Carro de Paulista – Dos Palcos ao Cinema na TV Carro de Paulista – Dos Palcos ao Cinema na TV Texto teatral de Mário Viana e Alessandro Marson Roteiro para o cinema de Dagomir Marquezi São Paulo, 2010 Governador Alberto Goldman GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO Governador Alberto Goldman Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Diretor-presidente Hubert Alquéres Coleção Aplauso Coordenador Geral Rubens Ewald Filho No Passado Está a História do Futuro A Imprensa Oficial muito tem contribuído com a sociedade no papel que lhe cabe: a democratização de conhecimento por meio da leitura. A Coleção Aplauso, lançada em 2004, é um exemplo bem-sucedido desse intento. Os temas nela abordados, como biografias de atores, diretores e dramaturgos, são garantia de que um fragmento da memória cultural do país será preservado. Por meio de conversas informais com jornalistas, a história dos artistas é transcrita em primeira pessoa, o que confere grande fluidez ao texto, conquistando mais e mais leitores. Assim, muitas dessas figuras que tiveram importância fundamental para as artes cênicas brasileiras têm sido resgatadas do esquecimento. Mesmo o nome daqueles que já partiram são frequentemente evocados pela voz de seus companheiros de palco ou de seus biógrafos. Ou seja, nessas histórias que se cruzam, verdadeiros mitos são redescobertos e imortalizados. E não só o público tem reconhecido a importância e a qualidade da Aplauso. Em 2008, a Coleção foi laureada com o mais importante prêmio da área editorial do Brasil: o Jabuti. Concedido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), a edição especial sobre Raul Cortez ganhou na categoria biografia. Mas o que começou modestamente tomou vulto e novos temas passaram a integrar a Coleção ao longo desses anos. Hoje, a Aplauso inclui inúmeros outros temas correlatos como a história das pioneiras TVs brasileiras, companhias de dança, roteiros de filmes, peças de teatro e uma parte dedicada à música, com biografias de compositores, cantores, maestros, etc. Para o final deste ano de 2010, está previsto o lançamento de 80 títulos, que se juntarão aos 220 já lançados até aqui. Destes, a maioria foi disponibilizada em acervo digital que pode ser acessado pela internet gratuitamente. Sem dúvida, essa ação constitui grande passo para difusão da nossa cultura entre estudantes, pesquisadores e leitores simplesmente interessados nas histórias. Com tudo isso, a Coleção Aplauso passa a fazer parte ela própria de uma história na qual personagens ficcionais se misturam à daqueles que os criaram, e que por sua vez compõe algumas páginas de outra muito maior: a história do Brasil. Boa leitura. Alberto Goldman Governador do Estado de São Paulo Coleção Aplauso O que lembro, tenho. Guimarães Rosa A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa Ofi cial, visa resgatar a memória da cultura nacio nal, biografando atores, atrizes e diretores que compõem a cena brasileira nas áreas de cine ma, teatro e televisão. Foram selecionados escritores com largo currículo em jornalismo cultural para esse trabalho em que a história cênica e audiovisual brasileiras vem sendo reconstituída de ma nei ra singular. Em entrevistas e encontros sucessivos estreita-se o contato en tre biógrafos e bio gra fados. Arquivos de documentos e imagens são pesquisados, e o universo que se reconstitui a partir do cotidiano e do fazer dessas personalidades permite reconstruir sua trajetória. A decisão sobre o depoimento de cada um na primeira pessoa mantém o aspecto de tradição oral dos relatos, tornando o texto coloquial, como seo biografado falasse diretamente ao leitor . Um aspecto importante da Coleção é que os resul ta dos obtidos ultrapassam simples registros biográ ficos, revelando ao leitor facetas que também caracterizam o artista e seu ofício. Bió grafo e biogra fado se colocaram em reflexões que se estende ram sobre a formação intelectual e ideo ló gica do artista, contex tua li zada na história brasileira. São inúmeros os artistas a apontar o importante papel que tiveram os livros e a leitura em sua vida, deixando transparecer a firmeza do pensamento crítico ou denunciando preconceitos seculares que atrasaram e continuam atrasando nosso país. Muitos mostraram a importância para a sua formação terem atua do tanto no teatro quanto no cinema e na televisão, adquirindo, linguagens diferenciadas – analisando-as com suas particularidades. Muitos títulos exploram o universo íntimo e psicológico do artista, revelando as circunstâncias que o conduziram à arte, como se abrigasse em si mesmo desde sempre, a complexidade dos personagens. São livros que, além de atrair o grande público, inte ressarão igualmente aos estudiosos das artes cênicas, pois na Coleção Aplauso foi discutido o processo de criação que concerne ao teatro, ao cinema e à televisão. Foram abordadas a construção dos personagens, a análise, a história, a importância e a atua lidade de alguns deles. Também foram exami nados o relacionamento dos artistas com seus pares e diretores, os processos e as possibilidades de correção de erros no exercício do teatro e do cinema, a diferença entre esses veículos e a expressão de suas linguagens. Se algum fator específico conduziu ao sucesso da Coleção Aplauso – e merece ser destacado –, é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o percurso cultural de seu país. À Imprensa Oficial e sua equipe coube reunir um bom time de jornalistas, organizar com eficácia a pesquisa documental e iconográfica e contar com a disposição e o empenho dos artistas, diretores, dramaturgos e roteiristas. Com a Coleção em curso, configurada e com identidade consolidada, constatamos que os sorti légios que envolvem palco, cenas, coxias, sets de filmagem, textos, imagens e palavras conjugados, e todos esses seres especiais – que neste universo transi tam, transmutam e vivem – também nos tomaram e sensibilizaram. É esse material cultural e de reflexão que pode ser agora compartilhado com os leitores de to do o Brasil. Hubert Alquéres Diretor-presidente Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Um Prefácio a Pelé, na Terceira Pessoa No início dos tempos, havia o pedido de dois atores para que o Mário Viana escrevesse uma comédia para eles. Nasciam Pedrão, Jorginho e uma primeira versão de Carro de Paulista – batizada assim por causa de uma piada da hoje roteirista Gabriela Amaral, carioca da gema. Quando leu o texto, o ator-autor-diretor Hugo Possolo sugeriu que os dois rapazes ganhassem a companhia de outros personagens. O argumento dele era imbatível: Essa galera não anda de carro em dois. Precisa encher a barca pra rachar o gás. Isso e mais a experiência de passar pela Rua Augusta e ver carros lotados de moleques endiabrados, mexendo até com poste, serviram de inspiração... É nessa parte que entra o Alessandro Marson, de quem o Mário já conhecia alguns textos e, principalmente, o humor certeiro. Durante um almoço no centro de São Paulo, nasceram Júnior e Raio de Sol. Daí em diante, as histórias se misturam e hoje nem os detetives do CSI conseguiriam separar o DNA de Mário ou Alessandro ao analisar cada cena. Um dia, o ator-diretor Jairo Mattos leu a peça e quis dirigi-la. Mário, que já estava em contato com um grupo de atores jovens, apresentou um aos outros. Eles somaram seus trocados – 800 reais – e a peça estreou no Centro Cultural São Paulo em abril de 2003. De lá pra cá, o Carro já estacionou em diversos palcos: Sérgio Cardoso, Faap, Cultura Inglesa – onde começou a virar fenômeno –, Jardim São Paulo, Santa Cruz, Folha, Maria della Costa, todos os CEUs, Cacilda Becker, Artur Azevedo e o Ruth Escobar, várias vezes. Sempre provocando risada, escandalizando alguns e reativando a memória de outros. A peça cresceu muito durante a temporada – não apenas com a risada do público e os improvisos dos atores. Os autores também não se seguraram. A cena da hostess na porta da balada foi assim. Surgiu para esticar a história e aumentar a participação feminina. As três mulheres do carro, sempre feitas pela mesma atriz, nem nome receberam. São a Mina do Ônibus, a Porteira – isto é, a Hostess – e a Puta. E antes que acusem os autores de machistas (já acusaram), é bom lembrar que quatro moleques da zona leste, em plena explosão hormonal, não se amarram nesses detalhes de nomes. Eles só têm olhos pra uma coisa. Prá dar tão certo, o Carro contou com o olhar atento do vigia do estacionamento, o Mario Sergio Loschiavo. E teve sempre ótimos passageiros. Por ordem alfabética, já pegaram carona: Aline Abovsky, Carlos Baldim, Daniel Dottori, Daniel Tavares, Davi Campos, Edgard Jordão, Elaine Dottori, Fabio Neppo, Giulianno Fortes, Junia Busch, Murilo Salles, Paulo Vinicius, Pedro Guilherme, Rodolfo Valente, Tadeu Pinheiro, Tales Vinicius, Thiago Catelani, Vinicius Calamari e Vinicius de Oliveira. Por enquanto. Mário Viana e Alessandro Marson P.S. O carro de madeira, todo vazado, feito pelo Jorge Jacques continua o mesmo. Sambado, mas firme. Um Carro no Desvio Quem conhece os percalços da atividade artística sabe: fila diante de teatro é algo a ser celebrado. Deparei-me com uma delas em 2004 ao sair de uma sessão teatral das 21 horas. Iniciava no saguão, saía porta afora, serpenteava. Entre perplexa e curiosa voltei à bilheteria para saber qual espetáculo atraía tanto público em plena sexta-feira e em horário não convencional. Era Carro de Paulista! Guardo nítida na memória minha sensação de intrigada surpresa. A montagem dessa peça de Mário Viana e Alessandro Marson, eu sabia, estreara no ano anterior e já passara por três outros teatros! Não recebera críticas na grande imprensa, cotações ou recomendações, nem apoio institucional significativo, menos ainda patrocínio para anúncios publicitários e também não contava com elenco de famosos. Qual o ponto de atração? Penso que algumas pistas para tal magnetismo podem ser detectadas no texto que o leitor tem agora em mãos. Somos convidados para uma viagem que pro-mete ser curta, simples e divertida: a aventura de quatro garotos saídos da adolescência que, num carro emprestado, rumam do bairro pobre à região nobre da cidade em busca de uma boa noitada. Sem ceder à pretensão de denunciar o que todos já sabem os autores tiram efeito cômico de uma espécie de apartheid comum a tantas metrópoles com seus territórios demarcados por fronteiras socioeconômicas. Com evidente talento para o humor negro criam situações hilárias explorando o atrito entre códigos culturais diferentes. Construir boa dramaturgia sobre essa base nesses tempos em que deslocamentos são tão velozes quanto à construção de muros para evitá-los por si só já justificaria os aplausos e a presente publicação. O perfil dos quatro garotos – o viril, o tosco, o tímido e o sensível – é desenhado com poucos traços numa precisão que remete à eficiência cômica dos tipos da commedia dell’arte e à síntese poética dos HQs. A partir daí a fricção se traduz em diálogos ágeis e boas tiradas. Vale frisar que a peça escapa do maior risco nela embutido, o de reforçar preconceitos, por exemplo, ao evitar a batida associação entre periferia e violência inserindo os personagens naquela parcela da população que trabalha duro desde cedo. Os autores ainda potencializam o mote central da trama – a insegurança de quem se desloca por terras estrangeiras sem bússola – ao colocarem na bagagem desses viajantes a urgência de viver o rito de passagem da iniciação sexual. Temos aí elementos suficientes para provocar a empatia de espectadores de diferentes extratos sociais. Como desfecho, a edição em livro poderia ser definida como mais um sinal da semelhança de trajetória entre personagens e peça. Mas não seria justo falar de um movimento da periferia ao centro nobre (da cena?), pois além de questionáveis essas categorias baseadas em referenciais geoeconômicos não são aplicáveis à arte. Carro de Paulista quebra sim expectativas iniciais de traçado. Porém por meio de um deslocamento bem mais interessante e subversivo porque sua potência está em ser desvio. Cavados na superfície dessa comédia há buracos negros que podem tragar o espectador para o inesperado, canais de acesso a regiões mais fundas do inconsciente. Entre um riso e outro pode pesar um silêncio dolorido diante de quatro garotos, postados numa loja de conveniência, perplexos com a própria invisibilidade. Pronto. Ao ser assim tocado o espectador já está em um lugar inesperado levado por esse Carro de Paulista. Que inverte eixos em seu itinerário. E atropela estrelinhas e recomendações. Beth Néspoli Carro de Paulista De Mário Viana e Alessandro Marson Personagens: Pedrão Jorginho Júnior Raio do Sol Hostess Mina Puta Vozes em Off: Mãe de Jorginho, locutor de rádio, funcionário da lanchonete, motorista de ônibus, Cenário: variado. O único elemento comum em todas as cenas é o carro que Pedrão está dirigindo, de modelo antigo e cor berrante. PRIMEIRA PARADA – ZONA LESTE SOMOS NÓS PEDRÃO e JÚNIOR, impacientes, estão na porta da casa de JORGINHO. Pedrão buzina. PEDRÃO – Jorginho! JORGINHO (voz Off) – Já vai!!! JÚNIOR (olha o relógio) – Aí, mano, desse jeito vai ficar muito tarde pra sair, tá ligado? PEDRÃO – Dá um tempo, Gilvanilson! JÚNIOR (alterado) – Porra, não me chama de Gilvanilson, mano! Meu nome é Júnior! Júnior, tá ligado? PEDRÃO – Então tá, Gil...nior. Amanhã é domin go, você não vai dar plantão na farmácia. JÚNIOR – É que eu acostumei a acordar cedo, tá ligado? Deu seis e meia, pá! Zoião aceso. PEDRÃO – Até de domingo? JÚNIOR – Até dia de domingo, veio! PEDRÃO (com desprezo) – Cuzão. (impaciente, grita) Porra, Jorginho! JORGINHO (Off) – Já vai! Jorginho sai de casa com ar zangado. Dá uma volta em torno do carro. JORGINHO – Cadê as minas? PEDRÃO – Que minas? JORGINHO – Você falou que a gente ia sair com umas minas aí. PEDRÃO – Assim que a princesinha estiver pron ta, a gente sai e enche o carro de mulher! JORGINHO (finalmente, reparando no carro) – Que carro é esse, Pedrão? JÚNIOR – Da hora, né mano? JORGINHO – Ô! De quem é? PEDRÃO – Do meu primo que veio passar uns dias lá em casa... E aí, vam’bora logo!!! JORGINHO – Eu... não vou. JÚNIOR – Beleza, veio, pela órdi! (percebe a frase do outro) Como é que é, mano? PEDRÃO – Que papo é esse de não vou? A gente combinou! JORGINHO – Não vai dar pra ir. PEDRÃO – Então vai sem dar, cacete! E as minas que a gente ia catar na Rua Augusta? JÚNIOR – E a gasolina? Rachar em três fica mais barato que em dois, mano! Quer dizer, eu acho, né? Faz as contas, aí! JORGINHO – Eu também tô puto! Minha mãe é foda! PEDRÃO – Ela não deixou? JÚNIOR – Você quer que eu fale com ela? Chego pra ela e falo, aí, mana, sorta o Jorginho pros lances, tá ligada? O bagulho vai ser animal, veia, tipos iradaço, sinistro, da hora, tá ligada? Só vai dar nós no DVD! Que tá pegando? Seguinte, se tá com pobrema e tá afim de jogar umas idéia fora, tô na área, tá ligada, c.b.? JORGINHO – Nem eu consegui entender isso aí que você falou. PEDRÃO – Que tá rolando? Cê tá sem grana? JÚNIOR – Tá de castigo? JORGINHO – Corta, ô! Eu tenho grana e minha mãe deixou eu ir. PEDRÃO – Então deixa de ser cuzão e entra logo no carro! JORGINHO – É que o meu primo tem que ir junto! JÚNIOR – Que primo, mano? Desde quando você tem primo? JORGINHO – As pessoas têm primo, Júnior. É assim, a minha mãe tem uma irmã... PEDRÃO – Tá, não precisa explicar. Esse primo aí é o Raio de Lua? JORGINHO – Não. O do Sol. O nome dele é Raio do Sol. PEDRÃO – Esse moleque é o maior pentelho! JÚNIOR – É aquele pirralho que vive na sua casa, mano? Ele nem tem idade pra sair de noite, tá ligado? JORGINHO – Com a gente, a minha tia deixa ele ir. PEDRÃO – Eu quero catar umas minas, não virar babá de filho de hippie. JORGINHO – Por isso que eu não vou. JÚNIOR – Se você não for, a gente também não pode ir, mano! Você já fez as contas? Dividir por três não fica mais barato, mesmo, mano? PEDRÃO – Pode crer. A grana só de dois não dá pro gás da barca. JORGINHO – Sem ele, minha mãe não deixa eu ir. Ela e minha tia vão pro bingo e o Raio não pode ficar sozinho em casa. JÚNIOR – Pô, veio, não sabia que hippie ia no bingo, tá ligado? JORGINHO – Cala a boca, Júnior. Hippie é igual gente. Faz tudo que gente faz, só não toma muito banho. JÚNIOR – Ainda por cima a gente vai ter que ficar ´guentando o cêcê do pirralho! Tô foraço! PEDRÃO – Porra! Que merda, que merda, que merda! RAIO (de fora) – Jorginho!!!! (entra correndo, com um cartucho de videogame na mão) Cê sabe consertar cartucho? Quebrou! JORGINHO – Caraca! Raio, o que você fez com o istrete fire? Essa fita não é minha! PEDRÃO – Istrete fire?!? É minha! RAIO – Oi, Pedrão. PEDRÃO – Você quebrou meu cartucho? RAIO – Não muito, só um pedaço. Mas dentro tá bom. (nota o carro) Nossa! Que carrão! (atira o cartucho longe e corre para alisar o carro) PEDRÃO – Meu istrete fire!!! (vai tentar salvar o cartucho, mas vê o garoto se aproximando do carro) Tira a mão!!! RAIO – Da onde? PEDRÃO – Sai daí! Não encosta um dedo no carro do meu primo! JÚNIOR – Ou pelo menos lava a mão antes! RAIO – É nesse carro que nós vamos sair? PEDRÃO – Nós quem, pivete? RAIO – Nós quatro, ué. Onde nós vamos? No Playcenter? JÚNIOR – Playcenter tá fechado a uma hora dessas, tá ligado? RAIO – Então é na sorveteria... JORGINHO – Minha mãe não deixa eu tomar sorvete de noite. RAIO – A gente não conta. JORGINHO – É que eu fico tossindo sem parar e ela saca. RAIO – Pô, Pedrão, diz aí, onde é que a gente vai nesse carrão, hein? PEDRÃO – Num puteiro. RAIO – Como é? PEDRÃO – Puteiro, zona, açougue, brega, inferninho, postíbolo, bordel, mangue, casa da luz vermelha, fudunço... sei lá como fala isso em língua de hippie. JORGINHO – Ô, Pedrão, pega leve com o moleque! PEDRÃO – Lugar cheio de xoxota, perseguida, rachada, pé-de-cabra, xana, xereca, buça, passarinha... Todas doidinhas pra dar pra gente. RAIO – Ah, não. Em puteiro eu não vou, não. JÚNIOR – Aí, mano, além de hippie tu é boiola? Qualé que é, veio? RAIO – Não, Gilvanilson... JÚNIOR – Júnior! Caralho, meu nome é Júnior, tá ligado? RAIO – Porque no seu crachá tá escrito Gilvanilson? Júnior percebe que está com o crachá da farmá cia. Guarda rápido. JÚNIOR – Esse crachá não é meu, é de um chegado. Mas não muda de assunto, não. Por que você não vai em puteiro, mano? RAIO – Por que o ato sexual é uma troca de energia entre duas pessoas! Quando a gente troca energia vital com alguém que não conhece, isso prejudica o nosso carma e/ PEDRÃO – Quer ir ou não quer? RAIO – Não! Em puteiro, eu não vou. PEDRÃO – Então, você não vai. Chato, hein? Fica pra próxima! JÚNIOR – Da outra vez, a gente vai na sorveteria. Faz assim, cê toma um banho e a gente vem aqui amanhã, tá ligado? JORGINHO – Pedrão, eu não posso ir sem o Raio! PEDRÃO (para Jorginho) – Faz o sonso e entra no carro. (Para Raio) Tchau! RAIO – Pô, que chato. Justo hoje que minha mãe me deu um monte de grana, eu não tenho onde gastar. Os três param. JÚNIOR – Tua mãe deu dinheiro, veio? RAIO – Prêmio. Ela não foi chamada nenhuma vez na escola esse mês. É o meu recorde. JORGINHO – E a tia deu muita grana? RAIO – Ô! Mais ou menos! Ó! (mostra a carteira, os três olham e ficam impressionados) JORGINHO – Nossa! JÚNIOR – Dá pra pagar a gasolina toda, mano! PEDRÃO – E ainda sobra troco pra encher a cara! (Pausa) Vamos, Banho de Lua! RAIO – Raio do Sol! Eu sou o Raio do Sol! Raio de Lua é a minha irmã! PEDRÃO – É que eu confundo, desculpa aí. JORGINHO – É só pensar assim: Sol, menino; lua, menina. Foi assim que eu decorei. JÚNIOR – Sol, menino, lua, menina, sol, menino, lua, menina... PEDRÃO – Hã-hã. Bom, a gente fica conversando e vai perder a noite de sábado. Vamos com a gente, Banho... (Hesita) de Sol? RAIO – Tá chegando perto. Mas se vocês forem no puteiro, eu não vou. PEDRÃO – A gente vai onde você quiser! RAIO – Jura? JÚNIOR – É... mano! Com essa grana toda, a gente vai até pro Parque da Mônica! JORGINHO – Vamos entrando no carro, no caminho a gente decide... Entram todos no carro. VOZ DA MÃE (Off) – Leva uma malha, Jorginho! Pode esfriar! JORGINHO (sorri, macho) – Que mané esfriar... VOZ DA MÃE (autoritária) – A malha, Jorge Augusto! JORGINHO (manso, volta para dentro) – Tá bom, mãe... (Sai, com uma malha nos ombros) Minha mãe é foda! JÚNIOR – Vamo’logo, veio! Já tá tarde pra caramba! RAIO – Pra onde a gente vai, então? PEDRÃO – Ih, rapaz, tem um negócio. Ô Rainho, a gente vai precisar parar num posto de gasolina e você, como está com o dinheiro mais à mão... RAIO (desconfiado) – Quanto que é? PEDRÃO – Só um tanque. RAIO – Um só? PEDRÃO – Só. RAIO – Então tá. PEDRÃO – Vamos pros Jardins encher essa barca de mulher!!! TODOS – Ueba!!!! Carro sai. Eles começam a andar. JÚNIOR – Aí, mano, Jardins é longe a pampa, tá ligado? PEDRÃO – Longe pra quem vai de buzão. Nós estamos motorizados, se liga! De carro a gente vai lá, ó, pá, num minuto. JORGINHO – Eu não sei chegar lá. JÚNIOR – Mano, eu nunca fui prá queles lado! PEDRÃO – É só pegar a Radial. JORGINHO – E depois? PEDRÃO – Depois o que, cuzão? JORGINHO – pra sair da ZL, tem que pegar a radial de qualquer jeito. PEDRÃO – Você é o maior otário! Depois da radial tem a marginal! JORGINHO (descrente) – E dá pra ir até os Jardins pela marginal? PEDRÃO – Dá. JORGINHO – Como? PEDRÃO (pausa; pensa) – Dá mais volta. Por isso que eu falei que a gente vai pela Radial. Entendeu, ô cuzão? JORGINHO – E tem muita mulher lá, é? PEDRÃO – Cara... eu fui levar uns documentos do meu patrão. Você não bota fé, cara, mas lá tem cada mulher gostosa! Cabelinho loiro, franjinha, calça jeans justinha, os peitos bem durinhos! Tudo mina bacana! Não é esses cadáver da Vila Formosa, nem essas com cheiro de ônibus de Guaianases! Lá é tudo perfumada, cheirosinha... JÚNIOR – É, elas tomam banho todo dia, viu Raio? Tem umas que tomam dois. RAIO – Legal! (Raio levanta os braços. Júnior faz ele abaixar.) JORGINHO – Essas minas é tudo maria-gasolina! PEDRÃO – Por isso nós estamos indo de barca! JÚNIOR – A gente podia ir pra Práça Sílvio Romero, veio! Tem uns chegados que vão na farmácia e falaram que lá é da hora. PEDRÃO – As minas do Tatuapé é tudo um bando de fresca, que acha que tem o rei na barriga. E depois você vai ver, elas são de Itaquera, Itaim Paulista, Jardim Castelo... pra chegar no Tatuapé elas pega uns três bumba. O carro segue andando. Black-out. SEGUNDA PARADA: LANCHONETE PEDRÃO, JÚNIOR E JORGINHO estão sentados no carro. Jorginho e Júnior dando risada. Pedrão puto. PEDRÃO – Pára de reclamar, porra! A gente tá aqui, não tá? JÚNIOR (Rindo) – Aí, veio, não fica injuriado, não! JORGINHO (Rindo) – Cara! A gente deu mais volta do que cavalinho de carrossel! JÚNIOR (imitando Pedrão) – Eu sei chegar, eu sei chegar! JORGINHO (Rindo) – Só atrás daquele prédio vermelho suspendido a gente passou umas 20 vezes! PEDRÃO – Tamo aqui, não tamo? RAIO volta com um saco de papel de mercado e entra no carro. PEDRÃO – Orra, até que enfim... Pensei que você tinha morrido lá dentro. RAIO – É que o cara lá... PEDRÃO (interrompe) – Passa logo a lata, tô morrendo de sede. Todos bebem. Pedrão e Júnior cospem. JÚNIOR – Que que é isso, veio?! RAIO – Fanta uva. PEDRÃO – Tá quente??!! RAIO – Gelado só tinha guaraná diet. PEDRÃO – Eu pedi cerveja! RAIO – Ah, vá... Fala sério. PEDRÃO – Eu saí de casa, peguei o carro do meu primo, vim até os Jardins... JÚNIOR – pra tomar refrigerante... JORGINHO – Que é que tem? PEDRÃO – Sem gelo! JORGINHO – E daí? Eu não posso tomar gelado. PEDRÃO – Mina gosta de cara que sabe beber, sacou? RAIO – Eu sei beber, ué. Olha aqui eu bebendo meu gatorade! JÚNIOR – Deixa de ser bobo, pivete. Quando a gente fala beber é de álcool, tá ligado? Bebida de macho! RAIO – Ui, ui, ui... Macho! Há! Tá bom! Você sabia que beber álcool é negativo pro carma? PEDRÃO – Eu é que vou perder a carma contigo, moleque. Eu quero cerva, que é bebida de macho, e só macho que sabe beber é que ganha as minas! RAIO – Que minas? JORGINHO – É mesmo, Pedrão. Que minas? JÚNIOR – Pode crer... Só tem cueca aqui, veio. RAIO – Vai ver, é tarde, elas foram dormir. PEDRÃO – Mina bacana dorme tarde, cuzão. JORGINHO – Será? JÚNIOR – Então elas ainda estão em casa, se emperequetando pro bonitão aqui, tá ligado? RAIO – Coitadas... JÚNIOR – É que tem gente que toma banho, tá ligado? PEDRÃO – Vamos esperar mais um pouco. Agora, no seco eu não fico. (Para Raio) Vai lá dentro buscar cer-ve-ja! RAIO – Eu??!! Já fui, ô! JÚNIOR – Não discute, mano! Vai lá e pega cer veja pra gente! Cê tá com dinheiro, mesmo! RAIO (sai resmungando) – Saco! PEDRÃO – Ge-la-da!! JORGINHO (grita) – Vê se ainda tem guaraná diet! JÚNIOR – Noite besta, veio! PEDRÃO – Fica quieto, cuzão. RAIO (volta só com o guaraná de Jorginho) – Tó. JÚNIOR – E a nossa cerveja, mano? RAIO – O cara não vendeu pra mim. Só porque eu sou de menor. PEDRÃO – Não acredito. RAIO – Ih, vai lá e briga com o moço. Comigo, não. JÚNIOR – Por que você não falou que era de maior, mano? RAIO – Eu falei, mas aí ele pediu pra ver o docu mento. E eu falei que ia pegar no carro. Só que eu não tenho documento. PEDRÃO – E por isso eu vou ficar sem cerveja? JORGINHO – É melhor você ir lá. PEDRÃO – Não te mete! Eu tô falando com o Raíto. JÚNIOR – Quer saber, veio? Eu vou lá com o Raio Que Os Parta e vou trazer a cerva. Vem, moleque. RAIO – Mas você tem documento? JÚNIOR – Tenho meu crachá. RAIO – Você não disse que não era seu? Júnior e Raio saem. Jorginho liga o rádio do carro. LOCUTOR (Off, apanhado no meio da notícia) – ... frente fria que está chegando traz nuvens pesadas, com pancadas de chuva. A massa de ar polar... PEDRÃO – Quem mandou você ligar o rádio?! (JORGINHO apressa-se e desliga) Cara folgado... JORGINHO – Foi maus... PEDRÃO – Fica ouvindo música em vez de prestar atenção nas minas.... JORGINHO – Não era música, não, era um cara falando aí... Acho que era horário eleitoral. (tom) Que minas? PEDRÃO – Eu te falei que as minas aqui chegavam tarde. Olha lá, chegou um monte... JORGINHO – É mesmo... Nossa, mano, quanta mina gostosa! PEDRÃO – Te falei, cara... Olha aquela loirinha ali... JORGINHO – A que tá em cima da moto? PEDRÃO – Aquilo é um cartaz, ô pé de pato! A loirinha aqui, olha lá, de blusinha preta... JORGINHO – Ah... Que é que tem ela? PEDRÃO – Maó gostosa... JORGINHO – É.... PEDRÃO – Olha os peitinhos dela... Não gostou, mano? JORGINHO – Meia magrela demais pro meu gosto... PEDRÃO – Se ela quisesse te dar você dispensava? JORGINHO – Eu??!!! Imagina! (pausa) Ela nunca vai querer dar pra mim mesmo.... PEDRÃO – A gente tá com muito papo. Aqui dentro da barca ninguém vai ver a gente. Temos que se expor. Vamos ficar lá fora. JORGINHO – E o sereno? PEDRÃO – Porra, Jorginho, deixa de ser cagão! Jorginho e Pedrão saem do carro. Os dois ficam sentados no capô . Passagem de tempo. Júnior e Raio chegam, trazendo cervejas e refrigerantes. Eles ficam horas ali, sem que ninguém lhes dê atenção. Não falam nada. O sorriso vitorioso de Pedrão vai esmorecendo. Jorginho passa a maior parte do tempo sentido frio. Em determinado momento, Jorginho toma uma atitude firme. Apanha a blusa de lã que a mãe o obrigara a trazer e veste. As conversas na loja de conveniência vão sumindo. Silêncio. Jorginho suspira fundo. PASSAGEM Volta a luz, em resistência. Jorginho e Raio dentro dentro do carro. Raio cochilando. Júnior não para de olhar para o relógio. Pedrão, volta e meia, faz pose, paquera, mas não consegue nada. Jorginho sai do carro. Raio continua dormindo. PEDRÃO – Noite mixa da porra... JÚNIOR – Falei que a gente devia ter ido pra Sílvio Romero, mano! JORGINHO – Nem a menina que pede esmola olhou pra nossa cara! JÚNIOR – Ainda bem. Tô sem trocado, tá ligado? JORGINHO – Pelo menos era uma mulher falando com a gente. PEDRÃO – Por isso que eu não gosto de sair com você, Jorginho! Que cara mais pra baixo! JORGINHO – Melhor a gente ir embora. JÚNIOR – Aí, mano, vamos pro isnéquibar, na Vila Prudente. PEDRÃO – Por quê? Jogam água nos pés dos dois. JORGINHO – Os caras vão lavar a calçada. JÚNIOR – Que lazarento! PEDRÃO – Ô bundão, não tá vendo que tem gente aqui?! FUNCIONÁRIO (Off) – Não, cadê? JORGINHO – Cuzão! FUNCIONÁRIO (Off, bravo) – Que é que foi, palhaço? JORGINHO – Ih, fodeu. PEDRÃO (no carro) – Entra, entra! Vam’bora logo! TERCEIRA PARADA – NA DISCO Raio continua dormindo. Os três entram no carro e saem rodando pelo palco. Um tempo de silêncio. Passagem de cena. Música. Eles rodam o carro, param e vêm para a frente do palco. Pedrão, Jorginho e Júnior ficam em fila indiana. Raio sai. Passagem de tempo. Jorginho olha os próprios pés. JORGINHO – Bosta! (os amigos ignoram) Minha meia tá toda molhada! Continuam ignorando. Jorginho senta-se no chão, tira os tênis e massageia os pés. Pedrão, finalmente, repara nele. PEDRÃO – Jorginho, que merda é essa? JORGINHO – Tô com friagem. (olha o pé sem meia) Olha aí, parece uma uva passa. PEDRÃO – Calça esse tênis, Jorginho! JORGINHO – Mas aí eu fico resfriado! JÚNIOR – Ih, veio, nada a ver esse lance. Tá todo mundo calçado na fila. JORGINHO – Ninguém molhou os pés deles! PEDRÃO – Se calça! Porra, e essa fila cuzona que não anda? Jorginho volta a se calçar. JÚNIOR – Podi crê. Tamo parado aqui faz uma cara, mano. PEDRÃO – E onde foi parar aquele roedor de carne de soja, cacete? JÚNIOR – Sumiu. JORGINHO – Nem brinca! Minha mãe nunca mais deixa eu pôr o nariz na porta de casa! PEDRÃO – Isso não é nada. O pior mesmo é que essa porra de fila não sai do lugar! JÚNIOR – Por falar nisso, veio. Essa fila é pra quê? PEDRÃO (hesitando) – Ué. Prum lance aí. Vai dizer que você não sabe? JÚNIOR – Eu, não. Você sabe, Jorginho? JORGINHO (batendo os pés no chão) – Só sei que meus pés tão congelados! E que meu primo sumiu! JÚNIOR – Olha ele lá! Raio de Sol entra. JÚNIOR – E aí, ô Sem-Banho! RAIO – Que que é? PEDRÃO – Foi até o começo da fila? RAIO – Fui. JORGINHO – É fila pra quê? RAIO – pra um clãb. Pausa. JORGINHO – Um o quê? RAIO – Clãb. JÚNIOR – Que porra é essa? RAIO – Sei lá. A porteira que falou. PEDRÃO – Vocês são tudo uns maloqueiro, mesmo. Clãb é como eles chamam discoteca nos Jardins, sacou? RAIO – Por que eles não chamam de disco te ca mesmo? PEDRÃO – Porque não é chique, ô baseado ambulante. JORGINHO – Paga pra entrar? JÚNIOR – Acho que não, veio. Se pagasse, não ia ter essa filona aí. PEDRÃO – Nem os cuzão iam ficam duas horas esperando sem sair do lugar. JORGINHO (para Raio) – Paga ou não paga? RAIO – Sei lá, a porteira não falou. PEDRÃO – Essa porteira faz o que lá, cacete? RAIO – Diz quem entra e quem não entra. PEDRÃO – Como é que é? Ela embaça a entrada? RAIO – Ela olha os figura, diz umas coisas esqui sitas e diz: você entra. Você não. JÚNIOR – Um por um? RAIO – Tem uns que entram sem ela falar nada. JORGINHO – Coisa esquisita. Vam’bora, gente. PEDRÃO – Falou em lugar bacana, o cuzão aí já quer dar no pé. JORGINHO – A gente só vai perder tempo aqui, Pedrão. PEDRÃO – Como é que você sabe? JORGINHO (apontando o próprio peito) – Algu ma coisa me diz. JÚNIOR – Ih, veio, vai virar bruxo, é? PEDRÃO – Besteira dele! Vamos lá. RAIO – Lá onde? PEDRÃO – Vamos entrar nessa bodega de uma vez. (para Raio) Você não disse que tem uns que entram sem nem falar com a porteira? RAIO – Tem, mas... PEDRÃO – É só fazer cara de rico. Vamo lá. JORGINHO – Como é que é cara de rico? PEDRÃO – É o avesso da tua! Vamo logo. Aproximam-se da Hostess, que está fazendo seu trabalho de triagem. Avançam sem falar nada, tentando entrar. HOSTESS – Epa, epa, epa! Vocês vão aonde? JORGINHO – Entrar. JUNIOR – No clãb. PEDRÃO – Muita conversa. Vamo logo. HOSTESS (esnobe) – Quem manda nessa porta sou eu! PEDRÃO (cafajeste) – Eu sei, docinho. Agora, deixa eu ir que tem uns mano me esperando lá dentro... HOSTESS – Você tem flyer? JORGINHO (baixo, para Raio e Júnior) – Fodeu. Pedrão fica sorrindo para Hostess, sem dizer nada, com olhar perdido. HOSTESS – Tem flyer ou não tem? PEDRÃO – Claro. Ela começa a se divertir com a situação; ele acha que está agradando e fica ainda mais cafajeste. HOSTESS – Tem nada. PEDRÃO – Você acha que eu ia vir até aqui sem... sem o ... HOSTESS – Flyer. PEDRÃO – Isso. É que me deu um branco... HOSTESS – Então, você tem flyer? PEDRÃO – Ô. Eu e os mano aqui (engloba os ami gos com um gesto). A gente tem muito.... hã.... HOSTESS – Flyer. PEDRÃO – Isso aí. HOSTESS – Então mostra. PEDRÃO – O quê? HOSTESS – Me mostra o seu flyer. PEDRÃO – Aqui? Você tá louca! RAIO – Pedrão, você tá confundindo. Flyer é... JÚNIOR (puxando Raio) – Ô gambá, vê se fica na tua, cara, deixa que o Pedrão resolve a parada. JORGINHO – Podi crê. Pedrão é o maior esperto. RAIO – Mas ele nem sabe o que é flyer! JÚNIOR – E você sabe? RAIO – Voador. JORGINHO – Como é que é? RAIO – Fly, em inglês, é voar. Então, flyer é voa dor. JORGINHO – Que esquisito. Ela quer ver o Pe drão voar? JÚNIOR – Não, veio! Ela quer que a gente pa gue em cheque. Nunca ouviu falar em cheque voador? JORGINHO – Fodeu. Eu mal tenho uns trocos aqui no bolso. JÚNIOR – Eu também estou no osso. JORGINHO – É melhor dar um toque no Pedrão, pra gente não passar mais vergonha. RAIO – Eu vou lá. Raio aproxima-se de Pedrão e Hostess, que estão conversando. Ele acha que está agradando e ela está apenas se divertindo. Quando Raio chama, ela volta ao trabalho. RAIO – Pedrão! Ô Pedrão! PEDRÃO – Não atrapalha, moleque. RAIO – É que o pessoal resolveu ir embora. PEDRÃO – Tchau. RAIO – Pô, Pedrão, a gente veio junto! PEDRÃO – Olha, pivete, eu não sou flor pra andar em buquê, tá ligado? Quer ficar, fica. Quer ir embora, vai tarde. HOSTESS (voltando, olha Raio com atenção) – Esse garoto é seu amigo? PEDRÃO – Não, que é isso! É primo de um mano meu... HOSTESS – Ele é tudo de bom! PEDRÃO – O Raíto? Pô, meu chegadaço! Bródi mesmo. HOSTESS (cercando Raio) – Amor, é você quem faz o seu modelito? RAIO – Não, é minha mãe... HOSTESS – Tô bege, amor! Ela é totalmente hype! PEDRÃO – Hype, não. Hippie. Puta mina burra. HOSTESS – Olha, amor. Em quantos vocês são? RAIO – Quatro. Pedrão faz sinal e os outros se aproximam. Ela olha, com certo asco. HOSTESS – Normalmente, vocês não poderiam fi car nem na calçada de um club como o nosso. Mas (aponta Raio) ele é tão tudo de bom, tão hypado... PEDRÃO – Hippie, mina! Fala direito, pô! HOSTESS (aponta Pedrão) – E ele é tão... tão... primitivo! Bronco style puro. E é isso que nós queremos em nosso club, essa mistura entre New York, Berlim e ... RAIO – Eu sou do Embu. HOSTESS (tenta disfarçar o nojo) – Podem entrar. JORGINHO – E eu da Vila Matilde. HOSTESS – Entra logo! Hostess franqueia a entrada. Eles passam, ainda meio aturdidos. JORGINHO – E agora? PEDRÃO – Agora a gente entra, mané. JORGINHO – E o cheque? JÚNIOR – Podi crê, veio. A mina quer que a gente pague em cheque. PEDRÃO – Ela não falou nada de dinheiro. Deixou a gente entrar... JORGINHO – Vai ver que é lá dentro que paga. PEDRÃO (sorrindo) – Bem se vê que você nasceu pra ser pobre, Jorginho. Nos Jardins, mano, é só você ficar bacana que não paga mais nada. RAIO – Vocês vão entrar ou não vão? JÚNIOR – Sei não. Se precisar pagar... Vai ver quanto é, Raio. RAIO – Eu hein? PEDRÃO – Vai, pivete. A gente fica esperando aqui e filmando as minas. RAIO – Vocês trouxeram filmadora? JÚNIOR – É jeito de falar, veio. Vai logo, descobre se tem de pagar ou é na faixa. RAIO – Saco. (sai) JORGINHO – Ih! PEDRÃO – Que foi? JORGINHO – A mina da novela. PEDRÃO – Onde? JORGINHO – Desceu daquele carro. JÚNIOR – Podi crê. Ela mesma, ó. (pausa) Que baixinha. JORGINHO – Na TV, ela parece mais alta. PEDRÃO (com desprezo) – Magrela! Cadê aque les coxão que ela mostrou na revista? JÚNIOR – Podi crê, veio. Ela tirou aquelas fotografia pelada, lembra? PEDRÃO – Ô, se lembro. Os dois suspiram. De repente, arregalam os olhos. JORGINHO – Ela deu um beijinho na porteira. JÚNIOR – Na boca! JORGINHO – Foi só um selinho. PEDRÃO – Só um selinho, só um selinho. Você dá selinho no porteiro do teu prédio? JORGINHO – Eh, cai fora! Eu moro em casa térrea. JÚNIOR – Puta mina tarada, veio. Raio volta. PEDRÃO – E aí? RAIO – Sessenta. JORGINHO – Sessenta o quê? RAIO – Sessenta paus, pra entrar. PEDRÃO – Tudo isso? Se a gente fizer uma va quinha, será que... RAIO – É sessenta cada um, Pedrão. JÚNIOR – Caralho! Sessenta paus é metade do meu salário. RAIO – Coitado! Você ganha só 120 por mês? JÚNIOR – Tá me estranhando, sujismundo? Eu ganho 200. RAIO – Então, 60 não é metade... JÚNIOR – Puta merda, fodeu de vez. É mais da metade! JORGINHO – E agora? JÚNIOR – Vamo embora, veio. PEDRÃO – Péra aí! Não vai saindo assim, dando bandeira de pobre, não. Tem que sair com classe, meu filho, com estilo. (vai até a hostess) Oi, linda. HOSTESS – Não entrou ainda, brucutu? PEDRÃO – Eh que... Tá dando uma ligeira confusão ali na entrada. HOSTESS – Que foi? PEDRÃO – O cara lá na porta, vê se pode, falou que a gente tem de pagar... HOSTESS – Tem mesmo. PEDRÃO – Pô, mas a gente ficou tão amigo, você foi super com a minha cara... HOSTESS – Sabe o que é, meu pré-histórico? Minha função aqui é filtrar quem entra. Agora, lá, você paga do mesmo jeito... PEDRÃO – Pô, mas sessenta paus... HOSTESS – Sem flyer. Com flyer, é só quarenta. PEDRÃO – Mas a gente não tem tudo isso. HOSTESS – Como é que é? Vocês não têm dinheiro? Os outros se aproximam. JUNIOR – Nem um puto. JORGINHO – Zeradinho. RAIO – Ainda sobrou um pouco do que a mi nha mãe me deu, mas eles me fizeram gastar qua se tudo... HOSTESS (no walkie-talkie) – Arrudão, tá na escuta? (ruídos) Arrudão, manda segurança aqui pra porta. Tem quatro pobres aqui, cara! Pobres! PEDRÃO – Pô, que trairagem... JUNIOR – Podi crê. Chamar guarda no radinho, veio, nada a ver. PEDRÃO – E a gente não é pobre, não, sua metida! HOSTESS (no walkie-talkie) – Manda refor ço, Arrudão! RAIO (olhando em direção à porta) – Nossa, ca da homão! JUNIOR – Caralho, veio, olha os armário que a mina chamou! HOSTESS (apontando com nojo) – Ali, Arrudão, os pobres são aqueles ali! PEDRÃO – Vam’bora, vam’bora, cacete! Saem correndo em direção ao carro. JORGINHO – Eu sabia! Eu sabia! Alguma coisa me dizia que não ia dar certo. QUARTA PARADA – TRIANON PEDRÃO – Puta lugar morto. JÚNIOR – Aí, veio, esses jardins tão mais pra jardim de cemitério, tá ligado? PEDRÃO – Cala a boca! JÚNIOR – Se a gente tivesse ficado no Tatuapé, a uma hora dessas... PEDRÃO – Porra, Júnior, cê nunca sai da ZL, não? JÚNIOR – Eu não. E lá é bem mais manero do que aqui, tá ligado? JORGINHO – Se a gente tivesse ficado lá na vila... PEDRÃO – ... ia estar comendo as minass lá de Itaquera! JÚNIOR – Aquelas minas é malaca, mas pelo menos têm buceta, tá ligado? PEDRÃO – E as minas daqui são aleijada, por acaso? JORGINHO – Não, mas parece que a gente é. Ficamos parados naquela lanchonete mais de duas horas e nenhuma olhou pra gente! JÚNIOR – E esse porra desse hippie, vai ficar dormindo até que horas, mano? RAIO – Eu tô acordado. Tô fazendo mentalização. JÚNIOR – Que mané metalização!? Isso é o que todo mundo aqui tá querendo, dar uma boa mentelaziçãozada, tá ligado? JORGINHO – Ô, Pedrão, vamos voltar pra casa, vai? Tá tendo uma quermesse na vila. PEDRÃO – Nem fodendo! Porra, Jorginho, será possível que você não tem ambição na vida? Não sonha alto? Nem parece que você quer comer uma mina dos jardins, cara! JORGINHO – Nem as minass de Itaquera dão pra gente! Você já comeu alguma? PEDRÃO – Eu sou fino, meu filho. Seleciono meus abates, entendeu? JORGINHO – Seleciona tanto que acaba ficando na mão. JÚNIOR – Eu tô comendo uma mina que vai lá na farmácia! Um dia ela foi tomar uma injeção e acabou levando duas, tá ligado? JORGINHO – Ah, vai, conta outra. Tá na cara que você é cabação. JÚNIOR – Que cabação, veio? Sou o maior abridor de concha! A mulher da injeção vai na farmácia toda semana... outro dia ela até lambeu o meu subaco! JORGINHO – Puta nojo! PEDRÃO – Papo furado! O cara é maior punheteiro da ZL! Ele e o Raio tão ali, ó, só no cinco contra um! RAIO (abrindo os olhos) – Eu já tive a minha iniciação sexual na comunidade. JORGINHO – Você!? Duvido! RAIO – Então pergunta pra minha mãe. PEDRÃO – Porra, a sua mãe sabe que você trepou? RAIO – Claro. Foi com a amiga dela! Uma mulher que eu conheço desde pequeno, com uma energia superlegal. JÚNIOR – Que energia, veio? O que tem que ser legal são os airbag! JORGINHO – Você deve ter sonhado, isso sim! RAIO – Lá na comunidade a gente tem um ritual de iniciação sexual quando faz 14 anos. Eu já tenho 15. Meu ritual foi no fim do ano passado. PEDRÃO – Até esse pirralho já carcou! RAIO – Por que, vocês nunca fizeram sexo? PEDRÃO E JORGINHO – Claro que sim! PEDRÃO – Um monte de vezes. JORGINHO – Várias! PEDRÃO – É, várias, um monte de vez... JÚNIOR – Então, diz aí, Pedrão... quando você trepou da última vez, mano? PEDRÃO – Ê, que papo besta! Parece coisa de veadinho, ficar contando essas coisas. JORGINHO (grita) – Ó o carro, Pedrão! Pedrão dá uma freada brusca. Os quatro vêm para a frente. RAIO – Nossa, quase que você acerta a traseira do carro! PEDRÃO – Também, esse filho da puta para sem mais nem menos. Aí, ó, parou pra ficar conversando com um cara! (Grita) Babaca! JÚNIOR – Mano, vamos chegar que essa parada tá maior chocha. RAIO – Chegar! Mas a gente já chegou faz tempo. JORGINHO – Não, ô mané! Chegar quer dizer ir embora. RAIO – Ah bom... PEDRÃO – Eu não vou embora porra nenhuma! Hoje eu quero é comer uma buça! O carro anda mais um pouco. Silêncio. JORGINHO – Que saco! A gente vai ter que ficar a noite olhando um pra cara do outro. PEDRÃO – Olha pra rua. JORGINHO (olha pro outro lado) – Ih, olha lá. Quanto cara parado. PEDRÃO – Onde, onde? JORGINHO – Ali, naquela calçada. PEDRÃO – Aqui é o canal. RAIO – Canal do quê? JÚNIOR – Porra, tu é muito burro mesmo, veio! (P) Canal do que, Pedrão? PEDRÃO – Esses caras parados aqui só quer dizer uma coisa. Deve passar mulher pra caramba aqui! JORGINHO – Hããããã.... RAIO – Eu não tô vendo nenhuma. JÚNIOR – Mano, já sei. Deve ser que nem é no interior. Os caras ficam parados e as minas ficam dando volta em volta, tá ligado? JORGINHO – Não é ao contrário? PEDRÃO – Aqui nos jardins é diferente. O que você acha que esses caras tão fazendo parados aí? Daqui a pouco deve chegar a mulherada! JORGINHO – É, tá certo. Os caras não iam ficar aí parados à toa. PEDRÃO – Demorou pra cair a ficha, hein!? Vamos descer do carro! JORGINHO – A troco de quê? PEDRÃO – Vamos ficar que nem eles! JÚNIOR – Manero. Daqui a pouco a mulherada vai chegar, tá ligado? JORGINHO – A gente vai ficar parado na calçada feito poste?! PEDRÃO – Faz que nem eles e não enche o saco. Se tem tanta gente assim aqui é porque dá certo. Os quatro descem do carro. Ficam na calçada, olhando para os lados, tentando sorrir para os outros. Buzina. JORGINHO – Ah lá, um cara pedindo informação. Tá chamando você, Pedrão. JÚNIOR – Puta lance errado, veio. Por que o mano quer falar com o Pedrão? PEDRÃO – Por que tá na cara que eu manjo das coisas, né? Não sou que nem vocês, com essa cara de ZL. RAIO – O cara tá fazendo sinal. PEDRÃO – Eu vou lá. (Vai até o carro, fica agachado conversando com o motorista) Tudo bem. Pois é. Noite quente mesmo. Tem cerveja aí? Oba, valeu. Eu, novo por aqui!? Não... Quer dizer... É... Um pouco, né!?... Quanto o quê? Como assim, passivo? Eu o quê?! (levanta-se) Tá maluco!? Tá me estranhando!? Vá à merda, ô! (carro sai na disparada, cantando pneu) Ó a do cara, mano! Queria me comer! (gritando pro carro) Sou veado, não! Tá ouvindo? Os três caem na gargalhada. Pedrão volta, putíssimo. PEDRÃO – Ó o cara, a maior estampa de macho, bigodão, blusão de couro da hora, uma pulseirona de couro... (gritando pro carro) Boiola! (Para Jorginho) Para de rir, seu bosta! JÚNIOR – Aí, o veio achou que o Pedrão era frutinha, tá ligado? JORGINHO – Aí, Pedrão, vai queimar a rosca? JÚNIOR – Tá afim de sentir a unha no calca nhar, veio? JORGINHO – Ó o cara, vai morder a fronha! PEDRÃO – Vou, sim, vou dar o rabo pra tua irmã, aquela arrombada do caralho! JORGINHO – Olha aqui, não fala da minha irmã, não! (agarra Pedrão pelos colarinhos) Tá ouvindo? Não fala da minha irmã!!! RAIO – Jorginho, você é filho único... JÚNIOR – Tava estranhando, mesmo, tá ligado? JORGINHO – O que vale é a intenção. JÚNIOR – Aí, ó, o mano lá tá chamando. PEDRÃO – Será que esse também é veado? JORGINHO – Que nada, o cara é fortão. RAIO – Ele tá parado ali faz um tempão. JÚNIOR – Vai lá, Pedrão. PEDRÃO – Nem fodendo. Vai lá, Raio. RAIO – Eu!? Eu sou de menor. Vai você que tá de crachá, Júnior. JÚNIOR – Ele tá chamando o Jorginho, tá ligado? JORGINHO – Cês são tudo cuzão, mesmo. Jorginho vai até o cara. JORGINHO (de fora) – Tá pensando que eu sou palhaço, é? Vai se catar! Jorginho volta. Os três apreensivos. JÚNIOR – O que que o mano queria? JORGINHO – O cara me chama lá pra dizer que nós invadimos o ponto dele! PEDRÃO – E o que você respondeu? JORGINHO – pra ele deixar de ser cuzão, porque a gente tá aqui há um tempão e eu não vi passar um ônibus! JÚNIOR – É, nos jardins nem passa ônibus. Todo mundo tem carro, tá ligado? PEDRÃO – Pode crer, só passa carro, carro... (alguém atira uma pedra dos bastidores) Ô veado, quase me acerta! (atiram outra) Ai, acertou! Ô fi’da puta! JORGINHO – Caralho, Pedrão, aqueles caras tão jogando pedra na gente! RAIO – (grita) Violência gera violência, tá ouvindo? O carma de vocês vai aumentar... Ai! Raio leva uma pedrada. Começam a chover pedras. PEDRÃO – Vai, seus marica do caramba, atira pedra, atira! Por que vocês não vêm aqui brigar feito macho, bando de queima-rosca? JORGINHO – Ih, eles tão vindo! JÚNIOR – Eles tão vindo! Eles tão vindo, mano! PEDRÃO – Corre!!!! Os quatro saem correndo do palco, as pedras continuam a ser atiradas. QUINTA PARADA – A MINA DA CONSOLAÇÃO Carro vem andando. Os quatro em silêncio, envergonhados. Jorginho olha para o lado. Uma garota, com uma bolsa, parada, esperando o ônibus. JORGINHO – Pedrão, olha lá! PEDRÃO – Não enche. JORGINHO – É sério, Pedrão! Olha lá! PEDRÃO – Não enche o saco! JÚNIOR – Tem mulher ali, mano! PEDRÃO – Onde, onde, onde? JORGINHO – No ponto de ônibus. RAIO – Ué, aqui tem ônibus ou não tem ônibus? JÚNIOR – Aqui tem, né? Se tem ponto é porque tem bumba, tá ligado? RAIO – E a gente pode ficar nesse ponto ou vão dar pedrada na gente? PEDRÃO – Cala essa boca, ô filhote de bicho-grilo! JORGINHO – Peraí, a gente tá de carro... por que vai parar no ponto? PEDRÃO – Porra, ponto de ônibus é legal. O buzão não vem, as minas ficam impacientes, a gente oferece carona, elas aceitam, aí elas dão pra gente e a gente come elas, entendeu? RAIO – Rá, quero só ver... JÚNIOR – Vai ver, mesmo! E o papai aqui já sabe o que vai fazer. Vou buscar umas cerva pra nós, tá ligado? Dá a grana aí, Raio. RAIO (dando dinheiro para Júnior) – Eu quero Gatorade. PEDRÃO – Ó, Júnior, eu vou parar o carro lá no ponto. Traz uma cerva a mais, pra gente oferecer pras minas. JÚNIOR – Pela órdi, tá ligado? Pedrão para o carro e Júnior desce e sai de cena. Eles continuam andando. RAIO – Jorginho, eu quero fazer xixi. JORGINHO – E eu com isso?!? RAIO – O que que eu faço? PEDRÃO – Ué, tira o coisinho pra fora e mija! RAIO – Aqui!? Na rua? Na frente de todo mundo? PEDRÃO – Faz o seguinte, mija ali naquele jardim e depois encontra a gente no ponto. Pedrão para. Raio desce do carro e sai correndo de cena. Pedrão e Jorginho sozinhos no carro. Vão andando em direção ao ponto e param o carro. A mina fica parada, ignorando. Jorginho pega a chave do contato e coloca no bolso. PEDRÃO (para a mina) – Ooooiiii.... (nada; aumenta o sorriso e a extensão do oi) Oooooooiiiiiii!!!!! Ô, gata! Ô, mina! Tô falando com você! Ô!!! MINA – Ô é breque de burro! JORGINHO – Então é por isso que você tá parada? PEDRÃO – Cala a boca, Jorginho! JORGINHO – A mina é a maior metida! PEDRÃO (para Mina) – Desculpa aí, o meu amigo é meio crianção! MINA – Meio?! pra ser criança inteira só faltava usar fraldão! JORGINHO – Qual é, ô sua bobona... Eu sou é muito homem, viu? MINA – Se não usa fralda, tá cagando nas cal ças mesmo! JORGINHO – Vá se ferrar, baranga! PEDRÃO – Que é isso, Jorginho? JORGINHO – Ela que começou! MINA – Pega o rumo, vai! Vocês parados aí estão atrapalhando os bumbas! PEDRÃO – Ah, não vai dizer que você ficou mordida com o Jorginho. É zoeira dele! Ele é da hora, mano de fé... MINA – Então, por que você não fica com ele? PEDRÃO – Pô, péra aí! Não sou veado, não! MINA – Não amola! Sai voado, vai. Vai encher o pacuçá de outra! PEDRÃO – Aqui ó, você é maó metida! Tá aí, fo dida, esperando ônibus que nem uma favelada e fica toda posando de bacana! MINA – Vai ver se eu tô lá na esquina! PEDRÃO – Deve estar, aquilo ali na esquina é um puteiro. MINA – Pois é, quem me contratou lá foi tua mãe! JORGINHO – Ih, Pedrão, ela tá chamando tua mãe de puta! PEDRÃO – Você é muito da folgada, viu, mina? JORGINHO – É maior folgada, olha aí... MINA – Folgado é teu rabo de tanto dar pros guardas da Febem! JORGINHO – Você viu o que ela falou? Viu o que ela falou? Viu? Você viu o que ela falou? PEDRÃO – Não, eu não vi! Eu só ouvi, tá bom!? E você, ô sua piranhinha... MINA (firme) – Piranhinha é tua irmã, que não consegue cobrar muito porque já tá muito gasta até em puteiro de beira de estrada! PEDRÃO – Eu devia era sair daqui e te encher de porrada! MINA – Sai, sai do carro pra você ver o que é bom pra tosse. Sai! A mina abre a bolsa e tira uma faca. Começa a ameaçar os dois. Os dois fecham o vidro do carro. JORGINHO – Caralho, olha a faca que a mina carrega na bolsa! MINA – Desce do carro que eu te capo, seu filho da puta! Desce, que eu te capo! PEDRÃO – Você é louca! Doida! Devia estar presa! (tenta ligar o carro, não consegue) Sua... sua... sua doida! Cadê a chave do carro, caralho?! JORGINHO – Eu escondi! PEDRÃO – Escondeu onde?! MINA (batendo no carro deles) – Sai do carro, seu veado! Seu frouxo! Sai!!! Eu perco o ônibus, mas deixo você sem os dois ovos! Sai!!! PEDRÃO – Não bate no capô do carro!!! Caralho, Jorginho, onde você enfiou as chaves? JORGINHO – Tá aqui no meu bolso.... (procura) Ih, caiu! Onde será que foi parar? Malabarismos. Jorginho e Pedrão procuram as chaves do carro, sem sair de dentro dele. Enquanto isso, a mina continua batendo no capô do veículo. PEDRÃO – Não bate no carro!! MINA – Sai daqui vocês dois, que meu bumba vai passar e o motorista não gosta de carro parado aqui, não! JORGINHO – Achei! Achei! (exibe as chaves) PEDRÃO (tenta apanhá-las à força, sem sucesso) – Dá aqui elas! Dá aqui elas! JORGINHO – Por favor o quê? PEDRÃO – Isso lá é hora pra falar de etiqueta! (Liga o carro e abre um pouco o seu vidro) Ufa! Tchau aí, ô cruzamento do capeta com o mapa do inferno! MINA – Vai tarde! PEDRÃO – Se você não fosse tão besta podia pegar uma carona.... JORGINHO – E depois pegar os nossos pintos!!! (os dois gargalham) MINA (dando mais pancadas no carro) – Ah, vão se foder, vocês dois!!!! (ela começa a chutar o carro). PEDRÃO – O carro do meu primo! Não chuta o carro do meu primo!!! MINA – Seus bundas-sujas do caralho, por que não vão encher o saco da turma de vocês, hein? Sai daqui, rápido! Passa, chispa!!! PEDRÃO – Não chuta o carro, sua puta! MINA – Puta é a fodida que te pôs no mundo, seu monte de bosta fedorenta! JORGINHO – Vam’bora, Pedrão! Vam’bora logo! PEDRÃO – Não chuta o carro!!! MINA – Vai tomar no rabo, cuzão! (faz gestos obscenos, enquanto eles saem) JORGINHO – Puta mina boca suja!!! PEDRÃO – Você só me fode, Jorginho. JORGINHO – Eu??!! Tá louco? PEDRÃO – Você que viu a mina no ponto de ônibus. Vamos lá falar com ela, vamos lá, vamos lá! Parece que nunca viu mulher! O carro anda mais um pouco. Silêncio. A mina continua parada no ponto de ônibus. JORGINHO – Caralho, a gente tem que voltar! PEDRÃO – Tá doido? JORGINHO – O Raio ficou lá! E o Júnior também! PEDRÃO – Fodeu! Eu é que não volto lá! JORGINHO – Larga de ser cagão! Tá com medo da mina, é? PEDRÃO – Que medo o quê? JORGINHO – Então volta! PEDRÃO – Volta você! JORGINHO – De a pé? PEDRÃO – E se aquela maloqueira chutar a barca de novo? JORGINHO – Então, para que eu vou lá. Pedrão para o carro. Jorginho desce. JORGINHO – Você vai ficar aí? PEDRÃO – Vou, né? Não posso deixar o carro sozinho. JORGINHO – Cagão! Jorginho sai, puto. Pedrão fica dentro do carro. Jorginho vai andando, com medo. Júnior chega ao ponto de ônibus e conversa com a Mina. Jor ginho se esconde, tenta fazer sinais para Júnior, mas ele não o vê. JÚNIOR – O que você tá fazendo por aqui? MINA – Ah, sei lá... vim dar uns rolês... pra esses lados têm um monte de farmácia 24 horas. JÚNIOR – Pô, achei que você só fosse tomar injeção lá comigo! MINA – Ah, Gilvanzinho, você é o melhor apli cador de injeção que eu conheço. JÚNIOR – E aí, cê tá indo pra que lado? MINA – Lá pra vila... o ônibus já tá vindo. (insinuante) Eu não consegui tomar nenhuma benzetacilzinha hoje. Aqui é bem mais caro. Cê vai ficar aí? JÚNIOR – É, sei lá... acho que eu vou pra vila também. Amanhã eu falo com os manos. Júnior e a Mina entram no ônibus e saem de cena. Jorginho, apavorado, vai correndo até o carro. JORGINHO – A mina, ela levou o Júnior embora, Pedrão! A gente tem que salvar o cara! Anda, liga o carro. PEDRÃO – O que você tá falando, maluco? JORGINHO – A mina boca de esgoto. Ela sequestrou o Júnior. Obrigou ele a entrar no busão com ela... roubou as nossas cervas... apontou a faca pra ele... acho que ela sacou que ele era nosso chegado! PEDRÃO – Fodeu! E agora?!? O que a gente faz? JORGINHO – Vamos chamar os ómi! Vamos seguir o busão! Os dois entram no carro, desesperados. Um tempo. PEDRÃO – E o Raio? A gente vai largar ele aqui? JORGINHO – Puta que o pariu! Esqueci do moleque! PEDRÃO – E agora? O que a gente faz? JORGINHO – É... é... não sei. PEDRÃO – Nem eu. Os dois saem do carro e ficam andando de um lado para o outro. Raio chega e fica observando. Demora um tempo para eles notarem que ele está ali. RAIO – E aí? PEDRÃO – Que merda! Deu tudo errado! RAIO – O quê? JORGINHO – A bandidona levou o Júnior e o Raio sumiu! RAIO – Sumi nada! PEDRÃO E JORGINHO – Raio!? RAIO – Ué, estavam esperando quem? JORGINHO – Onde você estava? RAIO – Fazendo xixi. Fui procurar um banheiro. Cadê o Júnior? PEDRÃO – A mina levou ele embora. RAIO – Que mina? PEDRÃO – Ah, deixa pra lá... JORGINHO – Pedrão! A gente não vai fazer nada pra salvar o Júnior? E se ela capar o cara? PEDRÃO – Fazer o quê?!? JORGINHO – É... fazer o quê? RAIO – E aí, vamos embora? PEDRÃO – Eu já falei mais de mil vezes que eu não vou embora sem comer uma buça! Se vocês quiserem, fodam-se. Vão embora de lotação, de a pé, vão voando! Pedrão entra no carro. Jorginho e Raio entram, em silêncio. SEXTA PARADA – RUA AUGUSTA JORGINHO – Onde é que nós estamos, hein? (Olhando a placa) Rua... rua... A ... A ... Au... Agosto. PEDRÃO – Augusta. JORGINHO (olhando melhor) – Ah, é. Rua Augusta. PEDRÃO – Porra, legal, cara! Essa rua é cheia dos puteiro! JORGINHO – É mesmo? RAIO – Por isso! Tô sentindo mesmo uma energia pesada. Olha aqui, eu não vou entrar em puteiro nenhum, hein? JORGINHO – Então você fica olhando o carro. PEDRÃO – Olha só, as putas ficam tudo na rua, os caras passam e mexem com elas... Passagem de tempo. O trânsito anda lentamente. JORGINHO – Porra, tá tudo parado, cara! PEDRÃO – Eu tenho medo é que acabe a gasolina! RAIO – Eu não coloco mais nada. Já enchi o tan- que uma vez. JORGINHO (pondo a cabeça fora da janela) – Vamo’logo, seus cornos do caramba! PEDRÃO – Jorginho, para com isso! Puta vergonha! JORGINHO – Você conhece os caras da rua? PEDRÃO – Não. JORGINHO – Eles te conhecem? PEDRÃO – Não. JORGINHO – Então. PEDRÃO (reflete rapidamente; coloca a cabeça pra fora do carro também) – Bando de roda presa do caramba! JORGINHO – Anda logo, seus quase morto! PEDRÃO – Ih, andou, olha aí... (andam um pouco; param novamente; tédio) Nossa mãe! Olha só, Jorginho! Uma puta parada na rua, bem perto deles. JORGINHO – Puta que pariu, que mulherão! PEDRÃO – Olha as pernas da mina! JORGINHO – Precisa de escada pra subir nisso tudo! PEDRÃO – Que tetona! RAIO – Será que ela é prostituta? JORGINHO – Não, ela tá rodando a bolsa pra espantar mosquito. PEDRÃO – Com ela num quarto eu começava a chupar desde a maçaneta da porta. JORGINHO – Tanta carne e eu aqui roendo osso!!! PEDRÃO – Fala com ela! JORGINHO – Falar o quê? RAIO – Cuidado, hein, Jorginho? Essas pessoas têm uma carga de energia pesada. PEDRÃO – Pesada é a minha mão, moleque. Vai Jorginho, sei lá, ela é puta, fala qualquer coisa. JORGINHO – Eu nunca falei com puta! PEDRÃO – Puta é igual às minas que a gente conhece. A única diferença é que ela cobra. JORGINHO – Hã... Mas eu não sei falar com as outras minas também... PEDRÃO – Fala qualquer merda, o importante é puxar conversa. Vai! JORGINHO – Tá. (para Mulher) Oi. MULHER – Oi. JORGINHO (pausa; sem graça; olha, sorri, pensa) – Você é puta? MULHER (irritada) – O que é que foi? JORGINHO (para Pedrão) – Fala você com ela! Você é mais experiente. PEDRÃO (para Mulher) – Nada, não... É que... O meu amigo... Sabe como é... MULHER – Sei. Tchau. (anda um pouco). PEDRÃO – Peraí, não vai embora... (armando-se de coragem) Quanto é? MULHER – Cem. Mais o hotel. JORGINHO – Cem paus?! RAIO – Você faz sexo com as pessoas por cem reais? Você acha que essa quantia é suficiente? Sabia que o ato sexual é uma troca de energias entre seres que/ PEDRÃO (tapando a boca de Raio) – Precisa ser em hotel? MULHER – Você tem lugar pra gente ir? Pedrão olha para Jorginho. JORGINHO – Nã-nã... Lá em casa minha mãe não vai deixar. PEDRÃO (para Mulher) – O hotel, quanto é? MULHER – Cinquenta o período. Paga adiantado. PEDRÃO – Cinquenta.... Mais os seus cem... MULHER – Vou facilitar pra você, queridinho. Cinquenta mais cem dá cento e cinqüenta. Qual dos três que vai? JORGINHO – Cem paus é um só?! MULHER – Claro. Eu não sou a rainha do atacado. JORGINHO – Porra, mas cem paus... MULHER – Mais o hotel, não esquece. PEDRÃO – Nós três por cem...? JORGINHO – Eu sou rapidinho! RAIO – Eu não vejo sentido em pagar para se ter relação sexual com uma pessoa da qual eu nem conheço. A aura dela/ PEDRÃO – Cala a boca, sujismundo. (para a mulher) Então, cem pros dois? MULHER – Nem vem que não tem. JORGINHO – E se só um de nós fizer o serviço, os outros podem pelo menos ficar olhando? MULHER – Você é tarado, hein, moleque? Cai fora, vai! RAIO – Você é feliz assim? MULHER – O quê?! RAIO – É, você é feliz assim, usando seu corpo para satisfazer as vontades de pessoas que você não conhece? Isso pode trazer um carma pesado pra sua próxima vida, sabia? MULHER – Eu... olha aqui, pivete, você nem tem idade pra entender dessas coisas! E da licença, que vocês tão me fazendo perder tempo. E tempo é dinheiro. Pedrão desce do carro. Se arruma, confiante. PEDRÃO – Peraí, gata. A gente pode conversar. Jorginho e Raio também descem. MULHER – Que porra é essa, abriram o portão do Jardim da Infância? RAIO – Há quanto tempo você não conversa com um amigo? MULHER – Bom... outro dia eu liguei pra uma colega e a gente conversou um monte. Quiquié, você é crente ou o quê? RAIO – Não, eu sou neobudista tibetano. MULHER – Ah... tá. RAIO – Eu tô vendo que você tem uma aura legal, mas está com as cores meio turvas, por causa da sua atividade. MULHER – Fazer o quê, meu bem... tenho contas pra pagar! RAIO – Lá na minha comunidade, a gente vive superbem. Ninguém faz o que não quer, ninguém tem que pagar aluguel, a gente planta a nossa comida, toma banho no riacho... tudo em harmonia com a natureza. E de graça. MULHER – Não brinca! Onde fica esse paraíso? RAIO – É logo ali, perto de Embu... quer conhecer? MULHER – Tá brincando? Amanhã mesmo a gente vai pra lá. Adorei esse papo de harmonia com a natureza e banho de riacho! Mas, hoje, a gente vai lá pro meu apê... Quero te mostrar umas coisinhas... Você é uma belezinha, sabia? RAIO – Se você quiser, eu te faço uma massagem energizadora que vai reconstituir a gama de cores da sua aura. MULHER – Não brinca? Sempre quis fazer isso! Eu também sei fazer umas massagens ótimas! Saem de cena. Pedrão e Jorginho ficam olhando, incrédulos. Vão para o carro e seguem. JORGINHO – E agora, o que eu falo pra minha tia? PEDRÃO – Cala a boca! Se você tocar no nome daquele pirralho folgado, te largo aqui. (pausa) Olha lá, olha lá, mais puta, olha lá... JORGINHO (gritando pela janela) – Eta monte de puta!!! PEDRÃO – Ih, cara... Não é puta, não. É travesti. JORGINHO – Tá brincando? Aquela gostosa ali é macho? PEDRÃO – Traveco, no duro. Vai lá, vai. Vai, que você enche a mão!!! JORGINHO – Eu, hein? Tô fora! (gritando para os travestis) E aí, bichona? Fala, boneca!!! PEDRÃO – Florzinha! Mimosa! Delicadinha! JORGINHO – Ai, ai, ai, ui, ui, ui.... Ficam mexendo com os travestis. Param subitamente, olhos arregalados. Continuam andando de carro, emudecidos, olhando fixo para a frente. JORGINHO – Que pintão! PEDRÃO – Deve ser de mentira. JORGINHO – Parecia de verdade. PEDRÃO – Ah, vai, ninguém tem um pau daque le tamanho. JORGINHO – É, impossível. Ninguém tem... Os dois olham para seus respectivos volumes e ficam meio decepcionados. SÉTIMA PARADA: DRIVE-IN PARADISE Pedrão e Jorginho no carro. JORGINHO – pra onde a gente tá indo, Pedrão? PEDRÃO – Pegar a Radial. JORGINHO – Tamos indo pra casa? PEDRÃO – Antes que acabe a gasolina e a gente fique aqui, no meio do nada.... JORGINHO – Gasolina a gente põe, ora! Qualquer cinco conto dá pra alegrar o carro. PEDRÃO – Não é grana o problema, Jorginho. É que... Ah, quer saber, eu fiquei de saco cheio! A gente sai do nosso pedaço, vem até onde todo mundo diz que tem as minas mais bacanas e volta de mão abanando!!! Pô, que merda!!! JORGINHO – Pô, Pedrão, não fica assim... PEDRÃO – Não fica como? Porra, Jorginho, você é meu mano, cara, meu chapa, meu melhor amigo, mas desculpa aí. Hoje eu queria trepar, entendeu? JORGINHO – Trepar? PEDRÃO – É. Foder. Dar uma metida. Um fincão. Um picote. Trocar o óleo. Bimbar. Passar a régua. Pitocar. Fazer neném, fazer fuque-fuque, fazer totinha... Caralho, eu só queria tre-par!!! JORGINHO – Perder o cabaço! PEDRÃO – Quê? Não, isso não... JORGINHO – Eu sou cabaço, Pedrão. Nunca saí com mulher nenhuma. E você também, eu tô achando que você ó... é fogo de palha... PEDRÃO – Tá é muito enganado. Trovão, relâmpagos. JORGINHO – Xiiii, vai chover.... PEDRÃO – Já tá chovendo lá pros nossos lados. Olha lá longe os raios. JORGINHO – Tomara que não dê enchente. PEDRÃO – Vira essa boca pra lá. JORGINHO – Mas é! Lá na minha rua, neguinho deu um espirro, pronto, inunda tudo. Maior merda. Começa a chuva forte. PEDRÃO – Inundação! Era só o que faltava. Saí de casa, perdi tempo, não comi ninguém e ainda volto pra casa com um macho! Não me faltava mais nada, faltava? Hein? Faltava? (o carro para de repente) Que é que foi? Que merda é essa? (Tenta ligar o carro) Pega, filho da puta! Pega!!! (carro não funciona). JORGINHO – E agora? PEDRÃO – Tem que descer pra empurrar. JORGINHO – Nessa chuva?! PEDRÃO – Não. Espera melhorar o tempo! Claro que é nessa chuva, mané, já pensou se vem um carro e.... (buzina, luzes, barulho de ônibus, freada brusca) MOTORISTA DE ÔNIBUS (Off) – Ô seu corno, tira essa lata velha do caminho! (arrancada do ônibus; espirra água no carro) JORGINHO – Melhor descer e empurrar... Descem e empurram com dificuldade. Chove muito. Conversam aos gritos. JORGINHO – pra onde a gente vai? PEDRÃO – Quê?! JORGINHO – pra onde a gente vai? PEDRÃO – Vamos entrar ali, ó... (letreiro lumi noso) Ih, caralho.... JORGINHO – Que que foi? PEDRÃO – É um drive-in. JORGINHO – E daí? PEDRÃO – Tem graça, dois machos entrarem num drive-in... JORGINHO – Tá chovendo lá dentro? PEDRÃO – Não... JORGINHO – Então, não enche o saco. Entram. Estacionam o carro. Jorginho sai. Volta com duas coca-colas. Entra no carro. PEDRÃO – Coca-cola? JORGINHO – Não tem nada alcoólico. Eu perguntei. Na TV do cara deu que a nossa região tá toda inundada. Não tem como chegar lá. Pelo menos enquanto estiver chovendo. PEDRÃO – Bosta. Merda. Caralho. Puta que pariu. Cacete. JORGINHO – Pô, Pedrão, calma aí... PEDRÃO – Terminar a noite num drive-in com um macho tomando coca-cola! Porra, que merda!!! (banco cai) Hã... Que é isso? Bom, pelo menos o banco dessa lata-velha deita! JORGINHO – É mesmo! (inclina seu banco) Já dá pra ficar mais confortável. PEDRÃO – Belo conforto. (vira de lado, de costas pra Jorginho) JORGINHO – Vou ligar o rádio. PEDRÃO – Liga o que você quiser. JORGINHO – Pô, musiquinha esperta. O barulhi nho da chuva. Não tá tão ruim. Jorginho vira-se de lado, voltado para o amigo. Aproxima-se. O outro se afasta. Ele se aproxima de novo. O outro se afasta. Ele se aproxima. PEDRÃO – Qual é, Jorginho? JORGINHO – Relaxa, Pedrão. Curte o som. Ouve a chuvinha caindo! Gostosa.... PEDRÃO – Jorginho, olha esse dedo bobo aí, cara! JORGINHO – Ah, vá, Pedrão! Você queria tanto trepar! PEDRÃO – Não desvirtua minhas palavras! JORGINHO – Relaxa, cara, relaxa... PEDRÃO – Nem vem, Jorginho! Nem vem! JORGINHO – Pô, Pedrão! Tamo só nós dois aqui, veio! PEDRÃO – E daí? JORGINHO – Daí que eu não vou contar pra ninguém. Pausa. Jorginho se encosta mais e Pedrão já não se afasta. JORGINHO – E aí? PEDRÃO (conformado) – Fazer o quê, né? O drive-in já tá pago mesmo! BLACK-OUT O Carro – da Peça ao Roteiro Temos o edital de telefilmes. Quer ir ver amanhã comigo a peça Carro de Paulista, com este fim? O e-mail (postado no dia 10 de outubro de 2008) era do cineasta e amigo Ricardo Pinto e Silva. A gente trabalhava na época na reformulação do roteiro do longa-metragem Dores & Amores. E também em busca de um novo projeto. Uma das possibilidades era um edital de telefilmes para a TV Cultura com o tema São Paulo, Essa Metrópole. A idéia era assistir à peça e verificar se seria adaptável para a tela da TV. Até aquele e-mail, eu nunca tinha ouvido falar de Carro de Paulista. Muito menos que era uma peça com tantos anos em cartaz. A sinopse me animou. Carro era uma comédia leve, longe do papo cabeça. Ri muito com ela. Adorei o esforço cômico daqueles quatro homens e uma mulher contracenando com um carro imaginário. Saí de lá com idéias na cabeça para a adaptação. Na segunda feira eu estava com o texto da peça de Mario Viana e Alessandro Marson num arquivo PDF. Li a peça, pensei bem na sua estrutura, anotei mentalmente o que deveria ser cortado e o que poderia ser ampliado. Tudo o que eu pude preservar do texto original eu preservei. Não se deve mexer muito num texto vencedor. As principais mudanças: 1) A tarefa mais urgente foi limpar a peça de seus muitos palavrões. Elas cabem perfeitamente num palco, mas não num telefilme de emissora aberta. Tornei a cena final com Jorginho e Pedrão menos explícita e mais sutil pela mesma razão. 2) No palco, os quatro personagens masculinos estão quase o tempo todo juntos, gritando uns com os outros e se exibindo como galos da mesma granja. No roteiro foi possível desenvolver um pouco mais as personalidades de cada um deles em cenas mais intimistas. Desde a primeira vez que assisti à peça achei o Pedrão um personagem fascinante, que me lembrava o imortal Carlos Bronco Dinossauro de Ronald Golias. Um líder que ninguém segue, um malandro que faz tudo errado. No roteiro, explorei um pouco mais seu lado blefador (na cena do Club, quando todos dizem que vieram da zona leste, Pedrão diz que é do Morumbi). Jorginho continua um cara bastante indeciso sobre sua própria sexualidade sufocado pela mãe possessiva. No filme pudemos desenvolver a relação com a prima Lua, que o desafia a ser homem. Gilvanilson Junior continua um bobo quando se junta com os amigos (homens são assim mesmo). Mas se revela um sedutor de primeira com a Mina da Injeção. Leva jeito com as mulheres e mostra com elas uma maturidade que abandona na balada. O hippie Raio de Sol no filme ficou mais malandro. Com sua conversa sobre budismo tibetano e limpeza de carma, ele conquista a mulher mais cobiçada. 4) Das 3 personagens femininas da peça (interpretadas por uma única atriz), uma ficou praticamente igual: a Hostess. Mas a Mina da Injeção cresceu e faz uma cena bem erótica com Gilvanilson na cabina de farmacêutico. A Prostituta ganhou nome (Kelly de noite, Grace de dia, numa das boas idéias do colaborador no roteiro Ricardo Pinto e Silva). Grace/Kelly também cresceu como personagem no seu não menos bizarro relacionamento com Raio de Sol. 5) Alguns personagens são apenas citados na peça e se materializaram no telefilme. Como Raio de Lua, a provocativa irmã de Raio de Sol e prima de Jorginho. Como toda a ação dramática da peça é iniciada por Reinaldo, o primo de Pedrão (com o empréstimo do carro), eu abri o roteiro com ele. É a primeira cena do filme: Reinaldo, balançando a chave do carro para a câmera. Esta abertura serviu para estabelecer a foco da ação: ganhe as mulheres que quiser, mas devolva o carro inteiro. As mães de Raio de Sol e Jorginho, apenas sugeridas na peça, também ganharam vida na adaptação. A cena em que Jorginho encontra a mãe e a tia num bar de lésbicas foi inspirada por uma experiência real acontecida comigo e dois amigos. Outro que adquiriu personalidade própria foi seu Bibi, o paranóico dono de farmácia e patrão de Junior. Outras mudanças da peça para o filme foram mais estruturais. No palco, a ação é linear. A plateia acompanha as aventuras dos rapazes como se estivesse o tempo todo com eles. No filme eu pude (especialmente na metade final) alternar entre sequências que aconteciam em lugares diferentes. Outro aspecto importante: na peça, o único objeto em cena é um carro esquemático feito de madeira. No filme, a cidade de São Paulo aparece como personagem. É uma cidade exótica para quem não costuma sair da zona leste. Com o aperto no prazo do edital, entreguei as 52 páginas da primeira versão do roteiro em 11 dias. O script seria, claro, muito modificado durante as filmagens pelo diretor e também pelos cacos dos atores. Quando o telefilme foi ao ar no fim do ano seguinte, a gente já estava pensando na criação de uma série Carro de Paulista. Onde os personagens mostrariam ainda mais nuanças de personalidade e possibilidades de ação. Para quem achava que a peça de Viana & Marson era um simples besteirol, suas criaturas se revelam cada vez mais complexas e dramaticamente promissoras. Dagomir Marquezi DM – SP – 09 junho 2010 – 04:52 Carro de Paulista na TV Quando a Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo institui, em setembro de 2008, o concurso para a produção de Telefilmes inéditos, o Edital ProAc n° 6, Programa de Ação Cultural, em cerimônia na sede da Secretaria, surgiu o impulso em participar, com empolgação, mas com uma amarra: o concurso estabelecia um tema: São Paulo essa Metrópole. De todas as ideias, sinopses e roteiros que eu já tinha trabalho e que, prontos, aguardavam por uma oportunidade de fomento, talvez nada fosse especificamente enquadrado no tema sugerido. E o prázo para inscrições seria curto, de 12 de setembro a 29 de outubro de 2008. A realização deveria ser feita e o telefilme entregue até 31 de outubro de 2009. O que mais me atraiu e, posteriormente, demonstrou ser o melhor modelo de produção que possa existir para um cineasta, foi o fato de o Edital contemplar com 100% dos custos de produção por intermédio da verba do concurso, acrescido dos benefícios da parceria estabelecida com a TV Cultura, mantida pela Fundação Padre Anchieta, a saber: o uso de 12 diárias de estúdios, equipamentos de câmera e iluminação e a garantia da exibição no final do ano de 2009. E assim foi. Saindo da cerimônia na sede da Secretaria, no bairro da Luz, no centro de São Paulo, comecei a olhar ao redor: a Estação Ferroviária, o Viaduto do Chá, o Anhangabaú, a 23 de maio. E me perguntei : que história se passaria por aquelas ruas. Ao checar em casa, no bairro da Vila Progredior, nos arredores do Butantã, já tinha me lembrado da sinopse que vez ou outra via publicada na seção de roteiro de teatro: Carro de Paulista. Pesquisei e descobri que a peça de Mario Viana e Alessandro Marson ainda se mantinha em cartaz e percebi do que se tratava: um sucesso cultuado por plateias adolescentes há mais de 6 anos em cartaz (e permanece anda hoje, em 2010) com sessão para o próximo sábado. Fui assistir e achei ótima, divertida e adequada para o meu próximo projeto. Na semana seguinte procurei o Mario Sergio Loschiavo, produtor teatral, solicitei convites e voltei acompanhado do roteirista Dagomir Marquezi, já tendo contatado, durante a semana, o co-autor Mário Viana e exposto nossa intenção. Mário prontamente assinalou sua concordância para a inscrição do seu texto visando ao concurso mas alertou, que nem ele, nem o Alessandro Marson, ambos com contratos em vigor com outras emissoras, poderiam participar da adaptação. Com o Dagomir ao meu lado, em poucas semanas, estávamos escrevendo o roteiro e o texto de defesa do Carro de Paulista. Todo edital segue um mesmo tipo de estrutura e nos exige o roteiro, o orçamento, o plano de trabalho e, entre o material a ser entregue para sua avaliação, o texto de apresentação, onde o proponente expõe seus objetivos e a justificativa para a realização daquela ideia. Auxiliado pelo Dagomir, escrevemos as poucas páginas, que se mostrariam eficiente para a nossa futura seleção para as fases seguintes de seleção e contratação do concurso de Telefilmes: Carro de Paulista conta a divertida história de quatro jovens da zona leste de São Paulo que saem de carro em um sábado à noite dispostos a paquerar meninas dos Jardins, bairro nobre da capital paulista. Esse é o início de uma série de aventuras hilariantes pela noite da cidade. Desavisados, e desconhecendo os códigos locais, Pedrão, Jorginho, Júnior e Raio de Sol encontram muita confusão pelo caminho, nesta comédia de linguajar apimentado e ritmo de videoclip. Objetivos Nosso objetivo é a produção e comercialização de um telefilme, no formato HD, cor, 1.1.85, som digital, com a duração de 52 minutos, gênero comédia e classificação etária para 12 anos. A direção estará a cargo do cineasta Ricardo Pinto e Silva. Realizamos a primeira etapa do projeto entre março e abril de 2009 e finalizaremos para levá-lo ao ar em outubro. Abordagem e Justificativa O roteiro do telefilme CARRO DE PAULISTA é baseado na comédia teatral de Mário Viana e Alessandro Marson, que faz sucesso há 6 anos nos palcos paulistas. Ao nos determos sobre os dados do mercado audiovisual no Brasil, temos frequentemente constatado que a dicotomia diversão/buscas de informação é o que motiva o espectador a escolher, entre as centenas de filmes lançados anualmente, o seu filme preferido. Em atenção aos hábitos de consumo de produtos audiovisuais é que selecionamos a comédia CARRO DE PAULISTA. As comédias humor ácido têm obtido excelente receptividade de público, alcançando as melhores médias de espectadores entre todos os gêneros. Elas satisfazem ao público que prefere ver filmes com a premissa de entreter-se, antes ou acima do interesse de informar-se; que vem a ser a motivação básica daqueles que procuram o segmento do cinema de arte. Nossas plateias são cada vez mais jovens, sendo assim constituídas: Público-alvo – Salas de Exibição Tradicionais Classes Sociais; A/B 49%; C 23%; D/E 9% Faixas Etárias: 12-17 anos 34%; 18 a 24 anos 40%; 25-44 anos 26%; 45 anos e mais 14%. Sexos: equilibra-se o número de espectadores por sexo, mas a decisão de escolha é predominante com o público feminino. Fonte: TGI Ibope (fev-jul/2005) Apontaríamos, portanto, a adequação de nosso projeto ao público jovem e adulto, entre 12 e 40 anos, de todas as classes sociais, que têm prestigiado produções nacionais de alto padrão artístico e fácil comunicação, qualificando-o como um provável filme de grande popularidade. O desejo de ascensão social, o conformismo, o ar perdido e submisso e a cultura alternativa dos personagens são alguns dos aspectos reconhecíveis no universo de Office-boys, estudantes, rappers e outros jovens que percorrem diariamente a Cidade de São Paulo, fazendo com que boa parte do público também possa identificarse com os personagens da comédia. Achamos que o audiovisual deve entreter e educar. E expandir as suas fronteiras. Esta é a nossa meta com o projeto CARRO DE PAULISTA. O jornalista e dramaturgo Dagomir Marquezi também está engajado no projeto colaborando na versão final do roteiro. A adolescência e os espaços urbanos São Paulo não é só uma grande metrópole. Representa vários mundos diferentes que mal se cruzam. Ao contrário do Rio de Janeiro ou outras capitais, a própria geografia esparramada da capital paulista deixa suas regiões distantes e isoladas umas das outras. Um habitante da zona norte pode passar seus dias trabalhando e se divertindo na mesma região. A zona leste da cidade apresenta a mesma característica. É uma região com vida e linguagem próprias. Possui baixo índice de desenvolvimento social e econômico, mas nada que se compare à miséria abissal do extremo sul da cidade. Sua paisagem não atrai ninguém pela beleza, mas a zona leste possui sua própria cultura e por que não dizer, seu charme característico. Quando os personagens de Carro de Paulista decidem ganhar mulher nos Jardins, estão dando um salto muito maior do que suas pernas. Eles são submetidos a um choque social e cultural que geram situações trágicas para uns e boas oportunidades para os outros. Por não entenderem o novo mundo que exploram, correm riscos – e percorrem no carro emprestado os duros caminhos do amadurecimento. Nessa aventura por um mundo desconhecido, o mais ansioso (Pedrão) acaba sendo o mais frustrado. E o que viaja sem querer (Raio de Sol) é o mais recompensado. Nessa contradição, aquele que está mais aberto à vida ganha mais dela. Pedrão simboliza o adolescente com os hormônios em chamas, obcecado por conquistar uma mulher. O desespero em ser recompensado sexualmente o transforma em um desastre ambulante, principalmente pela pretensão de querer conquistar uma garota de outra classe social. A busca dessa fêmea em território hostil acaba com o próprio prazer da sexualidade. Para Pedrão, a conquista é tudo. A mulher é nada. No outro extremo, Raio de Sol é o adolescente que quer sair apenas para tomar um sorvete, mas que conquista uma mulher pela sua inocência e sinceridade. Ironicamente, o pirralho Raio é o único que já teve uma experiência sexual. E por não estar tão obcecado em sexo, é o único que conquista alguém. Os outros dois personagens são os que mais se prendem ao universo da zona leste. Junior volta para casa com uma mulher que ele já conhecia da farmácia onde trabalha. E Jorginho pede o tempo todo para retornar por estar ainda preso à rede de proteção maternal. Carro de Paulista trata metaforicamente a diferença entre a zona leste e os Jardins como a distância entre a adolescência e a maturidade. Nesse salto, nem sempre o mais preparado é o mais ansioso e o mais pretensioso. Os inimigos que eles colecionam pelo caminho (a hostess, os garotos de programa, a garota do ponto) são a representação de seus próprios fantasmas pessoais numa fase conturbada da vida. Representam também os elementos de hostilidade num mundo que não pertence a eles. Vai ter quermesse na Vila (como lembra Jorginho) é a esperança da volta ao confortável mundo de onde vieram, mas que precisam abandonar nem que seja por uma única noite se quiserem crescer. Após a primeira etapa de habilitação e seleção dos projetos, ficamos entre os dez pré-selecionados e tivemos que fazer a sua defesa oral, em pitching perante a comissão que escolheria os quatro projetos que seriam produzidos. Para esta últma etapa me preparei com a elaboração de uma apresentação visual do projeto, já tendo discutido com a equipe que formei para o filme, que me ajudou a treinar a defesa oral: o autor Mário Viana, a diretora de fotografia Kátia Coelho, a assistente de direção Claudia Pinheiro (que posteriormente não poderia fazer o projeto, por coincidir com a data de filmagem de seu primeiro filme) e o companheiro e roteirista Dagomir Marquezi. Não esteve presente o diretor de arte e figurinista Luis Carlos Rossi, mas já tinha falado com ele longamente. Faltava retornar à zona leste para tirar fotos, visando à apresentação do pitching. Peguei um ônibus do Butantã até a Estação Santa Cruz do metrô e fui até o final da linha vermelha, em Itaquera, por sugestão do Dagomir, que já tinha feito a travessia quando realizou uma reportagem sobre todas as estações do Metrô e arredores para uma revista. Parti para minha viagem de ambientação na zona leste. Foram um sábado e um domingo reveladores. Sem ter podido contar com a ajuda de meus colaboradores, decidi fotografar com a câmera do meu celular, o que se revelou muito oportuno para poder obter, dissimuladamente, vários registros sobre os jovens na zona leste, a ZL, sem importuná-los. Menos de um ano depois, chegaria a TV o telefilme Carro de Paulista, realizado em apenas 12 diárias de filmagens, com muitas noites frias e divertidas, marcando a vida da nossa equipe e elenco, com a inesquecível experiência de revelação das faces de nossa metrópole e sua desvairada juventude. A todos os companheiros desta aventura, meu muito obrigado. Ricardo Pinto e Silva São Paulo, 29 de julho de 2010 Carro Paulista V4 Roteiro de Dagomir Marquezi. Com a colaboração de Ricardo Pinto e Silva. Baseado na peça teatral de Mário Viana e Alessandro Marson. Zabumba Cinema e Video Ltda. 1 EXT. DIA – RUA ZONA LESTE – PENHA 1 Em superclose numa cena desfocada, surge lentamente uma chave de carro num chaveiro. A chave brilha em slow motion, como um objeto mágico. Ela está sendo oferecida por REINALDO ao seu primo mais novo, PEDRÃO. Pedrão arregala os olhos, que se movem em direção ao carro oferecido por Reinaldo. O carrão vermelho brilha ao sol em todos seus detalhes restaurados. REINALDO Você quer, Pedrão? Eu não vou usar. Vou ficar em casa o sabadão inteiro. PEDRÃO Primo, cê tá falando sério?! Esse carrão? Na minha mão?! REINALDO Quer ou não quer? PEDRÃO Mas é claro, Reinaldão! REINALDO Primo Pedro, esse carro não é meu. É de um cliente lá da oficina. O cara vem buscar na segunda-feira. Eu te empresto com duas condição: devolve com alguma gasolina, e no estado que eu estou te entregando. E bico calado! PEDRÃO Um túmulo! E a barca vai voltar melhor do que foi! REINALDO Menos, Pedrão. E bota nessa cachola: eu vou ficar muito, mas muito, mas muito boladão mesmo se esse carro voltar com um risquinho ou um amassado, por me-nor que seja. Estamos entendidos? PEDRÃO Dexa comigo, Reinaldão! Eu nem vou beber nem água pra não ter erro. Reinaldo entrega a chave para o Pedrão, que a recebe com os olhos arregalados pelo êxtase. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 2. REINALDO (MALICIOSO) Então, é hoje primo! Reinaldo ri e Pedro corresponde animado. 2 EXT. DIA – FRENTE DE FARMÁCIA 2 Imagem do movimento na rua. 3 INT. DIA – FARMÁCIA 3 O telefone toca. DONO DA FARMÁCIA atende. SEU BIBI Drogaria Bifarma, boa tarde, Bibi falando, em que posso ser útil? O Junior está aplicando nesse momento, quem gostaria? 4 INT. DIA – FARMÁCIA SALA DE APLICAÇÃO 4 Uma SENHORA de idade faz cara de alívio e quase prázer. JUNIOR termina de aplicar uma injeção. SENHORA DA INJEÇÃO Mmmm... Você está ainda melhor, Gilvanilson. JUNIOR Junior. (sai de trás da senhora com a seringa vazia na mão) Meu nome é Junior! SEU BIBI (OFF) Gilvanilson, telefone! SENHORA DA INJEÇÃO Eu não troco de aplicador nem morta! Você é o melhor da zona leste, Gilvanilson! 5 INT. DIA – FARMÁCIA 5 Junior e a senhora saem da sala. Ela passa a Junior uma nota de 2 reais amassada com uma piscadinha. O Seu Bibi dá um sorriso de agradecimento à freguesa, que sai. Olha feio para Junior e passa o telefone. SEU BIBI Telefone pra você, Gilvanilson. Eu já te disse que aqui não é (MAIS...) (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 3. SEU BIBI (...CONT.) lugar para papinhos particulares. Você sabe: coisas acontecem... JUNIOR Pode deixar, seu Bibi. (Atende) Alô? ALTERNA COM 6 EXT. DIA – VIADUTO ARICANDUVA – ZONA LESTE 6 Pedrão dirige o carro do primo com uma lata de cerveja numa mão e um celular na outra. PEDRÃO Tamo motorizado, mano! É hoje que a gente vai ganhar uma porrada de mulheres! Um GUARDA DE TRÂNSITO emparelha sua motocicleta com o carro de Pedrão, encarando-o. Ele para de beber. JUNIOR U-hú! Tô nessa! Vai chamar o bundão do Jorginho também? O guarda encara novamente, Pedrão para de falar, afasta o celular e sorri amarelo para o guarda. O guarda acelera. 7 INT. DIA – FARMÁCIA 7 Na FARMÁCIA, reação de Junior sem entender o súbito silêncio do amigo. Seu Bibi o encara, desconfiado. 8 EXT.DIA – CASA JORGINHO 8 Fachada da casa. RAIO DE SOL descarrega um cesto de legumes frescos de um carro muito estropiado. 9 EXT.DIA – CASA JORGINHO (COZINHA) 9 A MÃE DE JORGINHO abre uma sacola com hortaliças e frutas que a MÃE DE RAIO trouxe. RAIO DE LUA a cumprimenta, com beijos. MÃE DE JORGINHO Tudo bem, com você, De Lua? Cadê o Sol? (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 4. RAIO DE LUA Tá pegando mais cenouras no carro, tia. MÃE DE RAIO É tudo orgânico...nós que plantamos! Telefone toca, Lua corre para atender. RAIO DE LUA É pro Jorginho. A cobrar...Ele tá lá em cima? Mãe de Raio faz cara feia e berra com o andar superior. MÃE DE JORGINHO Jorginho!! Telefone! Atende e vai logo que eu preciso usar! (Para a irmã) Esse menino não tem um amigo que preste. (Para Lua) Você leva pra ele? 10 INT. DIA – CASA JORGINHO (ESCADA) 10 Lua sobe correndo e para na porta do banheiro. Escuta um som estranho, respiração afobada, pequenos gemidos. 11 INT. DIA – CASA JORGINHO (BANHEIRO) 11 JORGINHO faz uma série de flexões de braço, de pontacabeça, sem camisa. A cada contagem, geme. A prima abre a porta. JORGINHO Pô, num sabe batê não?! RAIO DE LUA Atende aí, primo bundão. Atrapalhei a malhação? Lua cutuca a barriga de Jorginho que, com cócegas, sobe na privada, refugiando-se dela. Lua o provoca, estende a mão com o telefone. RAIO DE LUA É um daqueles seus amigos que sua mãe adora. JORGINHO Me dá... Jorginho tenta pegar o telefone, Lua o afasta, virando o bumbum para ele. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 5. RAIO DE LUA Não dou... (sorrindo com malícia) Tá ficando fortinho hein, primo? JORGINHO (ARRANCA O TELEFONE) Não enche, sua pentelha! (Senta na privada) Alô? Fala Pedrão. Carro? Hoje?! Mmmmm... Preciso perguntar se eu posso. RAIO DE LUA (SENTA NA BANHEIRA) Tá confirmado: é bundão! 12 EXT. DIA – ZONA LESTE 12 CRÉDITOS ABERTURA Com MÚSICA TEMA destaque para o carro dirigido por Pedrão. Primeiro bem em destaque, vai misturando-se ao trânsito. CLIPE de imagens rápidas mostrando os manos e as minas da zona leste. Mostra também marcos da região, placas de trânsito, imagens do metrô e do trem, lugares badalados, lugares bonitos da zona leste. CRÉDITOS 13 EXT. DIA – PRÁÇA SÍLVIO ROMERO 13 Do clipe, voltamos a destacar o carro de Pedrão. Ele dá voltas na praça Sílvio Romero, olha as minas, paquera, exibindo o carrão. Elas sorriem de volta. Estaciona o carro em frente à farmácia e surge Junior, de camiseta, crachá. Os dois se cumprimentam com uma longa sequência de sinais particulares (soquinhos, tapinhas, cotoveladas) do tipo high-5. JUNIOR Mas que beleza de carango, hein Pedrão? Carro de patrão! É hoje que nois se dá bem! PEDRÃO Nóis se dá bem? Nois? Eu pode ser, mas você com essa ropa de maloqueiro não sei não. JUNIOR Eu me garanto, Pedrão. Hoje rola mulher pro Juninho aqui! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 6. PEDRÃO Você eu não sei. Mas eu não durmo sozi nho hoje. Juro. Junior entra no carro. Pedrão parte cantando os pneus. 14 EXT. DIA RUAS ZONA LESTE 14 Imagens do carro acima da velocidade permitida. 15 INT. DIA – RADIAL LESTE – METRO CARRÃO – CHROMA 15 Pedrão e Júnior cantam a música tema. 16 EXT. DIA – FRENTE CASA DE JORGINHO 16 O carro para, Pedrão e Junior descem, animadões. Pedrão toca a campainha. PASSAGEM DE TEMPO Pedrão e Junior ainda esperam, desanimados, encostados no carrão.. JUNIOR O cara não desce! Desse jeito vai ficar muito tarde pra sair, tá ligado? PEDRÃO Dá um tempo, Gilvanilson! JUNIOR Não me chama de Gilvanilson, mano! Meu nome é Júnior! Júnior, tá ligado? PEDRÃO Então tá, Gil...nior. Mas amanhã é domingo. JUNIOR Amanha tem plantão na farmácia, tá ligado? Deu seis e meia, pá! Zoião aceso. Jorginho sai de casa meio enfezado e circula o carro. JORGINHO Cadê as minas? PEDRÃO Que minas?! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 7. JORGINHO Você falou que a gente ia sair com umas minas aí. JUNIOR E a princesa queria que a gente já chegasse com as minas na sua casa? Tipo delivery? PEDRÃO Vamo embarcar logo, Jorginho. É hoje! Tô sentindo! JORGINHO Eu não vou. JUNIOR Como é que é, mano?! JORGINHO Minha mãe é osso. PEDRÃO Ela não deixou você ir? JORGINHO Só se levar meu primo. JUNIOR Que primo, mano? JORGINHO As pessoas têm primo, Júnior. É assim, a minha mãe tem uma irmã, ela veio visitar nois no fim de semana... PEDRÃO Tá! Não precisa explicar! Esse primo é o Raio de Lua? JORGINHO Raio de Lua é a minha prima. O meu pri mo é o Raio de Sol. JUNIOR Esse moleque é o maior pentelho! Por que a gente não leva sua prima, que é mó gostosa? PEDRÃO Eu quero catar umas minas, não virar babá de filho de hippie. JORGINHO Por isso que eu não vou. Minha mãe vai sair com a mãe dele. E a (MAIS...) (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 8. JORGINHO (...CONT.) De Lua é a queridinha da família, e aí sobrou pra mim... Raio de Sol aparece todo alegre. RAIO DE SOL Que carrão! É nesse que a gente vai sair? PEDRÃO Sai daí pivete! Não encosta! RAIO DE SOL Onde a gente vai? Na sorveteria? JORGINHO Não! Minha mãe não deixa eu tomar sorvete de noite. RAIO DE SOL Diz aí, PEDRÃO – aonde a gente vai com esse carrão? PEDRÃO Num puteiro. Zona, açougue, inferninho, prostíbolo, bordel... RAIO DE SOL Em prostíbulo eu não vou não. JUNIOR Alem de hippie é boiola? RAIO DE SOL O ato sexual é uma troca de energia entre duas pessoas. Quando a gente troca energia vital com alguém que não conhece, isso prejudica o nosso carma. PEDRÃO Então faz o seguinte, pirralho: fica em casa, põe um pijaminha, vai pra cama e deixa os adultos divertir-se. Raio de Sol se conforma, fecha o portão e caminha de volta para a casa. Disfarçadamente saca um bolinho de notas. RAIO DE SOL Tá legal... Pô, que chato. Justo hoje que minha mãe me deu um monte de grana pra sair com vocês. Junior, Pedrão e Jorginho olham para Raio de Sol. Eles pulam o portão e invadem o jardim. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 9. PEDRÃO Pera lá! Dexa o pijaminha na gaveta! Tá na hora do meninão sair com os adultos! Eles põem o menino nos ombros do primo. A Mãe de Jorginho põe a cabeça para fora da janela no andar de cima. MÃE DE JORGINHO Jorginho! Cuidado com seu primo. Eu te amo, Nê!. Mãe joga casaco para Jorginho, que cai na sua cabeça. Ele começa a sair, a mãe espera a resposta. MÃE DE JORGINHO Jorginho?... JORGINHO Eu também te amo, mãe... Risadas contidas dos outros três. Por trás da mãe de Jorginho aparece Lua, apontando para Jorginho e movendo os lábios para dizer sem som: Bundão! 17 EXT. FIM DE TARDE – RADIAL LESTE/CHROMA 17 Pedrão dirige com Jorginho ao lado. No banco de trás, Junior e Raio de Sol. RAIO DE SOL ... mas se vocês forem no bordel, eu não vou! E nem pago! PEDRÃO A gente vai aonde você quiser, ô magnata! JUNIOR É, mano! Com essa grana toda a gente te leva até pro Parque da Mônica! PEDRÃO (RINDO EXAGERADAMENTE) Boa! Boa! Boa! JORGINHO Toma cuidado com a direção, veio! PEDRÃO Qualé, mano? Tu tá querendo dizer que eu não sei dirigir? O carro muda de faixa, quase bate em outro, ao voltar para sua faixa dá uma fechada em outro carro, todos buzinam e se xingam. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 10. RAIO DE SOL A gasolina tá acabando... PEDRÃO Quê?! RAIO DE SOL Tem aquele posto ali. É bom parar. PEDRÃO Eu paro quando eu decidir moleque! RAIO DE SOL Eu dou 20 pilas para a gasolina. PEDRÃO Tá decidido. 18 EXT. ENTARDECER – POSTO DE GASOLINA 1 ZONA LESTE 18 Imediatamente o carro sai da pista (provocando mais protestos de outros motoristas, com as buzinas e as xingações). O carro já está sendo abastecido e os quatro estão fora dele, cada um com uma latinha de cerveja (Raio de Sol com suquinho). Uma FRENTISTA Raimunda de calça justa, atende os manos. JORGINHO Sério, pra onde a gente vai? Tem quermesse na Vila Matilde! PEDRÃO Mas você pensa pequeno, né Jorginho? Nós vai pros Jardins encher essa barca de mulher fina, saca? JUNIOR Jardins? Ueba!!! JORGINHO Aí, mano, Jardins é longe pra caramba! PEDRÃO Longe pra quem vai de buzão. De carro a gente vai num minuto.É Radial e Marginal. Pá e bola. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 11. JORGINHO Se é só pra catar mulher, tá cheio de gordelícia aqui na ZL. PEDRÃO Ê pobreza! Vai querer comparar?! Mulher dos jardins tem cabelinho loiro, franjinha, calça jeans justinha, peitinhos empinadinhos... Não é esse cadáver com cheiro de ônibus da Vila Formosa! JUNIOR As minas do Tatuapé acham que têm o rei na barriga. E depois você vai ver, elas são de Itaquera, Itaim Paulista, Jardim Castelo... Só pra chegar no Tatuapé elas pega uns três bumbas. Frentista entrega a chave, Pedrão, Junior e Jorginho entram eufóricos e excitados no carro. Raio de Sol paga o frentista, depois também entra no carro. O carro sai cantando pneu. 19 EXT. ENTARDECER/NOITE – ZONA LESTE 19 Várias passagens mostram o carro e pontos de vista da ZL, câmera acelerada. Música Tema. 20 EXT. NOITE – POSTO DE GASOLINA 2 ZONA LESTE OMITIDA 20 21 EXT. NOITE – AVENIDA 23 DE MAIO/CHROMA Pedrão dirige invocado. Junior e Jorginho não se importam. PEDRÃO Sabe o que tá faltando aqui? Bebum! Breja! Quem paga uma rodada? RAIO DE SOL Você sabia que beber álcool também é negativo pro carma? PEDRÃO Eu é que vou perder a carma contigo, moleque. Eu quero cerva, que é bebida de macho e só macho que sabe beber é que ganha as minas! Você vai pagar umas brejas lá nos Jardins, Banho de Lua! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 12. RAIO DE SOL Eu já paguei a gasolina.E meu nome é Raio de Sol! JUNIOR Eu tenho 30 (procura a gorjeta amassada) e duas pilas pra noite inteira. JORGINHO Ganhou. Tenho 25. Pedrão faz cara feia. PEDRÃO Você sai de casa com 25 reais? Como você vai se divertir com 25 reais nos Jardins? JORGINHO Dá pra duas brejas e a condução de volta. Jorginho liga o rádio. ATOR RÁDIO (OFF) Aí mano, precisa falar nada, mano... Aí, mano: que ser gay, mano? Cê seje gay, tá ligado? Aí mano, deixa eu falar, mano! PEDRÃO (DESLIGA) Quem mandou ligar o rádio? Cara folgado... eu quem arrumei este carro, eu quem mando...Fica ouvindo música em vez de prestar atenção nas minas.... Estamos na zona dos Jardins, macacada. A partir de agora é temporada de caça. Novamente explodem em alegria, dão tiros com os dedos para o alto. Entra a música te ma, instrumental. 22 EXT. NOITE – RUAS DA VILA MADALENA 22 Montagem (a la Jogo do Amor em Las Vegas) de clip de passagem do carro por bares lotados, e eles observam algumas LINDAS MULHERES nas mesas das ruas. Alterna com diálogos soltos e termina com a coreografia dos Manos cantando o refrão da música. Imagens das minas achando o grupo o fim da picada. Pagam o maior mico na coreografia sem graça. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 13. JORGINHO Nossa mano... Nunca vi tanta mina boazuda... JUNIOR Mó gostosa... PEDRÃO Não te falei? Mina de Jardins é outro papo... RAIO DE SOL Aqui não é Jardins. É Vila Madalena. JORGINHO Aqui dentro da barca ninguém tá vendo a gente. PEDRÃO Temos que se expor lá fora. JORGINHO E o sereno? PEDRÃO A gente exibe o charme da zona leste pra essa mulherada... JORGINHO Tô com frio... JUNIOR Cada breja custa 15 pau. PEDRÃO Nossa! Quinze pau? JORGINHO Vamos pra casa? PEDRÃO Vai te catar, meu! Se num enxerga não? As minas tá tudo olhando pra nois! JORGINHO Elas não estão olhando pra nós, Pedrão. Elas tão rindo de nós. Corta para mesinha onde estão Raio de Lua e uma AMIGA. Elas estão bem distantes dos quatro manos. Amiga aponta para o grupo, que dança na rua. AMIGA DA LUA É seu irmão, Lua! E seu primo! Olha lá! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 14. RAIO DE LUA (ESCONDE O ROSTO, ENVERGONHADA) Você tá enganada. Nunca vi esses palhaços na minha vida. 23 OMITIDA 23 24 EXT. NOITE – AVENIDA JARDINS/CHROMA 24 O carro segue. Pedrão está ainda mais bravo. Jorginho, de agasalho, tira uma maçã embrulhada em papel alumínio da pochete. Raio contempla as ruas. Junior contrariado. PEDRÃO Noite mixa até agora... JUNIOR Falei que a gente devia ter ido pra Sílvio Romero, mano! JORGINHO Nem a menina que pede esmola olhou pra nossa cara! JUNIOR Ainda bem. Tô sem trocado, tá ligado? JORGINHO Pelo menos era uma mulher falando com a gente. 25 EXT.NOITE – RUA DA BOATE 25 Pedrão estaciona o carro de repente, dando um susto em todo mundo. JUNIOR Vai com calma, mano! Tá maluco?! PEDRÃO Tá vendo aquela fila ali cheia de mulher? É nessa fila que eu vou entrar. Quem vem com o papai? Ao fundo uma boate com uma extensa FILA. 15. 26 EXT. NOITE – FRENTE DE DISCO 26 Com Pedrão na liderança, Junior e Jorginho, que ajeita o agasalho, seguem o fim da fila, onde se colocam muito agitados. JORGINHO Afinal prá que é essa fila? JUNIOR Já sei: eu vou lá e pergunto. Sempre eu. PEDRÃO Tá louco?! Vamo demonstrá que tamos por fora? Depois não ganha mulher e não sabe por quê! JORGINHO Só sei que a fila não anda, e eu pisei numa poça dágua. (senta na calçada) Minha meia tá congelando... Cadê meu primo? Jorginho levanta-se e procura por Raio de Sol. 27 EXT. NOITE – ENTRADA DO CLUB 27 Raio de Sol vem curiosamente checar o que acontece na porta. Vê uma HOSTESS selecionando os que entram e os que são barrados. Um SEGURANÇA indica-lhe o fim da fila. RAIO DE SOL E ai, grande, pra que é essa fila? SEGURANÇA É um clâb. RAIO DE SOL O quê? SEGURANÇA Um clâb, discoteca... RAIO DE SOL Ahnnn...Valeu. (faz sinal de paz e amor) Fica na paz... 16. 28 EXT. NOITE – FRENTE DE DISCO 28 Os três amigos chateados esperam. Rio de Sol chega perto deles. Pedro não percebe a sua chegada. PEDRÃO Essa fila bundona não anda? RAIO DE SOL Aqui é um clâb. JUNIOR Um o que?! Crãbs? RAIO DE SOL Um clâb. É tipo uma discoteca dos Jardins. JORGINHO E paga pra entrar? PEDRÃO Você acha que se pagasse ia ter essa fi la toda? JORGINHO Paga ou não paga? RAIO DE SOL Tem uma porteira que olha os figura, e diz: você entra. Você não. Tem uns que entra sem ela falar nada. PEDRÃO Então! É só fazer cara de rico! JORGINHO E como é cara de rico? PEDRÃO É o contrário dessa sua, mané. Vamo. Liderados por Pedrão, os quatro furam a fila e são vaiados por outros FREQUENTADORES. 29 INT. NOITE – ENTRADA DA DISCO 29 Os quatro chegam perto da hostess e Pedrão tenta entrar sem falar nada, fazendo cara de rico. HOSTESS Epa! Onde vocês pensam que vão? (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 17. JORGINHO Entrar. JUNIOR No clâb. HOSTESS Quem decide quem entra sou eu! PEDRÃO Tem uns mano esperando nois lá dentro. Eles acenam para supostos amigos. Chamam por um deles: – e aí, Pezão! HOSTESS Você tem flyer? JUNIOR Acuma?! Eles trocam olhares confusos, tentando descobrir o que é flyer. Pedrão blefa. PEDRÃO Claro que temo. HOSTESS Tem nada. A fila pressiona para entrar. HOSTESS Bom, já me diverti muito com vocês, agora por favor se mandem porque a fila, vocês sabem, anda. Hostess escolhe outros da fila para entrar. Pedrão puxa os outros três para um canto. PEDRÃO Alguma idéia? JORGINHO Vamo pra casa? PEDRÃO Vai te catá, bundão! Lá dentro tá cheio de mulher gostosa e eu não não vou voltar pra casa sozinho! Quem quiser ir pra casa vai firme. De busão! RAIO DE SOL Pô, mas a gente veio junto... (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 18. PEDRÃO Olha, pivete, eu não sou flor pra andar em buquê, tá ligado? Quer ficar, fica. Quer ir embora, vai tarde. Pedrão se vira e vai decidido na direção da Hostess. Os outros três ficam indecisos por um segundo e seguem atrás. De novo, Pedrão tenta passar pela Hostess com cara de rico, mas ela percebe e o interrompe. HOSTESS Epa! Eu ainda não liberei vocês! JUNIOR Se falou ainda, é porque vai liberar! Junior atira-se no sofá. Os outros o imitam. HOSTESS Vocês são muito... exóticos. RAIO DE SOL Eu sou de Pederneiras. HOSTESS Humm...É isso que eu quero aqui. Essa mistura de gente hypada, up to date, tipo gente... (aponta Raio) ... de Pederneiras. JORGINHO Eu sou da Vila Matilde! JUNIOR Vila Joia! PEDRÃO Eu sou do Morumbi. HOSTESS Rá! Morumbi. Percebe-se. Sangue azul. Tá legal. Entra logo antes que eu mude de idéia. Paga ali no caixa. Bebidas à parte. PEDRÃO Paga?! HOSTESS Sessenta. JUNIOR Sessenta pila?! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 19. HOSTESS Cada um. A hostess vai em direção a uma celebridade que chega, faz todo o charme para passá-la à frente dos outros da fila. Garotos decepcionados. A Hostess e a ARTISTA trocam beijinhos na boca. Junior fica chocado. JUNIOR Olha aquela artista! Poca vergonha... JORGINHO Foi só um selinho. PEDRÃO E por acaso você dá selinho no porteiro do seu prédio? Pedrão avança sobre Jorginho com fúria. JORGINHO Que que é? Que que é?! Tá tirando uma comigo?! Vai querê?! PEDRÃO Carma, Jorginho... Chega o segurança grandão. SEGURANÇA Que é que tá acontecendo aqui? JORGINHO Num rela em mim! Num rela em mim! JORGINHO Eu moro em casa, mané. Sobrado não tem porteiro. Jorginho sai invocado e atravessa a rua atropelando os carros. Os outros três vão atrás, atrapalhados. Junior comenta. JUNIOR Moio, melhor sartá fora. 30 EXT. NOITE – MARQUISE IBIRAPUERA 30 Os quatro amigos caminham sob a marquise do Parque do Ibirapuera. Patinadores, skatistas e jogadores de hockey. JUNIOR Se a gente tivesse ficado no Tatuapé... (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 20. PEDRÃO Nasceu pra ser pobre mesmo... Vocês não percebe? Se é pra ficar na Zona Leste, a gente nunca vai ter nada na vida. A gente precisa se arriscar pra conseguir coisa melhor. JORGINHO Tá tendo uma quermesse no A.E.Carvalho, vamos pra lá? PEDRÃO Já falei. Hoje ou eu durmo acompanhado ou não durmo. JORGINHO Nem as minas de Itaquera dão pra gente. Vai dizer que já comeu alguma... PEDRÃO Eu sou fino. Seleciono bem os meus abates. Pedrão sai na frente em direção ao estacionamento. Depois de uma pausa, os outros vão atrás. EXT.NOITE – JARDIM DAS ESCULTURAS (OCA) 31 Os quatro seguem em direção ao estacionamento. Raio sobe nas esculturas redondas e anda meio pulando como se fosse um jogo de amarelinha. JORGINHO Você não abate nada, Pedrão. Aqui ninguém comeu ninguém. RAIO DE SOL Eu já tive minha iniciação sexual na comunidade. Pedrão leva susto. PEDRÃO Conta outra, moleque! RAIO DE SOL Então pergunta pra minha mãe. JORGINHO Pera lá! Você já trepou... e sua mãe já sabe?! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 21. RAIO DE SOL Claro. Foi com uma amiga dela. Uma mulher que eu conheço desde pequeno, com uma energia superlegal. Junior acompanha sua exclamação com um gesto. JUNIOR Viche! PEDRÃO Vai te catá! Vai te catá! Não quero saber mais nada! Cala essa boca! O silêncio dura alguns segundos. Eles se aproximam do carro e Pedrão à frente. RAIO DE SOL Lá na comunidade a gente tem um ritual de iniciação sexual quando faz 14 anos. Eu já tenho 15. Meu ritual foi no fim do ano passado. PEDRÃO Eu falei pra calar a boca! Pedrão fica realmente muito bravo, entra no carro e bate a porta com força. Trava as portas. Os outros tentam entrar, não conseguem. Batem nos vidros, nas maçanetas e voltam para o vidro com velocidade cada vez maior. Mas Pedrão continua imóvel no volante. 32 EXT.NOITE – SAIDA DO PARQUE IBIRAPUERA (OBELISCO) 32 O carro passa pelo obelisco e segue para o viaduto para a 23 de maio. 33 INT. NOITE – OBELISCO/CHROMA 33 Pedrão já está normal, como se nada tivesse acontecido. PEDRÃO ... uta lugar morto, meu! JORGINHO Olha lá! PEDRÃO O quê? O quê? (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 22. JUNIOR Um monte de homem parado! PEDRÃO Isso só pode significar uma coisa. JORGINHO O quê? PEDRÃO Se tem um monte de homem parado, isso quer dizer que deve passar um monte de mulher por aqui! Os quatro explodem de novo em alegria e excitação dentro do carro. 34 EXT.NOITE – PRAÇA EM FRENTE AO IBIRAPUERA 34 Estacionam. Os quatro desembarcam e caminham em direção aos homens da calçada. Vemos os GAROTOS DE PROGRAMA e CLIENTES na calçada. No escuro, não se notam bem dois TRAVESTIS e uma DRAGQUEEN. JUNIOR Deve ser que nem no interior. Os caras ficam parado e as minas ficam dando volta em volta, tá ligado? RAIO DE SOL Em Pederneiras é assim! Chama footing! PEDRÃO Com tanto homem aí é que daqui a pouco deve chegar a mulherada! JORGINHO É, tá certo. Os caras não iam ficar parado à toa. Os quatro caminham mais um pouco e param numa esquina. Algum tempo se passa e um carro para ao lado deles. JORGINHO Acho que o cara quer informação. Eu não conheço nada dessas ruas! PEDRÃO Deixa comigo. Vou sou saber mais detalhes da mulherada aqui. Ocês não servem pra nada de útil, cambada! Pedrão vai até o carro e se agacha para falar com o motorista. Dentro do carro está WANDERLEY. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 23. PEDRÃO E aí, mano? Beleza?... WANDERLEY Oi, você é novo por aqui? PEDRÃO É, eu sou do Morumbi. WANDERLEY Tá calor né? Quer uma cerveja? PEDRÃO Tá geladinha? Pedrão disfarça e faz um sinal para sua turma dizendo que está se dando bem. Wanderley entrega a cerveja para Pedrão. PEDRÃO Valeu, meu chapa. Me diz aí, e a mulherada aqui quando é que chega? WANDERLEY A mulherada não sei. Mas e você, é liberal passivo? PEDRÃO Eu não se ligo nessas coisa de política não. WANDERLEY Quanto você cobra? PEDRÃO Epa! Tá pensando o quê? WANDERLEY Fala seu preço. Achei você um gato. Pedrão se assusta e cospe um chafariz de cerveja sobre Wanderley. Começa a berrar com ele. PEDRÃO Tá me achando com cara do quê?! Sou muito do macho, falou?! Te pego de pau, vagabundo. Vai te catar! Chibungo! Wanderley faz sinal de que está de olho em Pedrão e sai cantando o pneu. Pedrão mira a cerveja na direção do carro. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 24. PEDRÃO Pederasta! Frescão! Homossexual! JUNIOR (GESTO) Viche!! Pedrão joga a lata de cerveja, ela faz uma curva e cai em pés aparentemente femininos. CAM sobe, e percebemos que pertencem à DRAG QUEEN. DRAG QUEEN Viche... Pedrão se volta indignado aos amigos. PEDRÃO Vê se pode! Ó a do cara! O cara queria me comer! Os outros três caem na gargalhada. A Drag continua assustada. JUNIOR Quanto ele queria te pagar? Quem sabe não dava pra gasolina? JORGINHO O Pedrão dava sim! Ô se dava! RAIO DE SOL Eu acho válido qualquer forma de relacionamento entre pessoas do mesmo sexo... DRAG QUEEN (IMITA GESTO DE JUNIOR) Viiiiche... PEDRÃO Que válido o que, pirralho?! Vão se catar oceis tudo! JUNIOR E ainda bebeu a cerveja do cara! JORGINHO No gargalo! Pedrão se toca, cospe, limpa a boca com a manga da camisa. JORGINHO Putz, é mesmo! E se tiver contaminado, veio?! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 25. PEDRÃO Contaminado com quê?! Os três amigos e a Drag riem da ingenuidade de Pedro. 35 INT. NOITE – PROXIMIDADES PRÁÇA DA SÉ/ CHROMA 35 O carro desce lentamente em direção ao centro. Pedrão indignado. PEDRÃO Eu queria ter enchido tudo aqueles viados de porrada. Chibungada! Bando de pederasta. JUNIOR Êpa! To vendo mulher! PEDRÃO Não enche o saco, mora! Com a nossa sorte deve ser traveco. JUNIOR To falando, cara! Lá no ponto do bumba! JORGINHO Putz. É gostosa pra caramba. PEDRÃO Vou chegar junto. RAIO DE SOL Não é certo estacionar em ponto de ônibus. PEDRÃO Cala a boca, baseado ambulante. A gente estaciona no ponto e acabou. O busão demora, a mina fica impaciente. A gente oferece carona. Ela aceita. Aí em agradecimento ela dá pra gente e a gente come ela. Deu pra entender, o Raio Que os Parta? RAIO DE SOL Quem paga a multa? Seu primo? PEDRÃO Não enche meu saco moleque! Pedrão para o carro. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 26. PEDRÃO Descola mais uma grana que o Junior vai fazer o corre de umas breja. JUNIOR Às ordem, chefe! Júnior desce do carro. 36 EXT.NOITE – VIA DE ACESSO AO PÁTIO DO COLÉGIO 36 Pedrão estaciona o carro. Júnior chega à janela onde esta Raio de Sol e aponta a arma imaginária sob o casaco. JUNIOR Vamo lá riponga, solta a bufunfa. RAIO DE SOL (DANDO O DINHEIRO) Eu quero Chá Verde. PEDRÃO (PARA JUNIOR) Trás uma cerva a mais pra gente oferecer pra mina. Junior sai de cena com o dinheiro. RAIO DE SOL Jorginho, eu preciso fazer xixi. JORGINHO E eu com isso?! RAIO DE SOL O que que eu faço? PEDRÃO Ué, tira o coisinho pra fora e mija. Ninguém te ensinou ainda? RAIO DE SOL Aqui? Na rua? Na frente de todo mundo?! PEDRÃO Faz o seguinte. Vai ali naquele jardim. Depois encontra a gente no ponto do busão. Raio de Sol também sai rapidinho do carro em direção do jardim. Lentamente, Pedrão (com Jorginho do lado) vai em direção ao ponto. 27. 37 EXT. NOITE – PÁTIO DO COLÉGIO – PONTO DE ÔNIBUS 37 Pedrão encosta. De dentro do carro, puxam con-versa com a MINA DO PONTO, que usa um MP3. PEDRÃO Oooiiiiiiiiiiiiiiii... A Mina do Ponto não se mexe. PEDRÃO Tô falando com você, ô. MINA Ô é breque de burro. JORGINHO Então é por isso que você tá parada? PEDRÃO Cala a boca, Jorginho. Assim você espanta a mina. MINA Eu não sou mosca pra ser espantada. JORGINHO Pô, a mina é a maior metida. PEDRÃO Desculpe aí, meu amigo aqui é meio crianção... Escuta, pra onde você vai? Pedrão anda em direção à Mina. MINA Não amola! Sai voando, vai. Vai encher o pacuçá de outra! PEDRÃO Sabe do que mais? Meu amigo crianção aqui tá certo. Cê é a maior metida, mina. Esperando ônibus que nem favelada e posando de bacana... MINA Ah, vai ver se eu tô lá na esquina, vai! PEDRÃO Deve estar, aquilo lá na esquina é um puteiro! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 28. MINA Pois é, quem me contratou lá foi sua mãe. JORGINHO Ih, Pedrão, ela tá chamando sua mãe de vagabunda! PEDRÃO Tu é folgada. Na zona leste não durava nem 10 minuto. MINA Folgado é teu rabo. Vaza. JORGINHO Você viu o que ela falou?! Você viu o que ela falou?!! PEDRÃO Eu não vi o que ela falou, eu ouvi. E escuta aqui, seu projeto de piranha. Você tá querendo entrar na porrada? Tá? Eu vou aí e te cubro! Pedrão puxa a saia da Mina e ela fica atônita, tenta vestir a saia novamente e parte para cima dele. Ele dá uma volta em torno do carro. A mina o persegue. Ele entra e se tranca. Neste momento Jorginho sai e da outro puxão na saia da Mina. Corre para o carro mas tropeça junto ao meio-fio, ela o chuta no chão. Ele capengando entra no carro. A Mina do Ponto saca uma faca da bota e vai para a frente do carro. MINA Então vem! Sai do carro pra você ver o que é bom pra macho. (Aproxima-se da lateral do carro) Vem se é homem! Vem os dois de uma vez! Ela cospe neles. Assustados, Pedrão e Jorginho fecham as janelas e o teto solar do carro. PEDRÃO Não, o carro não! JORGINHO Eu falei que a gente devia ter ido embora! MINA Vem! Desce do carro! Vem, covardão! Vêm os dois que eu capo os dois! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 29. PEDRÃO Essa mulher é louca! Doida! Devia estar internada! MINA Vem! Vem, seus froxos! Eu perco o ônibus mas não perco a chance de capar vocês! JORGINHO Ela é obcecada em capar! PEDRÃO Não! O carro não! Pedrão observa com horror os dois punhos da Garota do Ponto segurado o punhal lá fora e fechando unidas lá fora e baixando com força em slow motion. Da expressão assustada de Pedrão CORTA PARA 38 EXT. DIA – RUA ZONA LESTE 38 FLASH BACK da primeira cena. Um flash da entrega da chave, imagem e som distorcidos. Na imaginação de Pedrão, Reinaldo ameaçador: REINALDO ... eu vou ficar muito, mas muito, mas muito boladão mesmo se esse carro voltar com um risquinho ou um amassado, por menor que seja. Estamos entendidos? VOLTA PARA 39 EXT. NOITE – PÁTIO DO COLÉGIO (PONTO DE ÔNIBUS) 39 O punho da Mina do Ponto continua sua lenta descida em slow motion e danifica o capô e a lateral do carro. PEDRÃO Nããããããããõooo!!! Não faz isso! Meu primo... JORGINHO Mal educada! 30. 40 EXT. NOITE – ANHANGABAU 40 Raio de Sol entoa um mantra enquanto faz o longo xixi. Ele não ouve o bate boca entre os amigos e a Mina do Ponto. Passam dois SKATISTAS. SKATISTA Mijão! 41 EXT. NOITE – AVENIDA CONSOLAÇÃO PONTO DE ÔNIBUS 41 A Mina quebra o farol do carro. MINA Vocês mexeram com a mina errada! PEDRÃO Pára de bater no carro, sua piranha! Pedrão e Jorginho ficam apavorados. A Mina do Ponto aponta a própria faca. MINA Ó a piranha aqui! Xispa daqui, seus bostinhas! Volta pro mato de onde vocês vieram! JORGINHO Se não fosse tão malcriada podia ter pe gado uma caroninha... Pedrão acelera e sai cantando o pneu. Garota mostra o dedo médio e em seguida retoca o batom. 42 EXT.NOITE – LARGO DE SÃO BENTO 42 Vê-se o carro virando à esquina, acelerando. Jorginho gritando. JORGINHO Para, para, para! 43 EXT. NOITE – VIADUTO DO CHÁ 43 O carro faz a curva acelerando ao máximo. De repente, para e estaciona. PEDRÃO Você pode me explicar por que eu tive que parar? (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 31. JORGINHO A gente não pode deixar o Raio e o Junior pra trás. PEDRÃO Você tá confundindo balada com filme de guerra. Sim, a gente pode deixar os bostinhas pra trás. Eles são adultos e sabe se virar! JORGINHO O Raio tem 15 anos! PEDRÃO Com 15 anos eu já tava trampando! JORGINHO Então eu também fico. Jorginho sai primeiro, nervoso. Pedrão sai depois para verificar os estragos. JORGINHO Minha mãe me mata se acontecer alguma coisa com o Raio. E é sacanagem largar o Junior com aquela mina doida solta! PEDRÃO Saco! Saco! Saco! Então vai lá! JORGINHO E você? PEDRÃO Alguém tem que cuidar do carro. JORGINHO Bundão! Covarde! Pedrão avalia os danos. PEDRÃO Na hora de entregar o carro todo detonado pro meu primo você não vai estar comigo, né?! Covarde! Bundão! Jorginho bate a porta do carro e sai. Volta em direção ao ponto de ônibus, com muita vontade. Em contraste, Pedrão sai lentamente. 32. 44 EXT. NOITE – SUBIDA DE ACESSO AO PÁTIO DO COLÉGIO 44 CAM acompanha Jorginho e quanto mais ele se aproxima do ponto, mais devagar e receoso vai ficando. 45 EXT. NOITE – BANCA DE JORNAL E RUA FRENTE AO PONTO DE ÔNIBUS 45 Quando chega lá, Jorginho se esconde atrás de uma banca de jornal para observar o ponto a uma distância segura. Ele vê que a Mina do Ponto continua esperando o ônibus, como se nada tivesse acontecido. Em seguida, observa assustado que Junior se aproxima do ponto com um saco de supermercado. JORGINHO (SUSSURRA PARA SI MESMO) Sai fora, Gilvanilson! Essa mina é psicopata! Sai fora, sai fora... Sem dar muita bola para a Mina do Ponto, Junior chega ao ponto e procura pelo carro de Pedrão. A Mina se aproxima dele por trás. PDV Jorginho. À distância, ele observa a garota dando uma gravata em Junior por trás. Tenta fazer sinais para o amigo. JORGINHO (SUSSURRA) Tá morto. O Gilvanilson tá morto! Eu sabia que a gente não devia ter saído de casa! De perto, vemos que Jorginho se assustou com a gravata. MINA E não é que encontro o melhor farmacêutico da cidade? JUNIOR Olha quem tá aqui... A Mina da injeção... O que você tá fazendo por essas bandas? MINA Vim dá um rolê. E você? JUNIOR Eu to na barca de uns chegados... Você não viu não? Junior descreve o carro de Pedrão. A Mina começa a rir. PDV JORGINHO – garota mostra a faca para Junior. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 33. JORGINHO (SUSSURRA) Ela vai furar ele! Ela vai furar ele! Subitamente um alarme começa a tocar numa moto ao lado de Jorginho, que sai correndo por trás da banca. De perto, a Mina abraça Junior, que ri. Vê-se Jorginho correndo no fundo. 46 EXT. NOITE – DESCIDA DO ACESSO AO PÁTIO DO COLÉGIO 46 Jorginho corre. Saca a bombinha de asma. Borrifa. 47 EXT. NOITE – VIADUTO SANTA IFIGÊNIA 47 Junior e a Mina do Ponto bebem as cervejas e caminham pelo viaduto. Ao fundo, a escultura do gatinho. MINA Seus amigos mexeram comigo... e eu fui obrigada a dar uma surra... JORGINHO Surra?! Neles?! MINA Não, no carro! Doi mais! JUNIOR Gatinha malvada. Você tá voltando pra Vila? MINA (SEDUTORA) To... e trago uma penis...cilinazinha aqui na bolsa. Você não quer aplicar sua... seringa... em mim? JUNIOR Pode ser lá em casa? MINA Não! Eu quero na farmácia. Só funciona na farmácia. JUNIOR Então eu volto com você pra Vila. Depois eu converso com os truta. 34. 48 EXT. NOITE – VIADUTO DO CHÁ 48 Jorginho chega correndo e reencontra Pedrão, que tenta encaixar o farol quebrado. Fala esbaforido, usa a bombinha. JORGINHO A mina... a psicopata... ela sequestrou o Gilvanilson. Roubou nossas cervas. Vamo chamá os ómi! E o Raio?! O cara sumiu!! Minha mãe vai me matar! Minha tia vai cuspir no meu túmulo! Pedrão larga as ferramentas (ou o esparadrapo) no chão. PEDRÃO Calma cara! Você tá histérico. A gente precisa refretir. Deixa eu pensar! Jorginho expectante. Pedrão decidido. PEDRÃO Pensei. Vamos procurar um lugar calmo pra gente pensar melhor. 49 EXT. NOITE – RUAS DIVERSAS 49 Clipe de transição. A noite fervendo. 50 EXT. NOITE – BAR MULHERES 50 O carro para diante do Tom Jazz. No totem: Sábado – As Perigosas. Jorginho e Pedrão entram. 51 INT. NOITE – BAR DAS MULHERES 51 Uma CANTORA toda tatuada é acompanhada por MULHERES MUSICISTAS ao piano, contrabai xo, bateria e trumpete (ou pistom). Jorginho e Pedrão olham o bar em panorâmica. Todas as mesas estão ocupadas por MULHERES. As GARÇONETES são mulheres. É um bar basicamente de lésbicas, mas Jorginho e Pedrão não percebem esse detalhe. PEDRÃO (DISCRETAMENTE) Mano... Acho que a gente se deu bem. JORGINHO (DISCRETAMENTE) Só tem mulher! E só nós de homem! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 35. Pedrão e Jorginho se sentam, chamam a GARÇONETE. PEDRÃO Cara... Nenhuma concorrência! JORGINHO Vamos sair cada um com duas... Fazem o gesto do revolvinho. A garçonete aparece muitíssimo mal encarada. PEDRÃO Epa, manda uma breja geladinha pros sortudos aqui... A garçonete se vira e sai sem dizer uma palavra. Quando está bem longe, Jorginho faz seu pedido baixinho. JORGINHO ... e uma porção de fritas pra mim! PEDRÃO Invocada, hein? JORGINHO Eu nunca vi tanta perereca à disposição. PEDRÃO Se a gente perder essa chance... JORGINHO Olha aí do seu lado... Pedrão vê uma GAROTA sozinha na mesa ao lado. PEDRÃO (PARA A GAROTA) Sozinha? Quer levar um papo? A garota tem um sorrizinho misterioso na cara. GAROTA DO BAR É? Que tipo de papo? PEDRÃO Qual é seu signo? GAROTA DO BAR Vem cá, você surgiu de onde? PEDRÃO Do Morumbi. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 36. GAROTA DO BAR E você quer me levar para seu apartamento chique do Morumbi? PEDRÃO Na minha máquina turbinada! Pedrão faz ruídos de motor. A garota ri. Nesse momento outra mulher, sua ACOMPANHANTE, se senta ao seu lado e encara Pedrão com fúria no olhar. Pedrão deixa a garota de lado. PEDRÃO Aí, Jorginho, qualé a dessa outra? JORGINHO Vai ver que é irmã dela, sei lá... Nesse momento a garçonete traz a cerveja, que deposita com violência na mesa, junto de dois copos e a porção de fritas. A garçonete sai olhando feio. Pedrão pega a cerveja. PEDRÃO Ei! Tá quente! JORGINHO O serviço aqui é ruim pra caramba... PEDRÃO Não sei como pode juntar tanta mulher com um chope quente desse.. JORGINHO Vou dar um mijão. Pede pra trocar a breja. PEDRÃO Aproveita pra dar uma investigada. JORGINHO Investigada no quê? PEDRÃO Nas mulher, ô xarope! Nas muguegadas! 37. 52 INT. NOITE BAR DAS MULHERES – BANHEIRO MASCULINO 52 Jorginho faz xixi sozinho no banheiro vazio. Depois lava as mãos, se olhando no espelho. Percebe que faltou tirar um fio da sobrancelha e tenta arrancar lá mesmo no banheiro. Cheira o sovaco. Tenta cheirar o próprio hálito. 53 INT. NOITE – BAR DAS MULHERES – ANDAR SUPERIOR 53 Em slow motion, Jorginho observa outras mesas no andar superior. Foca em dois pares de pernas que consegue ver por baixo de uma mesa. Faz cara de paquerador e vai na direção dessa mesa, de olho nas pernas, nos sapatos das duas mulheres. Chega mais perto, ajusta a camisa. E sem olhar no rosto das duas vai soltando sua frase-chaveco. JORGINHO Oi... tudo bem? Vocês sabem que horas são agora? Uma das mulheres consulta casualmente o relógio. MÃE DE JORGINHO Onze e dez... Jorginho! Jorginho empalidece ao ver quem são as duas mulheres. JORGINHO Mãe! Tia! Caras de espanto dos três. 54 EXT. NOITE – VIADUTO DO CHÁ 54 Júnior e a Mina andam pelo viaduto, romanticamente. MINA Eu nunca vi gente tão malas quanto os galinhas desses seus amigos! Os caras são lost pra caramba. JUNIOR Você detonou o carro total? MINA Nem sei. Eles me tiraram do sério. Quiseram me cantar. JUNIOR Eu não ponho culpa neles. Um mulherão desse porte... Junior vai se insinuando e tocando na Mina. Ela o repele. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 38. MINA Ainda não! Só na farmácia. JUNIOR Mas... por quê? MINA Porque sim. Só funciona lá. JUNIOR Nem um beijinho? MINA É melhor nem olhar muito pra mim. Junior se arrisca, ressabiado. A Mina aceita o beijo. 55 EXT. NOITE – BAR MULHERES – ANDAR SUPERIOR 55 Continua o diálogo entre Jorginho, sua mãe e sua tia. MÃE DE JORGINHO O que você tá fazendo nesse lugar a essa hora, Jorge Augusto?! JORGINHO Eu posso explicar, mãe, mas é uma lon ga história... MÃE DE RAIO E o Raio? Cadê meu filhote? JORGINHO O Raio? De Sol?! MÃE DE RAIO Ele mesmo. Cadê? JORGINHO (IMPROVISA) Ele a gente... deixou em casa. MÃE DE JORGINHO Sozinho?! JORGINHO Claro que não! MÃE DE RAIO Então quem está com ele? JORGINHO (VACILANTE) O... Junior. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 39. MÃE DE JORGINHO Que Junior?! JORGINHO Meu amigo farmacêutico. Ele me devia um favor, deixei o Raio dormindo, e o Junior vai ficar lá até eu chegar. MÃE DE RAIO Eu não acredito... Meu filho, dormindo com um desconhecido. JORGINHO Mas eu conheço ele, tia. MÃE DE JORGINHO Sabe o que você vai fazer agora? Vai direto pra casa cuidar do seu primo. Que irresponsabilidade. JORGINHO Sim senhora... MÃE DE JORGINHO Cadê seu agasalho? JORGINHO No carro. MÃE DE JORGINHO Que carro?! JORGINHO Carro? 56 INT. NOITE – BAR DAS MULHERES 56 Pedrão brinca com a contrabaixista, que sola. Joga charme para a cantora, as mulheres no plec plec, acompanham a percussão com os dedos. Jorginho interrompe Pedrão. JORGINHO Vaza, mano, sai fora, sai fora, ripa, veio. PEDRÃO Mas agora que eu to me dando bem?! JORGINHO Vai logo, mano! Jorginho arrasta Pedrão pelo braço. Deixa todo o troco que tem no bolso com a garçonete, a conta de 25 reais. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 40. JORGINHO Minha mãe tá aí! PEDRÃO Sua mãe?! O que ela tava fazendo nes se inferninho?! JORGINHO Conversando com minha tia! A mãe do Raio de Sol! PEDRÃO Aqui?! 57 EXT. NOITE – BAR DAS MULHERES 57 Pedrão e Jorginho esperam a chegada do carro. Jorginho tá desesperado. JORGINHO Aí eu disse que a gente deixou o Raio dormindo em casa. E que o Junior tava tomando conta. PEDRÃO Aí você se ferrou... Eu vou voltar pras perigosas! JORGINHO Agora ela me mandou ir pra casa. E eu não tenho a menor idéia de onde tá meu primo! Sem o Raio, eu nem volto mais! PEDRÃO E o que que você quer que eu faça?! JORGINHO Sei lá! Sei lá! O VALET traz o carro e apresenta a conta de 15 reais. Pedrão raspa os bolsos. Sem que os dois percebam, Raio de Sol está sentado no banco de trás. JORGINHO O Raio pode estar sendo estuprado em algum mato por aí! RAIO DE SOL Que horas são? Pedrão e Jorginho levam um tremendo susto. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 41. JORGINHO Que você tá fazendo aí?! RAIO DE SOL Eu fui fazer xixi, aí vocês sumiram, aí eu saí andando, aí eu vi esse tio estacionando o nosso carro lá em baixo, aí eu entrei... E olha, acho que ele bateu o carro, tá tudo quebrado... Jorginho dá uns tapas na nuca de Raio de Sol. JORGINHO Que puta susto que você me deu! Nunca mais me dá um susto desses seu pentelho. A mesma mão que dá o tapa aproxima Raio para um rápido abraço. JORGINHO Que bom que você tá aqui primo! Putsa, você não sabe do que eu me livrei! Jorginho sai do abraço e subitamente se apavora de novo. JORGINHO E o Junior? RAIO DE SOL (BOCEJANDO) Que que tem o Junior? JORGINHO O Junior pode estar morto com 15 facadas e 3 tecos na testa! RAIO DE SOL Como é que é? PEDRÃO Ah, vai. Você tá exagerando. JORGINHO Melhor a gente ir pro IML. PEDRÃO Nem a pau! Eu já falei mais de mil vezes que eu não vou embora sem arranjar uma rachada. Eu não volto sem arriar a bandeira do mastro! Hoje eu dou um picote! Esta noite o Junior... (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 42. PEDRÃO (aponta um revólver imaginário) ...morreu! Jorginho se apavora. 58 EXT. NOITE – LARGO DO PAISSANDU – GALERIA DO ROCK 58 Junior e a mina do Ponto dividem o MP3 e coreografam uma música. O ônibus chega e eles embarcam, felizes. 59 EXT.NOITE – PASSAGEM DR. ARNALDO 59 O carro no mergulhão da Doutor Arnaldo para a Paulista. 60 EXT. NOITE – RUA AUGUSTA/CHROMA 60 Detalhe: placa da Rua Augusta. Apesar da hora o movimento é grande e o trânsito, lento. No interior do carro (em chroma), Raio de Sol medita, como se estivesse roncando. Ele abre os olhos e se vê pelo vidro da frente sob seu PV muita gente e carros parados em fila dupla. JORGINHO O Pedrão, faz uma hora que nós estamos parados nesta Rua Augusta e nada, mano. Cadê as minas? PEDRÃO Que minas?... JORGINHO As de programa. Ai só tem as metida. PEDRÃO Assim que terminas as metida começas as dama. Aí vai ser o paraíso! Jorginho se anima e grita para fora do carro. JORGINHO Vamos logo seus cornos do caramba! PEDRÃO Para com isso, mano! Que vergonha! JORGINHO Você conhece os caras da rua? (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 43. PEDRÃO Não. JORGINHO Eles te conhece? PEDRÃO Não. JORGINHO Então... PEDRÃO (PAUSA. ABRE A JANELA E GRITA) Bando de roda presa! JORGINHO Anda logo, seus quase morto! RAIO DE SOL A gasolina tá acabando... PEDRÃO Não falei?! Não falei?! O cara é o maior baixo-astral! Só roga praga...Que bosta essa Augusta... Pedrão começa a manobrar para sair da fila. Raio de Sol volta a meditar. 61 EXT. NOITE – FRENTE DA FARMÁCIA 61 Junior e Mina do Ponto chegam excitados e em atitude suspeita. Junior tira um monte de chaves do bolso. MINA Vamo logo! JUNIOR Calma! Tá duro... A Mina se adianta e levanta a porta com força e entra. Junior ouve um apito de guarda noturno. Faz sinal de silêncio para a garota. Com cuidado, tenta fechar a porta da farmácia mas não alcança. Vai atrás da Mina, a CAM enquadra um display com uma promoção tipo na comprá de 10 fraldas descartáveis, ganhe mais dois preservativos. 62 EXT. NOITE – FUNDOS DA FARMÁCIA 62 Detalhe da ampola de penicilina. A Mina sorri sedutoramente para Junior, que a segue. Entram na sala de aplicação. 44. 63 INT. NOITE – FARMÁCIA SALA DE APLICAÇÃO 63 Lá dentro, a Garota do Ponto entrega a ampola de penicilina para Junior. Os dois passam a falar com voz sexy como num filme pornô. JUNIOR É no braço ou no bumbum? MINA O de sempre... A garota do ponto fica de costas para Junior, empinando o quadril. Junior coloca a agulha e preenche a seringa. JUNIOR Tô preparando... MINA Ai, que medo... Junior deposita a seringa. Pega um chumaço de algodão e molha de álcool perto do rosto da garota. MINA Esse cheiro de álcool... eu fico doida! Junior levanta a saia da garota. Passa o algodão. JUNIOR Algodãozinho, algodãozinho Ela geme e vira os olhos de prazer. MINA Ai, que geladinho... Junior espreme o algodão cheio de álcool. JUNIOR Chuvinha, chuvinha... MINA Vem, vem... JUNIOR Olha a picadinha de mosquito. MINA Pica, pica, mosquitão... Não vemos que tipo de picada Junior deu, mas vemos em close a expressão de prazer da Mina do Ponto e ouvimos seu grito de excitação. A CAM desce por sua tatuagem e encontra Junior olhando o símbolo do Corinthians na calcinha da Mina. Ele a morde e ela grita. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 45. MINA Ai, meu pitbull! 64 EXT. NOITE – ESTAÇÃO DA LUZ 64 Fachada da Estação da Luz. Closes sucessivos de Pedrão, Jorginho e Raio de Sol, assombrados. PDV carro localiza KELLY uns metros à frente. Uma deslumbrante mulher, trajando roupas muito sensuais. RAIO DE SOL Vocês têm certeza de que ela é prosti tu ta mesmo? O carro se aproxima da Estação da Luz, em cujo passeio vaga Kelly. JORGINHO Agora dá! Agora dá! Encosta! PEDRÃO Vai lá, mano, fala com essa anja! JORGINHO Eu nunca falei com prostituta! PEDRÃO Elas é igual às mina que a gente conhece. A única diferença é que elas cobram. JORGINHO Mas eu não falo com as outra minas também?! PEDRÃO Diz qualquer coisa! Puxa conversa! O carro estaciona. Jorginho abre a janela e fala com Kelly. JORGINHO Oi. KELLY Oi. JORGINHO Você é puta? KELLY (IRRITADA) Quê?! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 46. JORGINHO (PARA PEDRÃO) Fala você. PEDRÃO (SE ESTICA NO CARRO PARA FALAR COM KELLY) Desculpe meu amigo. Ele é meio inexperiente... KELLY Sei. Tchau. Kelly começa a andar. Raio de Sol toma coragem e desce do carro, anda em direção a Kelly. PEDRÃO Pera aí! Não vai embora! Quanto é? KELLY Cem. Mais o hotel. RAIO DE SOL (PARA KELLY) Você faz sexo com pessoas desconhecidas por cem reais? Você acha que essa quan tia compensa? Sabia que o ato sexual é uma troca de energias entre seres que mmmmppfpff... Jorginho agarra o braço de Raio de Sol e tapa sua boca. PEDRÃO (PARA KELLY) O hotel quanto é? KELLY Cinquenta o período. Paga adiantado. JORGINHO Cinquenta mais cem... KELLY Vou facilitar pra você, queridinho. Nem vou usar calculadora. Cem mais cinquenta dá... cento e cinquenta. Não aceito cheque nem cartão. Qual dos três vai? JORGINHO Cem conto é pra um só?! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 47. KELLY Claro. Eu não trabalho no atacado. PEDRÃO (APONTA JORGINHO) E nós dois por cem? JORGINHO Eu sou rapidinho! KELLY Nem pensar. Dá licença pra quem pode pagar. RAIO DE SOL Você é feliz assim? KELLY O quê?!! RAIO DE SOL Você é feliz assim, usando seu corpo para satisfazer quem você nem conhece? Isso pode trazer um carma pesado pra sua próxima vida, sabia? KELLY Sai fora, vocês estão me fazendo perder tempo. E tempo aqui é dinheiro. Kelly começa a se afastar, Pedrão sai do carro e se arruma, confiante. PEDRÃO Pera aí, gata, a gente pode conversar... Jorginho também desce do outro lado. KELLY Que que é isso?! Abriram as portas da perua escolar? RAIO DE SOL Há quanto tempo você não conversa com um amigo? KELLY Que que é, você é evangélico ou o quê? RAIO DE SOL Sou neobudista tibetano. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 48. KELLY Entendi... RAIO DE SOL Eu to vendo que você tem uma aura super-legal, mas está com as cores meio opacas, por causa da sua atividade profissional... KELLY Fazer o que, meu bem? Tenho conta pra pagar. RAIO DE SOL Lá na minha comunidade, a gente vive superbem. Ninguém faz o que não quer, ninguém tem que pagar aluguel. A gente planta a nossa comida, toma banho no riacho... tudo em harmonia com a natureza. E de graça. KELLY Jura, não brinca! Adoro cachoeira. Principalmente de graça. RAIO DE SOL É logo ali, perto do Embu. Quer conhecer? KELLY Quer saber? Fui com sua cara. Vou levar você pro meu apê pra você me explicar melhor esse lance de sítio grátis. Tem cavalo? Adoro andar de poney... Kelly pega Raio pela mão e começa a puxá-lo, levando-o para a calçada da Estação. Jorginho demonstra preocupação pelo primo. Raio fica à vontade e passa o chaveco. RAIO DE SOL Legal. Se você quiser, eu te faço uma massagem energizadora que vai reconstituir a gama de cores da sua aura. Quer ver? Raio de Sol pega a mão de Kelly e aperta num ponto que a deixa em êxtase. Do outro lado da rua, Pedrão tenta se impor. PEDRÃO Epa! Pera aí! Os homens aqui somos nós. Esse cara é um pivetinho! (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 49. KELLY (PARA RAIO) Que legal, eu também sei fazer umas massagens ótimas! Vamos logo que vai chover... JORGINHO Mas ... o que eu falo pra sua mãe?! RAIO DE SOL Fala que eu apareço amanhã na comunidade com uma candidata nova... Kelly se afasta com Raio, de mãos dadas, enquanto Pedrão e Jorginho permanecem pasmados sobre a calçada. 65 INT. NOITE – ESTAÇÃO DA LUZ 65 Kelly e Raio de Sol andam pela passarela da Estação da Luz. KELLY Como você se chama? RAIO DE SOL Raio de Sol. KELLY Que nome lindo... Ela se encosta na grade. Ao fundo uma composição de trem. RAIO DE SOL E o seu? KELLY Pode me chamar de Kelly... Ela sorri para ele e passa os dedos nos lábio de Raio. Raio arrisca um beijo, Kelly deixa-se beijar. Beijo inocente, de namoradinhos adolescentes. 66 EXT. NOITE – PONTE ESTAIADA – CHROMA 66 O carro segue sem rumo, eles novamente perdidos. O astral a bordo é péssimo. Pedrão destila rancor. Jorginho está preocupado. JORGINHO ... e ainda vou ter que chegar em casa e explicar pra minha tia que eu levei o filho dela de 15 anos pra uma noitada barra pesada... (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 50. PEDRÃO Para de reclamar, mano! Meu ouvido não é penico pra tanta choradeira! Pausa de silêncio. JORGINHO Pô, Pedrão, não adianta ficar com essa cara. PEDRÃO Jorginho, você é meu mano, meu chapa, meu melhor amigo. Mas hoje eu queria trepar. Eu acordei com essa vontade. Dar um fincão. Trocar o óleo. Passar a régua. Fazer fuque-fuque. JORGINHO Deixa de ser virgem. PEDRÃO Vai te catar! Que virgem o quê?! JORGINHO Você é. Eu sou. Nunca transei com mulher nenhuma. E nem você. Mais uns segundos de silêncio constrangido entre os dois. PEDRÃO Mas ia ser hoje! Eu tinha certeza! JORGINHO Então por que chamou um monte de homens pra ir junto? PEDRÃO Ah... vai te catar. Mais silêncio. 67 INT. NOITE – BECO COM GRAFITES 67 O carro entra num beco, muito escuro. PEDRÃO Que inferno! Num acho a saída nessas ruas do inferno! O que mais de ruim falta acontecer nessa bosta dessa noite?! Nesse exato momento acaba a gasolina. (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 51. PEDRÃO Não... não... não! Pedrão tenta ligar uma, duas, três vezes. Nem um sinal. PEDRÃO Pega! Pega! JORGINHO O jeito é empurrar! PEDRÃO Que cê tá esperando? 68 EXT. NOITE – BECO COM GRAFITES 68 Jorginho empurra o carro, a luz do freio acende. JORGINHO Tira o pé do freio, Pedrão... Jorginho arria e Pedrão é forçado a estacionar no escuro. Pedrão desliga o farol. Trevas. Jorginho encosta no carro. JORGINHO Eu falei que a gente devia ter voltado. PEDRÃO Ah, vai te catar! Empurra isso aí, molenga... CAM se afasta do carro, que some no escuro da noite. FADE OUT 69 EXT. AMANHECER – PANORÂMICA DE SÃO PAULO 69 FADE IN O sol nasce. 70 EXT. DIA – FRENTE DE FARMÁCIA ZL 70 Seu Bibi chega e percebe que a farmácia está aberta. Fica alarmado. Entra na farmácia com todo cuidado. 71 INT. DIA – FARMÁCIA 71 O dono da farmácia entra em silêncio e inspeciona tudo. Vestígios de uma bagunça no chão. Perto do caixa, pega a barra de ferro da porta. Observa que a porta da Sala de Aplicação está aberta. 52. 72 EXT. DIA – FUNDOS FARMÁCIA 72 Seu Bibi, pé ante pé, já com a barra levantada se aproxima da sala de aplicação e dá um chutão na porta. 73 INT. DIA – FARMÁCIA SALA DE APLICAÇÃO 73 Junior está largado no chão, dormindo pesado e acorda com o chute. Dá de cara com o chefe o ameaçando com a barra. JUNIOR Oi! Sou eu! O Juniorrrrrrr! SEU BIBI O que você tá fazendo aqui, Junior?! Dormindo? JUNIOR Eu posso explicar! Eu... eu... eu cheguei muito cedo. E resolvi tirar uma soneca. SEU BIBI E deixou a porta aberta! (dando uma geral na sala, tira os olhos do chão) Gostei que você tenha chegado tão cedo. Eu reconheço o esforço desinteressado de um funcionário. Mas dá uma arrumada nessa sala. Tá uma bagunça! O chefe tira os olhos de Junior, que encontra uma calcinha no chão, a guarda disfarçadamente no próprio bolso, antes que o dono da farmácia volte a olhar para ele. SEU BIBI Recomponha-se, Junior porque hoje vai ser um longo domingo. Nós dois só saímos daqui à noite. O Dono da Farmácia sai e fecha a porta. Junior finalmente consegue respirar e esfregar os olhos vermelhos. Ele começa a arrumar a salinha. En-contra uma injeção espetada sobre dois papéis no pacote de algodão. Junior apanha o primeiro. É uma receita médica: Danofloxanil-20, uma aplicação intramuscular por semana, durante cinco semanas. O segundo papel é um bilhete: Você quer me ajudar nesse tratamento? Sábado que vem eu volto para a segunda dose. Junior sorri orgulhoso de si mesmo. 53. 74 EXT. DIA – RUA MAUÁ 74 Raio de Sol sai de um Hotel fuleiro com Kelly. Em total contraste com as roupas de trabalho da noite anterior, Kelly se veste como uma hippie de cara limpa. RAIO DE SOL Cê tá linda, meu... KELLY Essa aqui sou eu de verdade, a Grace. A Kelly é só pra noite. RAIO DE SOL Minha princesa. 75 EXT. DIA – ESTAÇÃO DA LUZ 75 O trem chega na plataforma. Kelly e Raio do Sol se embarcam e o trem parte. O sol está forte. 76 EXT. DIA – RUA PERTO DO DETRAN 76 Uma placa de proibido parar e estacionar bem em frente ao local onde o carro está estacionado. Pela janela do carro, veem-se os pés de Pedrão e Jorginho embaralhados, sugerindo que eles dormiram de conchinha, dividindo o casaco de Jorginho, meio descoberto. JORGINHO Pedrão? PEDRÃO Fala. JORGINHO Devolve meu casaco? PEDRÃO Num enche, retardado. Pausa. JORGINHO Pedrão... PEDRÃO Fala, pentelho. JORGINHO Lembra da sua promessa de ontem à noite? (CONTINUA...) ...CONTINUANDO: 54. PEDRÃO Que promessa? JORGINHO (IMITA PEDRÃO) Hoje ou eu durmo acompanhado ou não durmo! PEDRÃO Vai te catar, mano! E vê se desencosta, veio! JORGINHO Tá frio, Pedrão! PEDRÃO Desencosta! Do interior do carro ouvimos um estrondo. Pedrão e Jorginho tomam um tremendo susto. Com um solavanco, o carro é erguido. Sem entender o que está acontecendo, Jorginho e Pedro se agarram apavorados. Neste momento o carro começa a andar. Pedrão olha para fora. Jorginho surge por trás dele, tipo cena romântica de casal despertando. CORTA PARA Plano geral onde se vê o carro sendo rebocado por um guincho da CET tendo ao fundo o prédio do Detran. Entram os CRÉDITOS FINAIS Índice No Passado Está a História do Futuro – Alberto Goldman 5 Coleção Aplauso – Hubert Alquéres 7 Um Prefácio a Pelé, na Terceira Pessoa – Mário Viana e Alessandro Marson 11 Um Carro no Desvio – Beth Néspoli 15 Carro de Paulista 19 O Carro – da Peça ao Roteiro – Dagomir Marquezi 95 Carro de Paulista na TV – Ricardo Pinto e Silva 101 Carro Paulista V4 117 Crédito das Fotografias Icaro Limaverde 94, 100, 102, 104, 107, 110, 114, 120, 123, 134, 136, 138, 154, 161, 167, 199, 212, 213, 218 Demais fotografias pertencem ao acervo de Ricardo Pinto e Silva A despeito dos esforços de pesquisa empreendidos pela Editora para identificar a autoria das fotos expostas nesta obra, parte delas não é de autoria conhecida de seus organizadores. Agradecemos o envio ou comunicação de toda informação relativa à autoria e/ou a outros dados que porventura estejam incompletos, para que sejam devidamente creditados. Coleção Aplauso Série Cinema Brasil Alain Fresnot – Um Cineasta sem Alma Alain Fresnot Agostinho Martins Pereira – Um Idealista Máximo Barro Alfredo Sternheim – Um Insólito Destino Alfredo Sternheim O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias Roteiro de Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert e Cao Hamburger Anselmo Duarte – O Homem da Palma de Ouro Luiz Carlos Merten Antonio Carlos da Fontoura – Espelho da Alma Rodrigo Murat Ary Fernandes – Sua Fascinante História Antônio Leão da Silva Neto O Bandido da Luz Vermelha Roteiro de Rogério Sganzerla Batismo de Sangue Roteiro de Dani Patarra e Helvécio Ratton Bens Confiscados Roteiro comentado pelos seus autores Daniel Chaia e Carlos Reichenbach Braz Chediak – Fragmentos de uma Vida Sérgio Rodrigo Reis Cabra-Cega Roteiro de Di Moretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo Kauffman O Caçador de Diamantes Roteiro de Vittorio Capellaro, comentado por Máximo Barro Carlos Coimbra – Um Homem Raro Luiz Carlos Merten Carlos Reichenbach – O Cinema Como Razão de Viver Marcelo Lyra A Cartomante Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis Casa de Meninas Romance original e roteiro de Inácio Araújo O Caso dos Irmãos Naves Roteiro de Jean-Claude Bernardet e Luis Sérgio Person O Céu de Suely Roteiro de Karim Aïnouz, Felipe Bragança e Maurício Zacharias Chega de Saudade Roteiro de Luiz Bolognesi Cidade dos Homens Roteiro de Elena Soárez Como Fazer um Filme de Amor Roteiro escrito e comentado por Luiz Moura e José Roberto Torero O Contador de Histórias Roteiro de Luiz Villaça, Mariana Veríssimo, Maurício Arruda e José Roberto Torero Críticas de B.J. Duarte – Paixão, Polêmica e Generosidade Luiz Antonio Souza Lima de Macedo Críticas de Edmar Pereira – Razão e Sensibilidade Org. Luiz Carlos Merten Críticas de Jairo Ferreira – Críticas de invenção: Os Anos do São Paulo Shimbun Org. Alessandro Gamo Críticas de Luiz Geraldo de Miranda Leão – Analisando Cinema: Críticas de LG Org. Aurora Miranda Leão Críticas de Ruben Biáfora – A Coragem de Ser Org. Carlos M. Motta e José Júlio Spiewak De Passagem Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias Desmundo Roteiro de Alain Fresnot, Anna Muylaert e Sabina Anzuategui Djalma Limongi Batista – Livre Pensador Marcel Nadale Dogma Feijoada: O Cinema Negro Brasileiro Jeferson De Dois Córregos Roteiro de Carlos Reichenbach A Dona da História Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho Os 12 Trabalhos Roteiro de Cláudio Yosida e Ricardo Elias Estômago Roteiro de Lusa Silvestre, Marcos Jorge e Cláudia da Natividade Feliz Natal Roteiro de Selton Mello e Marcelo Vindicatto Fernando Meirelles – Biografia Prematura Maria do Rosário Caetano Fim da Linha Roteiro de Gustavo Steinberg e Guilherme Werneck; Storyboards de Fábio Moon e Gabriel Bá Fome de Bola – Cinema e Futebol no Brasil Luiz Zanin Oricchio Francisco Ramalho Jr. – Éramos Apenas Paulistas Celso Sabadin Geraldo Moraes – O Cineasta do Interior Klecius Henrique Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta Cinéfilo Luiz Zanin Oricchio Helvécio Ratton – O Cinema Além das Montanhas Pablo Villaça O Homem que Virou Suco Roteiro de João Batista de Andrade, organização de Ariane Abdallah e Newton Cannito Ivan Cardoso – O Mestre do Terrir Remier João Batista de Andrade – Alguma Solidão e Muitas Histórias Maria do Rosário Caetano Jorge Bodanzky – O Homem com a Câmera Carlos Alberto Mattos José Antonio Garcia – Em Busca da Alma Feminina Marcel Nadale José Carlos Burle – Drama na Chanchada Máximo Barro Liberdade de Imprensa – O Cinema de Intervenção Renata Fortes e João Batista de Andrade Luiz Carlos Lacerda – Prazer & Cinema Alfredo Sternheim Maurice Capovilla – A Imagem Crítica Carlos Alberto Mattos Mauro Alice – Um Operário do Filme Sheila Schvarzman Máximo Barro – Talento e Altruísmo Alfredo Sternheim Miguel Borges – Um Lobisomem Sai da Sombra Antônio Leão da Silva Neto Não por Acaso Roteiro de Philippe Barcinski, Fabiana Werneck Barcinski e Eugênio Puppo Narradores de Javé Roteiro de Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu Olhos Azuis Argumento de José Joffily e Jorge Duran Roteiro de Jorge Duran e Melanie Dimantas Onde Andará Dulce Veiga Roteiro de Guilherme de Almeida Prado Orlando Senna – O Homem da Montanha Hermes Leal Pedro Jorge de Castro – O Calor da Tela Rogério Menezes Quanto Vale ou É por Quilo Roteiro de Eduardo Benaim, Newton Cannito e Sergio Bianchi Ricardo Pinto e Silva – Rir ou Chorar Rodrigo Capella Rodolfo Nanni – Um Realizador Persistente Neusa Barbosa Salve Geral Roteiro de Sergio Rezende e Patrícia Andrade O Signo da Cidade Roteiro de Bruna Lombardi Ugo Giorgetti – O Sonho Intacto Rosane Pavam Viva-Voz Roteiro de Márcio Alemão Vladimir Carvalho – Pedras na Lua e Pelejas no Planalto Carlos Alberto Mattos Vlado – 30 Anos Depois Roteiro de João Batista de Andrade Zuzu Angel Roteiro de Marcos Bernstein e Sergio Rezende Série Cinema Bastidores – Um Outro Lado do Cinema Elaine Guerini Série Ciência & Tecnologia Cinema Digital – Um Novo Começo? Luiz Gonzaga Assis de Luca A Hora do Cinema Digital – Democratização e Globalização do Audiovisual Luiz Gonzaga Assis De Luca Série Crônicas Crônicas de Maria Lúcia Dahl – O Quebra-cabeças Maria Lúcia Dahl Série Dança Rodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo – Dança Universal Sérgio Rodrigo Reis Série Música Maestro Diogo Pacheco – Um Maestro para Todos Alfredo Sternheim Rogério Duprat – Ecletismo Musical Máximo Barro Sérgio Ricardo – Canto Vadio Eliana Pace Wagner Tiso – Som, Imagem, Ação Beatriz Coelho Silva Série Teatro Brasil Alcides Nogueira – Alma de Cetim Tuna Dwek Antenor Pimenta – Circo e Poesia Danielle Pimenta Cia de Teatro Os Satyros – Um Palco Visceral Alberto Guzik Críticas de Clóvis Garcia – A Crítica Como Oficio Org. Carmelinda Guimarães Críticas de Maria Lucia Candeias – Duas Tábuas e Uma Paixão Org. José Simões de Almeida Júnior Federico Garcia Lorca – Pequeno Poema Infinito Antonio Gilberto e José Mauro Brant Ilo Krugli – Poesia Rasgada Ieda de Abreu João Bethencourt – O Locatário da Comédia Rodrigo Murat José Renato – Energia Eterna Hersch Basbaum Leilah Assumpção – A Consciência da Mulher Eliana Pace Luís Alberto de Abreu – Até a Última Sílaba Adélia Nicolete Maurice Vaneau – Artista Múltiplo Leila Corrêa Renata Palottini – Cumprimenta e Pede Passagem Rita Ribeiro Guimarães Teatro Brasileiro de Comédia – Eu Vivi o TBC Nydia Licia O Teatro de Abílio Pereira de Almeida Abílio Pereira de Almeida O Teatro de Aimar Labaki Aimar Labaki O Teatro de Alberto Guzik Alberto Guzik O Teatro de Antonio Rocco Antonio Rocco O Teatro de Cordel de Chico de Assis Chico de Assis O Teatro de Emílio Boechat Emílio Boechat O Teatro de Germano Pereira – Reescrevendo Clássicos Germano Pereira O Teatro de José Saffioti Filho José Saffioti Filho O Teatro de Alcides Nogueira – Trilogia: Ópera Joyce – Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso – Pólvora e Poesia Alcides Nogueira O Teatro de Ivam Cabral – Quatro textos para um teatro veloz: Faz de Conta que tem Sol lá Fora – Os Cantos de Maldoror – De Profundis – A Herança do Teatro Ivam Cabral O Teatro de Noemi Marinho: Fulaninha e Dona Coisa, Homeless, Cor de Chá, Plantonista Vilma Noemi Marinho Teatro de Revista em São Paulo – De Pernas para o Ar Neyde Veneziano O Teatro de Samir Yazbek: A Entrevista – O Fingidor – A Terra Prometida Samir Yazbek O Teatro de Sérgio Roveri Sérgio Roveri Teresa Aguiar e o Grupo Rotunda – Quatro Décadas em Cena Ariane Porto Série Perfil Analy Alvarez – De Corpo e Alma Nicolau Radamés Creti Aracy Balabanian – Nunca Fui Anjo Tania Carvalho Arllete Montenegro – Fé, Amor e Emoção Alfredo Sternheim Ary Fontoura – Entre Rios e Janeiros Rogério Menezes Berta Zemel – A Alma das Pedras Rodrigo Antunes Corrêa Bete Mendes – O Cão e a Rosa Rogério Menezes Betty Faria – Rebelde por Natureza Tania Carvalho Carla Camurati – Luz Natural Carlos Alberto Mattos Cecil Thiré – Mestre do seu Ofício Tania Carvalho Celso Nunes – Sem Amarras Eliana Rocha Cleyde Yaconis – Dama Discreta Vilmar Ledesma David Cardoso – Persistência e Paixão Alfredo Sternheim Débora Duarte – Filha da Televisão Laura Malin Denise Del Vecchio – Memórias da Lua Tuna Dwek Elisabeth Hartmann – A Sarah dos Pampas Reinaldo Braga Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida Maria Leticia Emilio Di Biasi – O Tempo e a Vida de um Aprendiz Erika Riedel Etty Fraser – Virada Pra Lua Vilmar Ledesma Ewerton de Castro – Minha Vida na Arte: Memória e Poética Reni Cardoso Fernanda Montenegro – A Defesa do Mistério Neusa Barbosa Fernando Peixoto – Em Cena Aberta Marília Balbi Geórgia Gomide – Uma Atriz Brasileira Eliana Pace Gianfrancesco Guarnieri – Um Grito Solto no Ar Sérgio Roveri Glauco Mirko Laurelli – Um Artesão do Cinema Maria Angela de Jesus Ilka Soares – A Bela da Tela Wagner de Assis Irene Ravache – Caçadora de Emoções Tania Carvalho Irene Stefania – Arte e Psicoterapia Germano Pereira Isabel Ribeiro – Iluminada Luis Sergio Lima e Silva Isolda Cresta – Zozô Vulcão Luis Sérgio Lima e Silva Joana Fomm – Momento de Decisão Vilmar Ledesma John Herbert – Um Gentleman no Palco e na Vida Neusa Barbosa Jonas Bloch – O Ofício de uma Paixão Nilu Lebert Jorge Loredo – O Perigote do Brasil Cláudio Fragata José Dumont – Do Cordel às Telas Klecius Henrique Leonardo Villar – Garra e Paixão Nydia Licia Lília Cabral – Descobrindo Lília Cabral Analu Ribeiro Lolita Rodrigues – De Carne e Osso Eliana Castro Louise Cardoso – A Mulher do Barbosa Vilmar Ledesma Marcos Caruso – Um Obstinado Eliana Rocha Maria Adelaide Amaral – A Emoção Libertária Tuna Dwek Marisa Prado – A Estrela, O Mistério Luiz Carlos Lisboa Mauro Mendonça – Em Busca da Perfeição Renato Sérgio Miriam Mehler – Sensibilidade e Paixão Vilmar Ledesma Naum Alves de Souza: Imagem, Cena, Palavra Alberto Guzik Nicette Bruno e Paulo Goulart – Tudo em Família Elaine Guerrini Nívea Maria – Uma Atriz Real Mauro Alencar e Eliana Pace Niza de Castro Tank – Niza, Apesar das Outras Sara Lopes Paulo Betti – Na Carreira de um Sonhador Teté Ribeiro Paulo José – Memórias Substantivas Tania Carvalho Paulo Hesse – A Vida Fez de Mim um Livro e Eu Não Sei Ler Eliana Pace Pedro Paulo Rangel – O Samba e o Fado Tania Carvalho Regina Braga – Talento é um Aprendizado Marta Góes Reginaldo Faria – O Solo de Um Inquieto Wagner de Assis Renata Fronzi – Chorar de Rir Wagner de Assis Renato Borghi – Borghi em Revista Élcio Nogueira Seixas Renato Consorte – Contestador por Índole Eliana Pace Rolando Boldrin – Palco Brasil Ieda de Abreu Rosamaria Murtinho – Simples Magia Tania Carvalho Rubens de Falco – Um Internacional Ator Brasileiro Nydia Licia Ruth de Souza – Estrela Negra Maria Ângela de Jesus Sérgio Hingst – Um Ator de Cinema Máximo Barro Sérgio Viotti – O Cavalheiro das Artes Nilu Lebert Silnei Siqueira – A Palavra em Cena Ieda de Abreu Silvio de Abreu – Um Homem de Sorte Vilmar Ledesma Sônia Guedes – Chá das Cinco Adélia Nicolete Sonia Maria Dorce – A Queridinha do meu Bairro Sonia Maria Dorce Armonia Sonia Oiticica – Uma Atriz Rodriguiana? Maria Thereza Vargas Stênio Garcia – Força da Natureza Wagner Assis Suely Franco – A Alegria de Representar Alfredo Sternheim Tatiana Belinky – ... E Quem Quiser Que Conte Outra Sérgio Roveri Theresa Amayo – Ficção e Realidade Theresa Amayo Tony Ramos – No Tempo da Delicadeza Tania Carvalho Umberto Magnani – Um Rio de Memórias Adélia Nicolete Vera Holtz – O Gosto da Vera Analu Ribeiro Vera Nunes – Raro Talento Eliana Pace Walderez de Barros – Voz e Silêncios Rogério Menezes Walter George Durst – Doce Guerreiro Nilu Lebert Zezé Motta – Muito Prazer Rodrigo Murat Especial Agildo Ribeiro – O Capitão do Riso Wagner de Assis Av. Paulista, 900 – a História da TV Gazeta Elmo Francfort Beatriz Segall – Além das Aparências Nilu Lebert Carlos Zara – Paixão em Quatro Atos Tania Carvalho Célia Helena – Uma Atriz Visceral Nydia Licia Charles Möeller e Claudio Botelho – Os Reis dos Musicais Tania Carvalho Cinema da Boca – Dicionário de Diretores Alfredo Sternheim Dina Sfat – Retratos de uma Guerreira Antonio Gilberto Eva Todor – O Teatro de Minha Vida Maria Angela de Jesus Eva Wilma – Arte e Vida Edla van Steen Gloria in Excelsior – Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira Álvaro Moya Lembranças de Hollywood Dulce Damasceno de Britto, organizado por Alfredo Sternheim Maria Della Costa – Seu Teatro, Sua Vida Warde Marx Mazzaropi – Uma Antologia de Risos Paulo Duarte Ney Latorraca – Uma Celebração Tania Carvalho Odorico Paraguaçu: O Bem-amado de Dias Gomes – História de um Personagem Larapista e Maquiavelento José Dias Raul Cortez – Sem Medo de se Expor Nydia Licia Rede Manchete – Aconteceu, Virou História Elmo Francfort Sérgio Cardoso – Imagens de Sua Arte Nydia Licia Tônia Carrero – Movida pela Paixão Tania Carvalho TV Tupi – Uma Linda História de Amor Vida Alves Victor Berbara – O Homem das Mil Faces Tania Carvalho Walmor Chagas – Ensaio Aberto para Um Homem Indignado Djalma Limongi Batista © 2010 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Viana, Mário Carro de paulista: dos palcos ao cinema na TV / Texto teatral de Mário Viana e Alessandro Marson; roteiro para cinema de Dagomir Marquezi com a colaboração de Ricardo Pinto e Silva – São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo ,2010. 256p. : Il. – (Coleção Aplauso. Série Cinema Brasil/ Coordenador geral Rubens Ewald Filho). ISBN 978-85-7060-935-9 1. Cinema - Roteiros 2. Filmes brasileiros – História e crítica 3. Carro de paulista (Filme cinematográfico) I. Marson, Alessandro. II. Marquezi, Dagomir. III. Silva, Ricardo Pinto IV. Ewaldo Filho, Rubens. V. Título. VI. Série. CDD 791.437 098 1 Índices para catálogo sistemático: 1. Filmes cinematográficos brasileiros : Roteiros : Arte 791.437 098 1 2. Roteiros cinematográficos: Filmes brasileiros : Arte 791.437 098 1 Proibida reprodução total ou parcial sem autorização prévia do autor ou dos editores Lei nº 9.610 de 19/02/1998 Foi feito o depósito legal Lei nº 10.994, de 14/12/2004 Impresso no Brasil / 2010 Todos os direitos reservados. 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