colecao musica Adelaide Chiozzo O acordeom e o beijinho doce Patrícia Rodrigues Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Governo do Estado de São Paulo Aos meus pais, Geraldo e Leonor (in memoriam), meu marido, Carlos Mattos (in memoriam), minha filha, Cristina Maria Chiozzo, meus netos, Bruno, Fábio e Roberto, e às minhas amigas Alice Vianna, Fernanda Caetano e Olinda Marques. Adelaide Chiozzo Ao meu pai, Francisco de Assis À minha mãe, Maria Elza (in memoriam) Patrícia Rodrigues Sumário Introdução 9 Uma Família Italiana 12 Um Acordeom Mágico 21 A estreia no rádio 26 Um Pedro Raymundo de Saias 35 Adelaide Brilha também no Cinema 44 Viajando com o Cupido 55 O Casamento 60 A Namoradinha do Brasil 75 Estrela da Atlântida 95 Saudades da Atlântida 115 Irmãs Chiozzo 120 Viajando pelo Brasil 133 Eles e Elas 156 Gravações 179 Atriz de Novelas 183 Uma Grande Perda 190 O Palco é o Meu Chão 192 Discografia 200 Filmografia 208 Fontes Consultadas 214 Agradecimentos 214 Créditos fotográficos 215 Introdução Adelaide Chiozzo é uma das mais importantes artistas brasileiras. Acordeonista, cantora, compositora e atriz, desenvolveu seu trabalho nos palcos de teatros, rádios, estúdios de cinema e televisão. Nasceu com o dom natural da música, e soube desenvolver e aprimorar sua capacidade em uma brilhante carreira que prossegue até os nossos dias. Seus primeiros passos na vida artística se deram ainda na infância, no bairro do Brás, em São Paulo. A vida de Adelaide foi marcada pelo acordeom e ela faz questão de afirmar o tempo todo que nunca estudou música, nunca teve professor. Seu dom é, talvez, espiritual. Para conhecer melhor Adelaide, é necessário mergulhar um pouco mais profundamente em suas origens, na influência do meio em que foi criada, nas características do cenário social e político em que desenvolveu as várias etapas de sua vida artística, bem como na influência que teve de amigos e artistas que com ela conviveram. Para escrever este livro, foi feita uma série de entrevistas com Adelaide Chiozzo em seu apartamento na Tijuca, no Rio de Janeiro, onde ela guarda as lembranças de sua carreira, registradas em mais de duas mil fotos, recortes de jornais e revistas, discos, filmes e o seu inseparável acordeom. A história tem início na imigração italiana para o Brasil no fim do século XIX. Em uma das levas de imigrantes, estavam a bisavó de Adelaide e seus filhos. Em quase todas as entrevistas, Adelaide se referiu ao fato, se entusiasmou, seus olhos brilharam e ela narrou as peripécias da viagem como se tivesse presenciado e participado dos acontecimentos, com detalhes que provavelmente só existiram em sua fantasia romântica. A verdade é que as reconhecidas sensibilidade artística e a musicalidade italianas estão fortemente presentes em Adelaide. Efeitos da hereditariedade. Em outros momentos, ao falar de sua infância, novamente Adelaide se entusiasmou e discorreu sobre os acontecimentos ao sabor das emoções. Na maioria das vezes, deixou que as ideias se atropelassem e a cronologia ficasse prejudicada, tamanha era a emoção revivida. Ao falar de sua vida artística, desde a infância até os dias atuais, acrescentava sempre algum fato pitoresco para ilustrar a narração, revelando os componentes alegres, descontraídos e até mesmo descompromissados de seu comportamento. Na ânsia de não deixar escapar nenhum detalhe, Adelaide quebrou constantemente a sequência da entrevista para contar outras histórias, mostrar fotografias, recortes e outros objetos que ilustravam o que estava contando. Ao mesmo tempo, criou um ambiente frenético, que chegou a lembrar os bastidores de seus shows, ou até mesmo as trapalhadas das chanchadas que ela viveu no cinema. O sucesso de um artista não depende somente do talento. É resultado de toda uma conjuntura. Na década de 1930, houve um estímulo do governo brasileiro às atividades radiofônicas. A partir de 1936, com a inauguração da PRE-8, Rádio Nacional do Rio de Janeiro, o rádio foi popularizando-se cada vez mais como o grande veículo de comunicação de massa. Em março de 1940, a Nacional ganhou nova força, com o Decreto-lei nº 2.073, do, então presidente da República, Getúlio Vargas. Ele criou as empresas incorporadas ao Patrimônio da União que, entre outras coisas, determinou a incorporação de todo o acervo das Sociedades A Noite, Rio Gráfica e Rádio Nacional. Assim, a emissora da Praça Mauá passou à administração do poder público, teve um rápido crescimento e tornou-se a maior do Brasil. A Rádio Nacional possuía um grande auditório e os mais modernos estúdios e equipamentos de transmissão radiofônica da época, que levavam suas ondas a todo o território brasileiro. Contava com grandes orquestras e alguns dos principais maestros da época: Lyrio Panicalli, Radamés Gnatalli, Leo Peracchi, Chiquinho, Romeu Ghipsman e Carioca, por exemplo. Em seu cast, figuravam os mais renomados cantores, locutores, rádio-atores e músicos. O ambiente da rádio era extremamente profissional, com um excelente relacionamento entre todos os funcionários. Além disso, a emissora transmitia ao público todo o glamour do mundo artístico, que seduzia, e mantinha a fidelidade dos ouvintes. A influência da Nacional se estendia para além do ambiente radiofônico. Surgiram revistas especializadas, e toda a imprensa da época dedicava um espaço para falar dos artistas do rádio. Pertencer à Rádio Nacional era o sonho de todo artista e garantia de sucesso. Adelaide Chiozzo chegou à Rádio Nacional em 1946, quando a emissora estava no auge. Na medida em que Adelaide foi ganhando projeção e tornando-se conhecida em todo o Brasil, foram se abrindo portas: boates, casas de shows e apresentações em outras cidades. Suas primeiras participações em filmes também coincidiram com o início de sua carreira na Rádio Nacional. O cinema levou para todo o Brasil, além do acordeom e da voz, a figura bonita e simpática de Adelaide Chiozzo. Assim, ela hoje se orgulha de ter trabalhado nas duas empresas que davam mais status a qualquer artista na época: a Rádio Nacional e a Atlântida Cinematográfica. Fundada em 1941, por Moacyr Fenelon e José Carlos Burle, a Atlântida tornou-se a maior produtora cinematográfica brasileira. Ficou marcada pela produção das conhecidas chanchadas – comédias ingênuas, números musicais e romance – onde participavam, além dos principais atores da época, músicos e artistas de grande popularidade. Vários desses artistas têm seus nomes definitivamente ligados à Atlântida. Entre eles, os diretores Moacyr Fenelon, José Carlos Burle, Watson Macedo e Carlos Manga; os grandes comediantes Oscarito e Grande Otelo; os galãs Cyll Farney e Anselmo Duarte; os vilões José Lewgoy e Renato Restier; e as inesquecíveis mocinhas Fada Santoro, Eliana e Adelaide Chiozzo. A primeira experiência de Adelaide Chiozzo em televisão aconteceu na Rádio Nacional, por ocasião das demonstrações públicas de televisão, feitas pela emissora em 1948. Nas décadas de 1950 e 1960, Adelaide apresentou-se em diversos programas de TV como acordeonista e cantora. Mas a atuação mais importante de Adelaide na televisão foi nas telenovelas da TV Globo. A primeira foi Feijão Maravilha (1979), de Bráulio Pedroso. Depois vieram Cambalacho (1986) e Deus nos acuda (1992), ambas de Silvio de Abreu. Assim, a menina que começou tocando e cantando músicas caipiras no Brás, brilhou na Rádio Nacional, cantou e encantou nos filmes da Atlântida, firmou-se como atriz de TV, e prossegue sua vitoriosa carreira realizando shows e alegrando seus numerosos fãs. Adelaide mantém viva a lembrança de todos os momentos de sua carreira e fala sobre eles como se os estivesse revivendo. É pura emoção. Patrícia Rodrigues Uma Família Italiana Meus pais, Geraldo Chiozzo e Leonor Cavallinni Chiozzo, eram descendentes de italianos. Meus avós vieram para o Brasil no fim do século XIX. A Itália estava com um problema muito triste. Não tinha trabalho, não tinha nada. Então, eles decidiram vir para o Brasil porque aqui tinha tudo. Tinha boa terra. Minha bisavó por parte de mãe era viúva e viajou com os dois filhos: Stéfano, com 16 anos, e Marieta, minha nona (avó), com 14. No navio, minha nona conheceu meu avô, Afonso Cavallinni. Ele viajava sozinho e não tinha família. Minha nona, seu irmão Stéfano e Afonso ficaram muito amigos. Minha bisavó morreu durante a viagem e os filhos ficaram sozinhos. O comandante, então, quis saber se os dois tinham outros parentes, e eles disseram que não. Como Afonso, Stéfano e Marieta estavam sempre juntos, o comandante sugeriu que Afonso e Marieta se casassem. Havia um problema: Marieta era menor de idade e para casar precisava que algum responsável autorizasse. O comandante alegou que no navio ele era a única autoridade, e realizou o casamento dos dois. Minha nona teve 18 filhos. Todos nascidos no Brasil. Minha mãe foi a 14ª. Com meu pai foi diferente. Ele nasceu na Itália e veio para o Brasil com a família, ainda bebê. Devia ter um ou dois meses de idade. Nem registrado ele era. Quando os italianos chegavam a São Paulo, desembarcavam no Porto de Santos e depois seguiam de trem até a Estação da Luz. De lá, eles eram encaminhados para as fazendas. A família da minha mãe foi para Sorocaba e a do meu pai foi para Botucatu. Meus pais se casaram na década de 1920, e foram morar no Brás. Tiveram quatro filhos: Carolina, a mais velha, Afonso, eu e a Sylvinha, que nasceu sete anos depois de mim. Nasci na Rua Martim Burchard, no Bairro do Brás, em São Paulo, no dia 8 de maio de 1931. Meu pai não me registrou no mesmo dia. Só no dia 13 de maio é que ele foi ao cartório. Quando o tabelião perguntou em que dia eu tinha nascido, ele respondeu: hoje. Meus pais só conviviam com italianos. Chamavam o Brás de Piccola Itália. Lá não tinha uma pessoa que não falasse italiano. Tudo, tudo, tutti italiani. Fui criada num regime bastante rigoroso. Meus pais sempre foram muito bons, mas eram muito enérgicos. Na hora das refeições, meu pai exigia que a gente sentasse direito. Ele dizia: Empina o corpo! Não se come em cima do prato! Com três anos de idade, eu tive um problema sério de saúde. Tive apendicite supurada. Fiquei quase um mês no hospital, entre a vida e a morte. As irmãs de caridade que trabalhavam no hospital viviam colocando vela na minha mão. Minha mãe sofreu muito com isso. Na época, estava acontecendo aqui no Brasil um congresso de médicos, e veio um médico italiano pra cá. Meu pai ficou sabendo e foi lá pedir para que ele fosse me ver. Papai insistiu muito e ele acabou indo ao hospital onde eu estava, me examinou e mandou que me dessem banhos de luz. Eu melhorei. Foi a minha salvação! Foi uma felicidade para minha família. Mas eu não conseguia esticar a perna direita. Minha mãe fez uma promessa para Nossa Senhora da Penha e, quando voltei a andar, ela me levou à igreja com uma vela do meu tamanho. Isso ficou muito marcado na minha vida. Papai trabalhava em uma fábrica de móveis que era a maior da América do Sul naquele tempo, a Paschoal Bianco. Ocupava uma quadra inteira no Brás. Nós morávamos em uma vila que pertencia à fábrica. Papai era mestre entalhador. Fazia coisas lindas com a madeira. Na fábrica, ele era gerente de corte. Era ele quem marcava a madeira e vigiava o corte para que não desperdiçassem madeira. Ele tinha, também, uma oficina nos fundos da nossa casa. Sempre tinha muitas encomendas, e os filhos ajudavam. Eu serrava a madeira em uma máquina e meu irmão Afonso polia em outra. Meu pai riscava a madeira e eu cortava. Não podia errar, senão o castigo era certo. Depois, eu lixava tudo e pintava. Eu trabalhei muito nessa oficina. Tudo para ajudar a família. Eu devia ter uns sete ou oito anos e já trabalhava muito. Meu pai dizia: Em casa de italiano ninguém fica parado. Os filhos têm de trabalhar porque nada cai do céu. Estudei na Escola Romão Puigari. Ficava no Brás também, pertinho da rua onde eu morava. Nunca fui boa aluna, mas as professoras sempre simpatizavam comigo. Quando eu chegava em casa, tinha de trabalhar. Então, não dava tempo de estudar. Tinha tanta coisa pra fazer, que eu não sabia se comia ou se trabalhava. Meu pai fazia uns móveis em miniatura e era eu que pintava. Quando chegava a hora de ir para a escola, eu tinha que tomar banho correndo e me arrumar. Nem sempre eu conseguia tirar as manchas de tinta que ficavam em mim e quando chegava à escola não me deixavam entrar. Eu era muito sacrificada. Era aquela menina que tinha de fazer tudo. Eu trabalhava muito. Acho que foi por isso que Deus me fez tão feliz como eu sou. Porque eu ajudei muito a minha família. Mesmo depois de casada. Sempre fui uma pessoa muito dedicada à família. Quando tinha tempo, eu gostava de ir ao cinema. Nós morávamos perto do cinema Olímpia, que ficava na Avenida Rangel Pestana. Eu chamava uma amiguinha minha, a Dirce, que sempre sabia que filme estava passando. Eu perguntava: Esse filme é bom? Ela dizia: É sim. Tem a Shirley Temple. Ela sapateia, é uma beleza! Quando chegava a hora do filme, a Dirce me chamava e eu pulava o muro (era muito levada, até em árvore eu subia). Eu ficava observando como a Shirley Temple sapateava e imitava em casa. Depois, minha mãe comprou um sapatinho e colocou umas tachinhas. Meu pai tocava violão e eu sapateava. Nessa época, eu devia ter uns sete anos de idade. Eu também pegava os vestidos da minha mãe, vestia e ficava na frente do espelho imitando cantoras líricas. Eu tocava uma violinha de seis cordas, fazia um ponteado, música bem caipira mesmo. Naquele tempo, a gente não falava música sertaneja. Era música caipira, moda de viola, desafios, tudo com rima. Minha irmã Carolina tocava violão e eu ficava na viola. Eu dizia: não sei pra que isso tem seis cordas se eu só toco em duas! Eu tocava música bem caipira mesmo. As verdadeiras modas de viola. Fui criada nesse meio. Além da italianada, tinha a caipirada também, moda de viola, essas coisas... Não era música sertaneja, como dizem hoje. Agora sertanejo é igual à música do Roberto Carlos. E Roberto Carlos não é sertanejo. A música sertaneja mesmo é nóis vai, nóis vem, e não o que fazem hoje. Se você escutar uma moda de viola mesmo, você se comove com as letras. São coisas muito simples, mas muito bonitas. Em 1943, a Carolina casou. Lembro que fiquei muito triste quando ela foi embora (Adelaide pega o violão e começa a tocar e cantar): Carolina foi se embora Quem ficar não vai no trem O maquinista apitou Na saída da estação O bicho saiu bufando Inté cortou meu coração Vai levando a minha prenda Carolina foi se embora Eu fiquei chorando Ai, ai, ai, ai Com um lenço branco na mão Chorei, chorei Com essa separação Quando eu tinha uns 12 anos, mais ou menos, meu pai sofreu um acidente de carro e quebrou as duas pernas. Ele ficou um ano sem poder trabalhar. Como a casa era muito grande, minha mãe decidiu montar uma pensão. Os pensionistas faziam as refeições e também dormiam lá. Eu ajudava minha mãe na cozinha e na arrumação dos quartos. Nessa época, a Carolina já estava casada. Ela casou muito cedo, com apenas 15 anos de idade. Então, eu fiquei sozinha para ajudar a minha mãe. Todos os dias, eu acordava às cinco horas da manhã para ir comprar pão. A padaria ficava na Rua Caetano Pinto, onde também havia o açougue da dona Dolores. Minha mãe era assim: Vai buscar pão, vai buscar carne... Quando ela me mandava comprar linguiça, eu ia até o açougue e pedia à dona Dolores: me dá três quilos de linguiça fina. Quando eu chegava em casa, minha mãe dizia: Não é essa! E eu já tinha comido quase meio quilo pelo caminho. Sabe como é criança... Às vezes, minha mãe mandava eu ir comprar as coisas e, quando eu via, ela estava do meu lado. Eu corria, andava depressa, porque fazia um frio danado em São Paulo. Quando eu chegava para fazer a compra, minha mãe vinha chegando também. Eu perguntava: mãe, por que me acorda, se a senhora vem? Ela dizia que ficava com medo de alguém me roubar, por isso ia atrás. Minha mãe trabalhou muito. Era uma mulher forte. Ela foi uma heroína. Um Acordeom Mágico O Paschoal Bianco gostava muito do meu pai. Sempre que precisavam de um bom entalhador, ele o indicava. Uma vez, ele fez um trabalho para uma loja de instrumentos musicais e recebeu como pagamento um acordeom. Nessa época, eu devia ter uns dez anos de idade. Fiquei encantada com a novidade. Pensei: meu Deus, que coisa linda. Parece um caixote, mas bem acabado, com aquelas teclas... Parece um piano. Eu fiquei apaixonada. Aí papai falou assim: Eu não quero que ninguém mexa nesse instrumento – Adelaide fala com sotaque italiano – e trancou o acordeom no armário. Toda noite, depois que ele chegava do trabalho e jantava, pegava o acordeom e ficava tentando tocar, mas não saía nada. Não saía uma melodia. Era uma barulheira. Papai tocava violão muito bem, mas o acordeom, ele não conseguia. Eu ficava olhando, e doida pra pegar naquele acordeom e tocar. Um dia, depois que meu pai saiu para trabalhar, eu falei para minha mãe: Mama, se eu pegar essa harmônica (italiano chama acordeom de harmônica), eu vou tocar. E ela me respondeu: Que é isso minha filha? Tem tanto botãozinho aí, tem esses tecladinhos aí na frente... Você não vai conseguir. E isso é muito pesado. Eu falei: Mama, se a senhora segurar as correias do acordeom bem firme, eu vou tocar. Mas tem de ser escondido do papai. Ela disse assim: Nossa, se ele descobre, mata nós duas! Eu insisti tanto que minha mãe não aguentou, pegou o acordeom e botou no meu colo. Ela segurou as correias, eu abri a trava que segurava o fole e comecei a tocar uma valsa que era do meu tio Luiz Cavallinni, que havia morrido há muitos anos. Eu toquei a valsa inteirinha, com minha mãe segurando, com medo que o instrumento caísse. Quando terminei de tocar, ela colocou o acordeom em cima da cama, ficou sem cor e desmaiou de susto. Minha irmã Carolina, quando viu minha mãe desmaiada, começou a gritar: Que foi mama? Que foi mama? Ela acordou espantada e disse assim: Mas o que foi isso? Ela tocou a valsa do Luiz inteira! Meu tio Luiz foi um grande acordeonista. Ele morreu com 33 anos de idade. Minha mãe achava que eu tinha o mesmo jeito dele de tocar. Eu nunca tive professor, não sei uma nota musical. Então ela achava que tinha alguma influência do meu tio, que só podia ser espiritual. Antes de morrer, meu tio entregou uma medalha de Santa Rita de Cássia para minha nona e pediu que ela guardasse. Era da noiva dele, que também tinha morrido. Não cheguei a conhecer meu tio. Eu nasci, mais ou menos, uns dez anos depois que ele morreu. Minha nona sonhou que minha mãe teve uma filha e meu tio dizia para ela no sonho: Mama, eu quero que entregue essa medalha para Adelaidinha, filha da Leonor, que nasceu há pouco tempo. Minha nona acordou muito espantada e pediu para uma vizinha escrever uma carta para minha mãe, pedindo que ela fosse a casa dela. Minha nona morava em Sorocaba e ainda não sabia que eu tinha nascido. Mamãe foi comigo até a casa dela. Eu era pequenininha, mamava ainda. Quando chegamos lá, minha nona contou a história do sonho e deu a medalha para minha mãe. Quando eu tinha sete anos, ela me entregou a medalha e contou toda a história do meu tio Luiz. Mamãe me disse: guarde muito bem essa medalha. Eu tenho essa medalha até hoje. Está quase se desmanchando, mas eu tenho medo de levar em algum lugar para restaurar. Tenho medo que tire esse encanto, porque eu acho que deve ter alguma coisa de espiritual. Sempre cuidei da Adelaide como se ela fosse mais filha do que irmã. Sou a irmã mais velha. Então, sempre me senti como se fosse mãe das minhas irmãs. Eu tinha muita preocupação com a Adelaide também por causa do problema de saúde que ela teve quando tinha três anos de idade. Era eu quem a arrumava para a escola. Tinha de arrumar direitinho, senão ela não queria ir. A Adelaide sempre foi muito vaidosa. Se o lacinho não combinasse com o vestido, ela reclamava. Deus me livre se não tivesse um vestidinho bonitinho... Às vezes, eu tinha de engraxar o sapato no pé dela. Quando ela calçava o sapato e cismava que estava feio, eu tinha de engraxar. Ela dizia: Não está engraxado, não vou. Assim está feio. Ela botava os vestidos da mamãe e saía arrastando como se fosse uma noiva. Eu também incentivava. A Adelaide tinha uma vaidade incrível. Uma vez, ela pegou uma cola do meu pai e colou um broche de pedras, que era da mamãe, no peito, direto na pele. Foi um sacrifício pra tirar. Meu pai teve que esquentar pra poder tirar a cola. Ela ficou até com uma cicatriz. Papai brigou comigo, porque era eu que tomava conta. Mas ela fez tudo escondido. A vaidade dela suplantava tudo. Ainda pequena, já usava maquiagem dentro de casa. Quando meu pai chegou com o acordeom, ela ficou louca pra pegar e tocar. Ela ficava pedindo à minha mãe. Papai guardava com muito cuidado porque era um instrumento muito caro. A Adelaide começou tirando notas, tirando músicas... Todos os dias minha mãe a deixava pegar um pouquinho. Quando meu pai descobriu, ela já estava tocando muito bem. Ela era muito espertinha. Ela nasceu para ser artista. Se fosse outra coisa, seria frustrada. A Adelaide sempre gostou de aparecer. Quando a gente ia tirar fotografia, ela saía empurrando pra ficar na frente. Um dia, a Adelaide também cismou que queria sapatear. Antigamente não existia esses sapatos com tachinhas embaixo, próprios para sapateado. Ela pediu para minha mãe comprar um tamanquinho. Começou a sapatear de tamanquinho. Ela aprendeu sozinha. Quando meu pai viu, falou: Meu Deus, o que é isso? Ele deu muita risada. Tudo, a gente fazia escondido do papai. Ele amava os filhos loucamente, mas a gente não tinha liberdade para fazer as coisas. Ele era aquele italianão, meio carrancudo, mas dava muita risada quando via as coisas que a Adelaide fazia. Então, ia contar, todo orgulhoso, para os amigos. Depois, ela começou a tocar acordeom e a cantar junto. Eu também cantava e aprendi a tocar violão. Antes do acordeom, ela tocava uma violinha, que também tinha seis cordas, mas chamavam de violão tenor. A gente tocava modas de viola, só música bem regional. Eu fazia a primeira voz e ela a segunda. Papai começou a levar a gente para tocar nas festas. Assim, nós fomos amadurecendo e tocando músicas mais importantes. Formamos a dupla Irmãs Chiozzo. Depois, ela formou dupla com nosso irmão Afonso, quando ele aprendeu a tocar acordeom. O Afonso tocava muito lindo. Ele tocava mais música clássica. Como papai era muito enérgico, a Adelaide não podia sair sem estar acompanhada ,então, o Afonso ia junto. Eu também acompanhei a Adelaide quando ela já estava na Rádio Nacional, e cheguei a cantar com ela no programa Alma do Sertão, do Renato Murce. A estreia no rádio Todos os dias eu pedia à minha mãe que me deixasse pegar o acordeom para tocar um pouco. Quero tocar outras valsas – eu dizia. Minha mãe ficava muito nervosa e com medo que meu pai descobrisse que eu estava mexendo no acordeom dele e tocando. Ela resolveu chamar um amigo nosso, o seu Giácomo, para me ver tocar. Giácomo, está acontecendo uma coisa e eu tenho que desabafar. Estou muito aflita. A Adelaidinha está tocando harmônica! Ela tocou uma valsa que era do meu irmão que morreu. Ninguém acreditava. Como eu podia tocar se nunca tinha aprendido música? Manda ela tocar. Eu quero ver se ela sabe mesmo – disse Giácomo. Eu toquei Rapaziada do Brás (Alberto Marino). Quando ele ouviu, ficou impressionado: Dio Santo! O que é isso? Algum tempo depois, o seu Giácomo chegou lá em casa muito animado. Ele ouviu na Rádio Bandeirantes um anúncio que dizia assim: Procuram-se novos talentos. Era um quadro de um programa apresentado por Vicente Leporace. Seu Giácomo conseguiu convencer minha mãe a me deixar participar do concurso. No dia seguinte, logo depois que meu pai saiu para trabalhar, fomos para a rádio. Quando cheguei lá, encontrei muita gente que também estava indo participar do programa. Entrava um músico pra tocar, depois outro. Eu ficava só olhando. Pensava: eles tocam bem. Será que eu vou conseguir? Chegou a minha vez. Entrei e toquei Rapaziada do Brás e Branca (Zequinha de Abreu). Quando terminei, ficou todo mundo de pé me aplaudindo. O Vicente Leporace me perguntou: O que é isso? Você aprendeu onde, menina? Eu respondi: Não aprendi com ninguém. Nunca tive professor. Pelo amor de Deus, meu pai nem sabe que eu estou aqui tocando. Venci o concurso e fui contratada para trabalhar na emissora, no programa Serra da Mantiqueira, apresentado pela dupla caipira Irmãos Motta (Silvio e Mário). Minha mãe assinou o contrato, porque eu tinha apenas 12 anos. Meu pai ainda não sabia de nada. Ele só descobriu porque um amigo dele ouviu o meu nome na rádio e falou pra ele: Chiozzo, você tem uma filha chamada Adelaide? Meu pai respondeu: Tenho a Adelaidinha. Por quê? O amigo continuou: Porque eu acho que estão tirando o nome da sua filha e o teu sobrenome. Tem uma Adelaide Chiozzo tocando harmônica todo dia de manhã com os Irmãos Motta, lá na Rádio Bandeirantes. Papai ficou muito nervoso e foi mais cedo pra casa: Quero saber quem é que está tocando harmônica aqui! Minha mãe baixou a cabeça e eu também. Ficamos com medo de falar. Até que minha mãe tomou coragem e disse: Olha, você vai escutar e não vai brigar. A Adelaidinha quis pegar a harmônica e eu deixei. Ela tocou uma valsa inteirinha. Eu acho que ela tem o mesmo jeito de tocar do Luiz, meu irmão. Meu pai não acreditou: Mas, como ela toca, se nem eu consigo? Está aprendendo com quem? Vocês estão fazendo segredo comigo. Ele me mandou pegar o acordeom e tocar. Toquei as valsas Saudades de Matão (Antenógenes Silva, Raul Torres e Jorge Galati) e Branca. Meu pai ficou assustado. Mas o que é isso minha filha? Você está bem? Acho que ele pensou que eu estava maluca. Ele não brigou comigo, mas disse que eu só poderia tocar o acordeom dentro de casa. Não quero que você vire artista – ele dizia. Naquela época, artista não era muito bem visto. Não era profissão de moça de família. A muito custo, consegui convencer meu pai e ele me deixou continuar na rádio. Mas com uma condição: meu irmão Afonso teria de ir junto. Alguns dias depois, meu pai comprou mais um acordeom. Eu fui ensinando o Afonso a tocar e, depois de algum tempo, ele passou a me acompanhar. Formamos a dupla Irmãos Chiozzo. Viajamos muito com os Irmãos Motta. O Afonso começou a progredir e a fazer solos de choros e valsas. Fizemos muito sucesso no Brasil inteiro. Todo mundo falava nos Irmãos Chiozzo. Tocávamos todos os gêneros. Até clássicos. Ficamos um ano na Rádio Bandeirantes. Quando a dupla Irmãos Motta se desfez, o programa acabou. Continuei me apresentando em programas de rádio com meu irmão. Tocamos na Rádio Record e também na Rádio Panamericana. Participávamos de programas de auditório e fazíamos muitos shows em várias cidades do interior de São Paulo e Minas Gerais. Nesse tempo, as estradas não tinham asfalto. Viajávamos muito de trem. Depois nós formamos um conjunto chamado Família Chiozzo. Minha irmã Carolina cantava comigo. Ela fazia a primeira voz, e eu a segunda. A Carolina tinha um vozeirão. A gente ouvia músicas bonitas e começava a cantar. Eu fazia as introduções de músicas sertanejas, e ela cantava comigo. Mineira me pediu Um vestido delicado Eu mandei dizer pra ela Espere vender meu gado Mineira mandou dizer Boiadeiro tá quebrado Eu tinha muita facilidade para fazer música desde menina. Eu tocava viola e a Carolina, violão. Ela também aprendeu a tocar sozinha. Meu pai acompanhava a gente com o violão, e o Afonso com o acordeom. A Sylvinha entrava dançando. Ela dançava balé muito bem. Quando nos mudamos para o Rio de Janeiro, eu a coloquei para estudar dança na escola do Theatro Municipal. Nessa época, conhecemos a Marina, uma moça que tocava violino muito bem. Ela passou a participar dos nossos shows. Com ela, eu só tocava música clássica. Durante a Segunda Guerra Mundial, nós costumávamos tocar para alegrar as famílias dos pracinhas. Lembro que estávamos fazendo um show no Cine Eldorado, na cidade de Pouso Alegre, em Minas Gerais, no dia em que a guerra acabou: 8 de maio de 1945. Era meu aniversário. Eu estava fazendo 14 anos. O cinema era enorme e estava lotado. Nós estávamos tocando, quando alguém entrou gritando: A guerra acabou! A guerra acabou! A multidão que assistia ao show ficou muito emocionada. Todo mundo se abraçava chorando. Pediram que nós saíssemos às ruas cantando. O período da guerra tinha sido muito difícil. Havia racionamento e filas para comprar tudo. Eu tinha de entrar numa fila para conseguir manteiga, leite e pão. Eu chegava às quatro horas da madrugada e ela já estava enorme. Para comprar a carne, também tinha de entrar na fila. E não podia escolher. Tudo era muito limitado. O povo colaborava como podia, doando para o governo (esforço de guerra) objetos de metal, como panelas e talheres. Minha mãe deu todas as joias dela. Ela dizia que queria que aquela guerra acabasse logo. Por isso, a população comemorou tanto o seu fim. Apesar de viajar muito, eu nunca namorei cedo, porque meu pai não permitia mesmo. Sempre tinha pretendentes, mas eu era muito menina. Na época em que tocávamos com os Irmãos Motta, conheci um repentista chamado Zulmiro. Ele tinha muita facilidade para fazer rimas. Ele cismou que queria me namorar e fez até uma música pra mim. Quem passa naquela estrada Bem pra lá do ribeirão Bem de longe a gente avista Lá do alto do espigão Uma casa grande antiga Com esteio de mourão É onde mora Adelaide A sanfoneira do sertão Há tempo vivo sofrendo E tenho muita razão Tanto bem que eu te quero Só recebo ingratidão O dia que eu não te vejo Eu vejo a tua visão O teu nome Adelaide Gravo no meu coração Um Pedro Raymundo de Saias No início do ano de 1946, mudamos para a cidade de Niterói, no Rio de Janeiro. Meu pai havia sido contratado pelo dono das barcas que faziam a travessia Rio-Niterói. Ele havia acabado de construir uma casa e queria decorá-la com flores entalhadas em madeira. No Rio de Janeiro, ele não encontrou nenhum profissional para fazer o serviço. Então, foi até a Fábrica Paschoal Bianco, em São Paulo, a procura de um bom entalhador. Meu pai foi indicado pelo dono da fábrica. Minha mãe era louca para morar no Rio de Janeiro. Ela adorava a cidade. Eu dizia: mãe você não conhece, como é que gosta? Ela dizia que via as paisagens nos cartões postais. Mamãe insistiu muito com meu pai para mudarmos para o Rio. Ela dizia que ia ser bom para minha carreira e para a do Afonso, porque a gente ia aparecer mais. Em São Paulo, não aparecia. Os artistas, como a Isaurinha Garcia, que era uma maravilha, faziam lançamento de seus discos no Rio de Janeiro, na Rádio Nacional. Naquela época, todo o sucesso dos artistas paulistas ficava em São Paulo. No Rio, ninguém sabia o que se passava lá. Minha mãe já havia entrado em contato com meu padrinho de batismo. Ele morava em Niterói, na Rua Dr. Celestino, e tinha uma pequena fábrica de móveis, que estava querendo vender. Fui com meu pai para ver se toda a documentação estava em dia. Adelaidinha vai comigo porque ela é muito esperta. Vai me ajudar, disse meu pai. Viajamos para o Rio de Janeiro de trem. Naquela época, não tinha essa estrada que tem agora. Era tudo de terra. A viagem de ônibus levava um dia inteiro. Só tinha uma empresa de ônibus. Era a Pássaro Marrom. No início, fomos morar nos fundos da fábrica. Depois, nos mudamos para a Rua Barão do Amazonas. Meu pai foi muito bem aceito em Niterói. Fez serviços até mesmo para a prefeitura da cidade. Os móveis que ele fazia eram de primeira. Tinham muita qualidade. Um dia, quando a loja já estava com a porta arriada, meu pai pegou o violão e pediu que eu pegasse o acordeom. Lembro que era um domingo e meu pai estava muito contente. Começamos a tocar juntos. Um senhor que estava passando ouviu e pediu para entrar e assistir. Era o Irani de Oliveira, compositor de várias músicas do Palhaço Carequinha. Mas essa menina toca muito bem. É uma artista. Precisa ir para o rádio – disse Irani. Ele perguntou ao meu pai se ele conhecia o programa Papel Carbono, apresentado pelo Renato Murce, na Rádio Nacional. Nós ainda não conhecíamos nada no Rio de Janeiro. Ele disse: É um programa muito bom. Eu posso levar sua filha? Eu tenho certeza de que ela vai se sair muito bem. Meu pai concordou, mas só se meu irmão fosse junto. Na semana seguinte, Afonso e eu chegamos à Rádio Nacional. Eu estava muito nervosa, pensando no que iria cantar. Quando chegou a minha vez, o Renato Murce me perguntou o que eu ia fazer. Eu disse: eu vou cantar... Ele não deixou nem eu terminar de falar. Não. Aqui é Papel Carbono. Você tem de se apresentar fazendo a cópia de alguém. Tem de cantar uma música fazendo lembrar um artista, explicou Renato. Aí me veio à cabeça o Pedro Raymundo (sanfoneiro e cantor gaúcho). Não sei por quê. Eu gostava daquela música que ele cantava: Adeus, Mariana. Estava fazendo muito sucesso naquela ocasião. Nasci lá na cidade, me casei na serra Com a minha Mariana, moça lá de fora Um dia eu estranhei o carinho dela Disse: adeus Mariana, que eu já vou embora Na época, saiu no jornal: Tem um Pedro Raymundo de saias cantando na Rádio Nacional. Meu irmão fez a cópia do Luiz Gonzaga. Participamos do programa durante quatro semanas. Eu venci o concurso e passei a me apresentar nos programas da rádio junto com meu irmão Afonso. O primeiro foi o Programa César de Alencar. Adelaide Chiozzo forma, com seu irmão Afonso, uma interessante dupla que muito vem animando o Programa César de Alencar. Adelaide é paulista, muito bonita e está fazendo, com seu irmão Afonso, uma das mais rápidas carreiras do rádio. (Revista Carioca – novembro de 1946) Algum tempo depois, assinei um contrato de três meses. Era um contrato provisório, porque eu era menor, tinha apenas 15 anos. Fui contratada como acordeonista. O Victor Costa me fez uma recomendação: Você só vai tocar acordeom. Não abra a boca pra cantar porque você canta muito feio. Ele pensou que eu só cantava igual ao Pedro Raymundo. Depois dessa experiência na Rádio Nacional, participei de programas em outras emissoras, sempre acompanhada pelo Afonso. Fizemos algumas apresentações no Programa Aérton Perlingeiro, na Rádio Clube do Brasil, na Rádio Tupi e no programa Trem da Alegria, apresentado por Lamartine Babo, Yara Salles e Heber de Bôscoli, na Rádio Mayrink Veiga. Passamos a ser convidados para fazer shows também. Tocamos muito para políticos de Niterói e viajamos muito com a Caravana Alice do Amaral Peixoto, fazendo shows beneficentes pelo interior do estado do Rio de Janeiro. Tocamos também em festas juninas. Antigamente as festas caipiras eram tão importantes quanto o carnaval. Todas as cidades faziam. Tocamos com Luiz Gonzaga na Primeira Festa Junina da Cidade do Rio de Janeiro (1948). Em 1948, fui contratada novamente pela Rádio Nacional como acordeonista. Passei a integrar o Regional de Dante Santoro. Aprendi muito durante o tempo que fiz parte do Regional. Foi muito bom pra mim. Eu acompanhava todos os grandes artistas da emissora: Emilinha Borba, Marlene, Belinha Silva, Leda Barbosa, Nelson Gonçalves, Silvio Caldas, Orlando Silva e muitos outros. Durante o dia, não tinha orquestra acompanhando os cantores. O acompanhamento nos programas de estúdio era do regional, formado pelos músicos Carlos Lentini (violão), Valdemar (Cavaquinho), Joca do Pandeiro (substituído depois por Jorginho do Pandeiro), Norival Guimarães (violão), Rubens Bergman (violão) e Valzinho (violão). O Dante gostava muito de mim. Ele dizia que eu fazia umas introduções muito bonitas. Um dia, uma cantora, que havia sido contratada há pouco tempo, esqueceu a letra da música que ia cantar (Último Desejo – Noel Rosa). Eu fiz a introdução para ela entrar, e nada. Fiz a introdução mais duas vezes, falei a letra no ouvido dela, mas não tinha jeito. Ela não conseguiu lembrar de jeito nenhum! Na quarta vez, quando fiz a introdução e ela não entrou, eu comecei a cantar: Nosso amor que eu não esqueço E que teve o seu começo Numa festa de São João Morre hoje sem foguete Sem retrato e sem bilhete Sem luar e sem violão... A cantora saiu correndo do estúdio, morrendo de vergonha. Eu continuei cantando. O regional inteiro ficou olhando pra mim. Estavam todos assustados. Quando eu olhei para a técnica, o Victor Costa estava me olhando pelo vidro. Fiquei gelada. Pensei: Meu Deus, ele vai me mandar embora! Nesse dia, o Dante Santoro não estava. Quem estava comandando o regional era o Norival Guimarães. Os músicos do regional ficaram muito contentes. Quando terminei, eles vieram me cumprimentar: Parabéns! Você salvou o programa! Eu fiquei muito nervosa e falei para eles: Eu cantei a música inteira. O Victor Costa vai me mandar embora. Ele disse que não era para eu cantar. Eles disseram: Calma, Adelaide. Ele não pode te mandar embora, você salvou o programa! Quando o programa terminou, eu recebi o recado: o Dr. Victor Costa pediu para você ir até o gabinete dele. Eu ainda estava muito nervosa e disse para os músicos do regional: eu falei pra vocês! Ele vai me mandar embora! Quando cheguei próximo à porta da sala dele, a secretária falou: O Dr. Victor Costa está te aguardando. Eu perguntei: ele está zangado? Ela respondeu: Não sei... Eu entrei no gabinete do Victor Costa. Com licença. O senhor quer falar comigo? – perguntei. Ele disse: Eu te proibi de cantar. Mas como você canta bonito, afinado. Você cantou certinho. Tirou o vazio que estava. Eu me expliquei: eu fiz a introdução quatro vezes. Ela não entrou, então, eu cantei. Eu sabia a letra. O senhor me desculpe. Eu nunca mais vou cantar. Não, minha filha. Eu vou rasgar o seu contrato. Eu sabia. O senhor falou que não era para eu cantar. Agora está me mandando embora. Não. Eu vou fazer outro contrato. Agora você vai ser cantora e acordeonista da Rádio Nacional. Não vai mais tocar no regional. Quando saí do gabinete do Victor Costa, os músicos do regional estavam todos me esperando. Eu disse: saí do regional. Eles ficaram muito nervosos: Mas não pode! Você salvou o programa! Eu expliquei: agora tenho outro contrato. Vou ser cantora e acordeonista. Não vou mais tocar no regional. Conheci a Adelaide quando ela entrou para a Rádio Nacional, em 1948. Ela foi contratada como acordeonista e passou a fazer parte do conjunto de Dante Santoro. A gente brincava muito. Ela fazia contratempos comigo. Era muito bom trabalhar com a Adelaide. Ela tinha um ouvido muito bom. Quando ia acompanhar a gente, ela sabia todos os acordes. Ajudava muito no acompanhamento, solava com o Dante... Adelaide sempre foi muito boa como cantora e como musicista. Participávamos de vários programas de auditório da época: César de Alencar, Manoel Barcelos, Paulo Gracindo e muitos outros programas. Adelaide Brilha também no Cinema Adelaide e Afonso: Irmãos Chiozzo. Acordeonistas que fizeram cartaz no Programa César de Alencar, da Rádio Nacional. Dois elementos de futuro no rádio carioca. Atualmente, os Irmãos Chiozzo estão filmando na Atlântida, ao lado do cowboy Bob Nelson. (Folha da Noite – 1946) O Irani de Oliveira foi um anjo na minha vida. Ele também me levou para fazer um teste na Atlântida Cinematográfica. Ele foi lá falar com o José Carlos Burle. Tem uma menina que toca acordeom muito bem na Rádio Nacional. O Burle então disse para o Irani me levar para fazer um teste. Novamente, eu fiquei muito nervosa. Eu nem sabia o que era teste. Minha mãe foi comigo e tentou me acalmar: Calma, minha filha. Se não der certo, não tem problema. Você já está na Rádio Nacional. Quando cheguei à Atlântida, o Irani me apresentou ao Zequinha Burle. Ô, menina, você é muito bonitinha. Vamos fazer um teste? – disse Burle. Ele chamou os técnicos e falou: Bota a máquina aí! Vem aqui, garota, fique em pé aqui! Quando eu fizer o sinal, você sorri, olha pra cima, olha pra baixo, chora, canta e toca acordeom. Tudo ao mesmo tempo. Eu só tenho um metro de fita. Eu fiz tudo o que ele mandou. Tudo rápido. Parecia até cinema antigo. Aí, ele deu uma risada e disse: você fez tudo o que eu mandei. Gostei, garota! Nós estamos fazendo um filme. Vamos filmar um quadro com o Bob Nelson. As gravações começam daqui a quinze dias. Você tem de vir vestida de cowboy. Voltei para casa e quando contei para meu pai, ele disse: O que? Cinema? Só se o seu irmão for junto. Minha mãe fez uma roupa de cowboy para mim e outra para o Afonso. Nós ensaiamos com o Bob Nelson e depois gravamos. O primeiro filme que fizemos foi Este Mundo é um Pandeiro, lançado em 1947. Bob Nelson cantou a música Boi Barnabé (Bob Nelson e Vitor Simon) – Adelaide pega o acordeom, canta a música e imita Bob Nelson: Na minha fazenda tem um boi E esse boi se chama Barnabé Sabe moço Ele anda se babando Pela minha linda vaca Salomé Afonso e eu fizemos o acompanhamento com o acordeom. Eu fiquei sentada em um banquinho, lá no canto, e o Afonso ficou em pé. Tinha uma porteira e umas mocinhas sentadas. O Bob Nelson vinha cantando. Era tudo ao vivo. Só tinha um microfone, que ficava em cima. O Bob Nelson tinha de botar a voz e a gente tinha de tocar baixo para não cobrir a voz dele. Mandaram que eu ficasse o tempo todo sorrindo. Tocando acordeom e sorrindo. A gravação demorou muito. Lembro que saímos de casa às sete horas da manhã e só voltamos às três horas da madrugada. Demorava muito para gravar por causa da câmera e da iluminação. Demorava muito para fazer uma cena. Fiquei tanto tempo sorrindo, que tive até câimbra. Fui para casa com a boca aberta, como se estivesse sorrindo. Meu irmão falava: Fecha a boca! Eu dizia: não posso, não consigo, minha bochecha está doendo. Quando cheguei em casa, minha mãe fez uma massagem e me deu uns tapinhas no rosto. Só assim, consegui voltar ao normal. Quando o filme saiu, meu pai disse: Eu vou ver primeiro! Se eu não gostar, vou lá na Atlântida e vou quebrar tudo! Se eu não gostar, vai ter! Ele demorou mais de uma hora pra voltar. Quando chegou, notei que ele estava furioso. Eu pensei: lá vem bomba. Minha mãe perguntou: Gostou, Geraldo? Ele respondeu: Ma che! Vocês ficaram um dia inteiro, uma noite inteira. Pensei que vocês iam fazer um filme de ponta a ponta. Aí botam a Adelaide sentadinha, humilhadinha, o tempo todo sorrindo. E o Afonso? Se o cavalo não balança o rabo, nem ele eu via! Minha mãe respondeu: Calma, Geraldo. É assim mesmo. Ela ficou sentada porque o acordeom pesa muito. No início é assim mesmo. Nesse filme, ela ficou sentada. No próximo, ela levanta. Depois de Este Mundo é um Pandeiro, veio o filme É com Esse que eu Vou, em 1948. A direção era de José Carlos Burle. Mais uma vez Afonso e eu acompanhamos Bob Nelson. Quando ligaram da Atlântida e disseram que íamos filmar mais um quadro com Bob Nelson, falei para meu irmão Afonso: Já vamos vestidos de cowboy porque é outro número com Bob Nelson. Nesse filme, ele cantou Como é Burro o meu Cavalo (Denis Brean e Osvaldo Guilherme). As filmagens demoraram muito por causa do cavalo. O Bob Nelson tinha de montar no cavalo, mas ele era maior que o animal. Arranjaram um cavalo muito fraquinho. Quando o Bob Nelson ia montar, ele abria as perninhas e quase caía. Aí eu falei para o Bob Nelson: você vai matar o cavalo desse jeito. Por que você não pega as rédeas dele e vem puxando? Ele queria montar no cavalo, mas quase que o cavalo monta nele. Eu tenho muita saudade do Bob Nelson. Ele era muito amigo. Infelizmente, ele faleceu em 2009. Era um grande artista. Depois desse filme, começou a sair nos jornais da época: Quem é aquela menina de trança que toca acordeom no quadro do Bob Nelson? Por que não deixam ela aparecer mais? Então decidiram que iam fazer um quadro comigo no filme E o Mundo se Diverte. O Watson Macedo me telefonou e disse: Tenho uma surpresa para você, Adelaide. Agora vamos filmar um quadro só seu. Não vai ter Bob Nelson dessa vez. Ele me pediu para arranjar uma música. Mostrei várias, mas ele não gostava de nenhuma. Ele dizia: Adelaide, todas as músicas que ouvi são lindas, mas eu quero uma coisa mais brejeira e que fale de infância. Fui até a Rádio Nacional com a minha mãe, porque muitos compositores iam lá para mostrar músicas. Quando cheguei à emissora, estava tudo vazio. Só estava a cantora Emilinha Borba no corredor e um compositor ao lado dela, tocando violão e cantando. Eu passei, cumprimentei a Emilinha e ela disse: O que você tem Adelaide? Está triste? Minha mãe respondeu: Ih, Dona Emilinha, minha filha está sofrendo. Ela vai fazer um quadro, vai cantar sozinha no filme. Pediram pra ela levar uma música, mas não aceitaram nada do que ela cantou. Emilinha olhou pra mim e disse: Esse compositor aqui é o João de Souza. Ele está cantando uma música que tem muito a ver com você e que vai fazer muito sucesso. Eu expliquei que a música tinha que falar de infância. Ela me respondeu: Ah, Adelaide, é isso! Emilinha pediu então para João de Souza cantar pra mim. O nome da música era Tempo de Criança (João de Souza e Ely Turquine) Me lembro quando criancinha Minha mãezinha ralhava comigo Dizia pra Dona Chiquinha: Essa garotinha vai ser um perigo! Corria para me bater Eu a correr, ela a gritar: Para, menina, para Senão vais apanhar! Aprendi a música com o compositor e quando cheguei em casa, fiz uma introdução no acordeom. Fiquei até tarde da noite ensaiando. No dia seguinte, fui para a Atlântida e mostrei a música para o Watson Macedo. É isso, Adelaide! É isso que eu quero! – ele disse. No filme, eu apareço cantando, dançando e tocando acordeom. Usei um vestido bem rodado e o cabelo arrumado, com uma trança. E o Mundo se Diverte foi o primeiro filme da Eliana. Ela era sobrinha do Watson Macedo. O nome dela era Ely Macedo de Souza. Eliana era nome artístico. Foi nessa época que nos conhecemos e ficamos amigas. Ela também morava em Niterói e costumávamos voltar para casa juntas depois das filmagens. Ainda não existia a ponte Rio-Niterói. A travessia era feita de barca. À noite, se a gente perdesse uma, tinha de ficar mais de uma hora esperando a outra. Queremos nos manifestar, através das páginas dessa vossa utilíssima Página do Rádio-Ouvinte, sobre o encanto da arte de Adelaide Chiozzo. Esta artista deixa no chinelo todas as suas competidoras na difícil arte de tocar acordeom. O seu pequeno papel no filme E o Mundo se Diverte é simplesmente uma maravilha de interpretação e de naturalidade. Além do mais, Adelaide tem uma bela voz e uma linda e encantadora figurinha. (Revista Carioca, 1949 – Carta dos ouvintes Ruy, Ester, Joana e Ermelinda, de Bauru, São Paulo) Em 1949, participei também do filme Carnaval no Fogo. Recebi um telefonema do Watson Macedo dizendo para eu comparecer à Atlântida, porque ele ia me dar um número como tinha me dado em E o Mundo se Diverte. Ele pediu para o Bené Nunes fazer uma melodia bem alegre. Queria uma música que falasse sobre a Holanda. Quando cheguei à Atlântida, o Bené Nunes já estava tocando a música no piano, mas ainda faltava a letra. O Anselmo Duarte ouviu e falou: Dá uma boa letra. Eu vou fazer. No quadro, eu apareço em um cenário com bicicletas e moinhos, vestida de holandesa, com uma saia bem rodada. Eu lancei esse estilo de saia bem rodada, com muitas anáguas. Cantei bem alegre: Amanhece e anoitece Por esta estrada eu vou Pedalando, pedalando Vou buscar o meu amor Canta toda a natureza A Holanda está em flor! Canta velho, canta moço Só não canta o senhor Pedalando, pedalando Vou buscar o meu amor O Afonso também participou do quadro tocando acordeom comigo. A música foi um sucesso. As pessoas saíam do cinema assoviando a melodia. Eu fiquei muito feliz. Nesse filme, a Eliana cantou a música Tico-tico no Fubá (Zequinha de Abreu e Eurico Barreiros). Afonso e eu fizemos o acompanhamento no acordeom e o Bené Nunes, no piano. Eu também contracenei com a Eliana, mas foi muito pouco, porque estavam me experimentando. Eu sempre era a amiga dela. Nesse filme, eu fazia par romântico com o Rocir Silveira. Filmamos uma cena no Alto da Boa Vista. O Personagem dele só falava em inglês. Eu dizia: ele fala tão lindo inglês. Eu não entendo nada, mas é tão lindo. O filme Carnaval no Fogo foi o mais castigado. Não podia ter acontecido coisa pior do que o que aconteceu com a Atlântida. Houve uma enchente, aquelas latas dos filmes ficaram boiando e Carnaval no Fogo ficou muito prejudicado. Foi com o filme Carnaval no Fogo que começou o que, na época, chamaram de chanchada. Participei da primeira e da última, que foi Garotas e Samba (1957). Viajando com o Cupido O Renato Murce gostou muito do filme Carnaval no Fogo e teve a ideia de fazer uma temporada de shows em cinemas das cidades do interior de São Paulo, onde o filme estava sendo exibido. Os cinemas eram todos do Severiano Ribeiro. Eram mais de 500. O Renato me convidou para fazer uma turnê de 25 dias e pediu que eu chamasse a Eliana também. Primeiro tive de falar com meu pai. Ele disse que só concordaria com a viagem, se minha mãe fosse junto. Minha mãe sempre me acompanhava. Ela sempre me ajudou muito. Quando meu pai tentava me impedir de fazer alguma coisa, ela sempre me apoiava e fazia de tudo para que eu não perdesse nenhuma oportunidade. Telefonei para a Eliana e pedi que fosse até minha casa (nós morávamos perto). Expliquei tudo a ela e no dia seguinte fomos para a Rádio Nacional. O Renato Murce explicou todos os detalhes da turnê. Nós iríamos fazer dois shows por dia. Primeiro vocês vão fazer o show em um cinema, antes de passar o filme, e depois correm para o outro cinema, onde a sessão já estará terminando, e fazem outro show. Eu perguntei ao Renato: mas eu vou sozinha com o acordeom? Como vai ser? Eu tenho que ensaiar algumas coisas com a Eliana. Ele respondeu: Eu vou levar um violonista que é um assombro. Ele vai ficar conhecido como o maior violonista do País. Você vai ver. Ele passou no meu programa. O nome dele é Carlos Mattos. Ele é discípulo de Dilermando Reis. Eu disse para o Renato que precisávamos ensaiar antes, mas ele falou que não seria possível, porque o Carlos trabalhava em boates e não ia dar tempo. Durante a viagem vocês ensaiam. Antigamente, tudo era na base do improviso mesmo. Então eu perguntei ao Renato: será que ele é tão bom assim com o violão? Porque eu me garanto com o acordeom, mas nem tudo eu posso fazer sozinha. Quando chegou o dia da viagem, o Renato Murce esperou a gente de carro na Praça XV, perto da Estação das Barcas. Depois, fomos para o Andaraí buscar o Carlos. Ele entrou no carro e me cumprimentou: Muito prazer. Eu vi o filme. Muito bom. Só se falava no filme. Carnaval no Fogo fez muito sucesso. Quando vi o Carlos, lembrei de um show que fiz no High Life Club, na Glória. Enquanto esperava minha hora de entrar, vi o Carlos tocando violão. Eu estava atrás do palco. Chamou minha atenção. Ele tocava músicas espanholas. Meu irmão comentou comigo: Como toca bem esse sujeito. Quando terminou a apresentação, ele passou por mim e eu falei: parabéns, você toca muito bem! Chegou a minha vez. Notei que o Carlos estava em pé, encostado no palco. Quando eu olhei e vi aqueles olhos verdes, que chegavam a faiscar, eu sorri e pisquei pra ele. Eu tinha essa mania. Era o meu jeito, desde criança. Olhei para ele umas duas ou três vezes. Foi a primeira vez que tive uma atitude dessas. Viajamos por mais de 50 cidades do Estado de São Paulo. Era uma correria. Eliana e eu cantávamos as músicas dos filmes, eu fazia alguns solos no acordeom e o Carlos acompanhava a gente. O Renato Murce apresentava. Não era só música. A gente também contava histórias. O Renato Murce falava coisas engraçadas. Na Rádio Nacional, ele fazia o programa Alma do Sertão e tinha muitas crônicas e textos que ele falava. Coisas tristes e alegres. Ele contava essas histórias nas nossas apresentações. Ele dizia: Vocês sabem quando a mosca é macho ou fêmea? O público respondia: Não. O Renato falava: Muito simples. Se a mosca parar no espelho, pode contar que é fêmea. Eram coisas muito simples. Não é como hoje que falam tudo francamente na televisão, até pornografia. Durante a viagem, a Eliana se encantou com o Renato e eu com o Carlos. Mas não tinha chance de acontecer nada. Minha mãe falava assim: no quarto deles ninguém entra. Se quiserem falar alguma coisa com vocês, eles que venham aqui. O Renato Murce ficava assoviando na porta do quarto quando queria falar com a gente. Sempre era minha mãe que atendia. O que o senhor quer? – ela perguntava. O Renato dizia que queria falar com a gente, mas ela não deixava nem ele entrar. Eu queria falar com a Adelaide para ela repetir mais aquela música, Pedalando. Estão gostando muito. Minha mãe dizia: Pode deixar que eu dou o recado. Ele deixava passar mais um tempo e voltava a assoviar na porta. Ele queria ver a Eliana. Então ficava inventando desculpas pra poder falar com a gente. Mas minha mãe não dava chance. O que o senhor deseja? O Renato respondia: Eu queria falar com a Eliana, para ela dançar mais. Quando acabou a turnê, Eliana e eu começamos a chorar. Ela por causa do Renato e eu por causa do Carlos. Quando voltamos para casa, meu pai nos viu chorando e perguntou à minha mãe: Ma che! O que há com a Adelaidinha, que está tão tristonha? O que aconteceu nessa viagem? Você olhou bem essas meninas, Leonor? Eu havia ensinado à Eliana o Beijinho Doce (Nhô Pai). Ela então teve a ideia de dizer que a gente estava chorando porque estávamos cantando uma música muito triste. Ela falou para meu pai: Seu Geraldo, nós vamos cantar a música e o senhor vai ver como é triste, e vai até chorar. Começamos a cantar: Que beijinho doce Que ele tem Depois que beijei ele Nunca mais amei ninguém Que beijinho doce Foi ele quem trouxe De longe pra mim Um abraço apertado Suspiro dobrado Que amor sem fim Meu pai concordou com a gente e falou quase chorando: Vocês têm razão, essa música é muito triste mesmo. Meu pai era bravo, mas tinha um coração de ouro. A Eliana falou: Por que você não telefona para o Renato? Vamos arranjar alguma coisa pra gente fazer juntos, eu, o Renato, você e o Carlos. Liguei para o Renato e contei que a Eliana estava gostando dele, e eu, do Carlos. No dia seguinte, o Carlos me telefonou e combinamos de nos encontrar na Confeitaria Colombo. Mas minha mãe fez minha irmã Sylvinha ir comigo. Ela era pior que pai e mãe. Tomava conta mesmo e ficava assim: está encostando muito nele. Vou contar pra minha mãe. Não tinha chance de beijo. Ficamos tomando chá e conversando. Dois dias depois, o Carlos me ligou e disse: Estou tremendamente apaixonado por você. Você não sai da minha cabeça. Eu disse que também estava gostando muito dele, mas tinha de falar com meu pai. Naquela época era bem diferente de hoje. Meu pai marcou um dia para o Carlos ir lá em casa falar com ele. O Carlos foi acompanhado da família toda. Ficamos noivos no mesmo dia. Meu pai pediu a folhinha (calendário) e falou para o Carlos: te dou o prazo de seis meses para casar com a minha filha. Não quero saber de namoro comprido. Disse que eu não iria mais à Rádio Nacional e que só poderia sair com a minha mãe, pois não queria encontros nem namoro escondido. O Casamento Carlos e eu nos casamos no dia 20 de janeiro de 1951. No mesmo dia, estava sendo inaugurada a primeira emissora de TV do Rio de Janeiro (TV Tupi). Na época, eu estava fazendo o filme Aviso aos Navegantes. Eu tinha de fazer uma cena com a Eliana, mas não deu tempo. Tive de sair correndo das filmagens por causa do casamento. Saí de lá às 9h30 da manhã, porque o casamento era às 11h. Não pude participar da última cena. Sempre terminava com os artistas que mais apareciam no filme. Antigamente, a gente casava primeiro no civil, de manhã. Depois, à tarde, era o casamento na igreja. Eu me casei em Niterói, na Igreja de São João Batista, que é a Catedral de lá. A orquestra da Rádio Nacional tocou no meu casamento. Foi muito bonito. O casamento estava marcado para as 18h, mas tive de casar mais cedo, porque as noivas que tinham marcado casamento para antes do meu não conseguiam entrar na igreja. Eu tive de entrar na frente das outras noivas. Tinha uma multidão enorme na rua. Eu não tinha avisado a ninguém que ia me casar. Não saiu em revista, em nada. Mas, nos proclamas que corriam na igreja aparecia o meu nome. Naquela época, o padre dizia: casa no dia 20 de janeiro Adelaide Chiozzo e Carlos de Azevedo Mattos. Então muita gente ficou sabendo e a notícia acabou se espalhando. A rua ficou cheia. As pessoas subiam nas árvores para ver a gente. No meu casamento tinha até ambulância e Corpo de Bombeiros, por causa do tumulto na rua. Não sei como eu me casei. Tiraram meu véu, rasgaram meu vestido, cortaram a gravata do Carlos. Só conseguimos tirar fotografias vestidos de noivos porque o fotógrafo disse para fazermos isso antes do casamento. Dizem que o noivo não pode ver a noiva antes do casamento porque não dá sorte, mas isso não é verdade. Eu vivi 57 anos com o Carlos, e ele me viu vestida de noiva antes de entrarmos na igreja. Passamos nossa lua de mel em Águas Lindas (GO). Ficamos apenas três dias lá. Quando voltamos para o Rio, já tínhamos um monte de convites para shows. No início, fomos morar com a família do Carlos. Morei quatro anos e meio com minha sogra. Ela era uma pessoa muito especial. Foi um anjo na minha vida. Ela não admitia que o Carlos desse um grito comigo. Meu marido sempre foi muito ciumento. A mãe dele reclamava: Você está sempre com ela, por que esse ciúme? O Carlos dizia: todo mundo acha ela bonita, ficam olhando... Até morrer, ele foi assim. Sempre foi muito ciumento. Mas eu fui muito feliz com ele. Nunca tivemos uma briga ou discussão. Foi uma paixão muito grande e essa paixão durou até Deus nos separar. Aprendi muito com o Carlos também. Ele era um grande músico, um grande violonista. Um dos casamentos radiofônicos que deu certo foi o que uniu os jovens Carlos Mattos e Adelaide Chiozzo, que ainda não tiveram, felizmente, o dissabor de uma divergência conjugal. Carlos e Adelaide não conhecem aquela senhora sempre mal recebida nos lares verdadeiramente unidos, chamada desavença. Vivem satisfeitos pela escolha que fizeram, e Carlos vive em função de Adelaide. Perdoem o trocadilho, mas, felicidade entre eles é mattos... (A Cena Muda – 20/05/1953) Sempre fui muito ligada à família. Sempre ajudei meus pais. Mesmo depois de casada, continuei ajudando. O Carlos nunca se importou com isso. Depois, nós compramos nosso apartamento, que levou quatro anos para ficar pronto. No dia 25 de fevereiro de 1955, nasceu nossa filha Cristina Maria. Quando eu estava no hospital, chegou um livro enorme do cartório para eu assinar, porque o apartamento tinha ficado pronto. Na época, saiu no jornal que o Carlos havia me dado um apartamento por eu ter dado uma filha para ele. Mas, na verdade, nós dois trabalhamos muito para comprar o apartamento juntos. Cristina nasceu dois dias depois do carnaval. Alguns dias antes, correu um boato de que eu havia falecido durante o parto. Saiu até no jornal. Os telefones da Rádio Nacional não pararam de tocar. Cartas e telegramas pedindo a confirmação da notícia também foram enviados para a emissora. Chegaram a interromper os bailes de carnaval para fazer um minuto de silêncio em minha homenagem. Parece que estavam adivinhando. Meu trabalho de parto foi muito complicado. Minha filha era muito grande e nós duas corremos sérios riscos de morte. O médico chegou a dizer para o Carlos: Qual delas você quer que eu salve? Mas no fim, tudo acabou bem. Sempre fui uma mãe muito carinhosa e dedicada à Cristina Maria. Fiquei muito triste quando tive de desmamá-la por causa das constantes viagens que eu e o Carlos fazíamos. Quando estava junto dela, fazia questão de eu mesma alimentá-la. Certa vez, eu tinha um compromisso na Atlântida, às 8h da manhã. Deu 9h, e eu não aparecia. Nessa época, eu estava filmando Garotas e Samba. Então, o Carlos Manga foi até a minha casa para saber o que estava acontecendo. Quando chegou lá, ele viu a seguinte cena: eu dando mingau para Cristina, e antes de cada colherada, o Carlos acendia um fósforo e ela assoprava. Foi a única forma que encontramos para que a Cristina tomasse o mingau. O Carlos Manga viu um monte de palitos de fósforos queimados e disse: O que é isso? Eu expliquei, e ele me perguntou: Quantos anos tem essa menina? – Dois anos. – Se com essa idade já tem de gastar tanto fósforo, quando ela tiver com 15 anos vocês vão ter de incendiar o Edifício A Noite para ela poder se alimentar. Cristina foi uma menina muito doce, esperta e fotogênica. Sua foto ilustrou vários anúncios comerciais do sabonete e do creme dental Eucalol. Tinha também muita musicalidade. Quando tinha 4 anos de idade, chegou a cantar no Programa Paulo Gracindo, na Rádio Nacional. Sempre fomos muito unidas. Mesmo depois de casar e me presentear com três netos, nós permanecemos muito juntas. Hoje eu digo que ela é que é minha mãe, pelo grande cuidado que tem comigo. Como filha, é um privilégio falar de Adelaide Chiozzo. Ela é uma mãe que está sempre muito presente na minha vida. Grande amiga, carinhosa, protetora, generosa, cotidianamente dando bons exemplos de vida. Apesar de não ter seguido a vida artística, na minha adolescência tive o grande prazer de dividir o palco com a minha mama quando formamos o conjunto Eles e Elas. Como avó, acompanhou o crescimento dos três netos, além de inspirá-los para a música. Como artista, até hoje me surpreendo ao vê-la no palco cantando, dançando e tocando seu acordeom, com a mesma alegria e energia que eu a via quando ainda era criança. Me orgulho em ter essa mãe-artista, que ao longo de sua vida soube dividir a atenção entre a sua profissão e a sua família. Como falar de Adelaide Chiozzo? Pra mim, apenas a simples “Vó” que sempre cozinhou, me ensinou, me ajudou e me amou muito. Desde pequeno, ouço minha avó cantar e tocar, juntamente com meu “Vô Kaka”, Carlos Mattos, seu marido. Graças a eles, me interessei pela música, aprendendo a tocar instrumentos e dividir o palco com eles. O que, para mim, sempre foi um prazer imensurável. Só tenho a agradecer por tudo! Te amo e te admiro muito. Bruno Chiozzo Bem, posso dizer que sou privilegiada. Além de ter duas avós maternas, estas valem por todas! A primeira, minha Vó Célia, continuará para sempre viva em meu coração, por seus ensinamentos e amor incondicional. A segunda, minha Vó Adelaide, tive a graça de conhecer a pouco mais de três anos, mas, que por nossa afinidade, parece uma eternidade. Apesar de suas grandes virtudes, é simples descrevê-la. Não dizem que as avós são duplamente mães? Pois assim é ela, uma “mãezona” na essência da palavra, sempre preocupada com o bem estar de todos. Por isso, quem a conhece se apaixona por seu “beijinho doce”. Costumo dizer que os laços divinos são indissolúveis e assim acontece conosco, pois considero nossa amizade uma benção em minha vida. Deus nos ensinou que aquele que encontrou um amigo encontrou um verdadeiro tesouro e para mim, ela é um dos meus mais preciosos tesouros. Assim, espero ter conseguido traduzir em palavras ao menos um fragmento da minha admiração pela pessoa que ela é e por tudo que conquistou, e da minha gratidão, por todo carinho e doação a mim dedicados. Parabéns, Vó! Eu te amo! Renata (Noiva do Bruno) Quando penso em Adelaide Chiozzo, não vejo apenas a artista carismática, amada e uma profissional dedicada que o Brasil inteiro admira, mas lembro também da VOVÓ ADI, que a todo tempo nos cerca de carinho e amor, e que sempre procurou fazer todas as minhas vontades. É essa Adelaide que apenas eu e meus irmãos temos o privilégio de conhecer e conviver. Roberto Chiozzo Sentimos muito orgulho em ter uma avó como a Adelaide, tão presente, atenciosa, amiga, mãe, alegre. Sempre com bons conselhos para nos instruir e orientar, um ombro amigo a todo instante. Ela é um grande exemplo de vida e dignidade. Duas vezes mãe, duas vezes carinho, duas vezes amor... Fábio e Nina Adelaide é uma pessoa especial. Como artista, sou seu fã. Gosto muito de ir aos seus shows e ver sua musicalidade. Como membro de sua família, posso dizer que sempre nos deu bons exemplos de caráter, dignidade, sinceridade, muito amor e muito Beijinho Doce. José Augusto (Genro) A Namoradinha do Brasil Na mesma época em que fui contratada para fazer parte do Regional de Dante Santoro, a empresa francesa Compagnie des Compteurs de Montrouge veio ao Brasil fazer testes para a implantação da televisão em nosso país. As demonstrações foram feitas na Rádio Nacional. Colocaram dois aparelhos receptores em duas lojas do centro da cidade. As transmissões começaram com uma apresentação do Regional de Dante Santoro. Assim, eu fui a primeira artista a ser televisionada no Brasil. Participei de todos os grandes programas da Rádio Nacional: Nada Além de dois Minutos, Gente que Brilha, Alma do Sertão, Quando canta o Brasil e muitos outros. Além dos programas, os artistas da Rádio Nacional faziam muitos shows em hospitais e em presídios. Quem determinava onde íamos cantar era a direção da emissora. Eles colocavam a programação nas paredes dos corredores da rádio, e assim os artistas sabiam para quais programas haviam sido escalados. Aos sábados, eu cantava no Programa César de Alencar. Ele me anunciava assim: Adelaide Chiozzo, a que tem simpatia para dar e vender. O auditório ficava lotado. As pessoas iam para a Rádio Nacional para se divertir. A venda de ingressos para os programas começava na quarta-feira. Formava uma fila imensa na Praça Mauá. Uma vez, eu cheguei em cima da hora do programa e os elevadores haviam enguiçado. O Carlos estava com o amplificador e a guitarra, e eu com o acordeom. Tínhamos acabado de chegar de viagem e fomos direto para a rádio, para participar do Programa César de Alencar. Nós subimos 21 andares de escada. Quando eu cheguei lá, não conseguia nem falar, mas eu não faltei ao programa. O César disse: Isso é que é lindo em vocês. Fazem sacrifício, mas não deixam a gente na mão. Tinha também o Programa Manoel Barcelos, às quintas-feiras. Ele chamava o Carlos e eu de Casal 20. O Manoel Barcelos era mais fechado, mas era uma pessoa muito amável e doce também. Eu participei muito do programa dele. Eu recebia muitas cartas. Durante três anos seguidos, fui campeã de correspondência junto com a Emilinha Borba. Eu nunca quis ter fã-clube, mas sempre fui muito apoiada pelo fã-clube da Emilinha Borba. Aos domingos, eu cantava no Programa Paulo Gracindo. A gente costumava dizer que o Paulo Gracindo era uma dama. Ele era muito educado, muito gentil. Ele estava sempre na minha casa. O Carlos também gostava muito dele. O Paulo Gracindo teve a ideia de organizar shows com artistas da Rádio Nacional nos circos que passavam pela cidade. Ele convidou o Carlos e eu para sermos seus sócios, e deu o nome de Boate de Lona. Os circos lotavam. Muitos cantores que estavam fazendo sucesso na época se apresentaram na Boate de Lona do Paulo Gracindo: Dolores Duran, Emilinha Borba, Marlene, Cauby Peixoto, Francisco Carlos, Nelson Gonçalves, Carlos Galhardo... Eu cantava e também fazia solos de acordeom. O Paulo Gracindo apresentava o show. Era um sucesso muito grande. Durou aproximadamente dois anos. O circo queria ir embora, mas não podia porque estava fazendo muito sucesso. Tinha um público muito grande. No fim de cada show, nós conferíamos o dinheiro da bilheteria, pagávamos os artistas e dividíamos o lucro. O retorno sempre foi muito bom. Outro programa do qual eu participava muito era A Hora do Pato, apresentado pelo Oswaldo Elias. Era um programa de calouros, mas tinha uma parte que apresentava os profissionais. Era muito engraçado. O Lauro Borges e o Castro Barbosa, que faziam o programa humorístico PRK-30, também participavam muito. Eles eram maravilhosos, fantásticos. Também tive um programa na Rádio Nacional, aos sábados: Adelaide Chiozzo, Carlos Mattos e seu conjunto. Quando eu estava grávida, meu irmão Afonso me substituiu nas últimas semanas antes do parto. Em 1952, participei do concurso de Rainha do Rádio. O concurso era organizado pela ABR – Associação Brasileira de Rádio. As candidatas tinham de vender votos e a renda era revertida para a construção do hospital do radialista. A vencedora ganharia um automóvel Jaguar. Nesse ano, participaram do concurso, além de mim, as cantoras Olivinha Carvalho, Carmélia Alves, Mary Gonçalves, Dóris Monteiro, Aracy Costa e Ilza Silveira. Tinha cantoras de outros estados também. O concurso despertou muito interesse e excedeu todas as expectativas. Foram vendidos dois milhões e 200 mil votos. Toda semana era feita uma contagem dos votos. Em uma dessas apurações, fiquei em primeiro lugar, com 126.235 votos. Eu era apoiada pelo Joaquim Guilherme da Silveira, dono da Fábrica de Tecidos Bangu. Trabalhei muito nesse concurso para arrecadar votos. Viajei o Brasil todo fazendo shows. Durante o concurso fiz várias visitas aos dirigentes da Fábrica de Tecidos Bangu e também uma apresentação para os jogadores do Bangu Atlético Clube. Esse concurso foi muito polêmico. Eu estava liderando as apurações. Tinha tudo para ser eleita a Rainha do Rádio de 1952. Trabalhei muito para isso. Mas o título de Rainha do Rádio daquele ano ficou com Mary Gonçalves, candidata da Rádio Clube do Brasil. Nas apurações, ela ficava sempre em 7° lugar, depois passou para a 4ª colocação. Para surpresa de todos, na última apuração, fui ultrapassada por Mary Gonçalves. De acordo com os jornais da época, uma das candidatas teria cedido seus votos para Mary. Alguns disseram que foi um fã misterioso que comprou os votos. Mary Gonçalves venceu o concurso com 744.826 votos. Fiquei em segundo lugar (706.639 votos) e com título de Primeira Princesa. A entrega das faixas foi feita no Baile do Rádio, no Teatro João Caetano. Recebi cartas do Brasil todo. O público ficou inconformado com minha derrota e dizia que eu era a verdadeira Rainha do Rádio. Depois do concurso de Rainha do Rádio, fui presenteada pela Rádio Difusora de Petrópolis com um automóvel Dodge Coronet 1952. Foi como uma premiação vinda do público, de forma espontânea. Na década de 1950, eu estava fazendo muito sucesso no cinema, no rádio e nas turnês. Nessa época, o Paulo Gracindo sugeriu que a Revista do Rádio fizesse um concurso para eleger a Namoradinha do Brasil e eu fui eleita. No início da minha carreira, um fã mandou uma carta para a Revista Carioca: Adelaide tem 15 anos, com aparência de 18 e Afonso, 17. Ela é um encanto de menina. Voz cantante, gestos recatados, medo nas opiniões, feminilidade à beça. Todo mundo tem vontade de ser o namorado dela... mas a garota nem dá bola. Quando nos olha, com aqueles olhos de amêndoa, a gente fica com a alma assim de ternura e pureza. Em 1957, fui eleita a Mãe Radialista, em um concurso promovido pela revista Radiolândia. Fui escolhida pelos lojistas. Recebi muitas homenagens na Rádio Nacional, nos programas César de Alencar e Paulo Gracindo. No Dia das Mães, participei de um programa na TV Rio e recebi das mãos da atriz Yara Sales o diploma e uma medalha de ouro. Também viajei para a cidade de Resende (RJ), onde recebi mais homenagens. Havíamos simplesmente telefonado para a sua residência, dando a informação. Adelaide e seu esposo, Carlos Mattos, estavam no Norte, em mais uma excursão artística. Quando chegaram ao Rio, ela, como faz sempre, correu ao primeiro telefone para saber como passava sua filhinha, a bonita Cristina Maria. Falou, recebeu a notícia e voltou para os braços de Carlos, correndo e feliz, como uma criança, quando ganha uma boneca ou um chocolate... Abraçou-se ao esposo e disse: Carlos, acabo de receber o maior título de minha vida. Fui eleita A Mãe Radialista! (Radiolândia – maio/1957) No Dia das Mães do ano de 2010, recebi da Rádio Imperial de Petrópolis o título de Mãe Artista. A homenagem foi feita durante um show beneficente que fiz no Teatro D. Pedro, organizado pelo Padre Jac. Em 1952, participei, junto com a Emilinha Borba e outros artistas, da inauguração da Rádio Nacional de São Paulo e, em maio de 1958, da Rádio Nacional de Brasília. Era um sábado. A festa começou às 15h, com a transmissão do Programa César de Alencar. Também se apresentaram os cantores Nelson Gonçalves, Cauby Peixoto, Dalva de Oliveira, Heleninha Costa, Ivon Curi, Emilinha Borba, Luiz Gonzaga, Orlando Silva e Jorge Goulart, os locutores Roberto Faissal e Celso Guimarães, e muitos outros artistas. O início da década de 1960 ficou marcado por uma grande agitação política no Brasil, que acabou provocando um Golpe de Estado, e os militares tomaram o poder, em março de 1964. Eles fizeram uma intervenção na Rádio Nacional e demitiram a maioria dos artistas sob a acusação de serem subversivos. Na época, eu estava fazendo sucesso com um mambo chamado Viagem a Cuba. Vários programas da Rádio Nacional tocavam a música. Estavam aproveitando o sucesso. Um dia, quando cheguei à rádio para participar do Programa César de Alencar, encontrei uma confusão. Eu havia acabado de chegar da Bahia. Fiquei 15 dias lá porque não tinha avião para voltar. O cantor Luiz Vieira também estava com a gente. Disseram que no Rio de Janeiro estava tudo parado, não tinha nem táxi na rua. Quando chegou a hora do programa, o César de Alencar me anunciou: Adelaide Chiozzo, a que tem simpatia para dar e vender! Ele me perguntou o que eu ia tocar. Quando olhei para o auditório, vi um monte de homens fardados e armados. Não tinha mais ninguém assistindo ao programa. Só os militares tomando conta. Então eu falei para o César: você viu que sucesso eu estou fazendo com essa música? Ele me perguntou: Qual? Em vez de dizer Viagem a Cuba, eu respondi Viagem ao México. Fiquei com medo de levar um tiro. Eu já tinha sido chamada e o Carlos também. O César falou: Adelaide, não é Viagem... Eu interrompi: ao México. E fiz um sinal. Ele disse: Ah, é mesmo. Que bom que está fazendo sucesso. O César riu muito depois. Falavam que o César tinha acusado os colegas. Eu nunca ouvi o César falar de ninguém. Depois de um tempo, o pouco que restou dos programas da Rádio Nacional acabou. Parou tudo. Todos os artistas e músicos ficaram desnorteados. Estavam todos perdendo o emprego. Fizeram um acordo, alguns ficaram em outras funções e outros foram aposentados. Meu contrato com a Rádio Nacional foi encerrado em 1972. Alguns anos depois, o César de Alencar organizou um jantar e pediu que chamassem o Carlos, eu, minha irmã Sylvia, a cantora Ademilde Fonseca e o cantor José Ricardo. Quando chegamos ao restaurante, encontramos o César de Alencar. Ele estava muito magro e com dificuldade para falar. Eu queria muito revê-los, porque vocês nunca me acusaram de nada. Eu falei: acusar você de quê, César? Você sempre foi o homem que mais público teve no Brasil com o seu programa. Sempre foi muito amável. Nunca falou alguma coisa que entristecesse qualquer pessoa. Você só deu alegria para todo o público e para os artistas. Você foi fantástico, maravilhoso. Eu não sabia o que estava acontecendo e perguntei por que ele nos chamou. Ele falou que o estavam acusando e que nós fomos os únicos que não falamos mal dele quando nos perguntaram alguma coisa. O César já estava no fim da vida. Você trouxe o acordeom? Eu quero ouvir você. Sempre fui um grande admirador seu, Adelaide – disse o César. Eu toquei e cantei para ele, a Sylvia e a Ademilde também, e o José Ricardo, com aquela voz linda que Deus deu a ele, um cantor de verdade. Despedimo-nos do César e saímos todos chorando. Levei muitos dias para me recuperar da tristeza. Um mês depois, ele morreu (14/01/1990). Acusavam o César de Alencar injustamente (Adelaide se emociona). Eu sempre tive um carinho muito grande por todos os meus colegas da Rádio Nacional. Lembro de todos eles com muita saudade. A Rádio Nacional foi tudo para mim. Porque não existia e nunca mais vai existir uma emissora tão importante, tão querida e tão amada pelo público. Eu viajava muito pelo interior de São Paulo e Minas Gerais e também para os estados do Sul e do Norte do País. Só falavam na Rádio Nacional. Ela era uma potência. Era uma força mesmo. Uma força gigantesca de ouvintes. Estrela da Atlântida Em 1950, participei de Aviso aos Navegantes. Nesse filme, eu apareci muito mais. Novamente eu fazia a amiga da mocinha, que era a Eliana. Nós ficávamos o tempo todo dentro de um navio, como se estivéssemos viajando para a Argentina. Tive três números musicais em Aviso aos Navegantes. O primeiro foi Sereia de Bordo (Bené Nunes e José Carlos Burle). Com a Eliana, cantei a música Beijinho Doce (Nhô Pai). Cantamos com um sotaque bem caipira. Essa música fez muito sucesso e marcou definitivamente minha carreira. Daí em diante, em todos os meus shows, o Beijinho Doce tem de estar presente. A outra música que cantamos juntas foi a marcha Recruta Biruta. No quadro, nós duas aparecemos vestidas de marinheiro. Essa cena virou símbolo dos filmes da Atlântida. Waldemar é um recruta Biruta Que não sabe nem marchar E qualquer voz de comando Esquerda, direita Tonteia o Waldemar Aconteceram coisas incríveis nesse filme. A parte romântica era vivida por Anselmo Duarte, no papel de Alberto, e Eliana, no de Cléa. Eu fazia uma fofoqueira. Os dois brigaram e a personagem da Eliana (Cléa) pedia para eu ver onde estava o Alberto (Anselmo Duarte) e o que ele estava fazendo. Eu vigiava e depois contava tudo para ela. Teve uma cena que foi muito engraçada, e que todo mundo achou muito natural. Quando vi o Alberto abraçando uma loura, eu dei um pulo e disse assim: eu vou falar. Eu saí correndo e fui contar para a Cléa. O público adorou o eu vou falar. Havia uma briga no roteiro do filme. Naquela época, não existia dublê. Tinha umas 30 ou 40 pessoas na cena. Antes da filmagem, o Watson Macedo ficava fazendo fofoca. Ele dizia assim: Adelaide, cuidado com aquela mulher que está de vermelho. Ela disse que tem ódio de você e que vai quebrar a tua cara na hora da cena que tiver a briga. Depois, ele chegou perto dela e fez a mesma coisa. Disse que eu não gostava dela. Ele fez isso com o elenco inteiro. Então na hora de filmar a cena, a briga foi de verdade. Quando o Watson Macedo falou: corta, eu não tinha mais o relógio, nem a pulseira e nem os brincos. A Eliana também estava sem as jóias dela (antigamente, a gente trabalhava com jóias de verdade). O Watson Macedo não deixou ninguém sair de cena. Ele disse que não ia acusar ninguém. Ia mandar apagar as luzes por um minuto. Quem estivesse com as jóias deveria jogá-las no chão. Nós tínhamos que continuar a filmar e precisávamos estar com as mesmas jóias. Apagou a luz. Ficou aquela escuridão. Começamos a ouvir o barulho das coisas caindo no chão. Quando acendeu a luz, estava tudo lá. Cataram tudo e chamaram uma pessoa para consertar. Foi uma briga de foice. Foi pra valer. Eu fui parar no pronto-socorro com a Eliana. Nós ficamos com o rosto machucado. Foi uma coisa terrível. Fiquei muito triste quando um jornalista botou o nome chanchada. Ora, chanchada é uma brincadeira, e a gente fazia aquilo pra valer. Depois veio o filme Barnabé, Tu És Meu (1951). Nesse filme estavam a Emilinha Borba, que fazia par romântico com o Cyll Farney, Fada Santoro e Grande Otelo. O Oscarito foi o meu galã. Ele era o Barnabé. Foi um filme bem alegre. Eu saía correndo e gritando: Barnabé, Tu És Meu. A personagem da Fada Santoro também queria o Barnabé, porque ele era um homem importante. Lembro que eu usava um sapato com um salto bem fino e tinha de bater num bandido. Eu arranquei o sapato na cena e bati tanto na cabeça dele, que ele saiu gritando: Ai, ai, ai. Eu bati pra valer porque eu queria que saísse bem natural. Não adianta ficar só fazendo pose... Tive também um número musical nesse filme. Cantei a marcha Lá vem Seu Tenório (Manoel Pinto e Aldari de Almeida Airão). O filme termina com o Oscarito querendo me beijar. A gente corre e vai para trás de uma pilastra, e o Grande Otelo vem gritando: Olha, o galo vai cantar, hein! Tinha de acontecer alguma coisa para atrapalhar. Meu marido não queria e meu pai nunca quis que eu fizesse cena de beijo. Então, sempre tinha de inventar alguma coisa. Aí vem o Barão (1951) nós fomos filmar em um palácio perto de Petrópolis. Até hoje tem esse palácio lá. Eles copiaram toda a parte de dentro, e fizeram no estúdio, com os menores detalhes. Eu descia e subia a escada correndo com a Eliana. A Luíza Barreto fazia a governanta da casa. A Eliana e eu víamos uma reunião, na qual os bandidos planejavam matar o Barão (personagem do Oscarito) naquela noite. Nós duas tivemos que fazer uma cena em que a gente entrava no quarto do Oscarito pela janela para avisá-lo. O diretor (Watson Macedo) mandou colocar uma escada, dessas feitas com cordas, escondida no meio das plantas para a gente subir. A Eliana pisava no degrau, ia subindo e eu subia atrás dela. Uma corda soltou e ela sentou na minha cabeça. Eu não aguentei e caímos as duas no chão. Nós ficamos mudas. A gente não conseguia falar. O Watson Macedo pegou a minha cabeça, a dela, e bateu com tanta força que nós duas gritamos. Depois que passou, a gente caiu numa gargalhada que nem podia filmar. Depois, arranjaram uma escada de madeira bem fininha, a gente subiu de novo e fizemos a cena. Nesse filme, cantei com a Eliana as músicas Orgulhoso e Sabiá na Gaiola (Nhô Pai e Mário Zan). Sabiá lá na gaiola fez um buraquinho Voou, voou, voou, voou E a menina que gostava tanto do bichinho Chorou, chorou, chorou, chorou Sabiá fugiu pro terreiro, Foi cantar no abacateiro A menina vive a chamar Vem cá sábiá, vem cá A menina diz soluçando Sabiá estou te esperando Sabiá responde de lá Não chore que eu vou voltar Nesse filme, havia uma cena com alguns animais. Tinha também um leão, que se soltou. Foi uma confusão. Saiu todo mundo correndo. Os extras entraram, feito loucos, empurrando, e eu caí de costas com aquele acordeom pesado em cima de mim. Muitos anos depois, passei de carro em frente ao castelo e quis entrar para ver como estava. Quando cheguei lá, estava fechado. Só tinha um senhor tomando conta. Ele me disse que o neto do antigo dono estava lá, e foi chamá-lo. Pedi para entrar. Falei para ele que eu estava muito emocionada por estar ali, que as lembranças eram muito fortes. O castelo estava vazio mas, para mim, era como se estivesse revivendo a cena. Subi a escadaria e lembrei-me de quando a Eliana e eu subíamos e descíamos correndo aquela escada. Eu chorei muito. Fiquei muito emocionada. Na época do filme eu estava recém-casada e nesse retorno o Carlos já havia falecido. Em 2008, fui convidada pelo proprietário para passar o reveillon lá. No filme É Fogo na Roupa eu fui a estrela. Eu fazia muitos filmes com a Eliana, mas eu sempre era a coadjuvante. A direção também foi de Watson Macedo. A Eliana estava fazendo um filme em outra Companhia. Então, ele me chamou para fazer o papel principal. Eu fiquei radiante. Fiquei muito feliz, mas eu sentia falta da minha companheira Eliana. O filme foi feito no Hotel Quitandinha, em Petrópolis. Também participaram Pinduca, Ankito, Heloísa Helena e Ivon Curi. Eu fiz par com o Ankito. O Oscarito não estava mais. Nosso maravilhoso Oscarito foi o maior cômico que Deus botou na terra. Ele não precisava nem falar. Ele dava um passo ou dava um olhar... e as pessoas caíam na gargalhada, porque ele era completamente diferente. Ele ficou famoso e conhecido como o melhor humorista. Temos humoristas maravilhosos hoje, mas nenhum tem nada a ver com o estilo que ele fazia. Eu tenho muita saudade do Oscarito. Foi um filme que também deu uma grande bilheteria. Sempre que saía um filme da Atlântida, era recorde de público. Na época, saiu no jornal: Lá vem mais uma chanchada. Mas era o que o povo gostava. Fazia muito sucesso porque não tinha maldade. Era amor e muita música. Tinha sempre um bandido na história, e a parte romântica. Tinha de tudo. Era isso que agradava o público brasileiro. Embora eu estivesse muito feliz por estar fazendo o filme, foi uma coisa terrível para mim. Eu havia assinado um contrato para fazer shows no Estado de São Paulo durante 40 dias. Eu fazia o show e voltava correndo para Petrópolis para filmar. Eu chegava, me maquiava às pressas e ensaiava, ou, às vezes, fazia no improviso mesmo. A correria valeu a pena. O filme agradou e eu fiquei muito feliz. O Watson Macedo era uma pessoa muito querida. Todo mundo adorava. Ele também era muito engraçado. Tinha as piadinhas dele e, às vezes a gente ria tanto durante o filme, que tinha de parar tudo. Naquela época, os atores não tinham o script. Só o diretor. Então, ele dizia as falas dos personagens e o que a gente tinha de fazer. O Bené Nunes também estava nesse filme. Ele era um grande artista. Como músico, então, ele era fantástico, um excelente pianista. Ele foi o meu galã nesse filme. Era um companheiro, um amigo. Eu sempre fui muito respeitada pelos colegas. Adelaide Chiozzo, ainda muito nova, está fazendo uma carreira brilhantíssima, tanto no cinema, como no rádio. Adelaide possui todas as qualidades para se tornar, nas duas artes, uma das maiores estrelas do Brasil. (Revista Carioca – 07/02/1953) O Petróleo é Nosso (1954) foi produzido pelo Watson Macedo, na Vita Filmes. A Violeta Ferraz fazia minha mãe. Nós éramos da fazenda. Eu queria ser artista. Queria cantar no rádio. Eu ria muito nesse filme. O Humberto Catalano também participou. Ele era maravilhoso. Tinha também a Heloísa Helena e a Nancy Vanderley. Esse foi o primeiro filme do John Herbert no Rio de Janeiro. Ele filmava na Vera Cruz, em São Paulo. Lembro que comentavam isso na época. Eu fui a estrela do filme, junto com a Mary Gonçalves. Ela fazia pouco caso de mim, me chamava de caipira, de matuta. O personagem do John Herbert se apaixonava por mim. Eu só falava bobagens. Eu dizia pra ele: olha lá, que baita estrela! Eu queria pedir um favor pra você. Eu queria ir na roda gigante. No final, ele ficou comigo. Foi descoberto que na fazenda da minha mãe tinha petróleo. Por isso que o filme se chamou O Petróleo é Nosso, que também era o nome de uma campanha do governo na época. Em 1956, participei do filme Sai de baixo, produzido pela Herbert Richers. A direção foi de J.B. Tanko. Tinha muitas cenas externas. Foi feito na Brigada Paraquedista do Exército. Depois desse filme, eles me deram o título de A Diva dos Paraquedistas. Sai de Baixo foi um filme muito engraçado. Cismaram que eu tinha de saltar de paraquedas. Tinha uma torre muito alta, usada para o treinamento dos paraquedistas. Eles me amarraram em um equipamento de segurança. Eu tinha de sair correndo e saltar. Nunca senti tanta dor. Foi uma coisa terrível. Depois desse salto, eles falaram: Agora faz a cena. Eu disse: o que? Isso foi só o ensaio? Então vai ficar só no ensaio porque eu não vou fazer de novo. Fiquei uns 15 dias com dores no corpo. Os paraquedistas têm preparo físico pra isso. Eu não tinha. Nesse filme, o Palhaço Carequinha fazia par romântico comigo. Tinha uma cena em que ele estava dançando com uma moça, eu chegava, o empurrava e ele caía de costas em um lago. Mas eu fiquei assustada e tirei ele do lago. Eu cantava uma música ofendendo ele. Leva ele, leva ele, Ele é que sabe da vida dele Ele é que sabe da vida dele... O J. B. Tanko era tcheco. Era uma pessoa muito gentil e muito educada. Um excelente diretor. Ele explicava detalhadamente como ele queria que fosse feita cada cena. Todo mundo fazia com muito carinho, com muito amor. Se não fosse isso, a vontade de fazer, não sei o que seria dos filmes brasileiros. Tudo seria muito mais difícil. Não havia nenhum recurso. Os diretores eram profissionais, mas muitos dos artistas eram amadores. Eu nunca tive escola de teatro ou de cinema. Tudo o que fiz até agora na minha vida, foi por minha conta. Depois veio Genival é de Morte, em 1956. A direção foi do Ronaldo Lupo. O Carlos também participou. Nesse filme, eu canto em uma festa junina, uma música bem simples, mas muito bonita. Eu toco sanfona, eu toco Eu toco pra disfarçar Eu canto, Sá Dona, eu canto Eu canto pra não chorar Gostei de uma criatura Que não tinha coração Eu gostava tanto dele E me fez ingratidão Foi embora pra cidade E não quis voltar mais não... O cenário era cheio de bandeirinhas. Minha filha estava com nove meses e ela aparece na cena tocando uma sanfoninha. Eu ia ser a estrela de Genival é de Morte mas, quando o Ronaldo Lupo me chamou, eu já havia assumido compromisso com outro filme. Então, ele convidou a Tereza Raquel para o papel principal. Ela é uma grande atriz. Grandes artistas participaram desse filme. Foi muito bem aceito pelo público, mas não teve a mesma repercussão dos filmes da Atlântida. A Atlântida batia recorde de bilheteria com todos os filmes que produzia. Em 1957, veio o filme Garotas e Samba, a última chanchada da Atlântida. A direção foi do Carlos Manga. Ele é fantástico. Um grande diretor. O Manga começou com o Watson Macedo. O trabalho dele era bem mais evoluído. Ele fazia de tudo para melhorar as cenas e melhorar a história. Nessa época, as coisas já estavam mais modernizadas e já tinha script. Então, eu sentia a cena de uma determinada maneira. Por isso tem de ter diretor. A gente não sabia nem o princípio, nem o meio, nem o fim do filme, porque não recebíamos a sinopse, só o script com nossas falas. A gente ia fazendo sem saber qual era a história do filme. Quando o artista não fazia o que ele queria, ele dizia: Eu vou mostrar como eu quero que você faça isso. Ele ia lá e fazia a cena do jeito que ele queria que ficasse. Lembro que eu tinha de fazer uma cena chorando, mas eu não conseguia de jeito nenhum. O Manga falava: Adelaide, eu quero ver lágrimas nos seus olhos. Você tem de falar o texto chorando. Não saía uma lágrima. Ele então me perguntou: Você tem mãe? Eu respondi que sim. Ele disse: Então, imagina que ela está deitada em um caixão com quatro velas em volta. Ela está amarela... Eu chorei tanto, que quando acabou a cena, eu continuei chorando e não parava mais. Fiquei com os olhos inchados de tanto chorar. Não podia acontecer beijo. Meu marido não permitia que beijasse, nem que aparecessem as pernas. Meu pai pensava assim também. Não quero que aconteça isso – ele dizia. O Carlos achou uma maravilha meu pai ter essa ideia. Como eu não podia beijar nos filmes, sempre acontecia alguma coisa para atrapalhar na hora: caía alguma coisa, ou então o Grande Otelo e o Oscarito vinham correndo e se jogavam em cima, explodia uma bomba. Neste filme, fiz par romântico com o cantor Francisco Carlos. Não podia ter beijo. No filme Garotas e Samba fizeram um truque. A cena era assim: tinha um lago e eu vinha com uma flor nas mãos cantando a música Nossa Toada. Você já não é mais aquele Seu sorriso é triste Seu olhar tristonho Nunca mais uma flor você me deu Não me desperte deste sonho O Francisco Carlos vinha descendo uma rampa e eu cantando. Ele chegava, fazia duas vozes comigo e a gente sentava num banco. Na hora em que ele vinha chegando para dar o beijo, eu tinha de jogar a flor no lago. Assim, a água fazia umas ondas, juntava a gente nas imagens refletidas, e aí ficava parecendo que tínhamos dado beijo na boca mesmo. Olha, aquele dia foi difícil pra mim. Adelaide chegou e me disse: Eu não posso beijar ele (Francisco Carlos). Eu disse: Beijar? Mas é um beijinho, selinho, bobagem. Não adiantou nada. Eu falei: então, vamos fazer o seguinte, ele joga uma flor na água e aquela flor fica boiando... quando ele jogar a flor, a água mexe, ele beija você, e a gente abaixa a câmera, mostramos a imagem por baixo. Só que a câmera demorou muito a virar para a flor e ainda pegou uma encostadinha. Foi uma barra, Adelaide saiu chorando do estúdio. Eu tive de ir atrás do Carlos (marido da Adelaide). – Que é isso Carlinhos? – Eu vi – Mas não tem nada, eu botei a flor pra não mostrar, vem ver. Ele não podia ver, porque só podia ver depois de pronto o copião. Meu marido estava assistindo tudo. Ele viu que não teve beijo, mas os outros ficaram achando que teve. O Carlos enlouqueceu. Ele dizia: Vão falar de você. Vão falar de mim. Eu falei: Carlos, você assistiu. Você viu que não teve beijo. O que vale é a consciência da gente, não o que os outros estão pensando. Foi um truque. Você viu como o Carlos Manga faz truque. O Carlos andou de revólver querendo matar o Manga e o Francisco Carlos. Ele ficou com uma barba enorme. Ele andava na rua perguntando: beijou ou não beijou? Ele ficou louco. Aquilo foi um desespero na minha vida. Ele só falava nisso. O Carlos Manga tinha uma bronca... Ele falava: Carlos, por favor, sai um pouquinho. Vai pra lá. Por que você tem de ficar tomando conta da sua mulher? Ela não pode trabalhar assim. Ela trabalha olhando pra você. O que é isso? O Carlos ficou com cisma do Francisco Carlos. Ele me admirava por eu suportar essas coisas do meu marido. Porque nenhuma mulher suportaria isso. Eu estava trabalhando. Estava ganhando a vida. Eu fui muito feliz mesmo assim. Não posso dizer que não fui. A Adelaide é uma pessoa extremamente humilde. Uma das peças mais sérias das chanchadas. A única que não foi criticada, pois sempre foi uma grande atriz. Eu tive a infelicidade de ter trabalhado muito pouco com ela. Mas o pouco que trabalhei me ensinou muito. Um cartaz imenso e de uma sensibilidade imensa. Todos os papéis que ela fez, fez muito bem. Ela falava com muita sinceridade. Os filmes eram recordes de bilheteria. Tinha um marido extremamente severo e ciumento. Eu também seria. Porque a Adelaide é uma mulher encantadora, de sorriso e de princípios. O maior mérito é da pessoa humana que ela é. Eu amo profundamente essa moça. Eu respeito demais essa moça. Ela é educada, muito meiga. Quando ela cantava o trenzinho vai, o trenzinho vem... era uma das coisas mais líricas e mais engraçadas que eu já fiz no cinema. Com os colegas ela era sempre uma pessoa muito meiga, brincalhona, risonha. Era uma menina. Um exemplo de atriz, de pessoa, de meiguice, de esposa, de tudo. Eu fico muito emocionado quando falo dessa mulher. Falo da Adelaide com todo respeito que ela merece. (Carlos Manga) Em 1974, o Carlos Manga e o Silvio de Abreu me chamaram para participar do documentário Assim era a Atlântida. Eles me explicaram o que eu ia fazer, onde ia filmar e deixaram um texto para decorar. Nessa época, eu estava com o cabelo louro. Então, o pessoal estranhou um pouco. Nesse período todo, até ser convidada para participar de Assim era a Atlântida, eu não via artista nenhum. Eu não sabia como estavam. Nada. De repente, a Revista Manchete chamou a gente para ir até a Atlântida, que nessa época estava na Rua Haddock Lobo, na Tijuca. Quando cheguei lá, encontrei todo mundo. Estavam todos muito diferentes. Encontrei a esposa do Oscarito (Margot Louro), a Fada Santoro, Eliana, Anselmo Duarte, Ivon Curi, Francisco Carlos, Zezé Macedo, Zélia Hoffman, Cyll Farney. Ficamos todos muito felizes com esse reencontro. Foi uma luta muito grande a minha vida de artista. Eu costumava dizer que todo artista tem 15 minutos de sucesso. Então, eu tinha de aproveitar que estava fazendo um filme atrás do outro e estava nas duas melhores empresas da época: a Rádio Nacional e a Atlântida. Não existia nada melhor. Eu também já estava fazendo televisão. Participava de quadros, fazendo humorismo junto com o Grande Otelo e o Oscarito. Saudades da Atlântida Eu tenho muita saudade do Grande Otelo e do Oscarito. Eles eram meus amigos. Eu ainda era uma menina quando comecei a filmar com eles. Minha mãe ia comigo e ficava me esperando. A gente filmava a noite toda. Ficava um dia inteiro. Não tinha hora para acabar. Só tinha uma câmera. Então, depois que filmava uma cena, tinha de mudar a câmera para o outro lado, para o outro ambiente, onde ia ser feita outra cena. No alto, ficava um microfone enorme, que a gente chamava de girafa. O Oscarito ficava preocupado comigo. Na hora do almoço, ele dizia pra mim: Adelaide, come uma banana junto com a comida. Eu dizia pra ele que não gostava, e ele insistia: Come sim! Porque você ficou aqui a noite toda filmando e nós estamos almoçando muito tarde e ainda temos muita coisa para fazer. O Grande Otelo dizia: Quer que eu descasque pra você e corte em pedacinhos? Eles tomavam conta de mim como se fossem meus pais ou irmãos mais velhos. Tinham esse carinho comigo. Eu ficava muito encabulada. Eu, garota ainda, filmando com grandes nomes. Eu ficava preocupada até para falar as coisas. Eu tenho muita saudade também da minha grande amiga Eliana. Ela era como se fosse uma irmã para mim. Era muito boa pessoa. Isso me traz muita saudade. Tenho saudade de todos os artistas. No dia do meu casamento, eles não puderam ir. Então, cada um me deu uma coisinha, um presentinho. Naquele tempo, as coisas eram mais simples. A Eliana me deu uma ferradura com sete buracos e disse: Estou te dando isso porque não tive tempo de ir comprar nada. A ferradura com sete buracos vai dar sorte pra você. Depois que vocês voltarem da lua de mel a gente vai fazer uma festa. Trabalhar com a Eliana era uma festa. A Eliana era uma gracinha. Ela era um amor. Eu tinha um carinho muito grande por ela e ela por mim. Uma ajudava a outra. Nós fazíamos cinema e viajávamos por todo o Brasil juntas. Lembro com muita saudade das coisas engraçadas que aconteciam com a gente. Quando nós estávamos no auge, tínhamos de fazer matinê e à noite. As ruas lotavam com a multidão que queria entrar no cinema. Então nós fazíamos duas sessões. Num dos shows que fizemos em Ribeirão Preto, aconteceu uma coisa muito engraçada. A Eliana usava um calção (parecido com uma bermuda) por baixo do vestido para poder dançar. Ela usava uma saia muito rodada, dançava muito, então apareciam as pernas. Naquela época, era uma sensação. Eu tocava e dançava com ela a música Tico-Tico no Fubá e o Carlos acompanhava a gente no violão. Fizemos a primeira sessão e, quando estávamos nos preparando para fazer a segunda, a Eliana procurou o calção dela e não encontrou. Ela ficou desesperada: Adelaide, pelo amor de Deus, me empresta a sua calcinha. Eu perguntei: Por quê? O que foi que aconteceu? Ela disse: Roubaram o meu calção. Como é que eu vou dançar? Eu fui obrigada a emprestar a calcinha a ela e na hora do show não pude dançar. O Renato Murce falava pra mim: Adelaide, você não está dançando por quê? Dança, Adelaide! Eu olhava para ele, sorria e continuava tocando. Eu não saía do lugar. O Carlos também ficou espantado comigo, querendo saber o que estava acontecendo. O palco era muito alto. O cinema estava lotado. Imagina, se eu ia sair do lugar! Quando terminou a apresentação, o Renato falou: vamos ter uma conversa. Adelaide, por que você não dançou? Você sempre toca e dança o Tico-Tico no Fubá. Eu respondi: Renato, deixa pra lá. Hoje eu não estava com vontade de dançar. Eu fiquei com vergonha de contar para ele. A Eliana caiu na gargalhada e acabou contando: Ela estava sem a calcinha. Roubaram o meu calção e eu peguei a calcinha dela emprestada para vestir por cima da minha, que era transparente. A Eliana era muito especial para mim. Nós tínhamos uma amizade muito grande. Ela era muito engraçada, muito esperta e uma pessoa muito feliz. Tenho saudades do Renato Murce também. A Eliana ficou com o Renato até o fim da vida. Ele faleceu em 1987 e ela em 1990. Foi uma perda muito grande pra mim. Irmãs Chiozzo Minha irmã Sylvia cantava muito comigo em casa. Eu dizia para ela fazer a primeira voz. Eu fazia a segunda porque ninguém conseguia fazer. Ela começou a cantar comigo, e depois fez um teste na Rádio Nacional, passou, mas não pôde ser contratada porque ainda era menor de idade. Nessa época, havia sido proibida a contratação de menores de idade, mesmo com autorização dos pais. A Sylvinha teve de esperar dois anos. Ela também participou do concurso de novos talentos da Casa Neno (loja de eletrodomésticos), por onde passaram também as cantoras Rogéria e Ellen de Lima. A Sylvinha ia para a Rádio Nacional fazendo companhia para a Adelaide. Ela era bem pequena ainda. Devia ter uns 10 ou 12 anos de idade. Era bem garota. Ela estava sempre com a Adelaide, aí passou a cantar também e, por fim, acabou sendo contratada da rádio. Eu fiz muitos shows com a Sylvia e com a Adelaide na Boate de Lona do Paulo Gracindo. Elas cantavam e eu acompanhava, no pandeiro, e o Carlos Mattos, no violão. (Jorginho do Pandeiro) Em junho de 1956, ela finalmente foi contratada pela Rádio Nacional. Apresentamo-nos muitas vezes juntas no Programa Paulo Gracindo. A Sylvinha começou a gravar no mesmo ano. No primeiro disco, ela gravou as músicas Corações em Férias (Abel Ferreira e Luiz Bittencourt) e Este é o Samba (Getúlio Macedo e Almeida Batista). Eu era vizinha do compositor Paulo Borges, autor do rasqueado Cabecinha no Ombro. Ele me mostrou a música e eu fiz uma introdução no acordeom. O Paulo Borges gostou muito. Gravei Cabecinha no Ombro com a Sylvinha, em 1958. Ela ainda estava começando. Então, eu perguntei se ela não queria gravar comigo, porque ia fazer muito sucesso. Na segunda voz, eu faço umas nuances tipo música de igreja. As duas vozes ficam muito bonitas assim. Encosta a sua cabecinha no meu ombro e chora E conta logo a sua mágoa toda para mim Quem chora no meu ombro eu juro que não vai embora, Que não vai embora, que não vai embora Quem chora no meu ombro eu juro que não vai embora, Que não vai embora, porque gosta de mim Amor, eu quero o seu carinho, Porque eu vivo tão sozinha Não sei se a saudade fica ou se ela vai embora, Se ela vai embora, se ela vai embora No mesmo disco, gravamos juntas a valsa Ele Esqueceu. Essa música foi escrita pelo meu marido Carlos, com o Luiz Lemos. É a resposta do Beijinho doce. Que Beijinho doce Ai, ai que saudade Quem dera que fosse Pra eternidade Ainda sinto seu doce sabor Ainda me lembro da jura de amor O abraço apertado Que ele me deu Eu tenho guardado Mas ele esqueceu Suspiro que vai Vai, vai Suspiro que vem Vem, vem Me traz a saudade Do meu grande bem O Beijinho doce Só ele é que tem Nós viajamos muito juntas. Ela passou a fazer turnês comigo e com o Carlos. Fizemos muitos shows juntas. Em 1957, o Roberto Farias estava dirigindo o filme: Rico Ri à Toa. Ele me convidou para participar, mas eu não pude, porque tinha muitas viagens marcadas e não daria tempo. Sugeri que ele chamasse a Sylvinha. Eu falei pra ele: por que você não chama minha irmã. Ela é tão parecida comigo. Ela também tem muito jeito pra cinema. A Sylvinha ficou numa alegria... Nesse filme, ela teve três números musicais Zé da Onça (João do Vale, Abdias Filho e Adrian Caldeira), Nota Legal (Adrian Caldeira) e É Samba (Vicente Paiva, Luiz Iglesias e Valter Pinto) . Em 1959, ela casou com o locutor esportivo Osvaldo Moreira (também da Rádio Nacional). A carreira da Sylvinha não durou muito tempo. Vieram as filhas (Verônica e Mônica), e ela acabou deixando a carreira para se dedicar à família. Viajando pelo Brasil Viajei por todo o Brasil fazendo shows. Tenho público até hoje nessas cidades. O Carlos estava sempre comigo. Fazíamos viagens de quarenta a cinquenta dias. Cada dia em uma cidade. Até na segunda-feira a gente trabalhava. Não tinha folga. Antes de conhecer o Carlos, viajei muito fazendo shows com meu irmão Afonso. Viajamos o Estado do Rio todo. A primeira cidade foi Santa Maria Madalena (terra da Dercy Gonçalves). Fomos contratados para tocar em um casamento. No dia seguinte, pediram tanto, que nós tivemos de fazer um show no meio da rua mesmo. A primeira viagem que fiz com meu irmão Afonso, depois que participamos do Programa Papel Carbono, foi para Vitória da Conquista, na Bahia. Fomos contratados pelo Clube Social Conquista. Foi também a primeira vez que viajamos de avião. Quem acompanhou a gente foi o Luiz Abreu Maia, um amigo da família. Nosso show agradou muito. O clube ficou lotado. Depois da apresentação, um rapaz veio falar comigo. Ele me disse: Eu quero você. Eu sou da família Sales. Somos donos de quase tudo aqui e, quando eu gosto de alguma coisa, quero pra mim. No dia seguinte, ele foi ao aeroporto com dois empregados e me presenteou com flores, um bolo imenso, um rádio, um jogo de lençóis bordados e um anel de brilhante. Eu perguntei: Por que isso? Ele disse que queria se casar comigo. Eu falei: Ah, moço, não fala assim. Eu vim aqui só para trabalhar, para fazer o show. Não posso me casar com você. Algum tempo depois, ele começou a me mandar cartas toda semana. Então, eu pedi ao Renato Murce para me ajudar a escrever uma carta para a família dele dizendo que gostei muito da terra deles, do povo, mas não estava interessada em me casar. Passaram-se alguns anos e eu fui novamente convidada para fazer um show lá, mas não pude ir. Mandaram me avisar de que, se eu pisasse em Vitória da Conquista novamente, iriam me matar, porque o rapaz virou um bêbado por minha causa. Antes do Carlos, eu fui noiva de um rapaz que trabalhava na Rádio Nacional. Ele era de Porto Alegre. O nome dele era Avalone. A família dele era dona de um jornal em Porto Alegre e queria que ele trabalhasse lá. Mas o Avalone não quis. Ele dizia que queria ser artista, ser ator. Depois, ele acabou voltando para a cidade dele. Algum tempo mais tarde, ele me mandou uma carta dizendo que queria se casar comigo. A família me enviou um enxoval completo e um carro. Eu estava me preparando para fazer a turnê com o Renato Murce e ele disse que, se eu fosse, terminaria tudo. Eu não queria mesmo casar com ele, então enviei tudo de volta. Depois disso, nunca mais ouvi falar do Avalone. Afonso e eu fizemos muitos shows pelo interior de São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais. Apresentamo-nos também muitas vezes na Rádio Inconfidência, em Belo Horizonte. Duas Grandes Estreias, ao Microfone da PRI-3 A emissora da Feira, neste fim de ano, tem brindado os seus ouvintes com grandes atrações. Para hoje, estão incluídas na programação de estúdio da Inconfidência, duas grandes estreias: Irmãos Chiozzo e Alberto Ramires, artistas destacados do broadcasting nacional. Os Irmãos Chiozzo, conhecidos pelo slogan: Dois acordeons, duas simpatias, estarão cantando e executando bonitos números nos seus instrumentos. (Folha de Minas – 18/12/1947) Em Belém, nos apresentamos durante a festa de Nazaré, nos Teatros Poeira e Nazaré (1950). Os dois teatros ficavam numa praça, um em frente ao outro. A gente fazia o show e atravessava correndo para o outro teatro. Fazíamos muitas apresentações por dia. A festa do Círio de Nazaré durava 15 dias. Essa viagem foi uma confusão. Quando terminou a temporada, o empresário fugiu com todo o dinheiro, e não pagou nenhum dos artistas contratados. Ficamos sem ter até como voltar pra casa. Também estavam lá outros artistas, como Elvira Pagã, Lucio Alves, Marion, Dick Farney, Carmen Costa, Elizeth Cardoso e outros. Tivemos de fazer alguns shows para arrecadar dinheiro. Saiu em vários jornais na época. Eu fui à FAB (Força Aérea Brasileira) pedir ajuda. O comandante nos deixou dormir na Base Aérea, pois não podíamos mais ficar no hotel. O avião só saiu dois dias depois. Era um avião de carga. Não tinha assentos, então colocaram redes para que a gente pudesse sentar. Em 1950, me apresentei pela primeira vez na Rádio Iracema, em Fortaleza, com meu irmão Afonso. Fizemos muito sucesso durante nossa temporada lá. Os jornais da época disseram que foi o maior público já registrado em programas de rádio. O auditório ficou lotado. Na segunda vez que estive na Rádio Iracema, já estava casada. Então fui com o Carlos. Quase não consegui fazer o show porque não podia sair do hotel. A multidão na rua parecia um formigueiro. A gente andava uma quadra para chegar na Rádio Iracema. A rua estava tão cheia de gente que não dava para passar. Quando eu saí, quase me mataram. Todo mundo queria beijar, queria abraçar. Tiveram de fazer um cordão de isolamento e colocar guardas, para que a gente conseguisse chegar até a rádio. Até hoje eu tenho muito público em Fortaleza. Em 1957, recebi o título de Cidadã Cearense. Durante outra temporada que fiz com o Carlos, em Belém do Pará, também foi uma loucura. Todo mundo avançava, querendo um pedaço da minha roupa. Eles diziam que, quem ficasse com um pedacinho da minha roupa, ia ser feliz a vida inteira. Porque para eles eu era a Santa Adelaide. O Carlos estava me protegendo, mas a multidão era muito grande e incontrolável. Eu comecei a gritar: Carlos, estão me machucando. No meio da confusão, um fã não quis só o pedacinho da minha roupa não. Ele enfiou a mão por baixo do meu vestido e tirou um pedaço da parte interna da minha coxa com a unha. Ficou um buraco. A ferida inflamou e tive de ir ao médico para fazer curativos durante toda a turnê. Todo mundo ficou procurando, tentando descobrir quem foi. Até a polícia. Acho que até hoje ele deve ter guardado em uma caixinha o pedacinho da Adelaide Chiozzo. Os fãs enlouqueciam quando viam a gente. Não é como agora. Hoje ninguém liga, porque vê tanto o artista na televisão, que fica encantado, quer chegar perto e tudo, mas não desse jeito. Hoje tem segurança, também, que não deixa ninguém se aproximar. Naquela época não. O pessoal só faltava derrubar a gente. Em outro show, na hora em que eu fui dançar, o sapato saiu do meu pé e caiu na plateia. Um senhor que estava assistindo pegou o sapato e saiu correndo. O Carlos e eu fomos até a casa dele, mas não conseguimos convencê-lo a devolver. Ele disse que já tinha comprado até uma caixa de vidro para expor o sapato. Acabei dando o outro pé do sapato pra ele. Sempre acontecia alguma coisa engraçada nesses shows. Uma vez, minha anágua soltou do vestido e caiu. Eu disfarcei e tirei com o pé. Quando fiz isso, a anágua voou longe e desceu como se fosse um paraquedas. O público que estava assistindo pensou que fizesse parte do espetáculo e aplaudiu muito. Eu tive de sair correndo do palco porque o vestido era transparente. Quando fizemos outro show, ficaram gritando: O número da anágua! O número da anágua! Logo depois que voltamos de nossa lua de mel, Carlos e eu fizemos uma turnê com o Celso Guimarães (locutor e radioator da Rádio Nacional). Viajamos para Minas Gerais e São Paulo. Ficamos 25 dias viajando. Percorremos 31 cidades. O Carlos apresentava alguns números ao violão, o Celso recitava poesias, contava algumas histórias da Rádio Nacional, falava das radionovelas e como eram criados os efeitos sonoros. Fazíamos alguns esquetes também. Pra não ficar só música. Eu entrava com o acordeom para encerrar o show. Aconteceu uma coisa muito engraçada nessa viagem também. O Carlos fez uma brincadeira com o Celso. Em cada cidade que a gente chegava, ele escrevia um bilhete assim: Celso Guimarães, você é o homem mais lindo do Brasil. A sua voz é linda. Eu sou apaixonada por você. O Carlos era muito moleque. Toda hora o Celso recebia um bilhete por baixo da porta do quarto dele no hotel. Quando chegávamos ao cinema para fazer o show, ele ficava o tempo todo olhando para os lados e para a plateia. Ele olhava pra todo mundo, tentando descobrir quem mandava os bilhetes. O Carlos fez isso em todas as cidades por onde passamos. Quando chegamos à última cidade, ele contou a verdade para o Celso. Eu já estava ficando com medo dessa mulher. Achei que ela estava me perseguindo – disse o Celso. O show constava de variedades – hora ou hora e meia –apresentado antes ou depois do filme programado no cinema de cada cidade. Eu começava contando coisas pitorescas sobre as mais populares figuras do rádio, para justificar a existência dos mascarados do microfone, dos quais dava um exemplo em seguida: um filme onde eu apareço como um famoso violinista, dando ensejo a que fosse criticado por mim mesmo, do palco, num dos lados da tela. Uma novidade para o interior: eu no palco e na tela ao mesmo tempo! Depois disso, canções e solos de acordeom por Adelaide, solos de violão elétrico por Carlinhos, uma paródia sobre novelas e versos ditos por mim, e ainda várias cenas alegres interpretadas por nós três. (Celso Guimarães – Revista do Rádio – 1951) Em 1952, o Carlos e eu nos apresentamos durante as comemorações dos 25 anos da Rádio Gaúcha, em Porto Alegre. Também participaram outros cantores da Rádio Nacional. Foi nesse ano que o cantor Francisco Alves morreu em um acidente de carro. Foi uma coisa muito triste. A morte dele deixou todo mundo abalado. Francisco Alves foi um dos maiores cantores do Brasil. O Carlos e eu ficamos muito amigos da família do presidente Juscelino Kubitschek. As filhas dele, Márcia e Maria Estela, gostavam muito da gente. O Carlos dava aula de violão para a Maria Estela. Sempre nos convidavam para jantar. O Bené Nunes também ia muito lá. Na época da construção de Brasília, o presidente nos contratou para fazermos shows para os candangos. Nós viajamos muitas vezes pra lá no avião do Juscelino. Ainda estavam fazendo o Catetinho, então a gente não tinha onde ficar. Por duas vezes, dormimos dentro do avião. O presidente também. Não tinha nada em Brasília ainda, nem iluminação. Ventava muito também. Era só terra. Montanhas de terra vermelha. Quando a gente descia do avião, tinha um carro esperando para nos levar ao local onde a gente ia tocar. Quando a Márcia fez 15 anos, a Primeira-dama, Dona Sara, pediu que o Carlos e eu fôssemos até a casa dela para acordar a menina cantando Beijinho Doce. Ela adorava essa música. Chegamos às 6h30 da manhã. Dona Sara e o presidente vieram nos receber. Fomos para o quarto da Márcia e eu comecei a tocar bem baixinho perto dela. Ela acordou muito surpresa. Que coisa linda, mamãe, eu ser acordada com o Beijinho Doce – disse Márcia. Depois eu cantei Parabéns pra Você. Ela ficou muito feliz. Ainda na década de 1950, o Carlos formou uma orquestra com 28 músicos. No fim do ano, viajávamos muito para fazer apresentações em bailes de formatura. A gente estava sempre correndo porque eu sempre tinha algum filme para fazer também. Eu filmava e depois tinha de sair correndo para fazer show e também para cantar na Rádio Nacional. Em uma viagem que fiz a São Paulo, depois do show, veio um senhor, se ajoelhou nos meus pés, e disse: Senhora, nós estamos com um circo aqui há quase um ano. Todos já foram. Nós estamos com o caminhão quebrado e a lona toda furada. Ninguém vai mais assistir a um espetáculo nosso. Estamos passando fome. Não temos como ganhar dinheiro para ir embora para outra cidade. Tenho quatro filhos pequenos e não tenho como alimentá-los. Ele me pediu para fazer um show no circo pra eles. Quando eu viajava para as turnês, fazia shows todos os dias da semana mas, dessa vez, tivemos um dia de folga que era a segunda-feira. Eu falei pra ele: pode ser na segunda-feira? O homem ficou muito feliz e espalhou pela rua toda. Ele escreveu nas calçadas: Adelaide Chiozzo e Carlos Mattos no circo. Eles arrumaram tudo. Todo mundo ajudou a melhorar o circo, e eu fui lá com o Carlos tocar. O circo lotou. Depois do show, eles disseram: Eu quero agradecer de coração. Deus abençoe esse casal. Eu me despedi deles e, de manhã, antes de ir embora, passei em um supermercado, fiz umas compras e mandei entregar a eles. Algum tempo depois, recebi na Rádio Nacional, uma carta agradecendo. O que eles ganharam deu para consertar o caminhão. Eles levaram o circo para outra cidade e compraram uma lona nova. Eles estavam muito bem. As crianças estavam muito bem alimentadas e eles estavam organizando muito bem a vida deles. Em 1954, participei das comemorações dos 400 anos de fundação da cidade de São Paulo. Toquei a música São Paulo Quatrocentão, feita pelo Chiquinho do Acordeom, junto com Garoto e Avaré. Treinei bastante porque era uma música de difícil execução. Minha apresentação foi em um cinema. O público me aplaudiu de pé e pediu bis. Eu perguntei: essa mesma que vocês querem? Eles responderam: Toca um tango. Paulista gosta muito de tango. Toquei Inspiración (P. Paulus Hijo). Antigamente, nos cinemas tinha um painel de madeira com propaganda que descia depois que acabava o espetáculo. Eu estava tocando, quando o painel começou a descer devagarzinho. Vi o pessoal da plateia levantando e gritando. Eu pensei: nossa, antes de terminar, já estou agradando. Na verdade, eles estavam tentando me avisar que o painel estava descendo e ia bater na minha cabeça. De repente, senti um peso em cima de mim. Eu desmaiei no palco. Os médicos que estavam na plateia vieram me socorrer. Isso ficou muito marcado pra mim também. Aproveitei ao máximo a minha vida nessa época de shows. Porque a gente ganhava muito pouco. Um artista de sucesso tinha de trabalhar muitos anos para conseguir comprar um apartamento. Agora não. Um artista no auge hoje, como eu estava naquela época, com um show consegue comprar. Eles e Elas Durante a década de 1960, Carlos e eu continuamos a fazer shows por todo o Brasil. Nós calculamos pelo mapa, que até aquela época, tínhamos ido a mais de seiscentas cidades do País. Porque fazíamos shows, tanto nas grandes capitais, quanto em lugarejos e vilarejos, onde passavam os filmes. As pessoas queriam ver a gente de perto. A prefeitura contratava e nós íamos. Em 1967, mais ou menos, o Carlos teve a ideia de formarmos um conjunto de rock, ele, eu, nossa filha Cristina e nosso sobrinho Marco Antônio. Adelaide, nós estamos fazendo menos shows. Agora está se usando guitarra. Temos de mudar o nosso repertório e tocar rock, músicas mais agitadas – disse Carlos Mattos. Eu comecei a tocar contrabaixo eletrônico e o Carlos, guitarra. A Cristina tocava guitarra de base e Marco Antonio ficava na bateria. Fizemos muitos shows. O conjunto foi batizado em um programa que o César de Alencar fazia na TV Excelsior. Ele fez um concurso para escolher o nome. Recebemos mais de 400 cartas. O César escolheu dez, colocou em uma sacola e pediu para Cristina tirar um envelope. O nome escolhido foi Eles e Elas. O conjunto fez muito sucesso. A Cristina cantava muito bem em inglês. Eu cantava sambas com ritmo de rock e uma música em italiano. Quando terminava o show, o público gritava assim: Cadê o acordeom, Adelaide? Cadê a sanfona? Está fazendo falta! Então, além de tocar contrabaixo, tinha de tocar o acordeom também. Porque no final do show tinha de cantar o Beijinho Doce. Não tinha jeito. O público exigia. Beijinho Doce virou um clássico da música brasileira e minha marca registrada. Aonde eu vou, tenho que cantar. E o público canta junto. Tanto criança, como adulto. Todos cantam e sabem a letra inteira. Ficamos uns cinco anos fazendo rock. Fizemos shows em várias cidades do interior do Rio de Janeiro, de São Paulo, Minas Gerais e da Bahia. Quando foi acabando a euforia do rock, começaram a entrar as músicas do estilo do Roberto Carlos e da Wanderlea. A gente cantava músicas de todos os cantores que faziam sucesso. Nessa época, gravei uma música lindíssima que o Pedro Paulo de Leoni (ex-presidente da Radiobrás) fez para a esposa dele: Nosso Amor. A gravação foi feita com o coro do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Ainda no fim da década de 1960, participei do programa do Flávio Cavalcanti, na TV Tupi. Fiquei onze meses fazendo a Cantora Misteriosa. Eu tinha muita facilidade para fazer imitações. Eu imitava Isaurinha Garcia, Emilinha Borba, Heleninha Costa, Maysa, Wanderlea e outras. A Cantora Misteriosa tinha de cantar músicas de qualquer compositor que estivesse fazendo sucesso naquele momento. Por exemplo, tinha de cantar uma música gravada pela Wanderlea com a voz da Emilinha, ou uma música da Emilinha, cantando como a Wanderleia. Era meio confuso pra mim, mas consegui fazer todos. Eu entrava toda escondida, mascarada. Depois que terminava o programa, eu também tinha de sair escondida. Era uma loucura. Eu ficava o tempo todo de máscara. O programa foi muito comentado. Pegou fogo. Tinha gente que vinha me perguntar: Você que é artista, Adelaide, não sabe quem está cantando? Eu dizia pra todo mundo que não sabia. Ninguém acertava, porque eu mudava muito a voz. Eu tinha muita facilidade. Hoje não tenho mais. O programa só acabou porque o Flávio Cavalcanti saiu da Tupi. No início da década de 1970, voltei a ter muitos convites para shows em outros estados. Viajei adoidado para Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul. Quando eu ia cantar no Sul, eles colocavam no jornal: A Carinha de Anjo vai Chegar. Não sei por que eles me chamavam de carinha de anjo. Eles eram muito bonzinhos. O pessoal do Sul sempre foi muito educado. Em 1974, participei do programa do Simon Khouri, na Rádio Jornal do Brasil. Era um programa de entrevista. Foi uma coisa muito espontânea. Eu cantava também, e o Carlos me acompanhava no violão. Tudo no estúdio. O Simon disse para mim: Você não pode parar. Você tem muito talento e canta qualquer gênero. Eu respondi: Simon, está todo mundo parado mesmo. Eu cantei músicas românticas e sambas. O programa teve uma repercussão muito grande. Telefonavam pra mim e diziam: Mas que programa bom! Fiquei muito feliz. Eu nunca tinha participado de um programa de entrevista no rádio que agradasse tanto. Um dia, recebi um telefonema do Paulo Terra. Ele ouviu o programa do Simon Khouri e teve a ideia de fazer o show Cada um Tem o Acordeom que Merece. Ele disse: Já estou bolando tudo o que vou fazer. Vai ser uma entrevista com você no palco. Você conta a sua vida e, de vez em quando, toca uma música e canta. Nesse show o Carlos também me acompanhou no violão. A direção musical foi dele. Esse espetáculo fez muito sucesso. Era pra ser uma semana e acabou durando dez meses. Foi no Teatro Miguel Lemos, em Copacabana. Também fizemos algumas apresentações no Teatro Leopoldo Fróes, em Niterói, e no Teatro João Caetano. Lá, eu descia dentro de uma gaiola imensa e saía tocando acordeom e cantando a música Sabiá na Gaiola. Fiquei muito tempo no João Caetano também. Adelaide Chiozzo, de Volta O Mesmo Acordeom, A Mesma Brejeirice. Tudo Como Nos Tempos da Atlântida. O endereço é na Tijuca e, se não fosse o acordeom encostado a um canto da sala, o confortável apartamento de Adelaide Chiozzo não permitiria que se relembrasse a fase áurea das chanchadas, na qual ela foi uma das intérpretes de maior sucesso. Esse ambiente e também sua figura – aparentemente uma elegante dona de casa que prepara com carinho o enxoval da filha – poderão agora sofrer modificações. Vinte anos depois, embora nunca tenha deixado de se apresentar em público, Adelaide e seu marido, o violonista Carlos Mattos, iniciaram na semana passada uma temporada no Teatro Miguel Lemos, em Copacabana. E dois dias antes da estreia, Adelaide dizia sentir uma espécie de volta àquela época em que não havia tempo para nada. Só que com um detalhe: essa é a primeira vez que se apresenta na Zona Sul e isso amedronta, pois o acordeom, como afirmou, está muito marcado como instrumento de roça. (O Globo – 30/07/1975) O espetáculo foi apresentado pela atriz Mirian Pérsia. Eu interpretei músicas de Chico Buarque, Caetano Veloso, Dolores Duran e João Roberto Kelly. Também contei histórias da época da Rádio Nacional e da Atlântida e cantei músicas do meu repertório, como Cabecinha no Ombro, Trenzinho do Amor, Orgulhoso, Meu Sabiá, Recruta Biruta e Beijinho Doce. Nessa época, nós fazíamos muitos shows. Às vezes, tinha quatro shows no mesmo dia. Era uma correria. Uma vez, chegamos para fazer um show em um clube em Vila Isabel, às três da madrugada. Estava todo mundo lá. Ninguém saiu. O clube estava lotado. Em junho de 1977, participei da série de espetáculos Seis e Meia, no Teatro João Caetano, junto com meu marido e com o Ivon Curi. Nesse show, cantei sucessos de Chico Buarque, Luiz Gonzaga, Cartola, entre outros. O espetáculo foi dirigido por Albino Pinheiro. O Ivon Curi também me convidou para participar do programa dele na TV Tupi. Aconteceu uma coisa muito engraçada. Ele falou: Como o seu cabelo está bonito, Adelaide. Como tem brilho. O que você usa? Eu disse a marca do shampoo que usava. O Ivon Curi disse: Adelaide, esse programa é patrocinado por essa marca. Eu fiquei muito assustada. Não sabia. No dia seguinte, recebi em casa uma caixa cheia de produtos. Me telefonaram e fizeram também uma carta de agradecimento dizendo que o que fiz foi a melhor propaganda que eles tiveram. Eles me deram também dez mil cartazes para que eu usasse quando fizesse meus shows. O Carlos continuou comigo, me acompanhando em todos os shows. Ele era um grande violonista. Em 1978, ele participou do concurso Violão de Ouro, da TV Globo. Foram 450 concorrentes. Ele ficou em segundo lugar. O primeiro colocado era estrangeiro, então o Carlos ficou com o título de melhor violonista do Brasil. Ele também passou a dar aulas de violão. Trabalhou na Fundação Estadual de Educação do Menor, onde dava aulas gratuitamente. Em 1980, Eliana e eu fizemos uma temporada de shows no teatro da Funarte, no Rio de Janeiro. Nossas apresentações agradaram muito e fomos convidadas a fazer o Projeto Pixinguinha. Fizemos shows em 40 cidades junto com a dupla Kleiton e Kledir. Eu era a madrinha do Kleiton e a Eliana, do Kledir. Fomos para São Paulo e depois para o Sul. O teatro sempre lotava. As pessoas queriam saber como estavam a Adelaide Chiozzo e a Eliana. Geralmente, o meu público é formado por pessoas de mais idade, que lembram dos programas de rádio e dos filmes. Fomos muito elogiadas porque tivemos um público muito grande e também pelo show que fizemos. O Carlos também fez parte. Ele tocava guitarra. O conjunto que tocou com a gente era dirigido por ele. Tinha de seguir um roteiro. A Eliana e eu contávamos histórias que tinham acontecido com a gente nos filmes. Uma das histórias que a gente contava era de uma cena onde Eliana e eu estávamos amarradas e tinha um lago com jacarés de verdade. O jacaré veio pra cima de nós. Então, o Renato Murce puxou o animal pelo rabo. Eu perguntava para Eliana: será que ele ainda puxa rabo de jacaré? Ela respondia: Claro que puxa! O teatro vinha abaixo. Todo mundo caía na gargalhada. Eu contava algumas histórias da Rádio Nacional também. O texto fui eu que inventei. O público se divertia. Foi muito bom. O show agradou muito. A gente cantava e dançava. Era bem variado. Tinha músicas românticas e engraçadas também. Recebemos o prêmio de melhor show. O Carlos e eu também trabalhamos durante algum tempo como corretores de imóveis. Tinha gente que comprava de olhos fechados porque confiava muito em mim. Eu vendia casas, terrenos e até fazendas. Muita gente comprava também porque era eu que estava vendendo. Eu trabalhei muito. Nós estávamos fazendo poucos shows, então tínhamos de arranjar uma outra forma de sobreviver. Na década de 1990, o cantor Elymar Santos me convidou para desfilar numa escola de samba que estava homenageando ele. Foi muito comentado na época. Depois que passou o carnaval, ele me convidou para fazer uma temporada de shows com ele no Imperator, no Rio de Janeiro, e no Olímpia, em São Paulo. Também fizemos apresentações em Manaus e Santarém. Fiquei quase dois anos trabalhando com o Elymar Santos. Em 1996, me apresentei no espetáculo Ídolos da Atlântida, junto com o cantor Francisco Carlos, no Teatro Dulcina e no João Caetano. O show era dividido em três partes. Começava com o Francisco Carlos cantando músicas do repertório dele. Depois, eu entrava cantando músicas variadas, do Chico Buarque e do Caetano Velloso. A última parte do show, nós fazíamos juntos. Eu entrava cantando a música Recruta Biruta, que eu cantei em Aviso aos Navegantes, com a Eliana. Depois cantava outras músicas do meu repertório. Quando eu terminava de cantar, entrava o Francisco Carlos. Nós sentávamos em um banco, como no filme Garotas e Samba, e cantávamos a música Nossa Toada. Tinha um telão em que passava trechos dos nossos filmes. Nós contávamos as histórias da Atlântida e da Rádio Nacional. Continuo fazendo shows até hoje. Todo ano participo do Carnaval da Cinelândia, no Rio de Janeiro organizado pelo radialista Osmar Frazão. No carnaval 2010, recebi o título de Rainha do Carnaval do Clube Elite. Tenho feito muitos shows em Petrópolis. Canto música junina, rock, samba, todos os gêneros. Meus netos Bruno, Fábio e Roberto me acompanham. As pessoas admiram muito o cuidado que meus netos têm comigo. Eles arrumam o palco, colocam o acordeom em mim, ajustam o microfone e ainda tocam comigo. A maioria do público que vai assistir aos meus shows é formada por pessoas de mais idade, que hoje chamam de Terceira Idade. Elas levam as filhas e as netas para conhecer a artista de que gostavam quando eram jovens. As crianças falam que não querem ir, porque vai ser chato. Mas quando termina o show, a garotada, as mocinhas, os jovens, vêm dizer pra mim: Desculpa, eu pensei que ia ser chato, mas foi o melhor show a que eu já assisti. Me beijam e me abraçam. Por incrível que pareça, meu show agrada aos jovens. Eles ficam meus fãs e convidam os amigos para assistir também. Antigamente, as pessoas me viam nos filmes e ouviam no rádio. Hoje, não. Os jovens vão ao meu show para agradar à avó e acabam ficando encantados e querem voltar. As filhas da cantora Wanderlea assistiram ao meu show uma vez e adoraram. Continuam me chamando para fazer shows, mas não com a mesma frequência que antigamente. No Rio de Janeiro, as coisas estão muito difíceis. Antigamente, o Rio era a terra da cultura, mas agora acabou. Os artistas viajam muito para fazer shows em outros Estados, porque no Rio não tem mais. Estão fechando muita coisa, e os artistas estão perdendo espaço. É lamentável o que a gente vê hoje em dia. Os programas de TV escondem os artistas antigos. Quem mais assiste televisão não são os jovens. São pessoas de idade que ficam em casa e assistem novelas e assistem shows quando é de artista antigo. Nós deveríamos ser mais respeitados, principalmente pelas grandes emissoras de televisão. Deveria ter um quadro, um minuto apenas, em que o artista pudesse aparecer cantando um sucesso. Vários artistas de hoje estão gravando sucessos antigos, mas eles não dizem: essa música foi a Adelaide Chiozzo que lançou. Essa outra música quem cantava era o Francisco Alves, o Silvio Caldas, o Carlos Galhardo, a Emilinha Borba, a Marlene. Eles não fazem isso. Deveriam fazer porque eles teriam mais público do que têm. Gravações As minhas primeiras gravações no Rio de Janeiro foram feitas em 1950, na gravadora Star, que depois virou Copacabana. Eu gravei as músicas Pedalando e Tempo de Criança, com acompanhamento de Alencar Terra (acordeonista). Ao todo, gravei 19 discos de 78 rotações, um LP e um compacto duplo. Quando eu ainda estava em São Paulo, tocando na Rádio Bandeirantes, conheci a dupla Nhô Pai e Nhô Fio. Eles participavam muito do programa dos Irmãos Motta. Nessa época, eles foram a minha casa para me mostrar algumas músicas. Foi quando comecei a cantar a música Beijinho Doce. Cheguei a gravar na Rádio Bandeirantes, em São Paulo, mas infelizmente essa gravação se perdeu. Na época, gravei Beijinho Doce e mais três músicas. Voltei a gravar Beijinho Doce em 1951, em dupla com a Eliana. Apreciamos, desta feita, o disco Star nº 263, de seu último suplemento. Face A: Beijinho Doce, valsa de Nhô Pai, na interpretação da dupla Adelaide Chiozzo – Eliana, tendo no acompanhamento o conjunto liderado por Carlos Mattos. Inegavelmente, não só a melodia, mas também o texto escrito, reúnem atributos louváveis. O comportamento vocal de Adelaide e Eliana é digno de registro. A nosso ver, Adelaide é a verdadeira intérprete no disco. (Revista Carioca – 1951) Na Rádio Record de São Paulo, conheci o Hervê Cordovil. Ele me deu três músicas para gravar: Sabiá na Gaiola, Cabeça Inchada e É Noite Moreno. As músicas eram muito executadas nas rádios mas, quando entravam no cinema, as vendas cresciam muito. Foi assim com Beijinho Doce, Sabiá na Gaiola e muitas outras. Em 1955, quando nasceu minha filha, o compositor Adair Badaró fez uma letra para a música Nós Três (Garoto, Fafá Lemos e Chiquinho do Acordeom), em homenagem a mim, ao Carlos e a Cristina Maria. Nós três vivemos bem Sou eu, você e o nosso neném O nosso mundo é um lar pequenino Onde nós bendizemos Mas que tem tudo, tudo, tudo Que nós mais queremos Pois tem você que é meu bem E tem a graça do nosso neném Felicidade já mora lá em casa Pertinho de nós E o neném é que é portador Desta tão meiga voz... Em 1958, gravei um LP com 12 músicas, intitulado Lar... Doce Melodia. Nesse disco, gravei com uma orquestra e com acompanhamento do Carlos. Como compositora, tenho músicas gravadas pelos cantores Jorge Claudius, Sérgio Murilo, Joelma e José Ricardo. No fim da década de 1960, eu fiz algumas regravações também. Depois que passou a fase do rock, quando estava tudo mais calmo, eu quis gravar algumas músicas fazendo uma voz bem rouca, mais da garganta. Saía lindo no microfone. Eu gravei com o conjunto Os Cariocas. Eles eram os maiores cantores que tínhamos de conjunto vocal no momento. São lembrados até hoje. Eles faziam vozes diferentes. A harmonia era diferente. Era mais americanizado. Quando gravei com Os Cariocas, fiquei numa alegria muito grande. O Carlos foi o responsável pela orquestração. Uma das músicas que gravamos foi a versão da canção Laura. Quando terminamos as gravações, eu agradeci muito a Deus. Eu falei para o Carlos: nós fizemos uma gravação linda. Que beleza, Os Cariocas cantando com a gente. Que coisa linda! O Carlos também ficou muito feliz. Isso vai ser sucesso, Adelaide. Ninguém teve essa ideia de gravar esse gênero. Você cantando quase sussurrando e Os Cariocas fazendo aquele vocalismo lindo atrás. A alegria da gente infelizmente durou muito pouco. No dia seguinte à gravação, o rapaz que tomava conta na parte da manhã na gravadora viu aquele rolo de fita na máquina, apertou um botão e desgravou tudo o que nós tínhamos feito. Estávamos gravando há vários dias para sair perfeito. Perdemos todo o nosso trabalho. Eu cheguei a ficar doente por causa disso. Os Cariocas ficaram muito tristes também. Nós fizemos tudo com muito amor. Nunca saiu tão lindo o nosso vocalismo, como saiu com você – disse o pessoal do conjunto. Eles me chamaram para gravar novamente, mas eu não aceitei. Não ia sair igual. Fiquei muito decepcionada. A gravadora que eu estava nessa época estava muito fraca de divulgação. Quando eu viajava para fazer shows no interior, enchia o avião de caixas de discos e vendia lá. Conseguia vender tudo porque meus discos não chegavam até essas cidades. Devido a essas grandes dificuldades, fiquei muito decepcionada e parei de gravar. Atriz de Novelas Em 1976, minha mãe estava internada em um hospital, porque ela teve um derrame. Eu estava viajando, fazendo uma turnê. Quando cheguei de viagem, larguei as malas feito louca, porque ninguém me avisou. Não queriam me assustar, porque eu dirigia. Fui correndo ver minha mãe. Ela estava hospitalizada em Niterói. Depois, eu a transferi para um hospital no Andaraí. Assim, ela ficou mais perto de mim e eu ia todos os dias lá. As enfermeiras me viam e perguntavam: Por que você não trabalha em televisão? Por que você não faz mais filmes? Toda hora vinha uma enfermeira, em horários diferentes, e todas perguntavam a mesma coisa. Até que minha mãe falou para uma delas: Ela vai fazer uma novela. Vão chamar ela na Globo. Depois que a enfermeira saiu, eu disse: Mãe, a senhora está enganando os outros. Eu não vou fazer novela nenhuma. Ninguém me chamou. Ela respondeu: Vai sim, minha filha. Vai sim. Breve vão te chamar. Minha mãe durou mais uns 15 ou 20 dias. Algum tempo depois, me ligaram da TV Globo pedindo que eu fosse até lá. Chamaram a Eliana também. Fomos juntas. Quando chegamos à Globo, disseram que era para fazer uma novela do Bráulio Pedroso: Feijão Maravilha. Bráulio Pedroso era um grande novelista. Ele foi ver meu show Cada um Tem o Acordeom que Merece sete vezes, e quis fazer uma novela lembrando os filmes da Atlântida. Fizeram uma reunião com todos os artistas que iam participar: Roberto Faissal, Ivon Curi, Anselmo Duarte, José Lewgoy, Grande Otelo, Mara Rúbia e outros. Eu participei junto com a Eliana. Quando deram os nomes dos personagens, eles falaram assim: Eliana, seu nome vai ser Soraia, e você, Adelaide, vai ser a Leonor. Eu levei um susto. Tomei um choque. Leonor era o nome da minha mãe. Eu comecei a chorar e lembrei do que ela falou: Você vai fazer uma novela na Globo. Minha mãe era muito católica. Nunca teve nada a ver com espiritismo. Não consegui entender como ela teve esse pressentimento. Eu só sei dizer que quando eu cheguei lá me deram o nome da minha mãe. Participar dessa novela foi uma surpresa muito grande pra mim. Eliana e eu fazíamos duas personagens que diziam que eram artistas antigas. Eu falava para a Eliana: lembra daquele filme que nós fizemos? Nessa novela, nós contracenamos também com a Elisangela, que fazia minha filha, e com a Lucélia Santos, que era filha da personagem da Eliana. Eu queria que a Elisangela fosse artista, que tocasse acordeom também, mas ela queria ser baterista. A novela agradou muito porque lembrava os filmes antigos da Atlântida. As pessoas também queriam ver como os artistas estavam. Foi uma vitória. Na história, nossas personagens queriam voltar para o mundo artístico. A personagem da Eliana dizia assim: Ah, eu estou desanimada. Não quero mais. A minha dizia: Não fala uma coisa dessas! Nós ainda temos muita coisa pra fazer. Vamos procurar nossos empresários. No decorrer da novela, fui ficando descontente. Eles botavam a gente só para fazer coisa ruim. Por exemplo, a gente ia procurar os empresários antigos e eles já estavam bem velhinhos, tremendo. Eu fui à casa do Bráulio Pedroso falar com ele: só está acontecendo coisas ruins pra nós. Isso não vai servir pra gente fazer shows depois. Ele falou assim: pode deixar que eu vou melhorar a história. Alguns dias depois, ele me chamou: Adelaide, eu quero que você cante. Era uma música de discoteca, que estava na moda no momento. Ele me deu várias músicas para eu ouvir e escolher. Eu não gostei de nenhuma delas e resolvi eu mesma fazer uma: Escute aqui Não adianta me pedir perdão Me libertei E não quero mais escravidão Tirei você Totalmente do meu coração É tarde Já não dou o meu perdão Fizeram um cenário lindo. Botaram um vestido bem rodado em mim e na Eliana. Porque a gente tinha de terminar a novela alegre, e não triste, chorando. Os outros personagens diziam: Puxa, elas estão de volta, e jovens ainda... E assim terminou a novela. Em 1986, fiz uma participação especial na novela Cambalacho, junto com o Ivon Curi. Foi o Silvio de Abreu que me telefonou e me convidou para a novela. A Emilinha Borba e o Francisco Carlos também participaram. As cenas foram filmadas no Hotel Glória. Foi uma participação pequena. Fizemos só duas cenas. Em 1992, recebi outro convite do Silvio de Abreu. Desta vez para integrar o elenco da novela Deus nos Acuda. Minha personagem chamava-se Juscelina e trabalhava em uma casa de milionários. Era uma novela muito engraçada. Eu contracenava com a Aracy Balabanian. Ela fazia a dona Armênia. Contracenei também com a Cláudia Raia, a Marieta Severo, Fernanda Rodrigues, Glória Menezes, Francisco Cuoco, Maria Claudia e Gracindo Jr. Foi muito bom participar dessa novela. Eu falava que era cantora antiga. A dona Armênia dizia: Você tocava sanfona. A Juscelina dizia: Sanfona, não! Acordeom! Achavam muita graça. A direção era do Jorge Fernando. Durante as gravações dessa novela, aconteceu uma coisa muito triste. Eu estava filmando com o ator Raul Gazolla, quando ele recebeu a notícia de que a esposa dele (a atriz Daniella Perez) havia sido assassinada. Essa foi minha última participação em uma novela. Eu fiquei muito feliz por ter sido lembrada pelo Sílvio de Abreu, um grande amigo, a quem admiro muito. Uma Verdadeira Estrela Dizem que eu tenho mania de criar duplas para contar minhas histórias. Dois personagens que se complementam na trama, um dando a deixa para o outro compor a piada, incrementar a verve, dar ritmo à cena. É verdade. Nada mais gostoso do que escrever esse encadeamento cênico. Nada mais prazeroso do que assistir a dois grandes atores nessas pegadas. Um dando a mão ao outro, numa corrida lúdica de talento e carisma. Como fã das comédias da Atlântida, essa minha mania deve ter começado quando eu me deliciava com as dobradinhas das meninas da Atlântida, Eliana Macedo e Adelaide Chiozzo. Adelaide, a amiga predileta de todas as garotas daquela época, quando seu acordeom embalava Pedalando, Beijinho Doce, Sabiá na Gaiola, muitas vezes ao lado da primeira namoradinha do Brasil, a mocinha Eliana e seu violão. Um mágico encantamento invadia os filmes de Watson Macedo. A história se desenrolava quando as duas amigas entravam em cena e trocavam confidências para se livrarem das trapalhadas de Oscarito/Grande Otelo ou das cantadas ingênuas de Ivon Curi (ah, o príncipe!), das investidas românticas de Francisco Carlos e das monstruosas vilanias de José Lewgoy e Jece Valadão... Uma atração que lotava os cinemas de fãs encantados com a sua espontaneidade e brejeirice, como se dizia na época... O que ninguém suspeitava é que a paulistana do Brás, morando nos anos 1950 em Niterói, atravessava a barca ao lado de Eliana, sua vizinha, carregando o pesado acordeom de muitos baixos. Coisas das estrelas da Atlântida. Tive o prazer de homenageá-la duas vezes. Adelaide já reviveu os tempos da Atlântida em uma participação mais do que carinhosa em Cambalacho (1986,) e também, como Watson Macedo, tive o prazer de criar um personagem só para ela em Deus nos Acuda (1992–93), Dona Juscelina, inquilina na predinha de dona Armênia. É um privilégio poder conhecer mais de perto a história dessa atriz, cantora, a rainha do acordeom de muitos baixos. Não só a melhor amiga de Eliana, mas, principalmente, uma grande personalidade, uma voz afinadíssima, uma verve e um carisma como não se encontra mais. Nos tempos em que vivemos, em que cometas passam rápidos, sem deixar vestígio ou saudade, é reconfortante saber que as verdadeiras estrelas brilham para sempre. Silvio de Abreu Uma Grande Perda Em 1992, quando eu estava fazendo a novela Deus nos acuda, o Carlos já estava doente. O médico já tinha dito pra mim. Ele estava com mal de alzheimer. Ficou doente mais de dez anos. Nessa época, ele pediu a uma amiga nossa, a Alice Vianna, para me acompanhar nos shows. A Alice era muito fã da Emilinha Borba. Ela estava sempre com a Emilinha e virou minha amiga também. O Carlos a chamou aqui em casa e disse: Alice, eu não estou mais conseguindo tocar violão. Eu não sei o que é. Minhas mãos parecem que estão diferentes. Faz uma coisa pra mim? Acompanha a Adelaide em todos os lugares que ela for. Ela nunca ficou sozinha, ela pode se atrapalhar. Eu não sei. Tenho medo de que aconteça alguma coisa. A Alice foi muito bacana comigo. É minha grande amiga. Até hoje, ela me acompanha a todos os lugares que vou. Já viajou comigo para mais de trinta cidades. Outra amiga que me acompanhou muito foi a Fernanda Caetano, que era minha vizinha. Ela passou a viajar comigo quando o Carlos ficou doente. Ele tinha picos. De vez em quando, lembrava de alguma coisa. Falava tudo direitinho, nem parecia que estava doente. Depois, ele foi esquecendo tudo, piorando, não lembrava mais quem eu era, não conhecia mais a filha, nem os netos. O Carlos ficou três anos e meio internado em uma clínica. Na época em que ele ficou internado, eu trabalhei muito. Deus fez com que eu tivesse muito trabalho, porque eu precisava cuidar do Carlos. O tratamento era muito caro. Em 1999, eu fiz uma temporada de dez dias no Teatro João Caetano. Quem me ajudou foi o Agnaldo Timóteo. Ele fez o show junto comigo. Nessa época, quem me ajudou muito também foi o Maurício Silva, que é meu tecladista até hoje. Eu levava o Carlos para o teatro, mas ele ficava o tempo todo perguntando onde estava e que lugar era aquele. Depois, ele passou a levar a guitarra, e o meu neto Bruno ficava guiando ele, posicionando as mãos dele para fazer os acordes. O Bruno também me acompanhou nesse show tocando contrabaixo. Eu ia todos os dias ao hospital ficar com o Carlos. Eu chegava de viagem, às vezes sem dormir, sem comer, mas eu corria pra lá. Eu sentia saudade e ficava com medo de acontecer alguma coisa com ele e eu não estar perto. Ele faleceu no dia 1º de novembro de 2006. Eu fiquei muito desorientada. Demorei muito a me recuperar. Aos poucos, fui retomando as atividades artísticas, mas sinto muito falta do violão do Carlos e dos sons que ele tirava da guitarra. Eu amava loucamente o meu marido. Fomos sempre muito felizes durante todos os anos em que vivemos juntos. O Palco é o Meu Chão Eu sinto saudade de tudo. Até do cheiro. Não sei. Tinha um cheiro gostoso no ar. Tenho saudade dos meus companheiros. Como eu tenho saudade de Oscarito, Grande Otelo, Ivon Curi, Francisco Carlos, Emilinha Borba... Sinto muita falta da Eliana também. Ela foi minha companheira, minha amiga. Tenho saudade do Watson Macedo, do Roberto Faria, do Edgard Brasil (ele era responsável pela iluminação), o Cajado (que fazia os cenários). Eu lembro de todos eles com muita saudade. Bené Nunes, Anselmo Duarte, Cyll Farney. Às vezes tenho saudade e tristeza também por não ter feito certas coisas que eu deveria ter feito na minha vida artística. Eu não sei como venci na minha carreira. Meu pai me proibia de tudo. O meu marido tinha a mesma mentalidade e, apesar de tudo, consegui sobreviver no mundo artístico. Até hoje eu trabalho. Tenho recebido muitas homenagens também. Eu tenho saudade e agradeço a Deus por eu ter ultrapassado toda essa vigilância que eles tinham comigo. Não precisava de nada disso. Porque quando a pessoa nasce com um dom, seja ele qual for, não tem pai, não tem mãe, não tem ninguém que segure. Eu gostava de ser dona de casa e mãe dedicada. Porque eu gostava de tudo assim. Era como tinha de ser feito. Muitas vezes eu tenho saudade de ter de aceitar tudo pra poder viver. Não faz esse filme, porque eu não quero. Não faz esse teatro, porque tem de dar um abraço... Deixei de fazer muita coisa. Porque tinha cena em que eu tinha de sentar na cama, conversar na cama com o namorado, e meu pai não permitia. Tudo era proibido. Meu pai queria saber a história antes de começar a filmar, senão eu não podia fazer. O meu marido também era assim. E já avisava: Não quero que tenha beijo. Não quero que apareçam as pernas. Não quero cena sentada na cama com namorado. Eu superei isso tudo. Deus me ajudou muito. Se fosse hoje, eu não poderia fazer nada. Minha mãe foi muito especial para a minha vida artística. Ela fez muitos sacrifícios na vida para poder me ajudar. Ela fazia comida de madrugada para deixar tudo pronto para o dia seguinte, só para poder ir comigo para a rádio. Minha mãe era uma batalhadora. Ela fez tudo por mim. Eu dizia: mãe, eu quero ser artista. Eu gosto de ser artista. Papai ficava proibindo. Tinha vezes em que Afonso e eu já estávamos prontos para sair, cada um com seu acordeom, e ele dizia: ninguém sai daqui hoje. E a gente perdia. Minha irmã Carolina acha que ele fazia isso porque queria ir tocar junto com a gente, mas não podia. Eu fico com muita saudade daquela época, mas ao mesmo tempo fico pensando: Por que eu não nasci depois? Porque a gente perde muito tempo com bobagem. A gente perde muito tempo de viver, de ser feliz. Não vou dizer que não sou feliz, que não fui feliz. Fui feliz com meu marido a minha maneira, aceitando tudo. Nunca fiquei revoltada. Talvez agora, do jeito que o mundo está, eu ficasse. Mas naquele tempo, a gente tinha de aceitar. Sou feliz porque tenho minha filha, minha companheira. Tenho três netos, que são três homens maravilhosos. Eles também são músicos e tocam comigo. Isso é uma coisa que faz bem pro meu ego. O Bruno é incrível. Ele toca violão, guitarra e teclado. O Fábio toca cavaquinho e o Roberto toca violão e bateria divinamente. Minha filha também podia seguir, mas ela nunca quis saber disso. Ela diz: Mãe, eu me sinto mal no palco. Eu sou outra pessoa no palco. Eu me sinto mal, não gosto. É sinal de que a pessoa não gosta do chão do palco. Eu, por exemplo, me sinto bem pisando no palco. Aquele é o meu chão. Tem pessoas que sobem no palco e ficam tremendo, não sabem o que fazer, ficam nervosas, no início principalmente. Eu nunca fiquei. Sempre me sentia segura do que ia fazer. Graças a Deus, realmente, o chão do palco é o meu chão. Discografia Lar... Doce Melodia Copacabana – CLP 11035 (1958) Acompanhamento: Carlos Mattos, Conjunto e Orquestra As músicas Vá embora, Pagode em Xerém e Meu Veleiro são cantadas por Adelaide Chiozzo. As demais são interpretadas por ela no acordeom. Lado A 1. Viagem à Cuba (I. Fields / H. Ithier) 2. Vá Embora (Geraldo Cunha / Carlos Mattos) 3. Night and Day (Cole Porter) 4. É Samba (Vicente Paiva / Luis Iglesias / Walter Pinto) 5. Inspiración (Peregrino Paulos / Luis Rubistein) 6. Deixa Comigo (Índio do Cavaquinho) Lado B 1. Pagode em Xerém (Alcebíades Barcelos “Bide” / Sebastião Gomes) 2. Icaraí (Silvio Viana) 3. Padam Padam (Henri Contet / Norbert Glanzberg) 4. Dance Avec Moi (F. Lopes / A. Hornez) 5. Meu Veleiro (Lina Pesce) 6. Granada (Agustin Lara) 78 RPM Copacabana – 5.898 (1958) 1. Ele Esqueceu (Luis Lemos / Carlos Mattos) – Valsa 2. Cabecinha no Ombro (Paulo Borges) – Rasqueado Nesse disco, Adelaide cantou com a irmã Sylvinha Chiozzo Copacabana – 5.750 (1957) 1. Nossa Toada (Carlos Mattos / Luis Carlos) – Toada 2. Trenzinho do Amor (Sivan Castelo Neto / Lita Rodrigues) – Baião Revista Radiolândia Copacabana – 5.713 (1957) 1. A Sempre Viva (Paulo Gracindo / Mirabeau) – Marcha 2. Tua Companhia (Lourival Faissal / Getúlio Macedo) – Marcha Copacabana – 5.640 (1956) 1. Meu Papai (Getúlio Macedo / Lourival Faissal) – Valsa 2. Menina não Joga Pedra (Luis de Souza / Carlos Mattos) – Valsa Copacabana – 5.590 (1956) 1. Papel Fino (Mirabeau / Cid Ney / Don Madrid) – Baião 2. Vamos Soltar Balão (Luis Gonzaga Lins) – Marcha Copacabana – 5.470 (1955) 1. Passeio de Bonde (Bruno Marnet) – Fox 2. Nós Três (Fafá Lemos / Chiquinho do Acordeom / Garoto) – Baião Copacabana – 5.332 (1954) Adelaide Chiozzo e Eliana 1. Beijinho Doce (Nhô Pai) – Valsa 2. Cabeça Inchada (Hervé Cordovil) – Baião Copacabana – 5.248 (1954) 1. Casório lá no Arraiá (Getúlio Macedo / Lourival Faissal) – Valsa 2. Vai Comendo Raimundo (Petrus Paulus / Ismael Augusto) – Baião Copacabana – 5.201 (1954) 1. Meu Sabiá (Carlos Mattos / A. Amaral) – Toada 2. Tempinho Bom (Mário Zan / Sereno) – Rancheira Copacabana – 5.026 (1953) Adelaide Chiozzo e Eliana 1. Queria ser Patroa (Aldari de Almeida Airão / Manoel Pinto) – Marcha 2. Com Pandeiro na Mão (Manoel Pinto / D. Airão / Jorge Gonçalves / D. Airão / Jorge Gonçalves) – Samba Copacabana – 5.024 (1953) 1. Mais uma Bica no Morro (Heber Lobato / Manoel Pinto / Airão) – Samba 2. Meu Lamento (Lourival Faissal / Sebastião Lima / Marinho Lima) – Samba Star – 367 (1952) 1. É Noite, Morena (Hervé Cordovil / René Cordovil) – Baião 2. Minha Casa (Joubert de Carvalho) – Baião Star – 356 (1952) 1. Para Bombardeiro (Manoel Pinto / Aldari De Almeida Airão) – Baião 2. Cada Balão uma Estrela (Zé Violão / Carrapicho) – Marcha Star – 345 (1952) Adelaide Chiozzo e Eliana 1. Zé da Banda (Alencar Terra) – Polca 2. Vapô de Carangola (Manezinho Araújo / Fernando Lobo / Fernando Lobo) – Coco Star – 311 (1951) 1. Lá vem seu Tenório (Manoel Pinto / Aldari de Almeida Airão) – Marcha 2. Noite de Lua (Chocolate / Lourival Faissal) – Marcha Star – 264 (1951) Adelaide Chiozzo e Eliana 1. Sabiá lá na Gaiola (Hervé Cordovil / Mário Vieira / Mário Vieira) – Baião 2. Orgulhoso (Mário Zan / Nhô Pai) – Rasqueado Star – 263 (1951) 1. Beijinho Doce (Nhô Pai) – Valsa 2. Cabeça Inchada (Hervé Cordovil) – Baião Star – 194 (1950) 1. Venho de Minas (J. Portela /Alencar Terra) – Rancheira 2. A Saudade não me Deixa (Jorge Tavares / Nestor de Hollanda) – Baião Star – 192 (1950) 1. Pedalando (Bené Nunes / Anselmo Duarte) – Polca 2. Tempo de Criança (João de Souza / Ely Turquino) – Rancheira Acompanhamento de Alencar Terra Compacto Duplo 1970 A Cantora Misteriosa Lado A 1 Sonho de Maria Rosa (Ari Serrano / Jurandir Chamusca) 2 Eu te Perdi (Sylvinha e Adelaide Chiozzo) Lado B 1. Tempos de Outrora (Sylvinha e Adelaide Chiozzo) 2. Nosso Amor (Pedro Paulo de Leoni) Participações em outros discos CD 2003 Emilinha Pinta e Borba Adelaide canta com Emilinha Borba a música Morena de Angola (Chico Buarque) LP 40 Anos da Rádio Nacional Philips 6349 303 / 4 (1976) Nós Três (Fafá Lemos / Chiquinho do Acordeom / Garoto) Acompanhamento de Carlos Mattos Assim era a Atlântida Philips 6349 163 (1976) . Pedalando (Bené Nunes /Anselmo Duarte) . Recruta Biruta (Antônio Almeida / Alberto Ribeiro / Antônio Nássara) Com Eliana . Beijinho Doce (Nhô Pai) Com Eliana Alma do Sertão Copacabana CLP 11670 (1972) . Pingo D’água (Raul Torres / João Pacífico) Com Eliana . Campo Grande (Raul Torres) Com Eliana Lina Pesce – Seus Grandes Sucessos Copacabana CLP 11471 (1966) – Meu Veleiro (Lina Pesce) Festas Juninas (1957) Copacabana CLP 2032 (1957) – Papel Fino (Mirabeau / Cid Ney / Don Madrid) – Baião Carnaval de 57 – nº 1 Copacabana CLP 10005 (1957) – A Sempre Viva (Paulo Gracindo / Mirabeau) Show Copacabana nº 1 Copacabana CLP 2000 (1955) Beijinho Doce (Nhô Pai) Com Eliana Coletâneas CD Tempinho Bom (2001) Revivendo RVCD 160 1. Beijinho Doce (Nhô Pai) Com Eliana 2. Nós Três (Fafá Lemos / Chiquinho do Acordeom / Garoto) 3. Meu Sabiá (Carlos Mattos / A. Amaral) 4. Tempinho Bom (Mário Zan / Sereno) 5. Minha Casa (Joubert de Carvalho) 6. Zé da Banda (Alencar Terra) Com Eliana 7. Cada Balão uma Estrela (Zé Violão / Carrapicho) 8. É Noite, Morena (Hervé Cordovil / René Cordovil) 9. Com Pandeiro na Mão (Manoel Pinto / D. Airão / Jorge Gonçalves) Com Eliana 10. Casório lá no Arraiá (Getúlio Macedo / Lourival Faissal) 11. Pedalando (Bené Nunes / Anselmo Duarte) 12. Vai Comendo Raimundo (Petrus Paulus / Ismael Augusto) 13. Orgulhoso (Mário Zan / Nhô Pai) Com Eliana 14. Papel Fino (Mirabeau / Cid Ney / Don Madrid) 15. Queria ser Patroa (Aldari De Almeida Airão / Manoel Pinto) Com Eliana 16. Vapô de Carangola (Manezinho Araújo / Fernando Lobo) Com Eliana 17. Cabeça Inchada (Hervé Cordovil) Com Eliana 18. Tempo de Criança (João de Souza / Ely Turquino) 19. Nossa Toada (Carlos Mattos / Luis Carlos) 20. Meu Papai (Getúlio Macedo / Lourival Faissal) 21. Sabiá lá na Gaiola (Hervé Cordovil / Mário Vieira) Com Eliana Composições gravadas 1979 – Escute Aqui (Adelaide Chiozzo / Carlos Mattos) Cantor: Jorge Claudius – Vida Inteira (Jorge Mario de Castro e Adelaide Chiozzo) Cantor: Jorge Claudius - 1972 1o Festival de Serestas de Nova Iguaçú – Vida inteira (Jorge Mario de Castro e Adelaide Chiozzo) Cantor: Jorge Claudius – Confissão (Adelaide Chiozzo / Sylvinha Chiozzo) Cantor: Nuno Roland – Eterna Paixão (Adelaide Chiozzo / Carlos Mattos) Cantor: José Ricardo – Minha Amargura (Sylvinha / Adelaide Chiozzo) Cantor: José Ricardo – Por mim vai Chorar (Sylvinha Chiozzo / Adelaide Chiozzo) Cantor: Sérgio Murilo – Pra que Sonhar (Adelaide Chiozzo / Carlos Mattos) Cantora: Joelma 1966 Filmografia 1974 Assim era a Atlântida Direção: Carlos Manga Documentário sobre as chanchadas da Atlântida, com depoimentos dos atores e cenas dos filmes. 1957 Garotas e Samba Atlântida Cinematográfica Direção: Carlos Manga Elenco: Renata Fronzi, Sônia Mamede, Francisco Carlos, Zé Trindade, Jece Valadão, Zezé Macedo, César Ladeira, Pituca, Ivon Curi, Cyll Farney, Berta Loran, Suzy Kirby, Terezinha Morango, Nora Ney, Rui Rey, Jorge Goulart, Emilinha Borba, Joel de Almeida, César de Alencar, Isaurinha Garcia, Venilton Santos. 1956 Genival é de Morte Flama Filmes Direção: Ronaldo Lupo Elenco: Ronaldo Lupo, Zé trindade, Humberto Catalano, Tereza Raquel, Wilza Carla, Afonso Stuart, Ítala Ferreira, Carlos Mattos, Lea Coutinho, Vicente Marcheli, Sidália Salles, Ballet de Marlene Adamo. Sai de Baixo Herbert Richers Direção: J. B. Tanko Elenco: Carequinha, Fred Villar, Renato Restier, Norma Blum, Paulo Monte, Costinha, Older Cazarré, Luiz Teles, Wilma Faria, Valdo César, Perpétuo Silva, Aracy Cardoso, Ivon Curi, Oficiais do Corpo de Paraquedistas do Exército. 1954 O Petróleo é Nosso Vita Filmes Direção: Watson Macedo Elenco: Violeta Ferraz, Humberto Catalano, Heloísa Helena, Mary Gonçalves, Nancy Wanderley, Pituca, John Herbert, Consuelo Leandro, Berta Rosanova, Emilinha Borba, Gilda Valença, Virgínia Lane, Linda Batista, Rui Rey e sua Orquestra. Malandros em Quarta Dimensão Atlântida Cinematográfica Direção: Luiz de Barros Elenco: Grande Otelo, Cole Santana, Julie Bardot, Jaime Costa, Adriano Reis, Wilson Grey, Carlos Tovar, Gina Monte, Black-out, Dick Farney Filme produzido com números musicais que sobraram de Carnaval na Atlântida. Adelaide Chiozzo interpreta Beijinho Doce. 1952 É Fogo na Roupa Produções Watson Macedo Direção: Watson Macedo Elenco: Ankito, Violeta Ferraz, Heloísa Helena, Ivon Curi, Bené Nunes, Lúcia Regina, Osvaldo Elias, Gilma Coelho, Antonio Spina. 1951 Aí Vem o Barão Atlântida Cinematográfica Direção: Watson Macedo Elenco: Oscarito, Eliana, José Lewgoy, Cyll Farney, Ivon Curi, Luiza Barreto Leite, Antônio Nobre, Belmonte, Francisco Dantas, Félix Batista, João Martins, Lídio Costa, Leonil Saraiva e Bené Nunes. Barnabé Tu És Meu Atlântida Cinematográfica Direção: José Carlos Burle Elenco: Oscarito, Grande Otelo, Fada Santoro, José Lewgoy, Cyll Farney, Emilinha Borba, Renato Restier, Pagano Sobrinho, Berliet Jr., Jece Valadão, Bené Nunes, Vera Lúcia, Francisco Carlos, Ivon Curi, Marion, Rui Rey, Bill Far e Mary Gonçalves. 1950 Aviso aos Navegantes Atlântida Cinematográfica Direção: Watson Macedo Elenco: Oscarito, Grande Otelo, Anselmo Duarte, Eliana, José Lewgoy, Sérgio de Oliveira, Ivon Curi, Mara Rios, Cuquita Carballo, Zezé Macedo, Dalva de Oliveira, Emilinha Borba, Elvira Pagã. 1949 Carnaval no Fogo Direção: Watson Macedo Elenco: Oscarito, Grande Otelo, Anselmo Duarte, Eliana, José Lewgoy, Rocir Silveira, Modesto de Souza, Geraldo Gamboa, Francisco Dantas, Jorge Goulart, Marion, Elvira Pagã, Rui Rey, Cuquita Carballo. E o Mundo se Diverte Direção: Watson Macedo Elenco: Oscarito, Grande Otelo, Eliana, Humberto Catalano, Modesto de Souza, Alberto Miranda, Carmen Gonzáles, João Silva, Luiz Cataldo, Quitandinha Serenaders, Alvarenga e Ranchinho, Luiz Gonzaga, Horacina Corrêa, Luis Americano, Aracy Costa. 1948 É com Esse que eu Vou Direção: José Carlos Burle Elenco: Oscarito, Grande Otelo, Humberto Catalano, Marion, Heloísa Helena, Madame Lou, Jorge Murad, Antonio Spina, Solange França, Mara Rúbia, Paulo Wanderley, Marly Sorel, Luiz Cataldo, Ferreira Leite, Carmen Gonzales, Luiz Gonzaga, Emilinha Borba, Rui Rey, Ivon Curi, Ciro Monteiro, Horacina Corrêa, Alvarenga e Ranchinho, Quitandinha Serenaders. 1947 Este Mundo é um Pandeiro Direção: Watson Macedo Elenco: Oscarito, Humberto Catalano, Olga Latour, Marion, César Fronzi, Yolanda Fronzi, Grande Otelo, José Vasconcelos, Horacina Corrêa, Luiz Gonzaga, Bob Nelson, Emilinha Borba, Quitandinha Serenaders. Novelas 1992 Deus nos Acuda (Juscelina) Autor: Silvio de Abreu Direção: Jorge Fernando 1986 Cambalacho Autor: Silvio de Abreu Direção: Jorge Fernando e Del Rangel 1979 Feijão Maravilha (Leonor) Autor: Bráulio Pedroso Direção: Paulo Ubiratan Fontes consultadas Arquivo da Rádio Nacional do Rio de Janeiro Livros ALVIM, Zuleika M. F. Brava Gente! Os Italianos em São Paulo. 2ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1986. AUGUSTO, Sérgio. Este Mundo é um Pandeiro: a chanchada de Getúlio a JK. São Paulo: Cia. das Letras, 2005. HUPFER, Maria Luisa Rinaldi. As Rainhas do Rádio: Símbolos da Nascente Indústria Cultural Brasileira. São Paulo: Senac Editoras, 2009. PINHEIRO, Claudia. A Rádio Nacional. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. SAROLDI, Luiz Carlos; MOREIRA, Sônia Virgínia. Rádio Nacional: o Brasil em sintonia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005. Periódicos Revista do Rádio, Carioca, Radiolândia, Revista do Disco, Manchete, A Cena Muda, O Globo, Jornal do Brasil, A Noite, A Noite Ilustrada, Folha de Minas, O Estado do Pará e Folha de São Bernardo. Colaboração Sandra Ciocci – Pesquisa na Cinemateca Brasileira, em São Paulo. Depoimento de Carlos Manga sobre o filme Garotas e Samba Agradecimentos Alberto Luiz (Arquivo e Pesquisa – Rádio Nacional do Rio de Janeiro) Arquimedes Lima Esther Kupperman Geraldo José de Paula Marcos Gomes (Coordenador da Rádio Nacional do Rio de Janeiro) Olinda Marques Créditos fotográficos Acervo Rádio Nacional Demais imagens pertencem ao acervo Adelaide Chiozzo A Editora agradece quaisquer informações sobre os detentores dos direitos das imagens não creditadas neste livro, bem como de pessoas não identificadas nas fotografias, apesar dos esforços envidados para obtê-las. Coleção Aplauso Série Música Coordenador geral Rubens Ewald Filho Projeto gráfico Via Impressa Design Gráfico Direção de arte Clayton Policarpo Paulo Otavio Editoração Douglas Germano Emerson Brito Tratamento de imagens José Carlos da Silva Revisão Simone de Marco CTP, impressão e acabamento Imprensa Oficial do Estado de São Paulo © Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012 Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Rodrigues, Patricia Adelaide Chiozzo, o acordeon e o beijinho doce/ Patricia Rodrigues – São Paulo : Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012. 220p. : il. – (Coleção aplauso. Série música / Coordenador geral Rubens Ewald Filho) ISBN: 978-85-401-0017-6 1. Música popular – Brasil – História e crítica 2. Música sertaneja 3.Cantoras – Brasil 4. Chiozzo, Adelaide, 1931 I. Ewald Filho, Rubens. II. Título. III. Série. CDD 780. 92 Índice para catálogo sistemático: 1. Brasil : Cantoras : Biografia 780.92 Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização prévia do organizador e dos editores Direitos reservados e protegidos (lei no 9.610, de 19.02.1998) Foi feito o depósito legal na Biblioteca Nacional (lei no 10.994, de 14.12.2004) Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, em vigor no Brasil desde 2009 Impresso no Brasil 2012 Imprensa Oficial do Estado de Sao Paulo Rua da Mooca, 1.921 Mooca 03103-902 Sao Paulo SP Brasil sac 0800 01234 01 sac@imprensaoficial.com.br livros@imprensaoficial.com.br www.imprensaoficial.com.br GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO Governador Geraldo Alckmin Secretário Chefe da Casa Civil Sidney Beraldo Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Diretor-presidente Marcos Antonio Monteiro Formato 21 x 26cm Tipologia Chalet Comprime e Univers Papel capa triplex 250g/m2 Papel miolo offset 120g/m2 Número de páginas 220 ...........