido na casa dela. A música-tema era do Luiz Bonfá e a letra que foi composta para a melodia não caiu no gosto do diretor. Nessa época, eu tinha um parceiro musical, o Luiz Antônio, e a gente gostava de escrever a quatro mãos. Propus a ele que fizéssemos a letra e ele topou. Escrevemos em dois dias. O refrão é Ser o prisioneiro do rio / Em janeiro / Em pleno verão / Delírio e paixão. De repente, por circunstâncias da vida, virei parceira de um dos ídolos musicais de meu pai.   Taís Araújo Quando o Walter Avancini me convidou para fazer a Maria, mãe da Xica da Silva na televisão, eu estava em Cabo Verde filmando O Testamento do Sr. Nepomuceno. Cheguei no hotel, tinha um recado dele. Tomei o maior susto e, na hora, não consegui dizer nada. Mas no dia seguinte, quando acordei, pensei na homenagem que a vida estava me prestando através desse convite. Achava que quando a personagem virasse Rainha, usando aquelas roupas maravilhosas, toda glamourosa, eu fosse morrer de ciúmes. Mas nada. Amei a Taís de cara e só torcia para que o projeto desse certo. Até porque o Avancini exigia um trabalho de composição minucioso. Ele acertava com os atores o olhar, o andar, o timbre de voz, chegava a discutir qual era o orixá e o signo do personagem. Cacá Diegues Já fiz cinco filmes com Cacá – Xica da Silva, Quilombo, Dias Melhores Virão, Tieta, Orfeu – e no que depender de mim faço mais. Adoro trabalhar com ele. Quando ele me chamou para o Quilombo, achei que tinha enlouquecido de vez. Aquela mulher, Dandara, não podia ser feita por mim. Ela não sorria nunca, só guerreava. Eu não imaginei que fosse capaz de fazer um filme inteiro sem sorrir. Quilombo reconta um momento riquíssimo da história do Brasil, sob o ponto de vista dos vencidos. Pelos documentos oficiais de Portugal, os habitantes de Palmares eram considerados bandidos. O filme mostra que os negros sempre lutaram pela sobrevivência, não estavam acomodados à espera de um redentor. Ir para Cannes representando o filme com a equipe foi uma emoção à parte. Antônio Pompeo, Antônio Pitanga, Tony Tornado, Daniel Filho, Cacá, Lauro Escorel. O filme foi ovacionado na sessão de gala e nós saímos aos prantos da sala de projeção. Depois, em Dias Melhores Virão e Tieta também fiz duas personagens austeras: uma dubladora e uma solteirona. A dubladora foi mole porque eu fazia a melhor amiga da personagem da Marília Pêra. Então, foi só copiar da vida real. Já a solteirona do Jorge Amado, a Carmosina, deu uma certa responsabilidade porque ela já tinha sido interpretada na TV pela maravilhosa Arlete Salles. Quando vi o filme, achei que não tinha me saído bem. Mas depois Caetano, Miguel Faria Jr. e o próprio Cacá me convenceram de que eu tinha dado bem o recado. E no Orfeu eu tive a oportunidade de revisitar a obra, uma vez que eu tinha sido a Eurídice no teatro, ao lado do Zózimo Bulbul, dirigida pelo Haroldo de Oliveira. Na versão do Cacá, eu fazia a mãe do personagem do Toni Garrido. Fazer esse filme foi uma emoção à parte, porque Orfeu Negro, do Marcel Camus, foi o primeiro filme que eu vi na vida. Arnaldo Jabor Fiz Tudo Bem com o Jabor, um filme maravilhoso, todo rodado dentro de um apartamento, o que contribuiu muito para uma convivência íntima entre a equipe. Sonhara tanto em trabalhar com ele e com a Fernanda Montenegro e, de repente, estava lá, no meio dos dois. Quando o Jabor me deu o roteiro para ler, disse: Olha só, vai ter muito mais do que está escrito, mas isso a gente vai desenvolver juntos. Ele me ajudou porque eu não estava fisicamente bem durante as filmagens. Tinha acabado de ter um de meus abortos. Ele fez com que eu usasse essa barra pessoal na construção da personagem. Marília Pêra Já falei tanto dela, mas não posso deixar de ressaltar que é uma grande amiga, minha madrinha artística, uma pessoa que me ajudou muito no início da minha carreira e até hoje é bastante próxima. Sou madrinha da Nina Morena, filha dela e do Nelson Motta. Fui ver Mademoiselle Chanel e fiquei, mais uma vez, estarrecida com o talento, com a sua garra e disciplina. Fizemos peças, filmes e novelas juntas. Ela chegou a me dirigir num show e nunca esqueço da dedicação dela ao trabalho. Uma da manhã, eu já exausta, e ela dinâmica como se fosse meio-dia. Vamos lá, vamos ensaiar! Marco Nanini Trabalhei com ele na Vida Escrachada, do Bráulio Pedroso. Um ator maravilhoso. Fizemos juntos também o filme A Serpente e tem uma história incrível a respeito das filmagens. Numa determinada seqüência, havia uma cena forte de sexo entre mim e o Nanini na frente de uma reprodução da estátua do Cristo Redentor em estúdio. Quando eu li o roteiro, pensei: Não posso fazer esse filme. Ou tiram essa cena, ou eu não faço. Mas o diretor, Alberto Magno, falou que não tinha como cortar, porque, afinal era Nelson Rodrigues e não se mutila uma obra dele. Ou seja, ele me convenceu a fazer. Mas eu rezei muito antes, pedi perdão, autorização, tudo. Acho que o Nanini não teve maiores problemas em fazer a cena. A culpa era minha. Mas vendo o resultado, você não acredita que eu tenha hesitado. Porque eu fiz com tanta intensidade, tanta verdade! Acho que foi para compensar o meu medo em fazê-la. Carlos Prieto Conheci o Prieto no set de Rainha Diaba, do Fontoura, onde, além de ator, ele era o maquiador. Fizemos depois outros filmes juntos: Xica da Silva, Quilombo, Cordão de Ouro. Virou meu guru. Assinou todas as capas dos meus LPs, criou vários visuais, entre eles, aquele andrógino que eu usava na época da Xica. No meu primeiro show, a gente não tinha dinheiro para o figurino. Aí eu peguei um vestido preto que o Markito tinha me dado e ele bordou várias purpurinas no tecido. Ficou lindo, coloridíssimo. Cuidei dele quando ficou doente. No último dia de filmagem do Tieta, soube que ele havia morrido. Cheguei e fui direto para o velório. Grande figura. Jamelão Dirigi um show do Jamelão e não foi fácil. Fiquei arrasada porque ele combinou uma coisa comigo nos ensaios e na hora fez outra. Ele não queria cantar os clássicos dele, como Ela disse-me assim, do Lupicínio Rodrigues. E eu: Mas Jamelão, o povo vem pra te ver cantar o teu repertório! Ele não discutiu comigo, mas fez exatamente o que queria. Mas Jamelão é Jamelão. Ele pode. Carlos Machado Tive a honra de ser dirigida por ele em dois espetáculos: A Vida de Carmem Miranda, com Marília no papel de Carmem, e Hip Hip Rio, com a Djenane Machado. Ambos no Hotel Serrano, no Rio. Augusto César Vanucci Fiz vários programas com o Vanucci para a Sexta Super, da Globo, década de 70. Cheguei a dividir a apresentação com Miéle, Tônia Carrero, Marília Gabriela, Sandra Bréa, Edwin Luisi. Fazia um pouco de tudo: apresentava, cantava, recitava. Fiz, recentemente, um curta-metragem maravilhoso chamado Carolina, do Jeferson De. Eu estava gravando a novela O Beijo do Vampiro, do Antônio Calmon, no Rio, de segunda a sábado, e só tinha o domingo para filmar. Então tomei o avião às sete da manhã e fui direto para o estúdio em São Paulo. Acho que fiquei devendo e poderia ter feito melhor o personagem. Mesmo assim ganhei um prêmio em Varginha pela minha interpretação. A Carolina Maria de Jesus era uma mulher que catava papel e revendia para ferro-velho. Ela era mineira, mas viveu em São Paulo e sustentou três filhos fazendo esse trabalho. Ela tinha um diário. Todo dia voltava para casa e contava o que tinha presenciado pelas ruas: Hoje uma madame me tratou mal. Hoje não deu pra comprar carne pras crianças. Um dia, um jornalista estava fazendo uma matéria na favela em que ela morava e a surpreendeu batendo boca com uns rapazes que estavam usando os balanços e as gangorras de um parque de diversões, que o Adhemar de Barros tinha mandado instalar para as crianças da comunidade. Ela argumentava que eles estragariam os brinquedos e, como eles não saíssem, ela ameaçou escrever sobre o ocorrido em seu diário. O jornalista ficou curioso a respeito de tal diário e perguntou se poderia lê-lo. Ela então o levou até sua casa e mostrou 16 cadernos escritos. O resultado foi que eles escreveram a quatro mãos o livro Quarto de Despejo, que vendeu um milhão de cópias. O Luiz Antonio Pilar tem o projeto de fazer o longa-metragem sobre a Carolina e já me convidou para o papel. Só me pediu para emagrecer porque ela era muito magra. Para mim vai ser a oportunidade de retornar a um personagem cativante, que acho que não fiz como merecia por absoluta falta de tempo. Com o Jeferson De vou voltar a trabalhar no longa-metragem Um Dia. Além disso, estou filmando A Ilha dos Escravos, de Francisco Manso, com quem fiz O Testamento do Sr. Nepomuceno. Já rodei uma seqüência em Maceió e até o final do mês sigo para Cabo Verde a fim de concluir o trabalho. Vou fazer um CD – O Samba Mandou Me Chamar – pelo Quitanda, selo coordenado pela Maria Bethânia para a gravadora Biscoito Fino. Estou escolhendo repertório, ouvindo as músicas que novos compositores me enviam. Mas não será um disco só de inéditas. Quero gravar, por exemplo, Duas Contas, do Garoto e Adeus, América, de Geraldo Jacques e Haroldo Barbosa. E ainda faço chamadas, para o Canal Brasil, de clássicos dos anos 40-70 dentro do projeto Tesouros Brasileiros, que vai ao ar às segundas-feiras. Falo do elenco, do diretor, resumo a trama do filme. É uma produção caprichada, dirigida pelo Edson Audi. Para gravar oito aberturas, acabo levando o dia inteiro. Epílogo   Abre as asas sobre mim / ó senhora liberdade / eu fui condenado / sem merecimento / por um sentimento / por uma paixão / violenta emoção / o amor foi meu delito / mas foi um sonho tão bonito / hoje estou no fim / senhora liberdade / abre as asas sobre mim / não vou passar por inocente / mas já sofri terrivelmente / por caridade / ó liberdade / abre as asas sobre mim (Senhora Liberdade, Wilson Moreira e Nei Lopes)   Como se pode ver, estou sempre inventando mil coisas para fazer. E me acho uma pessoa de sorte, uma atriz privilegiada. Poucas atrizes no mundo têm a chance de interpretar um personagem como Xica da Silva. Mas não me considero uma estrela. Isso é bobagem. Fiz bastante coisa, mas ainda há muito a fazer. Nunca dá pra dizer: agora, chega. Sempre fica aquele gostinho de que falta alguma coisa. Artistas que a gente admira e com quem gostaria de trabalhar. Sylvio Back e Pedro Almodóvar, por exemplo. Se me convidarem pra filmar, eu vou feliz. Gosto dessa multiplicidade, de não ser vista só por um ângulo. Tem gente que passa na rua e fala: Oi, professora. É que anos atrás gravei Telecurso 2.º Grau, que até hoje é reprisado na TV Globo, e muita gente me assiste. O Vicentinho (o deputado Vicente Paulo da Silva) é um. Ele fez o Telecurso e depois se formou em Direito. Tem uns que não sabem que existe teleprompter e pensam que eu sou cultíssima, que sei aquilo tudo de cor. Então eu sou esse mix: atriz, cantora, mãe, esposa, professora. Não me arrependo de nada. Não sou de me arrepender. Acho que o que poderia ter sido melhor, ainda posso corrigir no futuro. Cronologia TV Novelas • Beto Rockfeller (Zezé) Data de estréia: 04/11/1968. De Bráulio Pedroso. Direção: Walter Avancini. Com Luiz Gustavo, Débora Duarte, Maria Della Costa, Irene Ravache, Bete Mendes, Marília Pêra, Ney Latorraca, Pepita Rodrigues, Walderez de Barros, Walter Foster, Cleyde Yaconis, Elias Gleiser, Etty Fraser, Ana Rosa. TV Tupi   • A Patota Data de estréia: 21/11/1972. De Maria Clara Machado. Direção: Reinaldo Boury. Com Débora Duarte, Marco Nanini, Mário Gomes, Pedro Paulo Rangel, Martim Francisco, Renata Fronzi, Lúcia Alves, Lupe Gigliotti, Reinaldo Gonzaga, Zeni Pereira, Sonia de Paula, Fábio Massimo, Rosana Garcia, Fernando José, Flora Geni. TV Globo • Supermanoela (Doralice) Data de estréia: 21/1/1974. De Walter Negrão. Direção: Gonzaga Blota e Reinaldo Boury. Com Marília Pêra, Paulo José, Antônio Pedro, Carlos Vereza, Fausto Rocha, Carlos Alberto Riccelli, Zilka Salaberry, Suzana Gonçalves, Carmem Monegal, Manfredo Colassanti, Lúcia Alves, Irene Stefânia, Roberto Pirillo, Rubens de Falco, Gracindo Jr, Rosita Tomás Lopes. TV Globo   • Duas Vidas (Jandira) Data de estréia: 13/3/1976. De Janete Clair. Direção: Daniel Filho e Jardel Melo. Com Betty Faria, Francisco Cuoco, Carlos Poyart, Christiane Torloni, Isabel Ribeiro, Stepan Nercessian, Sadi Cabral, Cecil Thiré. TV Globo   • Transas e Caretas (Dorinha) Data de estréia: 9/1/1984. De Lauro César Muniz. Direção: José Wilker e Mário Márcio Bandarra. Com Reginaldo Faria, José Wilker, Natália do Valle, Paulo Betti, Otávio Augusto, Christiane Torloni. TV Globo • Corpo a Corpo (Sônia) Data de estréia: 26/11/1984. De Gilberto Braga. Direção: Denis Carvalho e Jayme Monjardim. Com Malu Mader, Glória Menezes, Marcos Paulo, Joana Fomm, Débora Duarte, Eloísa Mafalda, José de Abreu, Antônio Fagundes, Caíque Ferreira. TV Globo • Helena Data de estréia: 4/5/1987. De Mário Prata, Dagomir Marquezi e Reinaldo Moraes. Com Luciana Braga, Thales Pan Chacon, Elias Andreato, Aracy Balabanian, Othon Bastos, Isabel Ribeiro, Léa Garcia, Iléa Ferraz, Jacira Silva. TV Manchete   • Pacto de Sangue (Maria) Data de estréia: 8/5/1989. De Regina Braga e Sérgio Marques. Direção: Herval Rossano. Com Carlos Vereza, Carla Camurati, Ruth de Souza, Léa Garcia, Iléa Ferraz, Jacira Silva, Luiz Guilherme, Othon Bastos. TV Globo • Kananga do Japão (Lulu Kelly) Data de estréia: 19/7/1989. De Wilson Aguiar Filho. Direção: Tizuka Yamasaki. Com Christiane Torloni, Raul Gazolla, Tônia Carrero, Carlos Alberto, Via Negromonte, Cláudio Marzo, Carlos Eduardo Dolabella, Nelson Xavier, Cristiana de Oliveira. TV Manchete • A Próxima Vítima (Fátima Noronha) Data de estréia: 13/3/1995. De Sílvio de Abreu. Direção: Jorge Fernando. Com Tony Ramos, Aracy Balabanian, Tereza Rachel, Yoná Magalhães, Cláudia Ohana, Gianfrancesco Guarnieri, Glória Menezes, José Wilker, Suzana Vieira, Norton Nascimento, André Gonçalves, Lui Mendes, Antônio Pitanga. TV Globo • Xica da Silva (Maria) Ano de exibição: 1996. De Walcyr Carrasco. Direção: Walter Avancini. Com Taís Araújo, Vítor Wagner, Drica de Moraes, Giovana Antonelli, Guilherme Piva, Léa Garcia, Dalton Vigh, Lui Mendes, Ludmila Dayer, Jayme Periard. TV Manchete • Corpo Dourado (Liana) Data de estréia: 12/1/1998. De Antonio Calmon. Direção: Flávio Colatrello, Marcos Schechtman. Com Lima Duarte, Carlos Vereza, Danielle Winits, Humberto Martins, Hugo Carvana, Adriana Garambone, Cristiana Oliveira, Maria Luísa Mendonça. TV Globo   • Esplendor (Irene) Data de estréia: 31/1/2000. De Ana Maria Moretzsohn. Direção: Maurício Farias, Wolf Maya. Com Letícia Spiller, Floriano Peixoto, Joana Fomm, Max Fercondini, Caio Blat, Caco Ciocler, Osmar Prado, Murilo Benício, Ítalo Rossi, Christine Fernandes, Tônia Carrero. TV Globo   • Porto dos Milagres (Ricardina) Data de estréia: 5/2/2001. De Aguinaldo Silva e Ricardo Linhares. Direção: Marcos Paulo e Roberto Naar. Com Arlete Salles, Lima Duarte, Luísa Tomé, Taís Araújo, Nathalia Timberg, Reginaldo Farias, Marcos Palmeira, Marcelo Serrado. TV Globo • O Beijo do Vampiro (Nadir) Data de estréia: 26/8/2002. De Antônio Calmon. Direção: Marcos Paulo e Roberto Naar. Com Kayky Brito, Flávia Alessandra, Alexandre Borges, Débora Secco, Cláudia Mauro, Ana Rosa, Tarcísio Meira, Thiago Lacerda, Eduardo Galvão. TV Globo Minisséries / Especiais   • Mãe de Santo (Ialorixá) TV Manchete • Memorial de Maria Moura (Rubina) TV Globo • Chiquinha Gonzaga (Conceição) TV Globo • O Testamento de Xica da Silva TV Globo, com Raul Cortez • Antes do Baile Verde Adaptado e dirigido por Walter George Durst da obra de Lygia Fagundes Telles, com Aracy Balabanian. • Mulher 80 Musical dirigido por Daniel Filho com Elis Regina, Gal Costa, Maria Bethânia, Marina, Ângela Ro Ro, Simone, Fafá de Belém, Quarteto em Cy, Joyce, Regina Duarte e Narjara Tureta, entre outras. Teatro 1968 • Roda Viva (coro) Comédia musical em dois atos, de Chico Buarque. Direção José Celso Martinez Corrêa. Com Heleno Prestes / Rodrigo Santiago (Benedito Silva / Ben Silver), Antônio Pedro (Anjo da Guarda), Marieta Severo / Marília Pêra (Juliana / Juju), Flávio São Tiago (Capeta), Paulo César Pereiro (Mané), Fernando Reski (coro), Pedro Paulo Rangel (coro), André Valli (coro), entre outros. Estreou em 17 de janeiro de 1968 no Teatro Princesa Isabel, seguindo depois temporada em São Paulo, no Teatro Ruth Escobar e Porto Alegre, no Teatro Leopoldina, onde foi definitivamente censurada em outubro de 1968. 1969 • A Moreninha (Paula) Comédia musical de Miroel Silveira e Cláudio Petraglia a partir do original de Joaquim Manuel de Macedo. Com Marília Pêra (Carolina), Perrry Salles (Augusto), Antônia Marzullo (Donana), Dinorah Marzullo (dona Violante), Fernando Almeida (Leopoldo), Ricardo Petraglia (Fabrizio), Cláudia Mello (Clementina), Gésio Amadeu (Rafael). Apresentada no Teatro Anchieta (SP) e Teatro João Caetano (RJ), onde estreou em julho de 1969. • Hamlet (1.ª atriz) Tragédia de William Shakespeare. Tradução e Direção de Flávio Rangel. Com Walmor Chagas (Hamlet), Cláudio Corrêa e Castro (Rei Claudius), Fredi Kleeman (Polonius), Lilian Lemmertz (Ofélia), Lineu Dias (Horácio), Beatriz Segall (Rainha Gertrudes), Jonas Bloch (Laertes), Zanoni Ferriti (Rosencrantz), Otávio Augusto (Guildenstern), Zózimo Bulbul (1.º ator), entre outros. Apresentada em São Paulo (1969) e, posteriormente, no Rio (1970). 1970 • A Vida Escrachada de Joana Martini e Baby Stompanato (Pérola Negra) Comédia musical de Bráulio Pedroso. Direção de Antônio Pedro. Músicas de Roberto e Erasmo Carlos. Com Marília Pêra (Joana), Hélio Souto / Carlos Koppa (Baby), Ileana Kwasinski, Maria Sìlvia, Sandra Pedra (girls), Marco Nanini e André Valli (boys), entre outros. Estreou em São Paulo no Teatro São Pedro em 1970, seguindo posteriormente para o Teatro Ipanema e o Teatro Mesbla, ambos no Rio de Janeiro. 1972 • Fígaro ou Um Dia Muito Louco (Condessa de Almaviva) Comédia de Beaumarchais. Tradução de Carlos Queirós Telles. Música de Murilo Alvarenga. Direção e cenários de Gianni Ratto. Com Beatriz Segall (Suzana), Jonas Mello (Fígaro) e Oswaldo Loureiro (Conde Almaviva), entre outros. Estreou em abril de 1972 no Teatro Anchieta, SP. • Godspell Musical de John-Michael Tebelak e Stephen Schwartz. Tradução de Renata Pallottini. Direção de Altair Lima. Com Wolf Maia, Airton Salvanini, Augusto Pompeu, Lucélia Santos, Lígia Diniz e Carlos Eduardo (Kadu Moliterno), entre outros. Zezé só esteve no elenco do Rio, no Circo Elétrico, em Botafogo. • Pobre Menina Rica (Maria Moita) Musical de Carlos Lyra e Vinicius de Moraes. Em cartaz no Teatro da Praia, com Carlos Lyra (Poeta), Kate Lira (Menina Rica), Rafael de Carvalho (Pau-de-Arara), João Pedro (Mendigo-chefe). Comentário do Orlando Senna no Correio da Manhã de 24/10/72: Quanto a Zezé Motta, a Maria Moita de Pobre Menina Rica, que tão poucas oportunidades boas teve até este momento, é incrível que não tenha sido descoberta como uma das intérpretes brasileiras de maior força comunicativa. Zezé está como uma flecha em um arco retesado, uma mão que se abre e ela voa até onde só Deus sabe. Os grandes musicais, os shows noturnos, um provável novo teatro de revista brasileiro deve reservar um lugar de destaque pra ela e o produtor, o descobridor de talentos que não vê as possibilidades de Zezé é, no mínimo, incompetente. • Orfeu da Conceição Direção: Haroldo de Oliveira. Com Zózimo Bulbul. Teatro Tereza Rachel 1976 • Rendez-Vous Comédia de Robert Thomas. Tradução de Paulo Nolding. Direção de Antônio Pedro. Com Eva Todor, Lutero Luiz, Roberto Azevedo, Luiz Pimentel e Luiz Armando Queiroz, entre outros. Em cartaz no Teatro Maison de France durante o ano de 1976. 1977 • A Rainha Morta (Bá) Texto de Heloísa Maranhão. Direção, cenários, figurinos e produção de Luiz Carlos Ripper. Com Rosita Tomás Lopes (Rainha de Portugal), Jorge Gomes (Infante dom Pedro), Renato Coutinho (Rei de Portugal) e Elke Maravilha (Iaiá / Inês de Castro), entre outros. A peça estreou no dia 1.º de janeiro de 1977 no Teatro Gláucio Gil. Posteriormente, fez temporada popular no Teatro João Caetano. • 1888 – A Causa da Liberdade Texto de Domingos de Oliveira. Direção Anselmo Vasconcellos – Com Nelson Dantas, Antônio Pompeo e Pascoal Villaboim, entre outros. 2003 • Disse-Me-Disse De José Carvalho. Direção de Gracindo Jr. Com Taís Araújo, Nelson Xavier, Léa Garcia, Romeu Evaristo, Milton Gonçalves, Maurício Gonçalves. A peça esteve em turnê durante o ano de 2003. Cinema 1969 • Em Cada Coração um Punhal Episódio Transplante de Mãe. Direção: Sebastião de Souza. Com Liana Duval, Etty Fraser, John Herbert. 1970 • Cleo e Daniel (freqüentadora do bar) Direção: Roberto Freire. Com John Herbert, Irene Stefânia, Chico Aragão, Rodrigo Santiago, Myriam Muniz, Lélia Abramo, Fernando Baleroni, Beatriz Segall, Sadi Cabral. • Vai Trabalhar Vagabundo (Shirley) Direção: Hugo Carvana. Com Hugo Carvana, Odete Lara, Nelson Xavier, Paulo César Pereio, Rose Lacreta, Valentina Godoy, Nelson Dantas, Wilson Grey, Otávio Augusto, Fregolente. 1973 • A Rainha Diaba (prostituta) Direção: Antônio Carlos da Fontoura. Com Mílton Gonçalves, Stepan Nercessian, Odete Lara, Nelson Xavier, Yara Côrtes, Lutero Luiz, Wilson Grey, Paulão, Carlinhos Prieto, Samuca. 1974 • Um Varão entre as Mulheres (empregada) Direção: Victor di Mello. Com Jorge Dória, Nídia de Paula, Sandra Barsotti, Lady Francisco. • Banana Mecânica Direção: Braz Chediak. Com Carlos Imperial, Miguel Carrano, Felipe Carone, Ary Fontoura, Nélia Paula, Miriam Pérsia, Rose di Primo, Kate Lyra, Pedro Aguinaga, Henriqueta Brieba. • A Força de Xangô (Estrela) Direção: Iberê Cavalcanti. Com Grande Otelo, Geraldo Rosa, dona Ivone Lara, Carlão Elegante, Elke Maravilha, Sônia Vieira, Ana Maria Silva. 1976 • Xica da Silva (Xica) Direção: Cacá Diegues. Com Walmor Chagas, Stepan Nercessian, Rodolfo Arena, Altair Lima, Elke Maravilha. • Cordão de Ouro Direção: Antonio Carlos da Fontoura. Com Nestor Capoeira, Jofre Soares. • Ouro Sangrento ou Tenda dos Prazeres (empregada) Direção: César Fronzi Ladeira. Com Tony Tornado, Sandra Barsotti, João Acaiabe, Jonas Bloch, José Lewgoy, Quim Negro. 1977 • Tudo Bem (Zezé) Direção: Arnaldo Jabor. Com Fernanda Montenegro, Paulo Gracindo, Regina Casé, Luiz Fernando Guimarães, Maria Silvia, Fernando Torres, Luiz Linhares, Jorge Loredo, Stênio Garcia, José Dumont. 1978 • Missa do Galo (curta-metragem) Direção: Nelson Pereira dos Santos. Com Fernanda Montenegro. 1982 • Para Viver um Grande Amor (Maria Moita) Direção: Miguel Faria Jr. Com Patrícia Pilar, Djavan, Nelson Xavier, Glória Menezes, Paulo Goulart, Lutero Luiz, Elba Ramalho, Maria Alves. 1984 • Quilombo (Dandara) Direção: Cacá Diegues. Com Antonio Pompeo, Tony Tornado, Vera Fischer, Antônio Pitanga, Maurício do Valle, Grande Otelo, Jofre Soares, Jonas Bloch. • Águia na Cabeça (Maria das Graças) Direção: Paulo Thiago. Com Nuno Leal Maia, Christiane Torloni, Jece Valadão, Tereza Rachel, Hugo Carvana, Xuxa Lopes. • El Mestizo (Cruz Guaregua) Direção: Mário Handler • Anjos da Noite (Malu) Direção: Wilson Barros. Com Marília Pêra, Marco Nanini, Antônio Fagundes, Guilherme Leme, Chiquinho Brandão, Aída Lerner, Cláudio Mamberti, Sérgio Mamberti. 1986 • Jubiabá (Rosenda) Direção: Nelson Pereira dos Santos. Com Françoise Goussard, Charles Baiano, Grande Otelo, Betty Faria, Ruth de Souza, Jofre Soares. 1987 • Natal da Portela (Maria Elisa) Direção: Paulo Cesar Saraceni. Com Milton Gonçalves, Adele Fátima, Grande Otelo, Almir Guineto, Paulo César Pereio, Maurício do Valle, Mauro Mendonça, Rosamaria Murtinho. 1988 • Sonhos de Menina-Moça Direção: Tereza Trautman. Com Marieta Severo, Louise Cardoso, Tônia Carrero, Eduardo Lago. 1989 • O Prisioneiro do Rio Direção: Lech Majewski. Com Paul Freeman, Steven Berkoff, Florinda Bolkan, José Wilker, Breno Moroni, Nice Meirelles. • Dias Melhores Virão (Dalila) Direção: Cacá Diegues. Com Marília Pêra, Antônio Pedro, Marilu Bueno, Rita Lee, Patrício Bisso, Paulo José, José Wilker. • O Gato de Botas Extraterrestre Direção: Wilson Rodrigues. Com Maurício Mattar, Flávia Monteiro, Carmem Silva, Tônia Carrero, Heitor Gaiotti, José Mojica Marins. • A Serpente (a Crioula) Direção: Alberto Magno. Com Marco Nanini, Monique Lafond, Jece Valadão. 1992 • Alva Paixão (curta-metragem) (Gavita) Direção: Maria Emilia de Azevedo. Com Robson Benta. 1995 • Tieta (Carmosina) Direção: Cacá Diegues. Com Sônia Braga, Marília Pêra, Heitor Martinez, Chico Anysio, Patrícia França, Cláudia Abreu, Leon Góes. Participação especial na trilha composta por Caetano Veloso, cantando a canção Miragem de Carnaval. 1996 • O Testamento do Sr. Nepomuceno (Governanta) Direção: Francisco Manso. Com Nelson Xavier, Maria Ceiça, Chico Diaz, Via Negromonte, Milton Gonçalves, Elisa Lucinda. 1997 • Orfeu (Conceição) Direção: Cacá Diegues. Com Murilo Benício, Toni Garrido, Patrícia França, Mílton Gonçalves, Maurício Gonçalves, Eliezer Mota, Stepan Nercessian, Nelson Sargento, Léa Garcia, Maria Ceiça. 1999 • Cronicamente Inviável Direção: Sérgio Bianchi. Com Umberto Magnani, Dan Stulbach, Daniel Dantas, Betty Gofman, Zezeh Barbosa, Cláudia Mello, Cecil Thiré, Dira Paes. 2000 • Poeta de Sete Faces Direção: Paulo Thiago. Com Carlos Gregório, Ana Beatriz Nogueira, Antonio Calloni, Cláudio Mamberti, Cristina Pereira, Leonardo Vieira. 2002 • Xuxa e os Duendes 2 – No Caminho das Fadas (Kálix) Direção: Rogério Gomes e Paulo Sérgio de Almeida. Com Luciano Szafir, Luís Carlos Tourinho, Vera Fischer, Guilherme Karan, Karen Accioly, Vic Militello, Betty Lago, Cristina Pereira. • Saudade / Sehnsucht Direção: Jürgen Brüning. Com Aldri D´Anunciação, Hendrik Scheider, Tarik Qazi. 2003 • A Idade do Homem (curta-metragem) Direção: Afonso Nunes. Com Adilson Magá, Camilo Lélis, Luciane Oliveira. 2004 • Bom Dia Eternidade Direção: Rogério de Moura. Com João Acaiabe, Eduardo Acaiabe, Valéria Pontes, Lena Roque. • O Moleque (curta-metragem) Direção: Ana Cândido Fernandes • Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida Direção: Moacyr Góes. Com Xuxa, Marcos Pasquim, Bruna Marquezine, Paulo Vilhena, Luiz Carlos Tourinho, Milton Gonçalves. • Carolina (curta-metragem) Direção: Jeferson De. Com Gabrielly de Abreu. • Quanto Vale ou é Por Quilo? Direção: Sérgio Bianchi. Com Ana Carbatti, Cláudia Mello, Ana Lúcia Torre, Herson Capri, Caco Ciocler, Caio Blat, Emílio de Mello, Silvio Guindane, Leona Cavalli, Ariclê Perez, Joana Fomm. Discografia   1975 • Trem Noturno - Gerson Conrad e Zezé Motta Produzido por Márcio Augusto A Dança do Besouro / Favor dos Ventos / Sono agitado / Trem Noturno / Estranho Sorriso / Bons Tempos / Legado da Terra / Sempre me Mim / Pop Star / Um Resto de Sol / Lírios Mortos / A Medida / Novo Porto / 1974 (todas as músicas de Gerson Conrad e Paulinho Mendonça) Lançado somente em LP   1978 • Zezé Motta Produzido por Liminha Muito Prazer Zezé (Rita Lee / Roberto de Carvalho) / Magrelinha (Luiz Melodia) / Trocando em Miúdos (Francis Hime / Chico Buarque) / Rita Baiana (John Neschling / Geraldo Carneiro) / Dores de Amores (Luiz Melodia) / Crioula (Moraes Moreira) / Pecado Original (Caetano Veloso) / Mameto Oiaice (Clélio José / Odeamim José) O Morro não Engana (Luiz Melodia / Ricardo Augusto) / Dengue (Lecy Brandão) / Babá Alapalá (Gilberto Gil) Editado em CD em 2002 1979 • Negritude Produzido por João de Aquino Manhã Brasileira (Manacéa) / Atividade (Padeirinho) / Ai de Mim (John Neschiling / Geraldo Carneiro) / Pensamento Yorubá (Moraes Moreira / Antônio Risério) / Autonomia (Cartola) / Tabuleiro (João de Aquino / José Márcio) / Senhora Liberdade (Wilson Moreira / Ney Lopes) / Cana Caiana (Rosinha de Valença / Maria Bethânia) / Trovoada (Tunai / Sérgio Natureza) / Negritude (Irinéia Maria / Paulo César Feital) / Yayá (H. Vogeler / Luiz Peixoto / Marques Porto) / Boca de Sapo (João Bosco / Aldir Blanc) 1980 • Dengo Produzido por Perinho Albuquerque Remendos (Joanna / Sarah Benchimol) / Feiticeira (Gilberto Gil) / O Dengo Que a Nega Tem (Dorival Caymmi) / Bola de Meia, Bola de Gude (Milton Nascimento / Fernando Brant) / Cais Escuro (Paulo Cesar Feital / Zezé Motta) / Oxum (Johnny Alf) / Fez Bobagem (Assis Valente) / Sete Faces (Gonzaguinha) / Sem Essa (Jards Macalé / Duda) / Poço Fundo (Gilberto Gil) Editado em CD em 2002 1984 • Frágil Força Produzido por José Maurício Machline Negrito (Belizário / Paulinho Resende) / Pouco me Importa (Francis Hime / Ruy Guerra) / Carnaval de Rua (Edil Pacheco / Paulo César Pinheiro) / Angorá (Irinéia Maria / Paulo César Feital) / Castigo (Marco Pólo) / Dança (Djalma Luz) / Romântico (Elodi / José Maurício) / Nega Dina (Moraes Moreira / Capinam) / Prateia (Maria Carmem Barbosa) / Frágil Força (Luiz Melodia) Editado somente em LP 1995 • Chave dos Segredos Produzido por Jorge Gambier Paixão (Luiz Melodia) / Doce Esperança (João Veloso / Roberto Mendes) / Direito à Vida (Elton Medeiros) / Ter Você Comigo (Jane Duboc / Sueli Corrêa) / Coisa Feita (João Bosco / Paulo Emilio / Aldir Blanc) / Como la Cigarra (Maria Helena Walsh) / Escrava Anastácia (Jota Maranhão / Tony Bahia) / Tema de Amor de Gabriela (Tom Jobim) / Pepe (Daniel Lemetre versão A. Santana) / Chorinho (Irinéia Maria / Suely) / Quero Porque Quero (Marina Lima / Zezé Motta) / Sins (Adriana Calcanhoto) / Meu Par (Irinéia Maria / Suely) / Chave dos Segredos (Timbaúba) Editado em CD   Quarteto Negro (1987) - produzido por Janine Houard  Folozinha (Marku Ribas / R. Amaral) / Sobre as Ondas (Jorge Degas) / Merengue (Adler São Luiz) / Festas da Xica (Paulo Moura) / Zumbi (Gilberto Gil / Wally Salomão) / Axé (Paulo Moura / Djalma Corrêa / Jorge Degas) / Brucutu (Jorge Degas / Djalma Corrêa) / Geísa (Roberto Guima) / A Quelé Menina (Djalma Luz) / Corta Jaca (Chiquinha Gonzaga) / Semba (Jorge Degas / Zezé Motta) / Lavadeira Blues (Paulo Moura) / Taisho-Koto (Djalma Corrêa) 2000 • Divina Saudade Produzido por Roberto Menescal Canção de Amor (Chocolate / Elano de Paula) / Consolação - Tem Dó (Baden Powell / Vinicius de Moraes) / Chega de Saudade (Tom Jobim / Vinicius de Moraes) / A Noite do Meu Bem (Dolores Duran) / Prece - Feitio de Oração (Vadico / Marino Pinto / Noel Rosa) / Noites Cariocas - Lamento (Jacob do Bandolim / Pixinguinha / Vinicius de Moraes) / Molambo (Jayme Florence / Augusto Mesquita) / Barracão - Samba Triste (Oldemar Magalhães / Luiz Antônio / Billy Blanco / Baden Powell) / Nossos Momentos – Tudo é Magnífico (Haroldo Barbosa / Luis Reis) / O Amor e a Rosa (Pernambuco / Antônio Maria) / Tristeza (Haroldo Lobo / Miltinho) Participações   • MPB SHELL 80: Anunciação (Paulo Feital / Diana Feital / J. Maranhão) • A Turma do Pererê: Tininim • Joel Teixeira: Não Quero Saber mais Dela (Sinhô) • Toninho Vargas • Luiz Melodia e Amigos (Estácio Eu e Você) • Homenagem a Herivelto Martins (Que Rei Sou Eu) • Cantoras Negras (Senhora Liberdade) • Trilha do filme Para Viver um Grande Amor (Sinhazinha, Chico Buarque) Índice Apresentação - Hubert Alquéres 05 Introdução 13 Capítulo I 17 Capítulo II 29 Capítulo III 37 Capítulo IV 49 Capítulo V 59 Capítulo VI 69 Capítulo VII 77 Capítulo VIII 81 Capítulo IX 91 Epílogo 117 Imagens de Zezé 120 Cronologia 143 Créditos das fotografias Todas as fotografias pertencem ao acervo pessoal de Zezé Motta Coleção Aplauso Perfil Anselmo Duarte - O Homem da Palma de Ouro Luiz Carlos Merten Aracy Balabanian - Nunca Fui Anjo Tania Carvalho Bete Mendes - O Cão e a Rosa Rogério Menezes Carla Camurati - Luz Natural Carlos Alberto Mattos Carlos Coimbra - Um Homem Raro Luiz Carlos Merten Carlos Reichenbach - O Cinema Como Razão de Viver Marcelo Lyra Cleyde Yaconis - Dama Discreta Vilmar Ledesma David Cardoso - Persistência e Paixão Alfredo Sternheim Djalma Limongi Batista - Livre Pensador Marcel Nadale Etty Fraser - Virada Pra Lua Vilmar Ledesma Gianfrancesco Guarnieri - Um Grito Solto no Ar Sérgio Roveri Helvécio Ratton - O Cinema Além das Montanhas Pablo Villaça Ilka Soares - A Bela da Tela Wagner de Assis Irene Ravache - Caçadora de Emoções Tania Carvalho João Batista de Andrade - Alguma Solidão e Muitas Histórias Maria do Rosário Caetano John Herbert - Um Gentleman no Palco e na Vida Neusa Barbosa José Dumont - Do Cordel às Telas Klecius Henrique Niza de Castro Tank - Niza Apesar das Outras Sara Lopes Paulo Betti - Na Carreira de um Sonhador Teté Ribeiro Paulo Goulart e Nicette Bruno - Tudo Em Família Elaine Guerrini Paulo José - Memórias Substantivas Tania Carvalho Reginaldo Faria - O Solo de Um Inquieto Wagner de Assis Renata Fronzi - Chorar de Rir Wagner de Assis Renato Consorte - Contestador por Índole Eliana Pace Rodolfo Nanni - Um Realizador Persistente Neusa Barbosa Rolando Boldrin - Palco Brasil Ieda de Abreu Rosamaria Murtinho - Simples Magia Tania Carvalho Rubens de Falco - Um Internacional Ator Brasileiro Nydia Licia Ruth de Souza - Estrela Negra Maria Ângela de Jesus Sérgio Hingst - Um Ator de Cinema Maximo Barro Sérgio Viotti - O Cavalheiro das Artes Nilu Lebert Sonia Oiticica - Uma Atriz Rodrigueana? Maria Thereza Vargas Ugo Giorgetti - O Sonho Intacto Rosane Pavam Walderez de Barros - Voz e Silêncios Rogério Menezes Especial Dina Sfat - Retratos de uma Guerreira Antonio Gilberto Gloria in Excelsior - Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira Álvaro Moya Maria Della Costa - Seu Teatro, Sua Vida Warde Marx Ney Latorraca - Uma Celebração Tania Carvalho Sérgio Cardoso - Imagens de Sua Arte Nydia Licia Cinema Brasil Bens Confiscados Roteiro comentado pelos seus autores Carlos Reichenbach e Daniel Chaia Cabra-Cega Roteiro de DiMoretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo Kauffman O Caçador de Diamantes Vittorio Capellaro comentado por Maximo Barro A Cartomante Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis Casa de Meninas Inácio Araújo O Caso dos Irmãos Naves Luís Sérgio Person e Jean-Claude Bernardet Como Fazer um Filme de Amor José Roberto Torero De Passagem Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias Dois Córregos Carlos Reichenbach A Dona da História Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho O Homem que Virou Suco Roteiro de João Batista de Andrade por Ariane Abdallah e Newton Cannito Narradores de Javé Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu Teatro Brasil Alcides Nogueira - Alma de Cetim Tuna Dwek Antenor Pimenta e o Circo Teatro Danielle Pimenta Luís Alberto de Abreu - Até a Última Sílaba Adélia Nicolete Trilogia Alcides Nogueira - ÓperaJoyce - Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso - Pólvora e Poesia Alcides Nogueira Ciência e Tecnologia Cinema Digital Luiz Gonzaga Assis de Luca Os livros da coleção Aplauso podem ser encontrados nas livrarias e no site www.imprensaoficial.com.br/lojavirtual ctp, impressão, acabamento IMPRENSA OFICIAL Rua da Mooca, 1921 São Paulo SP Fones: 2799-9800 – 0200 123401 WWW.imprensaoficial.com.br