Jorge Ileli O Suspense de Viver Jorge Ileli O Suspense de Viver Ely Azeredo São Paulo, 2010 GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO Governador Alberto Goldman Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Diretor-presidente Hubert Alquéres Coleção Aplauso Coordenador Geral Rubens Ewald Filho No Passado Está a História do Futuro A Imprensa Oficial muito tem contribuído com a sociedade no papel que lhe cabe: a democratização de conhecimento por meio da leitura. A Coleção Aplauso, lançada em 2004, é um exemplo bem-sucedido desse intento. Os temas nela abordados, como biografias de atores, diretores e dramaturgos, são garantia de que um fragmento da memória cultural do país será preservado. Por meio de conversas informais com jornalistas, a história dos artistas é transcrita em primeira pessoa, o que confere grande fluidez ao texto, conquistando mais e mais leitores. Assim, muitas dessas figuras que tiveram importância fundamental para as artes cênicas brasileiras têm sido resgatadas do esquecimento. Mesmo o nome daqueles que já partiram são frequentemente evocados pela voz de seus companheiros de palco ou de seus biógrafos. Ou seja, nessas histórias que se cruzam, verdadeiros mitos são redescobertos e imortalizados. E não só o público tem reconhecido a importância e a qualidade da Aplauso. Em 2008, a Coleção foi laureada com o mais importante prêmio da área editorial do Brasil: o Jabuti. Concedido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), a edição especial sobre Raul Cortez ganhou na categoria biografia. Mas o que começou modestamente tomou vulto e novos temas passaram a integrar a Coleção ao longo desses anos. Hoje, a Aplauso inclui inúmeros outros temas correlatos como a história das pioneiras TVs brasileiras, companhias de dança, roteiros de filmes, peças de teatro e uma parte dedicada à música, com biografias de compositores, cantores, maestros, etc. Para o final deste ano de 2010, está previsto o lançamento de 80 títulos, que se juntarão aos 220 já lançados até aqui. Destes, a maioria foi disponibilizada em acervo digital que pode ser acessado pela internet gratuitamente. Sem dúvida, essa ação constitui grande passo para difusão da nossa cultura entre estudantes, pesquisadores e leitores simplesmente interessados nas histórias. Com tudo isso, a Coleção Aplauso passa a fazer parte ela própria de uma história na qual personagens ficcionais se misturam à daqueles que os criaram, e que por sua vez compõe algumas páginas de outra muito maior: a história do Brasil. Boa leitura. Alberto Goldman Governador do Estado de São Paulo Coleção Aplauso O que lembro, tenho. Guimarães Rosa A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa Oficial, visa resgatar a memória da cultura nacional, biografando atores, atrizes e diretores que compõem a cena brasileira nas áreas de cinema, teatro e televisão. Foram selecionados escritores com largo currículo em jornalismo cultural para esse trabalho em que a história cênica e audiovisual brasileiras vem sendo reconstituída de ma nei ra singular. Em entrevistas e encontros sucessivos estreita-se o contato entre biógrafos e biografados. Arquivos de documentos e imagens são pesquisados, e o universo que se reconstitui a partir do cotidiano e do fazer dessas personalidades permite reconstruir sua trajetória. A decisão sobre o depoimento de cada um na primeira pessoa mantém o aspecto de tradição oral dos relatos, tornando o texto coloquial, como se o biografado falasse diretamente ao leitor . Um aspecto importante da Coleção é que os resul tados obtidos ultrapassam simples registros biográficos, revelando ao leitor facetas que também caracterizam o artista e seu ofício. Biógrafo e biografado se colocaram em reflexões que se estenderam sobre a formação intelectual e ideológica do artista, contextualizada na história brasileira. São inúmeros os artistas a apontar o importante papel que tiveram os livros e a leitura em sua vida, deixando transparecer a firmeza do pensamento crítico ou denunciando preconceitos seculares que atrasaram e continuam atrasando nosso país. Muitos mostraram a importância para a sua formação terem atuado tanto no teatro quanto no cinema e na televisão, adquirindo, linguagens diferenciadas – analisando-as com suas particularidades. Muitos títulos exploram o universo íntimo e psicológico do artista, revelando as circunstâncias que o conduziram à arte, como se abrigasse em si mesmo desde sempre, a complexidade dos personagens. São livros que, além de atrair o grande público, interessarão igualmente aos estudiosos das artes cênicas, pois na Coleção Aplauso foi discutido o processo de criação que concerne ao teatro, ao cinema e à televisão. Foram abordadas a construção dos personagens, a análise, a história, a importância e a atualidade de alguns deles. Também foram examinados o relacionamento dos artistas com seus pares e diretores, os processos e as possibilidades de correção de erros no exercício do teatro e do cinema, a diferença entre esses veículos e a expressão de suas linguagens. Se algum fator específico conduziu ao sucesso da Coleção Aplauso – e merece ser destacado –, é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o percurso cultural de seu país. À Imprensa Oficial e sua equipe coube reunir um bom time de jornalistas, organizar com eficácia a pesquisa documental e iconográfica e contar com a disposição e o empenho dos artistas, diretores, dramaturgos e roteiristas. Com a Coleção em curso, configurada e com identidade consolidada, constatamos que os sorti légios que envolvem palco, cenas, coxias, sets de filmagem, textos, imagens e palavras conjugados, e todos esses seres especiais – que neste universo transi tam, transmutam e vivem – também nos tomaram e sensibilizaram. É esse material cultural e de reflexão que pode ser agora compartilhado com os leitores de to do o Brasil. Hubert Alquéres Diretor-presidente Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Introdução Comecei a escrever profissionalmente como crítico de cinema em 1953, ano do lançamento de Amei um Bicheiro, a estreia do crítico Jorge Ileli na direção, em parceria com o veterano Paulo Vanderley. Na virada para o ano-novo acontecera a première no cinema Palácio, lotado, na Cinelândia carioca. Só tive oportunidade de ver o filme alguns meses depois, por ocasião do lançamento em circuito. Embora apreciando as qualidades surpreendentes – para uma produção da Atlântida – dei a cotação três (a máxima seria seis) em minha coluna na Tribuna da Imprensa. Eu ainda conhecia Ileli superficialmente quando o vi, por acaso, na Avenida Atlântica, em companhia de Vanderley. De relance, temi algum constrangimento, mas o apreço de ambos por meu trabalho era tão sincero que festejaram a acolhida. Esse clima afetivo nunca se desfez. Ileli era a discrição em pessoa. Era muito mais de ouvir – e com extrema atenção – do que de falar. Quando conversava com amigos os seus olhos brilhavam, não disfarçavam o prazer que sentia. Jamais conduzia o diálogo para as virtudes de seus filmes. Muito ao contrário: geralmente seu cinema só entrava na conversa se outros tomassem a iniciativa. Podia parecer, à primeira vista, um tanto frio e desejoso de manter alguma distância do interlocutor. Falsa impressão: era uma criatura doce. Nasceu em família de modestos recursos. No cinema, sempre deu muito mais do que recebeu. Inarredável em suas posições temáticas e estéticas, e cultor de um gênero – o thriller – cercado de preconceitos no Brasil, tornou-se um cineasta bissexto: apenas quatro longas-metragens em 20 anos de cinema! E todos os quatro foram sucesso de público. Em 1972, quando se despediu da atividade cinematográfica com o admirável Viver de Morrer, já estava a caminho de fazer fortuna como empresário, em atividades bem diversas; entre as quais a de livreiro e a de restaurateur. Este e aquele ramo fizeram com que mantivesse residências no Rio e São Paulo. Nenhum luxo. Grande dedicação ao trabalho. O círculo de amizades foi preservado. Nunca mudou em sua relação com as pessoas. E continuou atencioso com seus empregados. Com a rede Entrelivros, depois sucedida pela Unilivros, partiu para inovações: lojas muito claras, com uma arquitetura aberta ao transeunte; mais democrática. O ir e vir dos clientes ou curiosos era animado pelo estilo risonho e franco. Ninguém diria que aquele homem corpulento, em mangas de camisa, tomando um cafezinho na lanchonete da esquina era um próspero empresário. Em 1979, ainda na fase inicial da Era do Vídeo, voltei de viagem aos Estados Unidos com o projeto de um pequeno centro cultural equipado para exibições de filmes em videocassete. Com sugestões práticas de Ileli, pude investir algumas economias para transformar um espaço ocioso da Entrelivros/Leblon na primeira versão daquilo que batizei como Estúdio A. No ano seguinte, o estúdio recebia três profissionais de destaque em cinema e televisão, Leopoldo Serran, Doc Comparato e Antonio Carlos Fontoura, para uma Oficina de Roteiro. Começava uma série de oficinas sobre criação de programas televisivos, dramaturgia e linguagem audiovisuais – as primeiras realizadas no Rio fora dos muros da TV Globo. Em sua pequena editora, Ileli foi responsável por minha estreia em livro, Infinito Cinema, 1988. Sem seu insistente encorajamento, eu dificilmente ousaria montar um volume de crítica; até porque, na época, a parca bibliografia brasileira sobre cinema não atraía muitos interessados. Seu entusiasmo era tão grande que encontrou tempo para participar das revisões de texto. Jorge Ileli não surgiu como um estranho no ninho. No Brasil, desde a década de 1920, havia grande aproximação entre jornalistas e cineastas. Paulo Vanderley, outro bissexto, alternou temporadas na imprensa com incursões na produção. Vinha da histórica revista Cinearte, sem a qual cineastas dos chamados ciclos regionais do silencioso (Cataguases, Recife e tantos outros) dificilmente sairiam do anonimato em que viviam. Com a empolgação da Cinearte, o idealista Adhemar Gonzaga, um de seus fundadores e redatores, criou a produtora Cinédia e os primeiros estúdios modernamente equipados. O crítico Almeida Salles, de O Estado de S.Paulo, foi um dos ases do jogo artístico que trouxe de volta ao Brasil (para cuidar do surto industrializante da Vera Cruz) o diretor Alberto Cavalcanti, consagrado na Europa. Com apoio em minhas colunas, o jovem crítico Glauber Rocha liderou a eclosão do Cinema Novo, um dos mais férteis movimentos estéticos do país. Também foram críticos os artífices que tornaram possível a criação das cinematecas do Rio e de São Paulo, virtuais escolas que antecederam em décadas as faculdades de cinema. A Atlântida (tão maltratada pela maioria dos críticos) teve entre seus fundadores três homens de jornal: José Carlos Burle que, entre outras atividades, era cronista de rádio e (às vezes) de cinema; Alinor Azevedo, profissional das redações; e – last but not least – o Conde Pereira Carneiro, proprietário do Jornal do Brasil. Antes de cair sob o controle do exibidor e distribuidor Luiz Severiano Ribeiro Junior, em 1947, a Atlântida produziu filmes dramáticos como Vidas Solidárias, simpático à socialização da medicina; Também Somos Irmãos, que tocava no tabu do preconceito racial; e Moleque Tião, que, sem os pretextos das chanchadas, ousava ter um negro (Grande Otelo) como protagonista. Para grande parte da crítica, o cinema brasileiro daqueles tempos era sinônimo de primarismo e mau gosto, segundo afirma José Carlos Monteiro, que – neste livro – inscreve Jorge Ileli nas fileiras dos que, embora exigentes, alimentavam a crença na evolução de nossos filmes. Mais adiante inserimos dois textos do crítico Ileli sobre filmes da Atlântida, ilustrando estas observações. Avesso a filmes de engajamento político, Ileli nunca se aproximou do figurino mais frequente do Cinema Novo. Porém, dentro ou fora da mídia, não deixou de desenvolver reflexões sobre a produção nacional. Sintomaticamente, mesmo quando longe das redações, continuou participando da entidade dos jornalistas especializados do Rio, a Associação Brasileira de Cronistas Cinematográficos (ABCC). Nunca um teórico, mas atento à teoria e à prática, Ileli teve papel importante na política que buscava situar o cinema no processo da indústria cultural. Em 1966, essa política resultou na criação do Instituto Nacional do Cinema, segundo o projeto monitorado pelo cineasta e crítico Flávio Tambellini. Poucos meses depois, em 1967, quando o governo Costa e Silva nomeou o sucessor de Tambellini na presidência do INC, as relações de confiança entre Ileli e o novo dirigente, Durval Garcia, foram fundamentais para a inteligência da política cultural. Ileli assumiu por pouco tempo o Departamento do Filme de Longa-Metragem, mas o INC pôde contar com uma equipe dotada de cultura cinematográfica. Sob os auspícios do instituto foi possível salvar do risco de destruição o clássico Limite, de Mário Peixoto, obra de arte sem similares no panorama do cinema. Mas a memória cinematográfica continuou em sobressalto no Brasil. Como este livro expõe (Situação do Acervo Jorge Ileli), somente dois longas do cineasta ainda resistem – aparentemente incólumes, embora com escoriações. Mulheres e Milhões sobrevive incompleto e ainda sem diagnóstico definitivo sobre os males de seu corpo audiovisual. E é trágico o destino de Viver de Morrer, do qual a Cinemateca Brasileira mantém em depósito apenas imagens fragmentárias. Este livro é um tributo a um homem íntegro – cineasta e jornalista que jamais abriu mão da dignidade em sua produção cultural. Ely Azeredo Para Nancy Ileli Capítulo I Cinema na Escola da Crítica No início da década de 1930, Carlitos saíra de O Circo e vivia sob as Luzes da Cidade. Mas o menino Jorge nem sabia da existência do Vagabundo que fascinava multidões em todo o mundo. Tinha 5 ou 6 anos de idade. Nunca vira um cinema. Daí seu fascínio quando o personagem apareceu na rua em que morava, em São Cristóvão, zona norte do Rio. Um vizinho começava a projetar filmes de Carlitos ao ar livre, colocando um projetor em sua varanda e estendendo um lençol do outro lado da rua. A garotada vibrava. Ao contrário do menino de Cinema Paradiso (e de muitos cineastas, de King Vidor a Anselmo Duarte), Jorge não precisou fazer média com um projecionista de cinema para descobrir a magia dos filmes. Pouco tempo depois veria os caubóis e outros heróis. Mas Carlitos (Charles Chaplin) seria sua maior fascinação por toda a vida. Insuperável. Jorge Ileli (Jorge Miguel Ileli) nasceu em 1925, em Santa Teresa, bairro carioca que só ganhou uma salinha exibidora na década de 2000. Os pais, Miguel e Josephina, eram imigrantes sírios. O futuro cineasta conquistou a primeira láurea aos 8 anos, ainda no curso primário, e sua foto apareceu na primeira página do jornal A Noite: medalha de ouro como melhor aluno da Escola Floriano Peixoto. Anos depois, quando estudava no Instituto Rabelo, fundou o Cineclube Carlitos com a colaboração do colega Orlando Caramuru, que viria a participar das pesquisas para seu filme O Mundo em que Getúlio Viveu. Na década de 1940, teve emoção muito especial frente a uma página de jornal: como vencedor de um concurso de crônicas da Folha Carioca, que publicou seu texto sobre um filme com Elizabeth Taylor (cujo título esqueceu). Nessa época, Ileli já escrevia para a página dos leitores da revista A Cena, que nasceu na década de 1920 – anos gloriosos do cinema silencioso – e foi batizada de A Scena Muda. Interessado em jornalismo, ingressou na Faculdade de Filosofia – como faziam todos os atraídos pela imprensa, porque não existiam cursos de Comunicação. Mas largou a Faculdade em 1949, quando surgiu a chance de fazer crítica de cinema em Diretrizes, publicação oposicionista que, ao longo dos anos, foi alternadamente semanário e diário, reunindo colaboradores prestigiosos, sem discriminação ideológica. Acolheu grandes nomes – de comunistas, como Jorge Amado, a conservadores como (na época) Alceu Amoroso Lima. Diretrizes foi a estreia profissional. Como amador, escreveu antes em uma publicação obscura. A informação é de Alberto Dines, jornalista-mestre, que teve breve atuação como roteirista cinematográfico nos anos 1950. Conheci Ileli no pós-guerra. Eu era adolescente e ele era um dos responsáveis pelo Jornal da Juventude, que pertencia à linha auxiliar do Partido Comunista. Eu escrevia uma coluna sobre filatelia. (Ri.) Quem me levou para o JJ foi o (jornalista) Moysés Weltman, que era muito amigo e camarada do Ileli. Também em 1949, Ileli deu seus primeiros passos na criação cinematográfica, como um dos assistentes de direção (ao lado do crítico Alex Viany) e um dos roteiristas de Aglaia, filme inacabado dirigido pelo fotógrafo Ruy Santos em Angra dos Reis. O papel da menina Aglaia coube a Roberta, filha de Radamés Gnatalli, que Ileli considerava menina prodígio, de uma incrível força dramática. O contato com Gnatalli, que reconhecia um talento para o cinema em Ileli, propiciaria seu ingresso na revista O Cruzeiro – grande escola de jornalismo, com magníficos repórteres e fotógrafos – onde atuou do início dos anos 1950 até 1960. Em 1955, trabalhou no roteiro de outro filme inacabado, Sonho de Outono, dirigido por José Carlos Burle, com Jardel Filho, que havia interpretado a peça original seis anos antes. Antes de conceber Amei um Bicheiro, Jorge Ileli frequentava a Atlântida. Via filmagens e depois observava o filme nas telas. E achei que dava para fazer. Uma vez, vi uma filmagem do Watson Macedo. De outra vez, vi o Anselmo Duarte montar uma sequência de um filme de carnaval. O meu aprendizado de estúdio foi só esse. Sua escola de cinema, na verdade, foi o exercício da crítica cinematográfica, que no pós-guerra iniciara uma fase de grande efervescência. O marco histórico foi cravado em março de 1946, quando Moniz Vianna, estudante de Medicina, de 21 anos, conseguiu algo até então impensável: uma coluna com espaço fixo para produzir críticas todos os dias, no poderoso Correio da Manhã, conhecido como o jornal que derrubava ministros. Até então, com raras exceções, a crítica de cinema no país era dominada pelo achismo (recomendo, não recomendo). Era no máximo uma crônica; em muitos casos, uma resenha do enredo e comentários sobre as estrelas. Intensamente informativas, apaixonadas, desenvolvendo considerações sobre estética e técnicas narrativas, as colunas de Moniz Vianna criaram o hábito da leitura de críticas em plateias que, até então, conheciam no máximo o nome de um ou dois diretores que os estúdios se davam ao trabalho de informar: Cecil B. De Mille, rei dos épicos e bíblicos, ou Frank Capra, das comédias com grandes estrelas. Na visão intelectual de Ileli (como observa José Carlos Monteiro) o exercício crítico correspondia a um laboratório onde, através de escolhas de filmes, tendências e autores, elaborava as fórmulas de que se serviria quando passasse para trás das câmeras. Ele estava entre os críticos que, embora exigentes, alimentavam a crença na evolução de nossos filmes. Apreciava filmes como Cidade Nua, de Jules Dassin, que desenvolvia uma trama policial sem negligenciar a visão da grande cidade, com sua fauna humana, sua tensão; Amei um Bicheiro refletiria essa admiração do crítico de Diretrizes. E certamente foi o primeiro cineasta brasileiro a aproveitar lições da escola que considerava a mais importante quando se interessou por cinema: o neorrealismo italiano. Alguns personagens e sequências de Amei um Bicheiro ecoam, apesar de certa tendência ao melodrama, inspirações neorrealistas. Em 1948, Jorge Ileli havia escrito uma história passada em um salão de sinuca em que o galã era um bicheiro. O ator Jorge Dória, muito amigo, convenceu-o a fazer um argumento cujo foco central seria o jogo do bicho. Os dois vasculharam o tema e partiram para uma trama que abordaria pela primeira vez, a sério, o dia a dia de bicheiros. Severiano (Ribeiro Junior) achou que podia produzir. Mesmo tendo feito essencialmente chanchadas, ele já tinha produzido alguns filmes sérios dirigidos por J. B. Tanko. José Carlos Burle queria dirigir Amei um Bicheiro, mas eu achava que ele não tinha força. Tinham dito que o Paulo Vanderley era muito bom, que poderia fazer, que me aceitava como assistente. E Vanderley, um dos roteiristas do clássico Barro Humano, 1928, que tinha contrato com a Atlântida, foi o escolhido. Apesar do bom relacionamento com Vanderley, desde o primeiro dia de filmagem senti que ele tinha dificuldades, disse Ileli. Eu, como assistente, achava que a linha devia ser outra. A primeira cena que filmamos foi aquela em que Cyl Farney vai buscar dinheiro com o banqueiro e depois vai ao médico. Ficou uma cena muito prolongada. Eu então pedi ao Paulo licença para fazer. Ele foi gentilíssimo e eu acabei dirigindo a sequência do primeiro dia. Foi assim que entrei para o cinema. O próprio Paulo chegou para o Ribeiro e disse: O Ileli está com o filme todo na cabeça, é melhor ele fazer o filme junto comigo, como diretor. Eu acabei fazendo o filme e tenho uma grande gratidão por ele ter me proporcionado essa oportunidade. Apesar desse êxito, Ileli não viu na Atlântida nenhum clima para os projetos que gostaria de desenvolver. Chanchada era o cardápio do estúdio. Mas, sob o selo da Cinegráfica São Luiz uma das marcas do cartel empresarial comandado pelo exibidor Luiz Severiano Ribeiro Jr. aceitou um contrato para realizar cinejornais, em 1954. Surpreendeu todo mundo ao evitar o convencionalismo dos complementos de programa, realizando reportagens especiais. Pequenos documentários que refletiam seu espírito jornalístico. A acolhida do público e da crítica foi excelente. Essa linha de produção chegou ao fim quando realizou Vida de Gente, Vida de Cachorro, um de seus trabalhos favoritos. Vida de Gente era a vida sub-humana nos trens da Central, nas ruas. E a Vida de Cachorro era a dos cães que frequentavam cabeleireiro, faziam as unhas... Ficou um negócio tão violento que fui chamado de comunista e o filme não foi exibido, foi jogado no lixo. Sem interesse em fazer filmes de encomenda ou que não tivessem afinidades com suas inclinações estéticas e temáticas, Ileli se tornou um cineasta bissexto. Na longa-metragem, dirigiu apenas quatro filmes entre 1952, Amei um Bicheiro (lançado em 1953) e 1972 (o admirável Viver de Morrer – seu trabalho mais expressivo). Para bom entendedor, não surpreende que um homem de cinema tão completo (argumentista, roteirista, diretor, documentarista, produtor e crítico) tenha ingressado na rota dos bissextos. Para alguém tão exigente e rigoroso sob o prisma profissional, o cinema brasileiros dos anos 1950 apresentava uma instabilidade desanimadora. A década de 1960 e, até certa altura, os anos 1970, tiveram como tônica um rumo politizante, engajado, com o qual o cinema de Ileli nunca se relacionou. Apesar de tudo, fervilhavam os projetos pessoais, caso de um documentário sobre a trajetória de Juscelino Kubitschek e de uma versão do romance-realidade Aracelli, meu Amor – este último chegou à fase de roteiro, mas não prosseguiu por imprevistos pessoais, agravados por problemas de saúde. Amei um Bicheiro e os outros longas-metragens – assim como sua produção Juliana do Amor Per-dido, dirigida por Sérgio Ricardo, os cinejornais e projetos que não filmou são abordados nos dossiês que integram o livro. Capítulo II Baluarte de um Novo Cinema Entrevista com Sérgio Ricardo Em entrevista a Daniel Schenker, especialmente para esse livro, o cineasta e compositor Sérgio Ricardo disse que Jorge Ileli se transformou no baluarte de um novo cinema e acredita que tenha inspirado o Cinema Novo – ainda que não na temática. Sérgio (João Mansur Lutfi) é irmão do diretor de fotografia Dib Lutfi e primo de Ileli. Os três reuniram seus talentos em Juliana do Amor Perdido, produção de Ileli. Sensibilizado por Amei um Bicheiro, acompanhou as filmagens de Mulheres e Milhões, e depois partiu para a direção, realizando, entre outros filmes, Esse Mundo é Meu e A Noite do Espantalho. Daniel Schenker, um dos fundadores do site http:// www.criticos.com.br, é jornalista especializado em cinema e teatro e professor de História do Teatro. Quando você e Jorge Ileli se conheceram? Sérgio Ricardo – Conheci Ileli antes do Dib (Lutfi). Eu era fã dele como cineasta. Depois eu e Dib descobrimos que éramos primos de Ileli. Tenho a impressão de que ele já sabia disso. Quando se aproximaram pessoalmente? SR – A partir dos anos 1960. Eu frequentava muito o restaurante Fiorentina (Rio), ele, também. Nós passamos a nos apresentar como primos. Ele começou a me dar dicas esporádicas de cinema, mesmo sendo uma pessoa reservada. Ele me respeitava como artista. Tanto que produziu Juliana do Amor Perdido. Como vê a personalidade de Ileli? SR – Cativante. Tinha cuidado no trato com as pessoas. Uma vez me chamou a atenção, nesse sentido. Ele tinha um respeito muito grande pelas pessoas e nosso contato sempre foi bastante carinhoso. Era uma pessoa profundamente honesta. Com minha ingenuidade comercial, como produtor, descuidei de muita coisa ao longo do tempo. Mas lembro que em Juliana do Amor Perdido, Ileli, apesar de ter produzido e de ser, portanto, o dono do filme, disse: Sergio, o filme é seu. Você fará com ele o que quiser. Ele transferiu para mim todos os direitos do filme. Deixou tudo estipulado com a Nancy, sua mulher, para depois de sua morte. E também acho interessante sua faceta de homem de negócios. Tornou-se dono de uma cadeia de livrarias no Rio de Janeiro (Entrelivros, depois Unilivros). Qual a sua opinião sobre o Jorge Ileli diretor? SR – Admirava a evolução dele como diretor. A técnica (direção e roteiro) de seus filmes era superior à da maior parte das produções. Ele se transformou no baluarte de um novo cinema. Acredito que tenha inspirado o Cinema Novo – ainda que não na temática, porque fazia filmes policiais, gênero ligado ao cinema norte-americano. Ileli participou do processo de criação de Juliana do Amor Perdido? SR – Sim. Dava toques essenciais, em especial no que se referia aos personagens. Havia um perso- nagem no filme, um judeu, dono de um barco de pesca, que se tornou polêmico – e ele me alertou para isso. Falava para eu tomar cuidado com esse personagem. Depois uma pessoa influente, judia, fez objeção ao personagem. Disse que o comércio dos judeus não era o da pesca. Além disso, o personagem era o vilão do filme. Vocês não pensaram em continuar a parceria depois de Juliana do Amor Perdido? SR – Sim. Íamos continuar. Mas ele ficou doente. Capítulo III Com a Câmera na Mão Encontro com Dib Lutfi O diretor de fotografia Dib Lutfi, mestre da câmera na mão que se notabilizou no Cinema Novo operando para cineastas cerebrais como Ruy Guerra (Os Deuses e os Mortos), conversou com o jornalista Daniel Schenker sobre Jorge Ileli. Como um cineasta clássico da estirpe de Ileli, que preferia observar o mundo com o apoio do tripé, encarou as técnicas de Dib ao realizar Viver de Morrer? O fotógrafo lembra que trabalharam às vezes, também de câmera na mão. Era um diretor suave, sempre de bom humor, que aceitava todas as sugestões. Como começou sua parceria profissional com Jorge Ileli? DL – Ele é meu primo, mas não tínhamos contato. Logo que comecei a trabalhar em cinema, por volta de 1955, ouvi falar dele. Nós nos encontramos em São Paulo. Lembro que ele tinha um restaurante (Um Dois Feijão Com Arroz) e almoçamos por lá. Depois que nos conhecemos, Ileli passou a me dar conselhos. Dizia, por exemplo, para não fumar. Como se fosse um pai. Às vezes, Nancy, a esposa dele, ia assistir às filmagens de Viver de Morrer. Você se tornou conhecido pela filmagem com câmera na mão. Como recorda seu trabalho com um diretor clássico como Ileli? DL – Ileli gostava de filmar com tripé. Mas às vezes também de câmera na mão. O tempo de filmagem diminui com a câmera na mão porque não é preciso armar tripé. Ele aceitava todas as sugestões. Estava sempre de bom humor. Não discutia nunca. Facilitava muito para a equipe. Se não fosse precisar mais de cabos e refletores, doava tudo. Afinal, demoraria a fazer o filme seguinte e esse tipo de material é caro. Quando começou sua trajetória de diretor de fotografia especializado em câmera na mão? DL – Peguei o jeito de carregar a câmera quando trabalhei na TV Rio, nos anos 1960. Aprendi mesmo com os câmeras de televisão. Às vezes, quando saía para fazer uma reportagem, não podia levar tripé. Tive um professor, Armando Barroso, que me explicou tudo sobre a profissão. Ele dizia: ... Vou botar uma caixa de fósforo presa na parede. Quero ver você enquadrá-la de longe. Era bem difícil. Eu tinha que caminhar com a câmera até perto da caixa sem perder o foco. Acabei arranjando um jeito de carregar a câmera de modo a não tremer. Coloco o pano preto que cobre a câmera na clavícula para não machucar o ombro e conseguir uma imagem mais estável. E os próprios atores preferem a câmera na mão. Porque você vai com o ator para onde ele for. Paulo César Peréio, por exemplo, é um ator que sabe onde a câmera está. Quando a câmera está longe, Peréio representa de outra maneira. Como foram as filmagens de Viver de Morrer? DL – Foi gostoso, suave. Não havia a pressa que se costuma ter. Ileli não dava um grito. Não reclamava de nada. Era extremamente paciente. Muitos diretores não aguentam esperar que você regule uma lâmpada. Ileli esperava o tempo que fosse preciso. E como foi trabalhar com Sérgio Ricardo em Juliana do Amor Perdido? DL – Nós somos irmãos. Comecei a aprender tudo com ele. Sérgio me levou para a TV Rio. Não tem a mesma paciência do Ileli. Dá uns berros, mas, às vezes, é preciso... Capítulo IV Na Visão de Sternheim Ele não Pode Ser Esquecido Um depoimento de Alfredo Sternheim, que imprime sua sensibilidade à crítica de cinema desde 1963 e dirigiu mais de 30 filmes (começando com Paixão na Praia, Anjo Loiro), dos quais 25 longasmetragens. Sua bibliografia inclui Máximo Barro – Talento e Altruísmo e o indispensável Cinema da Boca – Dicionário de Diretores. Pessoalmente, conheci Jorge Ileli em 1961 quando eu era assistente de direção de Walter Hugo Khouri. Já o admirava por alguns de seus textos e por Amei um Bicheiro, filme lançado em 1953, que foi na contramão do cinema brasileiro que se fazia naquela ocasião. Jamais o jogo do bicho tinha despertado aproveitamento dramático tão intenso. O suspense era raro em nossas produções, principalmente o bom suspense. Até hoje, a sequência da morte de Passarinho (Grande Otelo) me impressiona. Quando o conheci, ele finalizava Mulheres e Milhões. Mais um thriller de um homem que, à primeira vista, não parecia simpático. De poucas palavras, com esse jeito algo seco, ele mostrou no transcorrer do tempo uma personalidade afável, preocupada com os outros. Posteriormente, ele fez o documentário O Mundo em que Getúlio Viveu. No meu antigetulismo (detesto o ditador que respeitou em demasia Hitler), manifestei minha discordância sobre al-guns aspectos do filme (não lembro quais) numa mesa da Fiorentina, no Rio. Mas ele reagiu com elegância e o debate não abalou nossa relação. Mais tarde, lançou (em 1972) o seu longa Viver de Morrer, que me agradou muito com seu refinado clima mórbido, seu suspense. Na ocasião, Ileli já se dedicava ao comércio de livros através da cadeia de lojas Entrelivros. Está certo que tivesse também uma atividade mais segura que o cinema – na época se autossustentando, sem as generosas benesses do mecenato oficial de agora. Mas nunca entendi ou aceitei o fato de um negócio paralelo (e necessário para as pessoas que faziam cinema) lhe tomar mais atenção e fazer com que, aparentemente, perdesse o tesão pelo cinema. Nos papos com ele, na livraria da Rua 24 de Maio, em São Paulo, senti que esmoreceu. Tentei perguntar, compreender esse afastamento (do cinema), mas a minha timidez impediu de lhe pedir o esclarecimento que queria. Contudo, nunca deixei de admirar o cineasta e de estimar a pessoa amável e serena de Jorge Ileli. Ele não pode ser esquecido. Capítulo V Dossiê Amei um Bicheiro O Tempo não Apaga Ely Azeredo Seis anos depois da estreia, exibição franqueada ao público no Grupo de Estudos Cinematográficos (UME) reitera a indestrutibilidade do cinema feito com o coração. Jorge Ileli, seis anos apos o nascimento de Amei um Bicheiro, cinco anos após o lançamento, teve o prazer de ver seu filme (e de Paulo Vanderley) íntegro e vivo, aprovado com grandes aplausos em uma exibição pública. A oportunidade se ofereceu em uma das superlotadas sessões do Grupo de Estudos Cinematográficos da União Metropolitana de Estudantes. Disse Dejean Magno Pellegrin (mentor do GEC), que projetou antes um documentário sobre a Petrobras para preparar o mood (ânimo, disposição, humor) patriótico... Mas o patriotismo não tem nada a ver com o sucesso popular e crítico de Amei um Bicheiro. O neoufanismo amadorístico de Rebelião em Vila Rica, por exemplo, não agrada aos que, como Ileli ou Khouri (Estranho Encontro), veem no cinema um país novo, de linguagem universal, onde o código único é o próprio homem. A sobrevivência cinematográfica de Amei um Bicheiro, em contraste com o péssimo estado da cópia (então) disponível, reafirma a indestrutibilidade do cinema feito com o coração. Convém frisar que uma sessão aberta a estudantes, como a do GEC, não reúne uma plateia de cineclubistas. É um público amigo de cinema, mas só uma parcela tem a sofisticação dos cineclubes e cinematecas. É plateia que ri quando quer rir, evidencia emoção sem pensar se fica bem ou não. E, com a habitual margem de erro, pode-se dizer que os risos e a emoção responderam às solicitações certas da tela. O filme permanece íntegro como espetáculo, não só como narrativa de um competente admirador de Dassin e Hitchcock. Não hesitamos em prever novo sucesso de bilheteria na eventualidade de um relançamento. Os defeitos de Amei um Bicheiro, a começar pelo título francamente comercial, onde o sofisticado choca o regional – são os já apontados na estreia. Defeitos naturais de um tour de force contra contingências de orçamento, elenco, história, recursos técnicos. Ileli retirou da história quase todo o seu peso dramalhônico: o que persiste está mais na maneira de ser de Eliana ou Cyl Farney, do que em deficiências próprias do script. Para confirmar o desnível entre a direção e as circunstâncias que o tolhem, basta reparar em duas coisas mais óbvias: as qualidades mais diretoriais da fotografia (posição dos atores na dinâmica da cena, ângulo, rendimento do décor) em paralelo com as mais técnicas (execução dos movimentos de câmera, iluminação); ou, seguindo o mesmo critério, a expressividade do protagonista como tipo humano (composição exterior) e a inexistência intrínseca do personagem por falta de um ator no papel entregue a Cyl Farney. E o galã permanente da Atlântida está em sua mais sofrível interpretação, respondendo com esforço às solicitações exteriores da direção. Já no caso de Eliana, o trabalho da direção foi frustrado. Privou-a de seu padrão habitual de boneca de engonço, de sucesso de programa de calouros, sem obter o mínimo de retribuição como sucedâneo. O resultado é uma atuação zumbi, constrangida: uma colegial lançada no set em transe hipnótico. Uma reapresentação em bom circuito faria justiça a esse filme de vanguarda de 1952, que continua de vanguarda em 1958. A velha esperança nos verdadeiros valores, entretanto, dará preferência, na primeira oportunidade, a Escola de Brotos ou Aí Vem o Barão. Mas Ileli e Vanderley estão em boa companhia na história do cinema brasileiro. O Cangaceiro e Estranho Encontro, filmes-cumes em um panorama de planície monótona e inóspita, também foram realizados em atmosfera de insolente descrença. E, se Lima Barreto foi transformado em monumento, Khouri toma providências para seu quarto filme, e Ileli deve começar ainda este ano sua carreira de produtor e diretor independente. Ainda há esperança para o cinema brasileiro. (1958) Realismo de Jorge Ileli José Louzeiro O escritor, roteirista e jornalista que passou pela escola da reportagem de polícia, José Louzeiro, destaca em Amei um Bicheiro as raízes realistas da ficção de Jorge Ileli, cineasta que cobre de emoção o fotograma. Quando falamos em neorrealismo italiano (décadas de 1940 e 1950) e na escola francesa do cinema-verdade, surgida após a Segunda Guerra Mundial, raramente se menciona que, no Brasil, ao mesmo tempo, um cineasta de aguda sensibilidade lançava-se a idêntico experimentalismo. Seu nome: Jorge Ileli. A elaboração de um de seus melhores filmes, Amei um Bicheiro, data de 1950. Foi a partir daí que ele começou a trabalhar a ideia, chegando ao argumento e roteiro. A produção e filmagem datam de 1952 ou, mais precisamente, durante sete semanas de 1952. A par da trama nitidamente neorrealista, Amei um Bicheiro traria uma gama de novidades: movimentos de câmera concisos, fotografia nervosa, ágil, boa iluminação, cenografia bemelaborada, música (de Leo Peracchi) ponteando a dramaticidade e fluindo poeticamente nos raros momentos de idílio. Em Amei um Bicheiro, temos o cineasta que cobre o fotograma de emoção e humanismo; temos o artista que, preocupado com a textura cinematográfica, com a técnica, volta-se por inteiro para a composição sensível dos personagens principais que lutam por um amor que depende do equilíbrio econômico. É o cineasta do real, sem as aberrações do naturalismo, sem apego a princípios filosóficos idealistas. Amei um Bicheiro, aparentemente um filme de peripécias, encerrando excelente carga dramática, tem diversas leituras, como todo filme e toda obra. Mas, uma das leituras que o cineasta nos propõe é aquela que se situa num momento bastante alto da reflexão: se a busca do homem é o amor, a compreensão, por que se agigantam o ódio e a incompreensão? E por que as pessoas têm de pagar elevado preço para viver tudo isso? Em trama simples, de perseguidos e perseguidores – submundo do bicho – Jorge Ileli coloca sua indagação um tanto cética quanto ao destino do homem. Que novo homem seria esse? O lirismo do filme, dos mais intensos do nosso cinema, nasce justamente do conflito dos que nada podem, contra os que tudo controlam, determinam e reprimem. A solidariedade está demonstrada em instantes tocantes da fita, mas sobressai, eloquente, no momento em que, perseguido por policiais, acuado, mas querendo salvar os companheiros, Grande Otelo se esconde numa caixa de registro de gás. Para que o esconderijo seja o mais perfeito possível, ele se fecha na caixa. E como o gás escapa, morre. Mas sem que a polícia tome conhecimento. O sacrifício no silêncio e na dor, o companheirismo a qualquer preço, o lado duro da vida. Mas Ileli se questiona. Valeu a pena o sacrifício do personagem de Otelo? Do ponto de vista técnico, Amei um Bicheiro é, também, um dos melhores trabalhos do cinema nacional. Jorge Ileli não confunde ritmo com velocidade, nem dramaticidade com pieguismo. Há em seus personagens a postura algo insólita, certo distanciamento, uma aura de crueza ou de estoicismo. Mas no Brasil a década de 1950 era promissora, diria a elite dirigente. Por que, então, Amei um Bicheiro é retrato tão amargo de uma época, algo que nos faz lembrar o período da depressão econômica norte-americana? Ou será que, como país integrante das chamadas Forças Aliadas, ajudamos a ganhar uma guerra no terreno bélico, com o sacrifício de centenas de brasileiros, enquanto perdíamos a batalha no campo econômico? Quero crer que essa talvez tenha sido a matriz geradora de Ileli, ao produzir este importante momento de nosso cinema. O Cinema Novo, que encontrou suporte a partir dos importantes Agulha no Palheiro, de Alex Viany; Rio, 40 Graus, de Nelson Pereira dos Santos; e O Grande Momento, de Roberto Santos, parte também de Amei um Bicheiro. (1952) Formatação de um Estilo Rodrigo Fonseca Rodrigo Fonseca é um dos mais jovens valores da crítica de cinema do Rio. Desafiado a sintonizar seu talento com os pequenos espaços oferecidos pela imprensa dos anos 2000, faz resenhas e, como crítico e repórter de O Globo, coberturas nacionais e internacionais. É professor de cinema, autor dos livros Meu Compadre Cinema – Sonhos, Saudades e Sucessos de Nelson Pereira dos Santos e (em parceria com Carlos Diegues e Luiz Carlos Merten) Cinco mais Cinco – Os Maiores Filmes Brasileiros em Bilheteria e Crítica. Amei um Bicheiro – escreve Rodrigo – foi o primeiro movimento na formatação de um estilo que tinha John Huston e o Jules Dassin de Rififi como parâmetros. Ao passar a década de 1950 a limpo no livro História Ilustrada dos Filmes Brasileiros – 1928–1988, Salvyano Cavalcanti de Paiva crava um surpresa agradável ao definir Amei um Bicheiro, rodado por Jorge Ileli em parceria com Paulo Vanderley. Além do aplauso da imprensa, garantiu rendas excepcionais, acrescenta, ressaltando a presença do então iniciante Herbert Richers, patriarca do maior império da dublagem nacional, como assistente de fotografia. Sob a lupa histórica de Salvyano, cresce o domínio exercido pela dupla de realizadores – a quem apresenta apenas como dois ex-críticos – sobre uma cartilha estética então incomum na terra brasilis. Consolidava-se com eles a ambição de filmar thrillers policialescos em solo carioca, assumindo questões da marginalidade local como eixo dramático. O jogo do bicho voltaria a inspirar reflexões audiovisuais sobre a instabilidade social a partir da crise da segurança pública; vide o subestimado O Rei do Rio (1984), de Fábio Barreto. Mas jamais a atividade ilegal, desenvolvida a partir das apostas em combinações numéricas associadas a animais, ganhou uma abordagem tão charmosa quanto aquela dada ao drama do provinciano Carlos (Cyl Farney). É difícil não associar sua determinação em vingar-se das maldades de Almeida (José Lewgoy) à vontade de ferro do sargento Dave Bannion, interpretado por Glenn Ford em Os Corruptos (The Big Heat), que Fritz Lang lançou nos Estados Unidos no mesmo ano. O que trança os dois longasmetragens é a maneira como ambos apontam a progressão aritmética de perdas que cercam o revanchismo. Se Ileli chega à direção com tamanho refinamento é porque trouxe, em sua bagagem de crítico, as regras de uma gramática na qual o mistério é rei. Mais do que isso, ele foi capaz de usar o mistério como expoente para potencializar as mazelas de um Rio sombrio, sem confetes carnavalescos. Mais tarde, o diretor comprovaria seu tato delicado para mapear faunas locais em Mulheres e Milhões (1961). Mas seu filme inicial foi o primeiro movimento na formatação de um estilo que tinha John Huston e o Jules Dassin de Rififi (1954) como parâmetros. Deles advêm a habilidade de tirar do espectador as certezas do que acontecerá a cada passo dos personagens. A imprevisibilidade é a munição mais farta nas armas de Ileli. Nunca se sabe o que será de Carlos a cada passo de seu mergulho no bicho. Sua situação não permite esperanças: egresso de uma família provinciana, ele se envolve no crime e acaba preso, esforçando-se para sair e dar o troco em seus rivais. Mesmo assim, a figura singela de Passarinho (Grande Otelo), que cruza seu caminho, sugere passos doces para o personagem. Mas, a cada plano clicado por Amleto Daissè, fica mais difícil sua habilidade de encontrar a harmonia perdida. Ele a perdeu entre as noites que passou aprendendo as manhas do jogo do bicho. (2010) Ritmo e Interpretação Antonio Olinto Antonio Olinto destaca entre as qualidades surpreendentes de Amei um Bicheiro seu ritmo vibrante e vivo e a conduta do elenco, bem motivada pela direção, que reconheceu serem os atores elementos preponderantes em qualquer criação cinematográfica. Poeta (Antologia Poética), romancista (O Cinema de Ubá), ensaísta (Brasileiros na África), crítico de literatura e cinema, Antonio Olinto foi adido cultural da Embaixada Brasileira em Londres. Seu romance A Casa da Água teve traduções para o inglês, o espanhol e o francês. O cinema brasileiro domina um terreno cada vez mais amplo. A conquista da técnica – de que O Cangaceiro é um ótimo exemplo – aliada ao senso de valores plásticos existentes na arte do cinema – de que Lima Barreto também faz alarde – vem, agora, ser acrescida de mais um avanço: a conquista da situação, isto é, da compreensão de que uma história apresenta situações de drama ou de comédia, de que o diretor pode extrair muita emoção. Este é precisamente o caso de Amei um Bicheiro, que Paulo Vanderley e Jorge Ileli dirigiram. O primeiro valor desse filme da Atlântida é apresentar atores bem dirigidos, atores trabalhando dentro do que eu poderia chamar de unidade de interpretação, seguindo uma determinada linha psicológica de personificação, uma linha interna de realização cinematográfica. A fotografia, a iluminação, os ângulos, tudo isso constitui elemento material do filme. É, contudo, na emoção que esse conjunto pode transmitir que reside o segredo do bom cinema. Em Amei um Bicheiro , os personagens são bem definidos. Existem. Existem com uma realidade que não está apenas no modo como aparecem na tela, mas no encadeamento da narrativa e no modo como entram em ação diante de determinadas situações. O segundo valor do filme está na narrativa. Há alguns saltos no ritmo (saltos devidos, principalmente, ao indevido uso do corte em vez do fade out ou do dissolve), mas eles não chegam a quebrar a cadência geral da história. Em Amei um Bicheiro, as coisas acontecem com uma verdade de narração. Paulo Vanderley e Jorge Ileli criaram um clima, cercaram os acontecimentos de um sentido. O filme tem algumas sequências de boa concepção e melhor feitura.. A do velório, por exemplo, é – com exceção de determinadas cenas de Limite – a melhor sequência que o cinema brasileiro já apresentou. Nela, tudo esta reunido: emoção, suspense, ironia, inesperado. Toda a perseguição final foi feita num ritmo absolutamente cinematográfico. A descida do elevador, depois que o banqueiro de bicho comete o crime, é também um dos pontos altos da realização de Vanderley e Ileli. A sequência do aeroporto está na medida exata e o fato de o casal passar ao lado do banqueiro caído, sem dar atenção à aglomeração de pessoas ao redor, constitui um final de grande efeito. Amei um Bicheiro tem defeitos. Principalmente técnicos. A iluminação está longe de ser funcional. O som deixa muitíssimo a desejar. Logo no começo, os erros da maquiagem e da iluminação do rosto do banqueiro (José Lewgoy) fazem com que a interpretação do ator desapareça na sequência. Nada disso, porém, elimina os valores da direção. Pela primeira vez desde que estreou no cinema, Cyl Farney nos dá uma boa interpretação. Eliana, embora um tanto apagada por causa da exiguidade emocional de seu papel, não compromete. Josette Bertal, no mesmo plano de Eliana. Como criação de personagens, Grande Otelo e José Lewgoy dominam o filme. Aquele vive o papel de auxiliar de bicheiro com uma verdade de interpretação rara em atores brasileiros. José Lewgoy está estupendo, principalmente nas sequências finais. Sua entrada no aeroporto apresenta uma máscara que impressiona pelo equilíbrio com que conseguiu transmitir uma emoção que ainda não era de suspense, mas que já trazia a marca da morte. Até que enfim pôde Lewgoy fugir à estreiteza dos papéis de falso mau a que seus filmes anteriores o obrigavam. Os demais atores, em pontas, maiores ou menores, seguem o tom geral de realidade do filme. Não deixem de ver Amei um Bicheiro. É um filme brasileiro dotado de um ritmo vibrante e vivo. Com uma história narrada cinematograficamente. Com uma direção que reconheceu serem os atores elementos preponderantes em qualquer obra de cinema e de ficção. Capítulo VI Dossiê Mulheres e Milhões Um Triunfo para o Cineasta Carlos Fonseca É realmente difícil admitir que um diretor inteligente e capaz como Jorge Ileli tenha ficado afastado da direção desde a realização de Amei um Bicheiro, há vários anos, sem o apoio dos estúdios de produção regular. Voltando agora, com Mulheres e Milhões, ele vem comprovar de maneira categórica a sua capacidade e a sua vocação cinematográfica, conseguindo fazer um filme vivo, dinâmico, muito inteligente. Antes de mais nada, Mulheres e Milhões coloca o cinema brasileiro na órbita internacional, dentro de plena maturidade, pois o filme, sendo essencialmente brasileiro (embora possa trair influências de realizadores estrangeiros), tem o que poderíamos chamar de classe internacional. O espectador comum poderá não gostar de Mulheres e Milhões da mesma forma que poderá não gostar de Psicose (por exemplo); ou seja, poderá não gostar de um filme de concepção madura. Mas, ao deixar o cinema, não estará conjeturando se, como cinema nacional, é bem ou malfeito. Mulheres e Milhões é compreendi do como um filme dentro do plano universal, o que é realmente um triunfo para o realizador. Construído dentro de um ritmo nervoso, rápido, cinematográfico, o bom gosto dos seus detalhes e da escolha dos intérpretes diz bem de uma sensibilidade apurada e imaginosa. O filme está cheio de momentos excelentes, em que a direção é a grande vedete, pois Ileli está sempre apto a conseguir o melhor efeito, com naturalidade, sem ostentação ou artifício. E com personalidade e estilo, sem copiar, pois Mulheres e Milhões, apesar dos anos que o separam de Amei um Bicheiro, possui as mesmas afinidades visíveis, embora seja obra muito superior e mais madura. Narrando uma história curiosa, um dos maiores defeitos do filme reside, porém, no roteiro. Falta a alguns personagens contextura humana e, ao todo, aquela densidade capaz de fechar integralmente o círculo de emoções com convicção, sem restrições ou reservas. E alguns senões ou falhas poderiam ser imputados ao próprio diretor, que permitiu algumas concessões, talvez para atender às exigências de bilheteria. Como é o caso de alguns números musicais (o de Norma Bengell, o da cantora na boate, o da dançarina de flamenco) que, sendo incidentais, dão-nos a impressão de forçados, para atrair público. A cena da obtenção da segunda chave, no café espanhol, pareceu-nos um pouco falsa, bem como a última cena do filme, que jamais deveria ter sido explicada em monólogo. O acontecimento que motiva o desfecho deveria ter sido mostrado ou sugerido num rápido plano; e a perseguição do autor intelectual do roubo ao caminhão com seu dinheiro deveria ser inteiramente muda, jogada apenas com a expressão do ator. Seria uma revelação muito mais dramática e o desfecho ganharia uma envergadura que não chega a ter. A registrar, ainda, a admirável segurança com que Jorge Ileli constrói as cenas de rua e a ambientação de todo o filme. O elenco é o melhor já reunido num filme brasileiro, e até mesmo os extras têm aparições curiosas, seja pela expressão, seja pelo físico. Luigi Picchi, Norma Bengell, Odete Lara, Jece Valadão, Aurélio Teixeira, José Mauro de Vasconcelos, Mário Benvenuti, Glauce Rocha formam um conjunto respeitável, enriquecido plasticamente pelas aparições de Lyris Castellani, Lueli Figueiró e outras. A fotografia (excelente) de Rodolfo Icsey e a música de Simonetti são dois fatores preponderantes para o sucesso artístico do filme. Mulheres e Milhões vem demonstrar que Jorge Ileli é um diretor que não pode de maneira alguma ficar inativo, pois sua contribuição ao cinema brasileiro é das mais definitivas. Direção Primorosa Walter Rocha Thriller em torno de audacioso assalto a uma agência bancária, não há que se negar sua filiação ao gênero consagrado por Rififi, de Jules Dassin, aliás, um dos cineastas favoritos de Ileli, que não faz segredo dessa predileção. Não se trata, porém, de uma cópia, de uma imitação, mas do desenvolvimento de uma trama que, embora pertencendo ao gênero, possui características próprias, utiliza personagens e situações inteiramente válidas, sustentadas por uma linha de interesse próprio que emana de cada metro de película. Poucas vezes tivemos no cinema brasileiro uma fita tão bem articulada, que, partindo de um conflito-chave central, o assalto, no caso, mobilizasse com tanta precisão uma galeria completa de tipos, integrando-os na trama como elementos essenciais e não apenas como acessórios. Tudo funciona harmonicamente, tal como o hábil golpe, que se desenvolve através de instruções emanadas de um gravador e vai criando no espírito do público toda a sorte de emoções, inclusive suspense, como as mais legítimas fitas policiais estrangeiras. A história de Jorge Dória é sugestiva e original, ganhando na adaptação todas as gamas da dramaticidade que impregna a narrativa. Mas cabem a Jorge Ileli as maiores honras pelo sucesso do filme, pois sua direção é firme e inteligente. Sabe extrair emoções de cada personagem e criar situações de tensa expectativa as quais mexem com os nervos do espectador e lhe proporcionam alguns bons momentos, não apenas durante o assalto, mas através de todos os preparativos para o golpe. As personagens parecem reais e humanas e não bonecos que se agitam diante da câmera, como na maioria dos filmes brasileiros. E vibram, e sofrem, e amam, e se desesperam ante a ironia do destino. Suas reações são válidas, e nos parecem plausíveis e convincentes. São atores que sabem atuar e se realizam ante a câmera e o público. Alguns melhores, naturalmente, como Jece Valadão, em um tipo realmente notável, que nos faz lembrar Richard Widmark, e é, sem favor, a melhor figura em cena; ou José Mauro de Vasconcelos; ou, ainda, Aurélio Teixeira, compondo um trio respeitável e que nos transmite seu drama. Luigi Picchi, Norma Bengell, Odete Lara são outras figuras de realce que também impressionam favoravelmente, vindo em plano menos expressivo os demais. Roberto Duval tem qualidades para salvar seu personagem de delegado duro e decidido. Mulheres e Milhões é assim, uma fita de muitas qualidades, uma prova de que o cinema brasileiro tem condições e elementos para vencer. É uma produção que pode competir, sem desvantagem, com as produções estrangeiras do gênero. Além da direção primorosa de Ileli, vale apreciar outros elementos de criação, como a excelente fotografia de Rodolfo Icsey e a música de Enrico Simonetti, sempre funcional e expressiva. Um filme nacional a que se assiste com satisfação e prazer; que nos dá emoções que habitualmente só encontramos em fitas estrangeiras; e que deve ser vista e prestigiada por nosso público, porque é realmente um belo espetáculo. Assimilação de Boas Influências Fernando Ferreira Mulheres e Milhões, de Jorge Ileli, tem argumento sugerido ou influenciado por O Segredo das Joias (The Asphalt Jungle), por Rififi (Du Rififi chez les Hommes) e por O Grande Golpe (The Killing). São boas influências e é louvável que tenham sido assimiladas – escreveu Fernando Ferreira. Guardo as melhores impressões, desde os anos 1950, da passionalidade das relações de Fernando com o cinema – um afeto que o credenciou a atuar na Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, da qual foi diretor no início da década seguinte. Fez crítica em O Globo da década de 1950 até os primeiros anos 1980. Um dos bons críticos do Rio, como observou André Setaro, também militante da crítica: (...) além do estilo elegante, conhece muito da arte do filme. É professor da PUC-Rio. Com filmes como este Mulheres e Milhões robustecem-se as esperanças de que o cinema brasileiro vá para a frente, livre das chanchadas de baixa espécie e dos carnavalescos de infeliz inspiração, escreveu em 1953. O filme de Jorge Ileli, é certo, não é perfeito, nem nos parece do nível qualitativo de A Primeira Missa (de Lima Barreto), que vem sendo propositadamente mal compreendido por alguns, acionados por motivos extracinema. Mas é, inegavelmente, um filme muito bemfeito, que revela um aprimoramento técnico elogiável e um sentido dinâmico, espontâneo e moderno da narrativa cinematográfica. Mulheres e Milhões é um filme policial, com argumento sugerido ou influenciado por O Segredo das Joias, por Rififi e por O Grande Golpe. As influências, como se vê, são boas... e é louvável que tenham sido assimiladas. O próprio diretor não as nega. O importante, entretanto, é que não foram transcritas literalmente, que foram personalizadas e que adquiriram uma característica própria. A história, a nosso ver, tem certas falhas pouco perdoáveis num argumento policial, pois incide em algumas inverossimilhanças comprometedoras, mas possui, por outro lado, vários achados bastante originais que não vamos, evidentemente, citar, para não tirar ao espectador o sabor de se deixar envolver por eles. E o diretor Ileli soube bem explorar esses bons momentos do roteiro, construindo um filme sempre fascinante, que mantém vivo o interesse da primeira à última cena. A direção de Ileli é, sem dúvida, a maior estrela do filme, que transcorre num ritmo nervoso, servido de cortes secos e oportunos que conferem à narrativa um dinamismo constantemente renovado. A fotografia de Rodolfo Icsey é excelente e o comentário musical de Enrico Simonetti é o melhor que já vimos em filme brasileiro. O filme é rico de mulheres, quase todas intencionalmente instruídas para atuar com um máximo de sofisticação, visando, provavelmente, a uma exemplificação nacional do fenômeno pin-up. Desse material carinhosamente trabalhado pelo diretor resultaram uma Odete Lara impressionante e uma Norma Bengell por vezes exagerada; uma Glauce Rocha muito correta e uma Norma Blum encantadora. Beyla Genauer, tem rápida aparição, convincente à atmosfera do filme (...). Em suma: Mulheres e Milhões é o melhor filme brasileiro até agora exibido nos circuitos comerciais do Rio, neste ano, e constitui uma nova esperança de se ver o cinema nacional caminhando em passos de adulto. Intensidade Narrativa Luiz Antonio O assunto de Mulheres e Milhões não é novidade. É até bastante explorado (assalto de banco, erotismo e musical). Tivemos, há pouco tempo, um bom exemplo no Rififi de Dassin. Mas Jorge Ileli, através de uma exposição cinematográfica inteligente, valendo-se de hábeis primeiros planos, de cortes inesperados e da música, funcional e dramática (Simonetti em grande dia), promove uma sensível reformulação do gênero. A narrativa, adquirindo sua intensidade menos no diálogo (curto, ágil, nervoso) do que na movimentação de câmara (alguns intérpretes não pronunciam sequer uma palavra), inova em vários momentos, com resultados amplamente satisfatórios. Como é curiosa a passagem (em silêncio) de Norma Blum pela história. Escolhidos em diversos habitats, os protagonistas compõem o mais extenso e homogêneo cast já reunido num filme nacional. Muito bons os tipos vividos por Aurélio Teixeira, José Mauro Vasconcelos e Mário Benvenuti. Se Luigi Picchi pareceu-nos retraído, Jece Valadão poderia ter sido mais contido em algumas cenas, Norma Bengell está à vontade, prometendo, sob direção segura, continuar surpreendendo, não apenas com a sua beleza. Odete Lara, em breve aparição, tem o sotaque paulista a lhe prejudicar o diálogo (demasiado sibilante). Mantém, contudo, intacto o seu fascínio de atriz extremamente fotogênica. Numa ponta, Beyla Genauer retira o melhor partido de sua sensibilidade. Despontando como a melhor figura de nosso cinema, Glauce Rocha alia à plasticidade de seu semblante gestos equilibrados e, o que é mais difícil entre os nossos atores, firme e esplêndida impostação de voz. Está irrepreensível em duas intervenções – pequenas, porém marcantes. Outro ponto alto é a fotografia de Rodolfo Icsey, técnico de méritos inegáveis, com um trabalho vigoroso e dinâmico, demonstrando haver apreendido o virtuosismo da direção de Ileli para um entrosamento perfeito da equipe. Capítulo VII Dossiê Viver de Morrer Ely Azeredo Viver de Morrer, de 1972, de Jorge Ileli, evoluiu a partir da ideia de seu argumento Um Morto nas Ruas, cuja produção começou a armar em 1957, quatro anos após o bem-sucedido lançamento de seu primeiro longa-metragem Amei um Bicheiro, dirigido em dupla com Paulo Vanderley. A inspiração partiu de reportagens publicadas pela Tribuna da Imprensa com o objetivo de desmascarar a indústria de atestados de óbito. Em reportagem que, além de imaginação e audácia, custou os poucos cruzeiros pagos por um atestado de óbito, Calazans Fernandes morreu para demonstrar que o documento estava ao alcance de todas as bolsas, o que oferecia soluções fáceis para inverter o velho refrão o crime não compensa. A realidade é muito mais impressionante que a ficção – ou do que pensam críticos apegados a critérios cautelosos de verossimilhança. Os abajures de pele humana poderiam parecer um delírio digno de Franz Kafka não tivessem sido encontrados em aposentos de oficiais de campos de concentração hitleristas. A aventura de Calazans Fernandes foi vivida, com alterações de script em 1973, por outros repórteres do Rio de Janeiro. Segundo matéria do Jornal do Brasil, fartamente documentada, obteve-se mediante o pagamento de 100 cruzeiros a uma funerária de Duque de Caxias, Estado do Rio, declaração de óbito dando enfarte do miocárdio como causa mortis, atestada por médico registrado no Conselho Regional de Medicina e assinada sem ter sido ainda preenchida a identidade do morto. Segundo a mesma reportagem, só no Rio de Janeiro, de 1967 a 1973, foram roubados mais de 5 mil formulários de atestado de óbito. O argumento de Um Morto nas Ruas retomava o humor negro da sequência do velório de Amei um Bicheiro, com o objetivo de dar um acento hitchcockiano ao filme policial. Mas a sobrevivência daquele projeto em Viver de Morrer limita-se à cena em que um médico vende um atestado. De fato, a proposição mais ambiciosa do filme é aquela implícita na aparente contradição do título: a morte como vida. Os lances de originalidade não constituem sua essência, ainda que sintonizados com o impacto espetacular e de reflexão que o cineasta procurou. A ausência de investigação em torno das sucessivas mortes deixa claro que não se procurou nada nas linhas tradicionais do filme policial. – Como se vive de morrer? Maria (Odete Lara), desesperada com a frustração econômica de Marcelo (Mário Benvenuti), seu marido, pretende abandoná-lo. Em reação, ele planeja um golpe contra uma companhia de seguros. Como primeiro passo, dá carona a um vagabundo (Flávio Porto) que tem as medidas necessárias para, com o rosto desfigurado em um acidente, passar por ele. Marcelo articula, assim, sua morte civil. Usurpando a identidade do outro, possibilita o embolso do seguro de vida pela mulher. Depois do funeral-farsa, Maria liquida Marcelo. Adapta aos seus interesses a tese do marido, segundo o qual seria possível viver de morrer. Sonha levar uma vida prazerosa com o amante (Carlo Mossy), bem mais jovem. Cabe à viúva, agora, a iniciativa de um novo golpe do seguro, transferindo sua identidade para Regina (Amiris Veronese), uma solitária no limiar do suicídio. O jogo de Viver de Morrer prosseguirá em seu ciclo imprevisível com o surgimento de um maquiavélico personagem que rondou todas essas vidas como um anjo exterminador (Dieter Bur-gel). Uma trama insólita, muito bem urdida em roteiro do próprio Ileli. Nesta ciranda macabra, o que importa é a metáfora da morte (leia-se também: o desrespeito pela vida e pela qualidade da vida) em alta no mercado. Nesse mundo que surpreendemos com a câmera não há momentos de piedade ou tolerância, frisou o cineasta. Mas não creio que tenha sido radical dividindo meus personagens em assassinos e assassinados. Trata-se apenas de uma redução dramática para mostrar bem o mecanismo, a estrutura daquilo que descobrimos um dia: a essência humana não é mais respeitada. Ela vale menos que um papel, um documento – mesmo falsificado. Ao mostrar os personagens em casa, nos bares, nos restaurantes, ou no próprio necrotério, alimentando-se da morte, quis ressaltar o drama de homens e mulheres que, em sua atividade cotidiana, descem todos os degraus da condição humana para simplesmente sobreviver. Acima da eficácia técnica, Ileli surpreende (mesmo aos mais sensíveis às arestas desencantadas e cruéis de seu filme anterior, Mulheres e Milhões) pela visão amarga de um roteiro cujo aparente absurdo nos parece cada vez mais lógico e real. Dos críticos brasileiros que passaram à realização cinematográfica, Ileli foi o único a não se encabular com o título de cultor de um gênero tão alienígena como o thriller – essa invenção norteamericana muitas vezes esnobada, mas responsável, no cinema e na literatura, pelo nascimento de inúmeras obras-primas. Amei um Bicheiro, policial com certa observação de costumes, deu novo alento ao cinema carioca, abalando a tendência monopolista da chanchada. Mulheres e Milhões, menos equilibrado, mais sofisticado e rico sob o prisma da forma, seguiu com um saldo positivo bastante expressivo a vertente clássica de O Segredo das Joias, de John Huston, obra de natural influência em muitos centros produtores, e também obteve boa receptividade popular. Viver de morrer retoma a conduta do thriller, demonstrando a vitalidade do gênero como instrumento universal de comunicação. Assinala a plena maturidade de Ileli e sua importância para a saúde de nosso cinema. A nudez do ser humano em suas fragilidades fundamentais – física, moral e psicológica – , uma constante sob a aparente superficialidade de Mulheres e Milhões, tem agora um retrato mais convincente, que (sem nenhuma semelhança como história) lembra o inexorável canibalismo de O Sol por Testemunha, de René Clément. Se em Clément a sordidez e a brutalidade eram envolvidas em halo de poesia, no Ileli de Viver de Morrer – no qual o amor é uma fraqueza em baixa no mercado – elas se revelam em planos que falam direta e claramente de sua inevitabilidade em um mundo em que a inversão de valores se fez processo normal, embora camuflado sob pretextos humanistas. A psicologia, elemento obrigatório em exemplares clássicos do gênero, é menos que coadjuvante em Viver de Morrer. O crime, isoladamente, tem importância secundária. E é sintomático que – apesar do frisson que nasce dos planos inesperados da trama – o cineasta, desta vez, não trabalhe em função do suspense, e sim da fatuidade da vida dos personagens e do ritual de morte que engendram como meio de vida. Viver de Morrer fica a poucos passos do grande cinema. (1972) Crítica de Viver de Morrer de Rubens Ewald Filho Em 1973, em A Tribuna (de Santos), Rubens Ewald Filho observou que Ileli voltou ao gênero policial desenvolvendo “uma história de suspense com final inesperado”, mas fez restrições severas ao filme. “Jorge Ileli volta à direção com Viver de Morrer. Em 20 anos, sua obra se resume a uma coautoria (Amei um Bicheiro), um policial (Mulheres e Milhões), alguns curtas-metragens e produções alheias (como Juliana do amor perdido, de seu primo Sérgio Ricardo). Agora realizou outro policial, uma história de suspense com final inesperado. Mário Benvenuti faz um vendedor de cartões de crédito, Marcelo, que vê o casamento entrar em crise quando a mulher, Maria (Odete Lara), cansa da vida de miséria. Bola então um plano: faz um seguro de vida e arranja um cadáver que apareça com a sua carteira de identidade. Com a cumplicidade da esposa, tudo parece dar certo. Marcelo mata um desocupado (Flávio Portho, a melhor interpretação do filme) e recebe o dinheiro. Mas há uma única falha no plano: a esposa também quer se livrar dele. E a história se repete. Agora ela faz um seguro de vida, mata uma suicida, Regina (Amíris Veronese, esposa do crítico carioca Moniz Vianna), sempre com a ajuda de um namorado mais novo (Carlo Mossy). Passa então a viver de morrer, ou seja, de coletar seguros de vida. O final será surpreendente (durante o filme Ileli vai lançando pistas discretas) e foi em parte cortado pela censura (que o considerou imoral). Mas o corte preciso acabou ficando melhor do que se tivessem mostrado tudo. O filme não se realiza é no plano da verossimilhança. Por exemplo, os personagens de Mário Benvenuti e (depois) Odete vão assistir aos seus próprios funerais como se não houvesse amigos que pudessem reconhecê-los. Depois, tudo é fácil demais. Não há interferência da polícia, não há suspeitas da companhia seguradora, dificuldades de reconhecimento ou para a obtenção de falsas identidades. Para piorar, a fotografia do grande Dib Lutfi é desperdiçada, os diálogos são retóricos e malescritos. Há detalhes de gosto duvidoso (vômitos e autópsias de cadáveres), vários dos atores centrais foram dublados (Mossy, Benvenuti) e certas coisas não funcionam (será que a esposa nunca notou que Carlo/Mossy usa tão descaradamente uma peruca?). E por que ele demonstra isso no final? Mesmo Odete está numa fase ruim, ficou mais tensa, não tem conseguido resolver-se como atriz. Em compensação, há vários bons atores em pontas – Sônia Clara, Jorge Dória e Fregolente. No final, o resultado é tolerável. Não chega a ser um bom filme, mas está ainda acima da média.” (1973) Jorge Guimarães Em Viver de Morrer, Ileli estaria dedicado à análise de uma sociedade lá onde justamente a moral, qualquer que seja, baixou de nível. A sociedade que ele retrata fala também pela sua implacabilidade, pelos aspectos terríveis e frios de suas engrenagens. Esse parece ser o testemunho de Ileli. Em Viver de Morrer, ele sente que a piedade e o páthos, que até então mantinha, por sua índole, serão aqui falhas graves do ponto de vista dialético. Já não há, pois, a piedade, em seu filme da década dos 1970, em seu ensaio mais maduro. Ele tem que renunciar a essa visão católica dos personagens, porque ela se tornou perfeitamente incompatível com aquilo que está sendo visto e enunciado. Ileli não aprova o crime, nem ao me-nos parece compadecido, ele apenas compreende o que chamaríamos de uma engrenagem. Não é o cúmplice paternalista do assassinato, apenas o seu cronista frio, calculado. Não só seus personagens endurecem no crime, mas também ele, na medida em que tem que ter agora uma visão fria, mesmo desapiedada desse ato de revolta, para melhor compreendê-lo e aplicá-lo, sem ser o seu cúmplice. Mas a revolta é ainda assim intensa, e talvez por isso mesmo esses anti-heróis não aceitem a fome, a injustiça, a discriminação. Esta será sempre a sua única e grande dignidade. O desprezo pela vida fora filmado por Ileli em sua carreira. Vítimas e assassinos eram seus personagens. Estamos aqui num aboutissement dessa forma de fazer cinema. Com um orçamento caro para a época – 12 milhões de cruzeiros –, rodado em 35 dias, com equipe altamente profissional, montado e sonorizado em dois meses, Viver de Morrer acabaria por ser o mais completo e o mais claro dos filmes desse cineasta. Tratava-se aqui de fazer o policial sem polícia. lleli, que não mostrara a corrupção policial em Amei um Bicheiro, que fizera desfilar as formas da tortura policial em Mulheres e Milhões, que documentara um governo onde a polícia deixara página escura – a polícia de Müller –, já via essa instituição como ausente, inerte, num mundo que dividia agora entre vítimas e algozes no seio mesmo da sociedade. A ausência da lei e da punição à transgressão aos costumes são dados relevantes nessa narrativa de lobos. O arranjo operístico seria ophulsiano, se Ophüls não fosse um amoroso. A ronda seria ophulsiana, se o assunto não fosse o crime. Temos, assim, não um policial, mas um criminal. Círculos, onde o ser duro e a implacabilidade são a lei. Ainda uma vez o assunto que escolhe não é fácil nem gratificante. O primeiro dos desafios é o problema da identidade. Essa cogitação sobre a identidade dos caracteres ultrapassa o nível da simples narrativa. Aplicando o golpe do seguro, os personagens de Ileli passam a impressão de que vivemos num mundo de papel, onde os se-res têm sua legalidade testemunhada por uma carteira. Ao perderem o seu vínculo com a ordem burguesa, destroem-se. A ordem burguesa é mantida mais do que meramente por seus controles oficiais. Os próprios seres se autocontrolam e, ao fugirem dessa ordem, eliminam-se, perdemse. O crime não compensa, na medida em que o crime já é castigo. Os crimes-castigos são também exaustivamente explicados por Ileli. Tudo se passa de homem a homem, na sombra, no perecível, na tortura. Nada compensa ou compensará. A própria perda de identidade em Viver de Morrer é a melhor metáfora narrativa para mostrar a coisificação da pessoa humana, transformada num boneco, num corpo, dentro de um jogo de eliminações. Entretanto, Ileli não mostra a luz, apenas a sombra. Ele mostra as engrenagens onde a mulher (Maria) está, sim, coisificada, até a sua supressão final. Não só porque Maria perdeu a sua identidade civil, mas, sim, porque ela se deixou envolver por toda uma filosofia própria à ação criminosa de Carlos. Ileli vê essa sociedade muito negativamente, sem maiores esperanças. E talvez seja isso o que efetivamente mais interesse, esse aspecto noir de sua personalidade. Locomovemo-nos nesse perigoso, angustiante universo de rodovias, automóveis, nesse complexo urbano tentacular e vasto. A criminalidade de uma mulher, sendo centro deste drama, leva-nos, a partir da necessidade, da carência do dinheiro, a estes cemitérios, empresas fúnebres, a toda essa indústria da morte que o filme revela. Ileli conta aqui com a colaboração, na iluminação, de um primo seu, que havia se destacado como operador de câmera em Terra em Transe (de Glauber Rocha) e como diretor de fotografia em outros filmes. Dib Lutfi, como seu colaborador, fica bem à altura de outros profissionais citados. Ileli, pela primeira vez, usa a cor e o faz com instinto dramático. Em toda a primeira parte, sombria e seca do filme, onde a cor compõe não a animação, mas a interioridade em tons neutros, íntimos, despojados, criteriosamente projetados por Carmélio Cruz, um dos elementos dessa equipe. Talvez o retrato em negro de Ileli possa, em que pese a sombra, vir a iluminar outras películas que, como esta, queiram mostrar, muito simplesmente, que não vivemos no melhor dos mundos e que os seres que aí encontramos são vorazes lobos de homens. (1982) Capítulo VIII Dossiê O Mundo em que Getúlio Viveu Na Tela do Congresso O Mundo em que Getúlio Viveu despertou grande emoção, sobretudo em consequência da dimensão humana que Ileli soube projetar – sem nenhum recurso ao sentimentalismo e sem maquiar a personalidade do protagonista – ao criar esse painel histórico. Essa dimensão foi um dos pontos principais da conferência que fez em um auditório lotado do Congresso Nacional, antes da projeção do filme para senadores e deputados, em 1976. Longe de mim a pretensão de fazer um discurso para uma plateia de grandes oradores. Mas, diante da insistência para que eu dissesse algumas palavras sobre O Mundo em que Getúlio Viveu, preparei este ‘improviso escrito’, com o propósito de vencer minha inibição de falar em público, evitando longos silêncios em busca das palavras exatas, naturais hiatos no desenvolvimento do raciocínio, sem me preocupar com possíveis incorreções de linguagem. Espero que compreendam ser esta a única maneira que encontrei de enfrentar o meu nervosismo e de superar a minha emoção de estar aqui neste momento. Não estranho que os filmes de ‘reconstituição documentária’ ou ‘reportagens históricas’ – especialmente em longa-metragem, como Corações e Mentes, de Peter Davis* – sejam tão raros. O fascínio exercido pelos trabalhos de montagem que visam apresentar ‘a verdade, nada mais que a verdade é tão grande quanto as dificuldades materiais e a ‘carga horária’ que o gênero exige do cineasta. Não tenho pretensão a historiador, mas quando, com meus colaboradores, iniciei os preparativos da produção do filme sobre Getúlio Vargas, tivemos que desenvolver, paralelamente à prospecção do material documentário, trabalhosa pesquisa histórica. Portanto, há em um trabalho desse gênero, lado a lado, quase um trabalho de historiador; além da pesquisa de campo característica do repórter sério, a labuta de montagem, o exercício de organização dramática de ritmo e de seleção de planos que caracterizam o trabalho do autor de cinema ficcional. Como cineasta urbano eu sempre me interessei apaixonadamente pelo ambiente real, pelos personagens reais. Amei um Bicheiro, que fiz em colaboração com meu saudoso amigo Paulo Vanderley, é de 1953, e, apesar da tradição mais ‘comercial’ que a produtora cultivava na época, este filme foi considerado pela crítica um marco na busca da galeria humana carioca. Em Mulheres e Milhões, não escondo minha admiração pela linha de ficção com elementos documentais que marcou tantos filmes bons, americanos e franceses. Naturalmente, produzido em 1961 – uma fase penosa para o cinema brasileiro – Mulheres e Milhões se cercava de al-guns dados românticos e de maior preocupação com o suspense, a fim de procurar uma comunicação mais fácil com o grande público. Mas creio que sempre transmiti minha preocupação em dar aos meus filmes dados autênticos de crítica à corrupção, de interesse de pessoas amarguradas por seus extremos limites de ascensão social. Viver de Morrer, meu filme mais recente, se inspirou numa reportagem da Tribuna da Imprensa sobre a ‘indústria’ dos atestados de óbito que, depois que o filme foi realizado, foi tema de uma bem documentada denúncia do Jornal do Brasil, em reportagem de autoria de Jairo Costa e Paulo César de Araújo. Viver de Morrer, com a licença da elaboração dramática, quis mostrar que a essência humana não é mais respeitada; que no mundo contemporâneo ela vale menos que um pedaço de papel, mesmo falsificado, como os atestados de óbito que servem à teia de crimes do filme. Quem foi contemporâneo das vítimas do universo concentracionário do nazismo, quem viveu as ansiedades do mundo na guerra de 1939-1945, como eu, não poderia deixar de dar um testemunho sobre a fragilidade da essência humana num mundo de violência. Há muitos motivos para a inclusão do drama internacional em um filme sobre Getúlio Vargas. Quando iniciei as pesquisas, no começo da década de 1960 – na verdade, foram quase dez anos de buscas e de análise do material obtido – , pensava muito no caminho da ‘ficção da realidade’, que foi como Truman Capote definiu seu enfoque de um episódio real no livro A Sangue Frio**, mais tarde levado ao cinema por Richard Brooks. Minha formação jornalística me levava a sentir em profundidade a violência desenfreada que ficou ao alcance de todo espectador através dos meios de comunicação de massa – e já estávamos na época da televisão. Também havia sede de verdade nas novas gerações, e o difícil para mim, à proporção que ia enriquecendo a filmoteca do Projeto Getúlio, era escapar à embriaguez do sucesso das pesquisas. Não era um filme de quase um milhão de dólares, como Corações e Mentes, mas, enfatizando os investimentos em paciência e pesquisas de equipe, consegui reunir um acervo enorme. Deste acervo, manipulei 60 mil metros de filmes, para – após dois anos de análise, seleção, corte e montagem – chegar a 2 mil e 300 metros de filme, isto é, a uma compacta projeção de uma hora e 23 minutos. A ideia inicial era de uma série para televisão, em torno da vida de Vargas. Eu e Orlando Caramuru, que colaborou nas pesquisas e no roteiro, chegamos à conclusão de que era melhor um só filme de longa metragem do que uma série de filmes curtos para televisão. Durante a montagem, percebi que, colocando Getúlio dentro de um contexto internacional, o filme ganharia uma dimensão histórica. Havia o perigo de cair num retrato mais ou menos ‘oficial’, ou numa espécie de ‘estrelismo’; como, durante os anos 1930, a maior parte do que se filmou da vida de Getúlio foi feita por fontes oficiais, o ‘retrato’ poderia ficar limitado, circunstancial, tender mais para o ilustrativo. Com a prospecção e a compra de material filmado por dezenas de operadores – que registraram a Belle Époque, a Guerra de 1914-1918, a Revolução Russa, a Guerra da Espanha, a ascensão do nazismo, a marcha dos fascistas sobre Roma, os grandes momentos da Segunda Guerra Mundial, somado ao material sobre a escalada política de Vargas, os episódios de 1930-32, as tentativas de tomada do poder pelos comunistas, e depois pelos integralistas, o Estado Novo, a campanha da FEB na Itália, a volta de Getúlio via eleitoral e o drama que culminou com seu suicídio – o filme ganhou uma dimensão surpreendente. A receptividade do filme tem sido muito animadora: não somente críticos e profissionais da cinematografia, jornalistas e intelectuais, mas também pessoas sem nenhuma vinculação com o cinema, tanto os jovens quanto os de idade madura, saem das sessões com uma sensação de experiência vivida. Acredito que o filme vai encontrar, entre os espectadores que viveram os fatos que abordo, uma grande disposição de repensar a História do Brasil e os acontecimentos mundiais na primeira metade do século. Mesmo os não getulistas abandonarão automaticamente qualquer prevenção frente à carga histórica, à vivência do material que usei e que muito me motivou, assim como a Maria Guadalupe, a montadora. Não houve necessidade de dissertações sociológicas ou filosóficas. A imagem, o ritmo, os acontecimentos inter-relacionados falam por si. Getúlio errou e acertou. Foi um homem de indiscutível gênio político, mas o filme vem emocionando principalmente por sua dimensão humana. Não focalizamos um mito oficial, nem nos limitamos ao carisma que era uma característica marcante de seu êxito junto às camadas populares. Em meu filme, o ângulo trágico decorre do fato de Vargas ser um homem acossado por pressões de todos os lados, investido pelos acontecimentos e que, na condição de estadista, serviu de leito à correnteza da História. A vocação histórica do personagem foi bem sentida por Octávio de Faria, escritor admirável e estudioso de cinema, que, sem dúvida, num assomo de generosidade escreveu: ‘Ileli contou uma vida como Plutarco contaria, idade após idade, capítulo político após capítulo político, aqui as vitórias, ali os momentos de adversidade, mostrando, ora o perfil feliz, sorridente, classicamente sorridente, ora o semblante carregado, tudo medido, honesto, exato. ‘ O distanciamento, no sentido técnico e dramático da expressão, que se pode sentir hoje assistindo ao O Mundo em que Getúlio Viveu, não foi procurado por mim. É uma consequência natural dos fenômenos históricos focalizados, e que retira, ao conjunto do filme, qualquer possibilidade de ser interpretado sob um ponto de vista pequeno ou político-partidário. Na verdade há vários suicídios no filme. O de Getúlio é o único, literalmente falando. Mas o espectador pode testemunhar também o suicídio do Terceiro Reich ao levar a guerra ao mundo, ignorando a capacidade de aglutinação e de reciclagem de energias das nações que agrediu. E o suicídio de sociedades anacrônicas que não tinham reservas de inventiva política para responder às inquietações populares e ao desafio das crises. Durante o Estado Novo, em meu tempo de estudante, fui contra Getúlio. Mas, em 1950, seu retorno ao poder me encontrou com maturidade para compreender a legitimidade de sua base popular e a sua jogada histórica. Sem dúvida, nos últimos anos de sua vida, ele demonstrou estatura de estadista, e a descoberta do ‘mar de lama’ ao seu redor também o estarreceu, mas não manchou sua honra. Getúlio era de honestidade impecável e, com o passar dos anos, suas qualidades humanas crescem aos nossos olhos. Atualmente existe uma grande preocupação em preservar a memória nacional; acho que contribuí com um trabalho válido e significativo para essa preservação. Finalizando, devo salientar que meu filme pretende ser uma análise dialética de acontecimentos que formam um painel humano, realista e social do mundo em que Getúlio viveu. (*) Corações e Mentes (Hearts and Minds), 1974, produção norte-americana, premiada com o Oscar de melhor documentário, expõe o desastroso envolvimento dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã. Embora sua exibição nas telas norte-americanas fosse inicialmente muito restrita, o filme conseguiu chegar a plateias mais expressivas e contribuiu para estimular a conscientização sobre a insensatez da intervenção militar. (**) O livro A Sangue Frio (In Cold Blood), um romance não ficcional segundo o autor, Truman Capote, foi publicado em 1966, e rapidamente se tornou um best seller. Ganhou admirável versão cinematográfica no ano seguinte, sob o mesmo título, com roteiro e direção de Richard Brooks. O fascínio de Jorge Ileli pelo filme de Brooks corresponde ao seu tropismo pelo film noir, refletido, sobretudo, em Viver de Morrer. Não por acaso, o último projeto de Ileli – não concretizado – foi uma adaptação de Aracelli, meu Amor, de José Louzeiro, escritor-roteirista que deu origem à denominação romance-reportagem no Brasil, a partir de Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia, também levado ao cinema. Esplêndido Documentário Octavio de Faria ... como se estivesse escutando a fala conclusiva de um grande clássico, de um dramaturgo dos maiores... Assim se refere, a propósito do clímax de O Mundo em que Getúlio Viveu, o romancista Octávio de Faria, autor de Tragédia Burguesa, que (entre outras láureas) recebeu o Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, 1970, pelo conjunto de sua obra. Foi um dos fundadores do histórico Chaplin Clube. Publicou Significação do Far-west/ Estudo sobre Cinema e Pequena Introdução à História do Cinema. O cinema nacional já devia muito a Jorge Ileli. Poucos filmes, sem dúvida, mas produções de qualidade, testemunhas de um desses diretoresautores que sabem o que querem dizer e nada sacrificam à vulgaridade do público. Depois de uma estreia brilhante e altamente promissora, de parceria com o nosso saudoso amigo Paulo Vanderley, Amei um Bicheiro (1953), confirmou ele plenamente os seus dons cinematográficos em Mulheres e Milhões (1960) e, se não foi tão feliz no seu novo salto de tempo (1971), com Viver de Morrer, deixou plenamente intacta a confiança que lhe havíamos creditado quando de sua estreia. Volta ele agora à cena, passados cinco anos, com um depoimento que nos parece primoroso. Não só pelas suas qualidades cinematográficas, como pela sinceridade, pela honestidade, pela emoção, pelo entusiasmo com que foi feito O Mundo em que Getúlio Viveu. Se o cinema nacional já lhe devia muito pelas suas longas-metragens ficcionais, muito mais lhe fica devendo agora pelo seu esplêndido documentário. Aliás, ultimamente, temos tido bastante sorte nesse terreno – e vale relembrar, entre outros, o pouco falado (para a valia que tem), “70 anos de Brasil”, de Jurandyr Passos Noronha. O que mais me agradou no documentário de Ileli foi a capacidade que teve de transmitir o entusiasmo que lhe inspira (e que sempre parece ter inspirado) a figura de Getúlio Vargas. E isso sem fugir nem um só momento à absoluta honestidade com que se propôs a contar a gesta do gaúcho de São Borja. Devo declarar, como começo de conversa, que, em relação a Vargas, o meu terreno íntimo – aquele que Ileli ‘agrediu’ com as suas imagens, intencionalmente simples e avessas à retórica propagandística – se não era estéril, adverso à simpatia e à compreensão, também não era um campo favorável em que bastasse lançar a semente para vê-la brotar, crescer e frutificar. Nunca fui getulista e, se tempos houve em que acompanhei com simpatia sua política nacionalista, nunca ninguém foi mais antiqueremista* do que eu. Meu brigadeirismo**, meu udenismo*** de então, não teve outro fundamento: oposição íntima ao chefe dos que tinham amarrado os cavalos no Obelisco, simpatia espontânea, desinteressada e integral ao heroísmo paulista de 1932, dúvidas vagas quanto à legitimidade do Estado Novo e posteriores decepções. Para finalizar, depois do retorno à Presidência, tudo o que o ‘mar de lama’ representou para a nossa dignidade nacional... Vale relembrar tudo isso para justificar e exemplificar a estranheza de minha emoção ao ouvir, no final do filme, a leitura da carta-testamento em clima da mais alta tensão moral – exatamente como se estivesse escutando a fala conclusiva de um grande clássico, de um dramaturgo dos maiores, relatando o sacrifício de um herói grego. Um momento de real grandeza humana. Tal foi o milagre que Jorge Ileli me parece ter conseguido. Mercê de quê? De imagens extraordinárias? De truques cinematográficos? De palavras eloquentes, quiçá bombásticas? De falsas citações? De deturpações hábeis? Nada disso. Nada que se pareça com isso – e eu teria reagido negativamente logo ao primeiro sinal. Nada disso, repito. Ileli contou uma vida como Plutarco**** contaria, idade após idade, capítulo após capítulo, aqui as vitórias, ali os momentos de adversidade, mostrando ora o perfil feliz, sorridente, classicamente sorridente, ora o semblante carregado; tudo medido, honesto, exato. Nada aumentado. Nada escamoteado. Se não mostra em detalhe o ‘mar de lama’, é como se o fizesse: no semblante insistentemente focalizado de Getúlio apreensivo, não se vê realidade diferente. E, de súbito, vem um final grandioso: a grita dos jornais da oposição, a figura dos criminosos palacianos, os frenéticos apelos à renúncia, uma vista sombria do Palácio do Catete, a câmera que faz um zoom sobre uma janela fechada e, ao mesmo tempo, um tiro que ecoa. Então, é o povo que vemos desfilando e chorando o seu grande morto, enquanto se ouve a carta-testamento, esse grito do destino traído que procura se justificar, denunciando. O herói grego que morre ‘assassinado’... por si próprio. Não poderia ter sido mais feliz, no seu intento básico, Jorge Ileli. Ainda que não o possamos acompanhar em todo o seu entusiasmo getulista, não há como não reconhecer: o que ele quis fazer, fez, conseguiu. E conseguiu bem. Por uma vez que seja, está de parabéns o cinema nacional destes últimos tempos. (*) Antiqueremismo. Oposição ao movimento queremista. Foram chamados de queremistas os que defendiam a volta de Getúlio Vargas ao poder na campanha que popularizou o Queremos Getúlio. (**) Brigadeirismo. Referência à aglutinação em torno da figura do Brigadeiro Eduardo Gomes, candidato antigetulista à Presidência da República. (***) Udenismo. Referência à União Democrática Nacional, partido formado em oposição às correntes simpatizantes da volta de Getúlio Vargas ao poder, e que atraiu o Brigadeiro Eduardo Gomes à cena política. (****) Plutarco, escritor grego nascido em meados do primeiro século da era cristã e considerado o príncipe dos biógrafos. Autor das obras conhecidas como Vidas Paralelas (ou Vidas dos Homens Ilustres) e Obras Morais. A importância de seus escritos biográficos repercutiu, entre outros, em Shakespeare (Júlio César, Antônio e Cleópatra, Coriolano). Na Dimensão do Tempo Ely Azeredo Ao conceber o prólogo de O Mundo em que Getúlio Viveu, com um clima reminiscente do cinema de Alain Resnais – quase marienbadiano, de excepcional beleza, percorrendo com a câmera o Palácio do Catete vazio – Jorge Ileli, sem perturbar o rigor do documentário, mostrou como o documental pode ganhar com a experiência do ficcionista. E preparou o espectador para mergulhar na dimensão do tempo, indispensável à compreensão da História. Embora seu terceiro filme ficcional, o subestimado Viver de Morrer, 1972, esteja entre os mais vigorosamente críticos de todo o cinema brasileiro, é possível que os historiadores situem O Mundo em que Getúlio Viveu como o melhor dos quatro longas-metragens de Jorge Ileli. Mas a importância deste filme não se deve apenas à excelência e à dignidade de sua realização, que desarma as resistências dos que o procuram motivados pela polarização político-emocional. A exibição revelou um público surpreso ante a reflexão serena – ainda que comovida – que a obra suscita e, sobretudo entre os mais jovens, a sensação de revelação da força de um gênero tão conspurcado pelo oportunismo e a mediocridade – o documentário. Chamando a atenção para o período que gerou o fascismo, o nazismo e seu reflexo nativo sob o rótulo de Estado Novo – que atrasou a formação política de várias gerações – O Mundo em que Getúlio Viveu testemunha em favor de um cinema participante de seu tempo, socialmente responsável, e livre – sobretudo liberto de sectarismos que servem de pretexto à armação de barreiras obscurantistas. Eis um programa não somente consentido para as faixas de público, de menor idade, mas também irretorquivelmente recomendável como todas as obras de nobreza intelectual e importância histórica. Durante o Estado Novo, em meu tempo de juventude, fui contra Getúlio, disse o cineasta. Mas, em 1950, seu retorno ao poder me encontrou com maturidade para compreender a legitimidade de sua base popular e de sua jogada histórica. Sem dúvida, nos últimos anos de sua vida ele demonstrou estatura de estadista, e a descoberta do chamado ‘mar de lama’ ao seu redor também o estarreceu, mas não manchou sua honra. Se é impossível deixar de perceber que as simpatias de Ileli pendem acentuadamente para o ex-caudilho convertido, sem consciência ideológica, em líder popular, ungido de imprevisível grandeza nos trágicos, indômitos dias do fim de sua vida (e que o levam a minimizar no filme as fraquezas geradas na excessiva acomodação ao poder personalista), também é verdade que os pequenos desmaios de sua isenção não chegam a danificar o enfoque. A honestidade e a veracidade deste enfoque são reconhecidas até por antigetulistas de antiga e nobre espécie, como Octavio de Faria, segundo o qual Ileli contou uma vida como Plutarco o faria. Trata-se calorosamente de uma vida, de alguém que, embora colhido no elenco da História, não perde na tela sua condição de indivíduo. A fim de enriquecer seu filme, fugindo ao risco do retrato oficial ou oficioso, Ileli dedicou muitos anos a pesquisas, chegando a constituir uma filmoteca particular a partir da primeira prospecção efetuada no início da década de 1960. No gênero, nenhum outro filme brasileiro exigiu tanto investimento em tempo e pertinácia quanto o projeto Getúlio. Inicialmente, seria uma série de curtas-metragens para televisão. Depois assumiu a forma de um longa-metragem de material documentário brasileiro e limitado à biografia do político. Efetuada a montagem, Ileli e seus principais colaboradores – Orlando Caramuru (corresponsável pelas pesquisas, roteiro e texto) e Maria Guadalupe (edição) – compartilharam certa insatisfação: faltava algo para que o filme ganhasse maior emoção e fôlego histórico. Começou, então, a seleção de material estrangeiro, a decisão de levar até as últimas consequências a conclusão de que os acontecimentos brasileiros não poderiam ser perfeitamente sentidos e compreendidos sem seu posicionamento no mundo. Se nenhum homem é uma ilha, o que dizer das nações? E surgiu, então, o mundo, o complexo sociopolítico internacional, entre as imagens de Getúlio e seu tempo brasileiro. Somente em 1968, com uma sequência do prólogo fotografada por Ozen Sermet no Palácio do Catete deserto, a forma do filme se completou. As circunstâncias nacionais levariam Ileli a somente repensar O Mundo em que Getúlio Viveu no início da década de 1970, ainda continuando a adiar a submissão da obra à censura. A ideia de não tocar na montagem, resistindo à tentação de efetuar cortes, mantendo o filme como documento integral de um tempo muito preciso (letreiro final: Fim de uma Época) fez com que o cineasta também abandonasse o projeto de acrescentar imagens capazes de facilitar a aceitação comercial. O prólogo quase marienbadiano, de excepcional beleza – o palácio vazio, com a reverência dos cenários de tragédia –, reforça a sensação do distanciamento cronológico, da dimensão do tempo. De fato, sem eliminar elementos de humor que fazem parte da personalidade do biografado, sem fugir à irreverência (na abordagem das manifestações subdesenvolvidas dos integralistas em paralelo com o aparato estético-marcial das apresentações públicas do espetáculo nazista, por exemplo) e as inserções nostálgicas da alegria dos tempos condenados, o filme é fiel ao tom do prólogo. Prevalece o ângulo trágico, decorrente “do fato de ser Vargas um homem acossado por pressões de todos os lados, investido pelos acontecimentos, e que, na condição de estadista, serviu de leito à correnteza da História”. Se toda filmagem documentária – de atualidades ou reconstituição – levasse assinatura, a ficha técnica do filme em cartaz comportaria mais de uma centena de nomes só no que se refere à cinegrafia, dada a utilização de material nacional e estrangeiro sobre a quase totalidade das grandes convulsões político-sociais de meio século. A montagem inclui imagens da Belle Époque, os pródromos da guerra de 1914-1918, a ascensão do fascismo e do nazismo na Itália e na Alemanha, a Revolução Russa, a Guerra Civil Espanhola, as inquietações de massa do período entre as duas guerras mundiais, a guerra entre o Eixo e os Aliados (inclusive a valorosa participação brasileira no Atlântico Sul e em solo italiano), o movimento peronista, a agonia da Velha República no Brasil, a Coluna Prestes, os movimentos armados de 1930 e 1932, o Estado Novo, as tentativas de tomada do Poder por comunistas e integralistas, a democratização de 1945, as eleições subsequentes, o movimento queremista (o Queremos Getúlio!), a avalancha de votos que reconduziu Vargas ao Catete em 1950, as sucessivas crises – as válidas e as artificiais – por ocasião do novo mandato presidencial e, finalmente, o suicídio, que ao mesmo tempo reforçou a mitologia de Vargas e confirmou uma vocação política sem precedentes em nossa História. Fica bem dividida a trajetória de Getúlio: as tibiezas, acomodações, tergiversações hábeis que desaguam no Estado Novo, mantendo à distância as radicalizações ideológicas mediante a força e o atendimento paternalista de reivindicações populares; depois, na volta eleitoral, a legitimação definitiva do estadista com um programa de medidas nacionalistas. As imagens não podem mentir: nenhum peleguismo poderia mobilizar o oceano de povo que vemos nos comícios da última campanha e, depois, como um imenso coro (silencioso) de tragédia no cortejo fúnebre. E a montagem, sempre lúcida – mesmo quando nervosamente crispada –, testemunha um trabalho não apenas admirável sob o prisma técnico, mas, sobretudo, pela vivência posta em cada segundo de sua criação. Além do talento do cineasta, impõe-se destacar o que Maria Guadalupe evidencia em sua contribuição inestimável na montagem. Excelente a narração na voz de Armando Bógus, com participação também perfeita de Roberto Faissal no final. Embora importante, o texto permanece em segundo plano, discreto. A imagem reina. (1976) Retrato sem Preconceitos Sérgio Augusto O jornalista e crítico de cinema – e das mais diversas áreas da cultura – Sérgio Augusto, coloca em discussão o enfoque de Jorge Ileli na prospecção e realização de O Mundo em que Getúlio Viveu, sem deixar de destacar a ousadia do cineasta ao tomar como objeto de estudo o maior mito do Olimpo político nacional; e com maior honestidade procurar pintar um retrato sem preconceitos, nem pró, nem contra. Como nos livros neutros do historiador Hélio Silva. Há 13 anos, quando Jorge Ileli realizou este documentário sobre Getúlio Vargas, não era nada comum ver nas telas brasileiras qualquer espécie de colagem histórica a partir de filmes de arquivo. Além de representar uma experiência inusitada e contribuir valiosamente para a até hoje incipiente historiografia cinematográfica nacional, O Mundo em que Getúlio Viveu pare-cia alertar os contemporâneos do governo João Goulart de que nem sempre a história, ao se repetir, assume a forma de comédia. E tampouco precisa substituir no elenco alguns de seus mais sinistros coadjuvantes. Entre o voluntário e cauteloso engavetamento do filme por Ileli e seu lançamento esta semana no Rio, muita coisa mudou no Brasil e no cinema nacional. Acima de tudo, hoje em dia tornou-se possível interpretar à luz de novos documentos e análises revisionistas o complexo papel desempenhado por Getúlio Vargas na história moderna do país, e quem eram, de fato, as ‘aves de rapina’ a que ele se referiu em sua dramática carta-testamento. Na esteira desses estudos, igualmente Jorge Ileli poderia ter atualizado sua documentação com algumas das imagens que abnegados pesquisadores resgataram no início dos anos 1970 à crônica amnésia iconográfica brasileira. Preferiu, entretanto, deixar O Mundo em que Getúlio Viveu em seu estado original de 1963: sóbrio, ligeiro, emocionante, artificialmente cevado com exorbitantes testemunhos sobre a participação de Hitler, Mussolini e a Força Expedicionária Brasileira na Segunda Guerra Mundial. E com o objetivo de dar ao espectador a discutível impressão de que a República brasileira, a partir da subida da Aliança Liberal ao poder, em 1930, jamais deixou de receber seus principais estímulos do exterior. A privilegiada hegemonia, insistentemente conferida à influência da conjuntura internacional nos êxtases e percalços do populismo getulista, desmente a extravagante epígrafe do diplomata e historiador suíço Jacob Burckhardt (1891-1974) que prefacia os letreiros. Ao contrário do que pensa o equivocado Burckhardt, a História não consiste em mera sucessão casual de fatos brotados do nada. Não foi por acaso que Getúlio Vargas subiu ao Palácio do Catete em 1930. Nem devem ser creditados às sortes e aos azares da vida suas quedas do poder: a de 1945, ao ser derrubado por um golpe branco, e a de 1954, quando se suicidou denunciando forças ocultas no fecho de uma crise política iniciada com o atentado a Carlos Lacerda, em que morreu o major Rubens Vaz. No enfático pingue-pongue que Ileli estabelece entre Vargas e o mundo exterior, contudo, o essencial ficou de fora. São os compromissos ideológicos da guerra fria, que influenciaram decisivamente os militares conservadores e os levaram a sonegar apoio ao presidente nos últimos meses de seu derradeiro mandato. E as pressões econômicas de grandes trustes internacionais, alarmados com a vocação estatizante do governo getulista. Um dia, espera-se, o cinema brasileiro poderá discutir tudo isso sem receio e com detalhes. Por enquanto, resta o consolo de que um cineasta tomou como objeto de estudo o maior mito do Olimpo político nacional. E dele, com a maior honestidade, procurou pintar um retrato sem preconceitos, nem pró, nem contra. Como nos livros neutros do historiador Hélio Silva. (1978) Revisão de Julgamento Ivan Alves Orquestrando um vasto instrumental de imagens nacionais e internacionais em O Mundo em que Getúlio Viveu, um tempo caracterizado por violentos traumas políticos e choques sociais, Ileli teve a ambição de contribuir para o processo de revisão de julgamento sobre a personalidade de Vargas – escreveu o jornalista Ivan Alves. Um dos períodos mais agitados da história brasileira – e mundial – foi reconstituído no documentário O Mundo em que Getúlio Viveu, de Jorge Ileli. Durante uma hora e 23 minutos, imprimem-se na tela alguns dos mais expressivos personagens e acontecimentos das décadas de 1930, 1940 e 1950, tendo como eixo a figura de Getúlio Vargas, com seu charuto, seu carisma popular, suas ambiguidades e sua busca alternada de solidão nos pampas missioneiros de São Borja e de prestígio popular nos comícios do Estado Novo e do PTB. A ascensão de Vargas coincidiu com o boom do fascismo em escala planetária, mas ele sobreviveu quase dez anos ao desmantelamento do totalitarismo em seus moldes clássicos: deposto em 1945, voltou ao poder em 1950, através de eleição direta. Retornou para completar sua obra política e administrativa, que pinçara o país do patriciado rural, lançando-o na era da industrialização. Quatro anos depois, no quadro de uma crise levada ao paroxismo pela tragédia da Rua Toneleros, no Rio de Janeiro, suicidou-se numa fria manhã de agosto, no Palácio do Catete, cenário de sua solidão e de suas manobras políticas, e de onde, sob a veneração popular, ele saiu da vida para entrar na História. Se o ‘pingo’ passar encilhado, ele monta, disse uma vez Oswaldo Aranha, referindo-se à possibilidade de Getúlio Vargas aceitar, em 1950, sua candidatura à Presidência da República. Usando um regionalismo gaúcho – ‘pingo’ é cavalo, na terminologia das coxilhas do Sul – o ex-presidente da ONU quis sintetizar toda a argúcia do velho caudilho de São Borja. Nos idos de 1954, o historiador Afonso Arinos de Mello Franco, que chefiara com singular veemência a oposição parlamentar a Vargas, assim se manifestou sobre a astúcia lendária do presidente que se matara em pleno exercício do seu mandato constitucional: O suicídio de Getúlio Vargas foi um ato político. A bala que o matou também feriu de morte a UDN, Astúcia, amor ao poder, frieza, espírito demagógico – eis algumas expressões usadas frequentemente, quando se trata de traçar o perfil político de Getúlio Vargas, desde a humilde vereança municipal em São Borja até a Presidência da República – com passagem por numerosas funções e mandatos: deputado estadual e governador (Rio Grande do Sul), deputado federal, líder de bancada e ministro da Fazenda (governo Washington Luís), e finalmente chefe de um movimento revolucionário. E ainda senador eleito simultaneamente por dois Estados e ditador que enfeixava poderes iguais aos de Adolf Hitler e Benito Mussolini. Para contar a história de Vargas – que se confunde, ao longo de 30 anos, entre 1924 e 1954, com a própria história do país –, Jorge Ileli observa que, com um vasto material, foi possível concatenar as sequências dentro de um ‘timing’ exato, que apenas informasse sem adjetivar, obtendo-se um ritmo interno adequado para jogar os acontecimentos dentro de uma narrativa fluente. Conseguindo esse objetivo – diz Ileli – julgo que o filme vai além da expectativa, trazendo de volta não apenas os acontecimentos, a história, o passado, mas também a emoção, o clima, a nostalgia e a lição desse passado. O Mundo em que Getulio Viveu mostra o ex-presidente em todas as fases de sua carreira, criando órgãos fundamentais ao desenvolvimento do país, como a Petrobras e a Eletrobras, sufocando rebeliões da esquerda e da direita, isolado em seu retiro de São Borja, empreendendo a sua triunfal viagem de volta ao Catete, nos idos de 1950, e retornando, morto, à terra em que nasceu. Dos momentos de glória – os comícios de Primeiro de Maio, no Estádio Vasco da Gama, a chegada ao Rio de Janeiro em 1930 como chefe de um movimento revolucionário vitorioso – às fases de amargura – o crime da Rua Toneleros, o ‘mar de lama’ e a deposição de 1945 – , Vargas cumpriu um fascinante itinerário político. Ao reproduzir todas essas fases da história brasileira, o filme de Ileli pretende contribuir para o processo de revisão do julgamento sobre a personalidade de Vargas. O filme de Jorge Ileli não se limita, entretanto, a situar a figura de Getúlio Vargas no cenário político brasileiro. Articula-a com o contexto mundial da época, quando Adolf Hitler e Benito Mussolini estavam no auge do seu prestígio e preparavam o grande banho de sangue de 1939-45. Vargas deixou-se sensibilizar pelo modelo nazifascista, implantou uma ditadura no Brasil e proclamou o Estado Novo à imagem e semelhança – sob alguns aspectos – do Terceiro Reich. Os partidos políticos foram dissolvidos, a censura passou a cobrir todas as manifestações artísticas e intelectuais, as prisões se encheram de líderes políticos e operários. A derrocada do nazifascismo em 1945 e o retorno da Força Expedicionária Brasileira obrigaram Vargas a mudar as regras do jogo. As eleições foram convocadas, mas os militares o depuseram, receando que Vargas, no último momento, se perpetuasse no poder. Seguiu-se o longo exílio em São Borja, de onde ele voltou para o Catete. Vargas não foi, porém – como o filme reitera com clareza – , apenas o político maquiavélico, mas o homem interessado no processo de desenvolvimento industrial e, paradoxalmente, em função de suas origens sociais, empenhado na valorização do trabalhador, ao qual outorgou uma legislação considerada por muitos irreal ou demagógica. Seu suicídio em 24 de agosto de 1954 estabeleceu o fim de uma época e foi chorado pelo povo. A sua força carismática, vista hoje, se atenua, quase se dilui, e a opinião pública está preparada para fazer uma revisão tranquila, não passional, sobre a personalidade de Vargas, sua política e suas realizações, diz Ileli. O Mundo em que Getúlio Viveu foi caracterizado por violentos traumas políticos e choques sociais, entre os quais ele oscilou, ora inclinando-se para a direita, ora para uma posição de centro-esquerda, o que se evidenciou mais claramente nos últimos anos de sua segunda fase governamental. Por isso, foi tachado de oportunista. Como de oportunista foi tachada até a sua morte – um gesto político, segundo os líderes da oposição. Vargas, no entanto, preferiu permanecer fiel às suas diretrizes e intuições, na área política e administrativa, perdendo amigos ou conquistando antigos adversários. E fiel, principalmente, à perspectiva histórica, o que ficou bem evidenciado na carta-testamento lida no filme por Floriano Faissal: Aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Uma vitória que o jazigo da família Vargas guarda numa urna no modesto cemitério do município de São Borja. (1976) As Interrogações da Estreia O Mundo em que Getulio Viveu teve um espectador privilegiado: Samuel Wainer, cuja convivência com o tema foi a mais ampla possível. De fato, este repórter – que chegou a editor, diretor e proprietário de jornais – foi opositor e, depois, conselheiro político de Vargas. Sofreu prisão e exílio na época do Estado Novo. Mas a partir de 1949, quando foi incumbido de entrevistar o expresidente em seu retiro de São Borja, tornou-se aliado e beneficiário de seu retorno ao poder. Graças a Vargas, Wainer conseguiu recursos para lançar o diário Última Hora, um dos veículos que revolucionaram a imprensa brasileira. Antes, em 1938, em pleno Estado Novo, Samuel Wainer fundou a revista de oposição Diretrizes. Em agosto de 1942 sofreu a primeira de suas três prisões, acusado de atividades comunistas. Acabaria optando pelo exílio nos Estados Unidos e, depois de um ano, mudou-se para a Europa. Foi o único jornalista latino-americano a cobrir o julgamento de Nuremberg, atuando como correspondente de Diretrizes e da BBC de Londres Diretrizes fechou em 1944, proibida pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), a supercensura do Estado Novo, um ano antes da queda de Getúlio. Wainer voltou ao Brasil em 1947, sob contrato com os Diários Associados, de Assis Chateaubriand. É para os jornais de Chatô que ele entrevista Vargas. A matéria é publicada com um título profético: Ele Voltará... Anos depois, em entrevista para a série Dossiê Memória da Imprensa, da Folha de S. Paulo, Wainer falou de sua aproximação com o antigo adversário: Pra mim, o Getúlio era um grande assunto, porque o fundamental na vida do jornalista é o assunto. Se ele tem o assunto e o assunto se entrega a ele, ele deve tirar desse assunto as últimas consequências. O jornalista que mata ou trai a confiança de seu assunto é um médico que mata o seu paciente. Em outubro de 1976, quando dirigia o semanário Aqui (São Paulo), Samuel Wainer entrevistou Jorge Ileli juntamente com o jornalista Narciso Kallini, secretário da redação. AQUI – Por que você resolveu lançar O Mundo em que Getúlio Viveu agora? ILELI – Foi em cima da abertura do presidente Geisel, iniciada em 1974, e porque outros documentos sobre Getúlio tinham sido liberados. AQUI – Mas isso não faz um pouco parte dessa onda de nostalgia que está por aí, desde o musical até política? ILELI – Em relação ao interesse do público acredito que sim. Mas em relação a mim, foi por haver mais facilidade atualmente. Agora, pelo sucesso que teve no Rio, com semanas consecutivas em cartaz num só circuito, então acho que isso aí é um pouco da onda de nostalgia, é o absoluto desconhecimento do jovem sobre o que aconteceu no passado, porque 80% da plateia que assistia à fita era de jovens... AQUI – E como se manifestava essa plateia? ILELI – No meu entender era um interesse até excessivo, em se tratando de jovens – um assunto árido, um assunto político, e eles assistiam com muita atenção. A reação era de perplexidade por não terem a menor ideia do que havia acontecido. AQUI – Na concepção, na montagem, no texto, que recado você quis dar? Há pouco você disse que ficou assustado com a receptividade dos jovens, que eles se interessaram até exageradamente sobre o assunto... ILELI – O endereço certo da fita são os jovens... AQUI – Mas o que você está querendo dizer com a fita? ILELI – Em primeiro lugar, eu não quis questionar a figura de Getúlio porque me faltavam documentos. Hoje tem uma boa bibliografia, mas naquela época havia muito pouco. O material cinematográfico que eu havia arranjado era bom para um filme de média-metragem, mas não daria um longa-metragem de qualidade. Então, em vez de fazer uma fita sobre a figura de Getúlio, fiz um filme sobre o mundo em que ele viveu, tendo Getúlio como a figura central. Com os acontecimentos internacionais determinando os acontecimentos nacionais – um inter-relacionamento deles – dando uma ideia geral do mundo em que Getúlio viveu, com ele dentro do contexto internacional. Consegui um bom material estrangeiro; só usei bom material. Consegui coletar mais de 63 mil metros de filme e aproveitei só dois mil e 300. Por isso, pude ritmar muito bem a fita. Agora, para questionar Getúlio, me faltava fôlego de historiador. Era uma reportagem, não é falsa modéstia, eu não tenho fôlego de historiador, não tive contato com a família, nem uma boa biografia à mão, e não pude recorrer a arquivos de amigos e parentes. AQUI – Quais foram as suas fontes, então? ILELI – Filmes eu comprei de particulares, tanto brasileiros como estrangeiros. Na Agência Nacional, por exemplo, havia muito pouco e só as filmagens oficiais. O melhor material, o sobre a Revolução de 1932, consegui localizar com um velhinho aqui de São Paulo. Só ele tinha o material, ainda em nitrato. Hoje tenho um material sobre a revolução paulista que pouca gente possui. Mas de material oficial existe muito pouca coisa. AQUI – Nem no Rio Grande do Sul, daquela primeira fase dele governador? ILELI – Consegui, mas através de Alexandre Wulfes; alguma coisa comprei dele. AQUI – Mas por que esperou 12 anos para lançar? Houve restrições políticas ao filme? ILELI – O filme ia ser exibido em agosto de 1963, mas terminamos depois, em fins de setembro. Então resolvemos esperar a data do nascimento de Getúlio, 19 de abril. Mas nessa época aconteceu o movimento de 1964 e achamos inoportuno o lançamento. Por isso é que o filme esperou até agora. Acredito que, do ponto de vista da perspectiva histórica, ele esteja um pouco distanciado no tempo. AQUI – Você fez alguma modificação no texto? ILELI – Absolutamente. AQUI – O lançamento do filme, agora, não seria uma indução, talvez inconsciente, de que a figura de Getúlio está voltando em todos os setores? Você está sentindo isso? ILELI – Acho que sim. Estou sentindo isso inclusive nos altos escalões. O próprio presidente Geisel, em Belo Horizonte, citou nominalmente Getúlio. Hoje as pessoas podem tentar uma revisão tranquila dele. Acho que o assunto agora está despertando um interesse bem maior. AQUI – Está havendo uma revisão com maior tranquilidade? ILELI – Com maior tranquilidade, maior imparcialidade, uma isenção em relação à figura dele. AQUI – A crítica, como ela se conduziu em relação ao filme? ILELI – Foi muito boa. O Jornal do Brasil me deu um apoio incrível lá no Rio. Das três críticas que saíram, duas foram favoráveis, outra não. Pen-so que o filme situa Getúlio exatamente como deve ser situado, dando inclusive as influências externas da época. Getúlio sendo o tradutor da vontade das elites dirigentes – que um governo forte era a solução para os problemas sociais, no momento; então Getulio foi quem traduziu esse desejo. E, evidentemente, quando digo que ele é uma espécie de bode expiatório do Estado Novo, significa que ele não é o único culpado; o Estado Novo é um sistema, um conjunto de forças, de fatores, de ideias e de ação. Getúlio saiu desse sistema e o sistema continuou. Por isso, acho que o problema de Getúlio, em 1945, ter ficado como o único bode expiatório é injusto. Não é que ele não tenha culpa também, ele é um dos culpados, mas não o único. AQUI – O fato é que o Dutra foi o candidato das forças democráticas e o principal articulador do golpe de estado em 1937. Mas, deixando de lado, como é que você está se saindo com o filme? ILELI – Comercialmente, no Rio, o filme está sendo um extraordinário sucesso, porque, apesar de ser exibido em cinema de arte, é a maior bilheteria do cinema brasileiro, em seis semanas nesse tipo de sala de espetáculo. AQUI – Você conviveu com Getúlio? Você teve alguma proximidade com ele? Como é que você decidiu isso? ILELI – Quando aconteceu o suicídio, O Cruzeiro tinha um grande arquivo sobre ele. Eu trabalhava lá como redator e achei que era uma boa ideia fazer um levantamento cinematográfico; na época a televisão estava surgindo. Em 1955, 1956, mais ou menos, ficamos de arranjar material sobre Getúlio para uma série de televisão. No princípio dos anos 1960 – eu sou cineasta, além de jornalista, fiz outros filmes – o Walinho Simonsen estava importando alguns filmes e já possuíamos bastante material coletado sobre Getúlio, íamos fazer uma série sobre a vida política brasileira tendo como centro não Getúlio, mas a Revolução de 1930, a de 1932, o Brasil na guerra, a queda e a volta de Getúlio. Mas não chegamos a concretizar esse projeto, não só por causa da pobreza do material – teríamos que pesquisar mais um pouco – , mas também pela desistência de Walinho, o esvaziamento da TV Excelsior pelo Golpe de 1964. Resolvemos, então, aproveitar o que tínhamos coletado e fazer um filme de longa-metragem. AQUI – Quanto tempo você demorou para realizar o filme? ILELI – Foram dois anos de pesquisas, quando resolvi mesmo fazer o filme, às vezes montando durante dez horas por dia. AQUI – Ficou caro? ILELI – Agora não sei quanto seria, mas na época ficou em 11 mil cruzeiros. AQUI – Mas é um bom projeto para a televisão, fazer a vida política brasileira... ILELI – Mas eu não sei se teria a mesma liberdade que o cinema e o teatro têm. Na televisão os métodos de censura são mais rígidos. AQUI – A família de Getúlio tomou conhecimento do filme? ILELI – Tomou. A Alzira viu na época, a Celina viu quatro vezes e reviu agora novamente... AQUI – Ela agora está montando o Museu Getúlio Vargas... ILELI – É, inclusive ela possui um material que poderia ter cedido, mas eu a conheci depois do filme feito. Eles gostaram muito, porque os problemas principais são relatados com imparcialidade. Eles viram a honestidade dos propósitos, a verdade dos fatos principais. As deturpações da época não chegaram ao filme. AQUI – A prova de fogo será aqui em São Paulo, não? ILELI – É impressionante, São Paulo é outro país. AQUI – Você sabe da reação de Jango quando viu o filme? ILELI – Parece que ele se emocionou muito, teve que tomar uma injeção. Mas eu não assisti junto. AQUI – Foi proposital a colocação da carta ao fundo? ILELI – A carta resume tudo aquilo que o filme quer dizer. Ela foi feita para dar aquela reviravolta e resume todo o pensamento político e filosófico de Getúlio. Então, a carta jogada em cima do enterro dele teve um excelente resultado cinematográfico. Inclusive, quando o filme termina, as pessoas continuam sentadas por uns 40, 50 segundos, sem saber o que fazer, por causa do impacto final. Aquilo é o resumo do filme. AQUI – A quem está dirigida a mensagem? ILELI – É dirigida especificamente aos jovens. Eles é que vão dirigir esse país, e é preciso que saibam que existe um passado recente que precisam conhecer. Esse passado é de fundamental importância; de vez em quando ele volta. Hoje estamos com alguns problemas parecidos com os daquela época. Então, um homem que dedicou sua vida ao Brasil, que morreu pobre, que ‘jogou’ só para História, e que, apesar de acusado de ter um mar de lama ao seu redor, morreu pobre, honesto e intocável... E esse exemplo de Getúlio, do nacionalismo, de sua política – o filme não toma partido, mas concede um ângulo visual favorável e uma simpatia implícita – nacionalista entre 1950 e 1954 é que realmente está no cerne da questão, e que é de fato o que os jovens precisam saber... AQUI – Mas a manifestação do público se inclinou mais para a política nacionalista ou para o lado social de Getúlio? ILELI – No lado social ele não avançou tanto quanto no terreno nacionalista. AQUI – Embora isso seja mais forte na base popular... ILELI – Exatamente. AQUI – É quase um agradecimento... ILELI – Mas a política salarial dele é mais um paternalismo projetado na opinião pública. É verdade que ele concedeu algumas coisas ao operário, mas de maneira sagaz, de servir às classes dirigentes, de deter o avanço do socialismo. AQUI – Houve alguma intenção de centrar em cima do Lacerda o desencadeamento de toda a crise e a radicalidade do processo? O filme mostra isso? ILELI – Mostra como a gota d’água. Ele é o portavoz do processo... O filme mostra as diversas tentativas de derrubada: a primeira, a tese de que Getúlio não havia ganhado por maioria absoluta, disseram que ele não devia tomar posse. A segunda foi em relação a Perón, acusando Getúlio de estar querendo fazer uma república sindicalista no Brasil. A terceira foi a política de estatização que, aliás, agora voltou; a entrada das multinacionais, a briga pelo monopólio. A quarta foi aquele problema com os coronéis, com a nomeação de Jango para o Ministério do Trabalho. Eram crises. Essas tentativas não surtiram efeito. Então, a quinta começa com Lacerda, a sua campanha, e a gente percebe que sua evolução pode atingir o povo. Daí, os meios são fornecidos: imprensa, rádio, televisão são envolvidos. Até pessoas da família do presidente entraram, no ‘bolo’, e realmente o fio conduz a uma crise que vai desaguar no suicídio de Getúlio. Essa crise, em minha opinião, por causa do primarismo de Gregório, que, não entendendo o jogo político, quis resolver na base do crime. Fez o atentado ao Lacerda, em que morreu o major Vaz e, a partir daí, criou-se realmente uma crise quase insuperável. Isso aconteceu no dia 5 de agosto e a crise durou 19 dias, num crescendo, até o dia 24; inclusive com o envolvimento das pessoas da guarda pessoal e, depois, da família. Hoje se sabe que Getúlio e a família não tiveram nada com o atentado. Embora a guarda pessoal tenha participado sob a direção de Gregório, a família não participou. Talvez se Getúlio tivesse sabido antes, pudesse ter condições de contornar a crise, de tão inteligente e político que era. AQUI – Ficou histórico. Quando chegou a notícia do atentado, ele disse: Esse tiro foi uma punhalada nas minhas costas. Tem outra frase que ainda não ficou histórica. Quando o processo da oposição já estava avançando para tomar o poder, ele disse ao Lourival Fontes – e esse foi o primeiro prenúncio do suicídio – Deixa esse povo preparar o banquete, na hora da comida eu puxarei a toalha. ILELI – Houve, além disso, outro prenúncio. A predisposição de Getúlio para uma carta-testamento como jogada política. Aconteceu em 1932 em relação à Revolução Paulista. A informação está no livro O General Góes Depõe, de Joel Silveira e Lourival Coutinho. AQUI – Do ponto de vista do documentário cinematográfico, você acha que o seu trabalho sobre Getúlio é definitivo? ILELI – O meu trabalho é uma contribuição, mas eu a considero muito valiosa para a preservação da memória nacional, pois esta é curta, para não dizer inexistente. Essa contribuição é significativa, porque um país que se preza deve prezar a sua memória. Isso é até acaciano. Hoje há mais condições de se questionar Getúlio do que no meu tempo. Mais informações. O distanciamento permite que muitas pessoas possam dar seus testemunhos. Por isso não fiz interpretações. No meu filme apenas dei uma visão do mundo em que ele viveu. AQUI – Se você tivesse que traçar um paralelo entre Getúlio e os grandes heróis populares latino-americanos, onde você alinharia Getúlio? ILELI – Do ponto de vista social, por concessões paternalistas à classe operária, ao lado de Perón. E do ponto de vista da luta pela independência e de emancipação nacional, ao lado do mexicano Juarez. Capítulo IX Dossiê Cinejornais Jornalismo com a Câmera Antonio Olinto Escritor e crítico com longa vivência em redações de jornais, Antonio Olinto observou com especial interesse os cinejornais realizados por Jorge Ileli para a Cinegráfica São Luiz, nos anos 1950. Seus jornais têm sido, acima de tudo, obras de cinema. Os acontecimentos surgem neles com um ritmo bem mais vivo do que o comum no gênero. Um goleiro do passado, Batatais, que se celebrizou com a camisa do Fluminense, tornara-se zelador do Maracanã. Ileli levou a câmera e o craque ao estádio vazio, demonstrando como um cineasta pode dotar de sensibilidade e poesia um complemento de programa. O cinema pode assumir todos os tipos de lingua-gem. Enquadram-se nele não só o tema ficção, a narrativa, mas também a poesia, o ensaio e a reportagem. O jornal cinematográfico, por exemplo, tem o seu estilo próprio, o seu jeito dinâmico de relatar os acontecimentos, a sua técnica especial de corte. O acontecimento possui uma existência independente de quem o contempla, de quem dele toma conhecimento. A câmera de jornal capta-o em sua pureza, em sua simplicidade de coisa que está diante dos olhos. Faz com que as imagens substituam o texto do jornal escrito, a técnica de narrativa do cotidiano. Os jornais cinematográficos brasileiros são, em geral, feitos apressadamente, sem a orientação de alguém que compreenda que, mesmo dentro da pressa da notícia transformada em imagem, há possibilidade (mais do que isto, há necessidade) de que o acontecimento seja apresentado com uma certa beleza. De algum tempo para cá, a Cinegráfica São Luiz passou a fazer jornais mais bem concebidos. Quando se encarregou de jornais cinematográficos, Jorge Ileli já trazia, por isto, não só o seu talento natural para a realização de películas, mas também um contato direto com a arte da imagem. Seus jornais têm sido, acima de tudo, obras de cinema. Os acontecimentos surgem com um ritmo bem mais vivo do que o comum de nosso trabalho no gênero. O jornalismo cinematográfico comporta ainda a composição de elementos capazes de reviver um passado, de formar uma reportagem retrospectiva. Foi exatamente isto que Jorge Ileli fez em um de seus cinejornais. Todos se lembram de Batatais, o antigo defensor do Fluminense. Atualmente, Batatais é zelador do Maracanã. Ileli fez uma reportagem cinematográfica mostrando Batatais entrando em campo, aproximando-se da linha de gol, repetindo os seus passos de uma trave à outra e fazendo com um pé, sobre o gramado, uma cruz, coisa que era a sua mania nos tempos de craque. Depois, Batatais aproxima-se da câmera. As arquibancadas estão vazias e é como se ele ouvisse os aplausos de uma multidão invisível. No final, a câmera, colocada no alto das arquibancadas, mostra o jogador sozinho no meio do gramado, cercado de silêncio e solidão. Reportagens cinematográficas semelhantes a esta mostram o muito que Jorge Ileli pode fazer no gênero, sem abandonar o cinema de longametragem, o filme de ficção, que oferece um campo muito maior à sua capacidade criadora. Capítulo X De JK a Aracelli, meu Amor Depois do lançamento de O Mundo em que Getúlio Viveu, Ileli quis fazer outro documentário histórico, abordando a trajetória de Juscelino Kubitschek até o amargo fim, provocado por seu banimento da vida política. Soube que Adolpho Bloch, fundador da editora capitaneada pela revista Manchete e amigo do ex-presidente, possuía um material incrível sobre JK. Seu primeiro passo foi conversar com o escritor Carlos Heitor Cony, que tinha ótimas relações com Bloch. Cony sabia que Ileli não deixaria de vasculhar os desvãos da história e comentou: Você esperou 13 anos para exibir o filme sobre Getúlio, acabou em 1963 e só exibiu em 1976. Se você fizer um filme sobre Juscelino como fez o Getúlio, não vai poder exibir tão cedo.... Cony se referia aos rumores de assassinato de Juscelino – ninguém falava na época, apesar de todas as evidências. Como ninguém falava na coincidência de Jango, Juscelino e Carlos Lacerda terem morrido quase ao mesmo tempo, num espaço de sete meses, pouco antes da abertura – a distensão política liderada pelo general Geisel. Mais tarde, Ileli diria: Eu soube que, quando Carter (o presidente dos EUA) veio ao Brasil, houve um pedido para que as lideranças civis não pegassem o país de novo, e logo depois aconteceu isso, uma coincidência incrível. (Revelações de Jorge Ileli ao pesquisador Paulo Roberto Ferreira, em 1988.) De Amei um Bicheiro a Viver de Morrer, todos os quatro longas-metragens de Ileli floresceram a partir de fatos que tiveram o primeiro impacto nas páginas dos jornais. O quinto, projetado em 1979 para entrar em filmagem no ano seguinte, enfatizaria ainda mais esta tendência: Aracelli, meu Amor (possivelmente título provisório) partiria do livro que José Louzeiro (1976) concebeu pesquisando no local dos crimes – Vitória, Espírito Santo – e escrevendo com risco de vida. A história ‘não podia’ ser contada, segundo o dogma das duas famílias que dividiam o poder estadual. O livro ‘não deveria’ ser editado – era a mensagem de dois emissários que visitaram o editor Ênio Silveira, da indomável Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, com uma proposta em dinheiro (o valor de um apartamento de sua escolha) para convencer o autor. Se publicado, ‘não poderia’ circular: o clima era de medo na noite do lançamento, levando o livreiro a passar os exemplares às mãos dos compradores em sacolas fechadas; naquela tarde, a obra fora proibida pelo ministro da Justiça, Armando Falcão. O suspense dessa história deriva da força da repressão sob os fatos, disse Ileli, em nossa primeira conversa sobre o projeto. Poucos dias antes havia assinado contrato com Louzeiro para levar Aracelli às telas, para decepção de outros interessados em realizar a proeza. Mas ninguém podia derrotar a proposta de Ileli: sua filmografia e seu passado de jornalista faziam dele o diretor ‘natural’ para a empreitada. O escritor e o cineasta seriam associados à produção e trabalhariam juntos no roteiro. Três anos após a impressão do livro, o conteúdo explosivo ultrapassara os limites entre a capa e a contracapa. Os acontecimentos criminais decorrentes da pressão pela impunidade, a proibição arbitrária da obra, a inclusão desta nos autos do processo como documento de valor inestimável, e, sobretudo, as reflexões que o caso produziu fatalmente levariam – a meu ver – ao nascimento de uma criação cinematográfica capaz de ir muito além dos dossiês do caso Aracelli. Em maio de 1973, em Vitória, a menina Aracelli, filha de uma boliviana que fazia tráfico de drogas, foi incumbida de levar um envelope a um prédio em construção em Vitória. (José Louzeiro verificou que o prédio estava permanentemente ‘em construção’ porque, por conta de membros da família Michelini, abrigava orgias movidas a drogas.) Aracelli foi estuprada, selvagemente seviciada e morta. Seu corpo só apareceu seis dias depois, irreconhecível. Quando o pai esteve no Instituto Médico Legal, com Radar, o cachorro da menina, este a descobriu pelo faro: uma pequena marca em um dedo do pé abriu caminho para a identificação. O inquérito policial só começou a andar um ano e meio depois. O vereador Clério Falcão, depois eleito deputado na trilha das investigações, foi vítima de um acidente de trânsito (esmagado contra uma parede por um carro). Dois suspeitos foram mortos na prisão. A crônica do caso Aracelli registra mais dez assassinatos. Louzeiro e a fotógrafa Ednalva Tavares, sua (então) companheira, estiveram frequentemente a um passo da morte no decurso das investigações. Mas nada se fez, em definitivo, para perturbar o sono dos matadores de Aracelli. A opressão encobre os fatos – disse o cineasta. O que vamos contar é uma história de arbitrariedades. De uma opressão global que favorece a uns, enquanto a outros atemoriza, intimida, silencia. Capítulo XI A Visão Crítica de Ileli José Carlos Monteiro Intelectual e culto, Ileli tinha experiência jornalística. E na crítica cultivara acuidade analítica e bom gosto estético, escrevendo na década de 1940 para A Cena Muda, Diretrizes e, a partir de 1951, A Cigarra. No Cineclube Carlitos, do qual fora um dos fundadores, ampliou e aprofundou sua reflexão sobre as transformações da sétima arte no pós-guerra. Com Moniz Vianna e Leon Eliachar, escreveu um dos números da revista Jornal do Cinema, publicação voltada com inteligência para a discussão dos problemas do nosso cinema. Mesmo tendo deixado a militância crítica, Ileli foi eleito em 1951 vice-presidente da Associação Brasileira de Cronistas Cinematográficos (ABCC), do Rio de Janeiro, na chapa de Décio Vieira Ottoni. A essa altura Ileli já sonhava com a experiência diretorial. Enquanto crítico, adotou estratégia dialética, que consistia em valorizar as formas de arte do cinema estrangeiro sem deixar de prestigiar o esforço brasileiro no sentido de um desenvolvimento industrial orgânico, em meio aos planos utópicos, aos esquemas inviáveis e aos aventureirismos que proliferavam em 1949. Para Ileli, o exercício crítico correspondia a um laboratório onde, através de escolhas de filmes, tendências e autores, elaborava as fórmulas de que se serviria quando passasse para trás das câmeras. Enquanto Moniz Vianna (Correio da Manhã), Hugo Barcelos (Diário de Notícias), Pedro Lima (O Jornal, O Cruzeiro), Salvyano Cavalcanti de Paiva (Cena Muda) e Edmundo Lys (O Globo), entre outros, se dedicavam exclusivamente à análise e às resenhas, Ileli (e também Jonald, de A Noite) alimentava a pretensão de dirigir filmes. É nesta perspectiva que deve ser examinada sua contribuição à atividade. No front da crítica, as fileiras estavam cerradas entre duas tendências: a dos críticos cultores da estética, da arte pela arte (e que por isso repelia o cinema brasileiro, sistematicamente acusado de primarismo e mau gosto) e a dos críticos que, embora exigentes, alimentavam a crença de evolução dos nossos filmes. Ileli se inscrevia nesta última tendência. Nos seus textos críticos e artigos se evidenciava a disposição de dialogar com a cultura de massa e a “alta cultura”. Infelizmente, a irregularidade de sua presença nas colunas de Diretrizes, A Cena Muda e A Cigarra não permitiu o aprofundamento de exegeses instigantes sobre os caminhos a serem seguidos para renovação do cinema brasileiro. No jornal esquerdista de Samuel Wainer (Diretrizes), Ileli compartilhava o espaço de cobertura dos lançamentos com o escritor Antonio Olinto, enquanto Manoel Jorge se encarregava de reportagens. Seus textos eram os mais estimulantes com respeito a uma ideia de cinematografia nacional. Na relação dos melhores de 1948, publicada em Diretrizes, Ileli mostra como funcionava seu termômetro crítico e sua constelação de valores. Entre os lançamentos brasileiros, o único considerado valioso foi Obrigado, Doutor (1948), no qual reconhecia a seriedade de Moacyr Fenelon às voltas com a precariedade dos meios materiais. No campo das estreias estrangeiras, Ileli não hesitou em colocar no topo do ranking Monsieur Verdoux, obra perturbadora para os admiradores da estética do Chaplin de Luzes da Cidade, Tempos Modernos e O Circo. A preferência pela macabra sátira chapliniana dá o tom noutras escolhas de Ileli, em 1948. O crítico apreciava, por exemplo, a atmosfera de O Idiota (L´idiot, de Georges Lampin, 1946), Grandes Esperanças (Great Expectations, David Lean, 1946), Sinfonia Pastoral (La Symphonie Pastorale, Jean Dellanoy, 1946) e Os Amores de Carmen (Carmen, Christian-Jaque, 1943). Mas também foi seduzido pelo lirismo do búlgaro Violino e Sonho (de Václav Krska) e do mexicano A Pérola (La Perla, de Emilio Fernández, 1946). E até relevou o academismo de O Eterno Marido (de Pierre Billon) e Monsieur Vincent, o Capelão das Galeras (Monsieur Vincent, Maurice Cloche, 1947), pela mensagem humanitária via pregação religiosa. Sem tomar essas escolhas como expressão rigorosa da visão estética do crítico, é relevante, porém, observar quanto havia nelas de sugestivo da inclinação do futuro cineasta pelo noir, pelo thriller, pelos climas mórbidos. Na mesma lista de melhores, por exemplo, Ileli incluiria A Sombra do Pavor (Le Corbeau, 1943) e Crime em Paris (Quai des Orfèvres, 1947), exemplares típicos do cáustico Henri-Georges Clouzot, valorizava os exasperantes Brutalidade (Brute Force, Jules Dassin, 1947) e Beijo da Morte (Kiss of Death, Henry Hathaway) e, na mesma linha, consignava sua admiração pelo semidocumentarismo policial de Sublime Devoção (Call Northside 777, Henry Hathaway, 1948) e Cidade Nua (Naked City, Jules Dassin, 1948). A despeito do fascínio pelo thriller social – fascínio esse que extrapolava fronteiras (como na inclusão de Trágica Inocência/Non Coupable, Henri Decoin, 1947) – , Ileli foi sensível à fantasia de Michael Powell e Emeric Pressburger em Neste Mundo e no Outro (A Matter of Life and Death, 1946), ao fatalismo do George Cukor em Fatalidade (A Double Life, 1947) e ao psicologismo de Raoul Walsh no western noir Sua Única Saída (Pursued, 1947). No panteão desse ano, entraria Viver em Paz (Vivere in Pace, 1946), de Luigi Zampa, pela sua inflexão pacifista. Embora ideologicamente atraído pelo ideário neorrealista, artisticamente pulsava em Ileli a paixão pelo dinamismo cinematográfico made in USA combinada com a morbidez de alguns autores franceses (Clouzot à frente). Essa sintonia de Ileli com o thriller, com um cinema de fisionomia liberal e de construção narrativa sólida, permaneceria até o opus finale do cineasta (Viver de Morrer). E flexionaria decisivamente sua segunda realização diretorial, Mulheres e Milhões, na qual são visíveis as ressonâncias do Jules Dassin de Rififi e do John Huston de O Segredo das Joias (The Asphalt Jungle). Em fins da década de 1950, mesmo no recesso da criação artística e já distanciado da crítica semanal, Ileli continuou cinéfilo. Como integrante do Conselho dos Cinco da Tribuna da Imprensa (ao lado de José Lino Grünewald, Alberto Shatovsky, Carlos Perez e Ely Azeredo), suas opiniões gráficas evidenciavam um olhar exigente e bem-informado, fiel às predileções culturais e à escala de valores cultivada na década de 1940. A prospecção dos pontos de vista de Ileli à época pode revelar a integridade com que julgava filmes sem parti pris político ou corporativo. Quando do lançamento de Glória Feita de Sangue (Paths of Glory), por exemplo, Ileli atribuiu as maiores cotações ao filme de Stanley Kubrick, ao grego A Mulher de Negro, de Michael Cacoyannis, e ao sueco Sorrisos de uma Noite de Verão, de Ingmar Bergman. E com a coerência que em 1949 o levou a considerar E o Mundo se Diverte (Watson Macedo, 1947) superior à hollywoodiana Vida à Larga (Living in a Big Way, Gregory La Cava, 1947) e a defender o controverso Terra Violenta (Eddie Bernoudy, 1950), Ileli não teve nenhum constrangimento em desancar E o Espetáculo Continua, chanchada da Atlântida. A relação do cineasta bissexto Jorge Ileli com a atividade crítica ainda está por investigar. Seja como for, acreditamos que essas observações assinalam a fecundidade de uma pesquisa nesse sentido. Afinal, em poucos autores brasileiros de sua época foi tão evidente a interação entre a visão do crítico e a criação diretorial. Capítulo XII Crítica de Terra Violenta Em 1949, três anos antes de seu primeiro filme, Amei um Bicheiro, produção Atlântida, Jorge Ileli fez a crítica de um dos mais ambiciosos empreendimentos dessa empresa, Terra Violenta, dirigido pelo norte-americano Ed Bernoudy, que fora um dos assistentes do mestre William Wyler. Terra Violenta – Direção: Ed Bernoudy. Baseado em Terras do Sem Fim, de Jorge Amado. Produção Atlântida, RJ, 1948-49. Terra Violenta não tem unidade interna. Esta é a principal restrição ao filme que, afinal de contas, não é tão mau assim. Apesar de muitos defeitos, apresenta inúmeras qualidades. Há senso de imagem e direção. Da análise fria e rigorosa do seu conteúdo, concluímos que o filme não tem aquela força interior, dominante, que caracteriza os livros de Jorge Amado. Se levarmos em conta, como principal aspecto, o livro Terras do Sem Fim, chegamos à conclusão de que o adaptador falhou lamentavelmente, pois não colocou no plano do cinema aquele conteúdo humano, imenso e profundo, que existe na obra de Jorge Amado. Limitou-se a narrar superficialmente uma história, abordando, paralelamente, o drama da terra e um caso de amor. Nesse particular, tudo foi bem dosado, porque os dois assuntos não se perdem um do outro, entrosando-se perfeitamente. O que falta é profundidade temática e emocional. É evidente que o filme ficou aquém do livro. Mas o filme deve ser criticado independentemente do romance do qual foi extraído. Não há subserviência do cinema a qualquer outra arte. Ele existe por si mesmo e um filme muito bom pode ser inspirado num livro medíocre e vice-versa. Considerando esse aspecto, não concordamos com os que o atacam. Como uma simples obra cinematográfica, Terra Violenta está aceitável. Sobre o tão discutido Eddie Bernoudy*, achamos que ele falhou como adaptador e acertou como diretor. Os defeitos, geralmente, são derivados dos erros da adaptação. Não há unidade ligando o conteúdo, embora formalmente, apesar do ritmo contraponteado, a película esteja mais ou menos coesa. Falta força intrínseca ao drama que é apresentado. Os problemas da terra e do cacau não têm profundidade. A coisa é tocada de leve, como alguém que teme penetrar num beco sem saída. Mas tudo isso é oriundo de uma roteirização deficiente. É claro que a direção de cena não redime Bernoudy dos erros da adaptação, pois um bom diretor tem a obrigação de corrigir os deslizes do roteiro. E quando o roteirista e o diretor são a mesma pessoa, o caso é ainda mais grave. Contudo, a direção está boa. Na condução dos atores, no senso da imagem e na movimentação da câmera. O roteiro, como já disse, reduz bastante o mérito diretorial de Bernoudy. Chegamos ao ponto nevrálgico do assunto: podese culpar Bernoudy por causa disso? Por mais incrível que pareça, não! Ele sabia que, sozinho, não poderia dar conta do recado, principalmente sem adaptador e diretor de diálogos. E chamou Antonio Olinto para estas duas funções. A Atlântida não concordou e um assunto profundamente regional teve mesmo que ser adaptado por um estrangeiro, como também os diálogos, dirigidos por quem não entende a língua. Não queremos justificar Bernoudy, absolutamente! Apenas lamentar essa atitude, que impediu Antonio Olinto – o homem que faltou a Bernoudy, na sua própria opinião. Não temos dúvida de que se o Olinto tomasse parte na adaptação e na direção dos diálogos, o resultado seria bem diferente. Porque, conhecendo toda a obra de Jorge Amado e sendo possuidor de um senso poético que en-contra beleza nas coisas simples e corriqueiras da vida, conhecendo, profundamente, o problema da terra e o seu fundo econômico, seria fácil a ele impregnar o roteiro de um sentido social mais forte, de um conteúdo humano mais elevado, de uma força interior pujante, justamente o que faltou ao filme Terra Violenta. A interpretação está boa. Avultam os nomes de Graça Mello e Heloísa Helena. Graça Mello se integrou perfeitamente ao papel. O seu desempenho tem unidade interior. Heloísa Helena, muito bem, apesar das roupas. Anselmo Duarte, boa figura para cinema. Celso Guimarães, regular. Maria Fernanda tem possibilidades. Labanca, fora do papel. Sady Cabral não tem grande chance. Em parte de valor: Modesto de Souza, Mário Lago, David Conde e Ruth de Souza. Pontas muito bem defendidas, com naturalidade e domínio dos personagens. Agnaldo Camargo e Bahia, duas grandes máscaras. Na análise dialética de Terra Violenta devemos convir que o filme representa um avanço, na conquista da forma. (Diretrizes, 24-5-1949) (*) Eddie Bernoudy, muito ativo em Hollywood como assistente de direção, participou de equipes de Alfred Hitchcock (Correspondente Estrangeiro), William Wyler (Fogo de Outono/ Dodsworth) e outros cineastas. Estreou como diretor em Terra Violenta, mas não se manteve ligado ao cinema brasileiro (E.A.). Capítulo XIII Crítica de E o Mundo se Diverte Jorge Ileli ainda aguardava a chance de dirigir seu primeiro filme quando fez a crítica do musical E o Mundo se Diverte, 1949, dirigido por Watson Macedo, que assinou algumas das produções mais populares da Atlântida. E o Mundo se Diverte – Direção de Watson Macedo, Atlântida, RJ, 1949. Watson Macedo tem noção de cinema. Começou discreto em Segura esta Mulher, melhorou muito em Este Mundo é um Pandeiro, onde encontrou a fórmula para fazer o filme musical brasileiro, aperfeiçoando-a, agora, nesse agradável espetáculo que é E o Mundo se Diverte. O filme está bem-feito, os números musicais bem-imaginados, há graça e beleza, a história dá margem a adequadas intercalações musicais e existe, realmente, uma direção. Por causa dessas qualidades de agrado popular, E o Mundo se Diverte constitui um grave perigo para seu diretor: a estandardização. Nesse filme já se nota a preocupação de explorar soluções de sucesso de Este Mundo é um Pandeiro. E se não houver, futuramente, o cuidado de evitar a repetição e procurar a originalidade, estacionaremos no fil me sofisticado, feito ao sabor popular, viciando a plateia comum, apresentando alguns números interessantes e muito pouca coisa de novo. A técnica é satisfatória. Muito boa a fotografia (a iluminação das cenas interiores melhorou sensivelmente), movimentos de câmera são adequados e há uma coordenação bem-feita. Os diálogos cômicos de Max Nunes causam gostosas gargalhadas. A coreografia, feita por gente nova (os rostos cansados e manjados das coristas foram substituídos por faces novas, cheias de vida), empresta grande beleza ao filme, destacando-se o número de Horacina Corrêa, cantando uma triste e cadenciada melodia de Luiz Soberano, Aves sem Ninho, enquanto as bailarinas e um grupo de negros enfeitam o fundo, em graciosos movimentos, dando à cena um aspecto plástico de bom cinema. Há outros números interessantes que valorizam o conjunto: a dança espanhola seguida de boa caricatura; a cena musical de Eliana; o quadro de Luiz Gonzaga, com as crianças brincando num parque, que resulta em bom efeito pictórico. Oscarito e Grande Otelo são dois talentos histriônicos. A sua capacidade humorística é ilimitada. Em E o Mundo se Diverte estão bem aproveitados, mas eles precisam participar de um empreendimento de maior vulto. Conseguem manter a plateia em clima de constante hilaridade. Modesto de Souza acompanhaos de perto. Eliana é, realmente, uma boa revelação. Bonita, com um olhar expressivo, fisionomia maleável e grande máscara para cinema. Tem algumas falhas de inflexão. Com um curso de arte dramática poderá se transformar numa ótima atriz. Talento não lhe falta. Ainda há muita coisa ruim em E o Mundo se Diverte, que precisa ser sanada. E acreditamos que o será em futuro próximo, levando em consideração a evolução de Watson Macedo. Como divertimento, entretanto, E o Mundo se Diverte é um espetáculo. Se não cair na rotina, repetindo-se, estandardizando-se, Watson Macedo poderá ser um grande diretor de filmes musicados. (Diretrizes, 24-2-1949) Premiografia • Amei um Bicheiro No Primeiro Festival Cinematográfico do Distrito Federal (então Rio de Janeiro): Melhor filme. Melhor direção: Jorge Ileli e Paulo Vanderley. Melhor ator: José Lewgoy. Melhor fotografia: Amleto Daissè. O Jornal do Cinema concedeu o Troféu Índio a Jorge Ileli, como o melhor roteirista. Na entrega dos prêmios Governador do Estado (São Paulo), Jorge Ileli recebeu Menção Honrosa por seus trabalhos em Amei um Bicheiro. • Mulheres e Milhões Associação Brasileira de Cronistas Cinematográficos (ABCC), Rio de Janeiro: Melhor filme. Melhor direção: Jorge Ileli. Melhor atriz: Glauce Rocha. Melhor ator coadjuvante: Mário Benvenuti. Melhor música: Enrico Simonetti. Troféu Saci, do jornal O Estado de S. Paulo: Melhor filme. Melhor direção: Jorge Ileli. Melhor ator: José Mauro de Vasconcelos. Melhor atriz coadjuvante: Glauce Rocha. Melhor fotografia: Rodolfo Icsey. Melhor música: Enrico Simonetti. Melhor cenografia: Peter Overbeck. Troféu Cinelândia, promoção da revista Cinelândia e do jornal O Globo (Rio): Melhor filme. Melhor direção: Jorge Ileli. Melhor atriz: Norma Bengell. Prêmio Governador do Estado (São Paulo): Melhor direção: Jorge Ileli. Melhor produção: Gilberto Perrone. Melhor argumento: Jorge Dória. Melhor atriz: Norma Bengell. Melhor atriz coadjuvante: Glauce Rocha. Melhor ator coadjuvante: Mário Benvenuti. Melhor fotografia: Rodolfo Icsey. Prêmio Municipal de Cinema (São Paulo): Melhor diretor: Jorge Ileli. Troféu Cinelândia, promoção da revista Cinelândia e do jornal O Globo (Rio): Melhor filme. Melhor diretor: Jorge Ileli. • Carmen Miranda Prêmios do Instituto Nacional do Cinema para curta-metragem: Melhor direção: Jorge Ileli. Prêmio INC e troféu Coruja de Ouro. • Viver de Morrer Prêmios do Instituto Nacional do Cinema (INC) Melhor roteirista: Prêmio INC e troféu Coruja de Ouro. Prêmio Adicional de Qualidade – Eleito um dos 12 longas de melhor padrão técnico, artístico e cultural. Jorge Ileli foi um dos cinco selecionados pela Comissão Especial de Seleção de Filmes de Lon-ga-metragem, submetidos ao Júri Nacional de Cinema como candidatos ao Prêmio INC e troféu Coruja de Ouro de Melhor Diretor. Filmografia Longa-metragem 1972 • Viver de Morrer Direção, roteiro e história original: Jorge Ileli. Fotografia e câmera (Eastmancolor): Dib Lutfi. Música: Albinoni. Montagem: Maria Guadalupe. Cenografia, figurino e consultoria de cores: Carmélio Cruz. Som: José Tavares. Assistentes de direção: Flávio Portho e Jorge Guimarães. Produção executiva: Julio Heilbron. Produção: Entrefilmes/ Metro-Goldwyn-Mayer/Cinesul, Rio de Janeiro. Elenco – Odete Lara, Mário Benvenuti, Carlo Mossy, Amiris Veronese, Flávio Portho, Sônia Clara, Dieter Burgel, Jorge Dória, Fregolente, Myriam Pérsia, Edu da Gaita, Paulo Padilha, Labanca, Iara Cortes, Angelito Melo, Alberico Bruno. Lançamento: junho de 1972, Rio de Janeiro. 1963 (data da produção) • O Mundo em que Getúlio Viveu Direção e roteiro: Jorge Ileli. Levantamento histórico e coautoria do roteiro: Orlando Caramuru. Texto: Caramuru e Ileli. Montagem: Maria Guadalupe. Narradores: Armando Bógus e Roberto Faissal. Trilha musical: Salatiel Coelho. Assistente: Valério Andrade. Produção: Jorge Ileli, Rio de Janeiro. Documentário em preto e branco. Lançamento: 1976, Rio de Janeiro. 1963 • Mulheres e Milhões Direção: Jorge Ileli. Roteiro: Flávio Tambellini e Ileli. História original: Jorge Dória. Diálogos adicionais: Nelson Rodrigues. Fotografia (preto e branco): Rodolfo Icsey. Música: Enrico Simonetti. Montagem: Maria Guadalupe. Cenografia: Peter Overbeck. Decorações: Georges Walford. Som: Ernst Hack, Constantino Warnowsky. Coreografia: Yanka Rudzka. Diretor de produção: Camilo Sampaio. Assistente de direção: Milton Amaral. Produtor: Gilberto Perrone. Produção: Inbracine, Rio. Elenco – Luigi Picchi, Norma Bengell, Odete Lara, Jece Valadão, Aurélio Teixeira, José Mauro de Vasconcelos, Mário Benvenuti, Glauce Rocha, Lyris Castellani, André Dobroy, Norma Blum, Beyla Genauer, Lueli Figueiró, Sérgio Warnowsky, Roberto Duval, Monah Delacy, Daniel Filho, Marlene França, Myriam Rony, Jean Laffont, Roberto Maia, Benito Rodrigues, Mário Yoshinaga, Evelyne Barré e (em números musicais) Império Montenegro e Glória. Lançamento: julho de 1961, Rio de Janeiro. 1953 • Amei um Bicheiro Direção em colaboração com Paulo Vanderley. Adaptação e roteiro: Jorge Ileli. História origi nal: Jorge Dória. Fotografia (preto e branco): Amleto Daissè. Música: Leo Peracchi. Montagem: Waldemar Noya. Cenografia: Cajado Filho. Som: Aluísio Viana. Diretor de produção: Décio Tinoco. Assistente de direção: Carlos Manga. Assistente de fotografia: Herbert Richers. Produção: Atlântida, Rio de Janeiro. Elenco – Cyl Farney, Eliana, Grande Otelo, José Lewgoy, Josette Bertal, Wilson Grey, Aurélio Teixeira, Jece Valadão, Wilson Viana, Jesus Ruas, João Péricles, José Policena, Mário Japa, Renato Murce, Norma Fleming. Lançamento: abril de 1953, Rio de Janeiro. Longa-metragem – Produtor 1970 • Juliana do Amor Perdido. Direção: Sérgio Ricardo. Roteiro original: Sérgio Ricardo e Roberto Santos. Fotografia e câmera (cores): Dib Lutfi. Música: Sérgio Ricardo e Luiz Roberto Oliveira. Montagem: Sylvio Renoldi. Direção de arte: Carmélio Cruz. Produtor: Jorge Ileli. Elenco – Maria do Rosário, Francisco Di Franco, Macedo Neto, Ítala Nandi, Antonio Pitanga, Líbero Ripoli, Roberto Ferreira, Reinúncio Napoleão, Walderez de Barros e Flávio Portho. Lançamento: 1970, Rio de Janeiro. 1953 • Carnaval em Caxias Direção: Paulo Vanderley. Argumento e roteiro: Ileli, Vanderley, Leon Eliachar e Alex Viany. Fotografia (preto e branco): Ferenc Fekete e Amleto Daissè. Montagem: Rafael Justo Valverde. Som: Luiz Braga Júnior. Assistente de direção: Nelson Pereira dos Santos. Produtor: Jorge Ileli. Produção: Flama/Atlântida. Elenco – Dóris Monteiro, José Lewgoy, Modesto de Souza, Josette Bertal, Consuelo Leandro, Ariston, Iracema Vitória, Wilson Grey, Aurélio Teixeira, Jece Valadão, Nelson Dantas, Jesus Dias, Mário Japa, Benito Rodrigues, José Melo e (em números musicais) Linda Batista, Dircinha Batista, Nora Ney, Jorge Goulart, Carmélia Alves, Nelson Gonçalves, Bené Nunes e Valdo César. Lançamento: 1954, Rio de Janeiro. Curta-metragem 1970 • Francisco Alves (Uma Cruz na Estrada) Direção e roteiro: Jorge Ileli. Montagem: Maria Guadalupe. Produção: Instituto Nacional do Cinema (INC). Rio de Janeiro. 1970 • O Brasil na Guerra: a FEB contra o Nazifascismo) Direção e texto: Jorge Ileli. Montagem (a partir de material preexistente em preto e branco): Maria Guadalupe. Produção: Antonio Moniz Vianna. Rio de Janeiro. 1969 • Carmen Miranda Direção e texto: Jorge Ileli. Fotografia (preto e branco) de uma sequência: Hélio Silva. O filme foi montado a partir de material preexistente. Montagem: Maria Guadalupe. Produção: Astolfo Araújo. Rio de Janeiro. Cinejornais Em 1953, Jorge Ileli realizou para cinejornais da Cinegráfica São Luiz as reportagens Batatais, um Ídolo do Passado, Cidade Maravilhosa, Cheia de Buracos Mil, O Outro Lado de Copacabana, Vida de Cachorro, Vidas em Jogo, Zé Marmita. Situação do Acervo Ileli O material remanescente da produção audiovisual de Jorge Ileli – o que se encontrava em seu depósito particular (São Paulo) – foi entregue aos cuidados da Cinemateca Brasileira (São Paulo) pela editora Maria Guadalupe Landini, sua colaboradora e amiga, em 8 de agosto de 2001. A seguir transcrevemos o relato da Cinemateca (29 de maio de 2010) sobre a situação do acervo. • Amei um Bicheiro Detentor dos direitos patrimoniais: Cinemateca Brasileira. Embora não existam mais os negativos originais, o filme está preservado, pois a Cinemateca fez cópia sonora em 35 mm – que é a atual matriz do filme, e foi recentemente telecinada em suporte digital profissional. Tem cópia de difusão. • Mulheres e Milhões Detentora dos direitos patrimoniais: Nancy Ileli. Negativos originais de imagem e som muito deteriorados e incompletos. Da imagem faltam os rolos 1 e 3. Do som, do qual faltam os rolos 1 e 5, a Cinemateca fez uma cópia. Também fez um contratipo combinado a partir de uma cópia 35 mm já em processo de deterioração. Há uma cópia 35 mm incompleta (faltam os rolos 1 e 3), mas aparentemente em bom estado. • O Mundo em que Getúlio Viveu Detentora dos direitos patrimoniais: Nancy Ileli. Há no acervo uma cópia muito riscada que é considerada a matriz do filme. A matriz digital tirada deste material apresenta muitos trechos fora de quadro, talvez devido ao encolhimento da película. Há outras três cópias em 35 mm completas, mas bastante gastas. Não localizados: negativos originais de imagem e som. • Viver de Morrer Detentora dos direitos patrimoniais: Nancy Ileli 990 metros de negativo de imagem em 35 mm, cor, não montado. 860 metros de copião montado em 35 mm, cor e branco e preto, montado. 4 mil metros de sobras de negativo, cor. Não localizados: negativos originais de imagem e som. • O Brasil na Guerra: a FEB contra o Nazifascismo (Curta-metragem) DDP: Centro Técnico do Audiovisual – Ministério da Cultura (CTAv) Negativos originais de imagem e som completos, mas bastante deteriorados. Das quatro cópias em 35mm, apenas uma está em melhor estado e é considerada a matriz do filme. • Carmen Miranda (Curta) DDP: Centro Técnico do Audiovisual – Ministério da Cultura (CTAv). O negativo original de som está em estado razoável. O rolo 2 do negativo de imagem também. Mas o rolo 1 está completamente deteriorado. Há um contratipo combinado em bom estado, mas resta verificar se está completo. Várias cópias usadas em 35 mm. • Uma Cruz na Estrada (Curta) DDP: Centro Técnico do Audiovisual – Ministério da Cultura (CTAv) Dois másteres combinados em 35 mm. Quatro cópias em 35 mm, das quais duas em bom estado. Não localizados: negativos originais de imagem e som. • Carnaval em Caxias (Longa-metragem produzido por Jorge Ileli) Desaparecido. • Juliana do Amor Perdido (Longa-metragem produzido por Jorge Ileli) Do negativo original: dois rolos de imagem e três de som estão comprometidos pela deterioração. A Cinemateca Brasileira fez um máster de imagem e uma cópia sonora, ambos em 35 mm, a partir dos negativos. O acervo também inclui duas cópias em 35 mm (destas, uma em estado razoável). Cinejornais Não há nenhuma imagem das produções dirigidas por Jorge Ileli para cinejornais: Batatais, um Ídolo do Passado; Cidade Maravilhosa, Cheia de Buracos Mil; O Outro Lado de Copacabana; Vida de Cachorro; Vidas em Jogo; Zé Marmita. Réquiem pelas Imagens Minha convivência com Jorge Ileli foi especialmente ampla na década de 1970, quando ele concebeu, realizou e fez o lançamento de Viver de Morrer, obra da qual só restam fragmentos. Tragédia igual atingiu Barro Humano, • o grande clássico de nosso cinema silencioso, roteirizado por Paulo Vanderley (coautor, com Ileli, de Amei um Bicheiro) e Adhemar Gonzaga. De outras joias, como Favela dos meus Amores, • o favorito de Humberto Mauro, não sobraram nem fragmentos. Mais do que nunca – quando se noticia as perdas do acervo fílmico de Ileli – é preciso lembrar o drama permanente do acervo fílmico brasileiro. Sem a documentação audiovisual do passado teria sido impossível a criação do documentário histórico O Mundo em que Getúlio Viveu. Os cálculos mais otimistas indicam que a memória nacional perdeu cerca de 50% de seu lastro cinematográfico, computando-se não apenas o cinema de ficção, mas também os cinejornais e documentários que constituíam grandes safras anuais até a década de 1950. O que foi possível localizar e conservar do cinema silencioso não passa de interessantíssima amostragem, insuficiente para que se possa escrever uma história fidedigna do que foi filmado entre 1897 e 1898 e o início da década de 1930. Jurandyr Noronha, Caio Scheiby e outros pesquisadores viveram uma epopeia na exploração desse continente submerso, mas a fragilidade química das antigas películas de 35mm conspirava contra sua abnegação. Os filmes produzidos até meados do século 20 tinham uma base de nitrato de celulose, material altamente inflamável e de instabilidade crônica. Sua degenerescência é um processo (em condições normais) lentíssimo, mas invencível. Somente nos primeiros anos de 1950 a indústria adotou uma película de segurança, com base de acetato de celulose, para a bitola de 35 mm. As películas de 8 mm e de 16 mm sempre foram fabricadas com esse tipo de base, que apresentava alguns inconvenientes operacionais. O acetato acabou vencendo a guerra em todas as frentes: se riscarmos um fósforo sob o safety film, ele se reduzirá a cinzas, mas sem chamas. Vale dizer: sem os incêndios que provocaram tragédias desde os primeiros anos do cinematógrafo. À época em que Jorge Ileli concluía O Mundo em que Getúlio Viveu (1963), montado justamente a partir de imagens de arquivo – filmes sobreviventes – pessoas saltavam para a morte no asfalto para escapar das chamas no Edifício Astória, na Cinelândia carioca. Tudo indica que não haverá mais incêndios cinematográficos como o que começou ali, onde o produtor Herbert Richers mantinha um depósito, porque o acetato venceu a batalha e as películas evoluíram para uma base de triacetato. Mas os filmes de nitrato, teoricamente salvos, isto é, recolhidos em depósitos climatizados, com temperatura e umidade sob controle, sempre sofrem prejuízos pela vulnerabilidade de sua base. A salvaguarda seria a transferência para a película de segurança – operação que, na larga escala desejável, está muito acima da disponibilidade financeira das cinematecas. O futuro será todo em preto e branco se não protegermos com especial carinho o cinema cromático. Os filmes perdem a cor ao longo dos anos. E se o dano atinge todas as cópias, nenhuma restauração é possível. Filmes rodados e copiados em películas de segurança também pedem cuidados especiais para sobrevivência. Correm risco de decomposição se permanecerem expostos ao ciclo das temperaturas e umidades ambientais. E a digitalização? É óbvio que os arquivos digitais só podem guardar bem, para apreciação futura, imagens salvas em sua integridade. No Brasil, os incêndios se rivalizaram com a deterioração química em matéria de destruição. O fogo causou perdas graves em sete ocasiões. O incêndio da Botelho Film (Rio), dos irmãos Alberto e Paulino Botelho, consumiu uma das mais ricas coleções de documentários e cinejornais. O da Rossi Filme (São Paulo), de Gilberto Rossi e José Medina, destruiu quase todas as obras deste cineasta, o mais inventivo dos pioneiros da produção paulista, com exceção do curta Exemplo Regenerador (1919) e de Fragmentos da Vida (1929) – ambos antológicos. Outro filme curto de Medina, O Canto da Raça, exaltação de São Paulo inspirada em poema de Cassiano Ricardo, foi proibido pelos censores do Estado Novo, que incineraram até o negativo. A Cinemateca Brasileira foi vítima de dois incêndios, nos anos 1950 e 1960, perdendo grande parte de seu acervo. A Brasil Vita Filme (Rio), criada pela produtora e atriz Carmen Santos, perdeu nas chamas, entre outros, o maior sucesso de público de Humberto Mauro, Favela dos meus Amores (1935), Cidade-Mulher (1936), também de Mauro, e Inconfidência Mineira (do qual só restam fragmentos), dirigido pela própria Carmen Santos (1939 a 1943). O incêndio da Sonofilmes (Rio) destruiu antes do lançamento a primeira versão de Asas do Brasil – sobre o Correio Aéreo Nacional – escrita e dirigida pelo ator Raul Roulien, em 1940. A segunda versão, dirigida por Moacyr Fenelon (1947), não teve destino diferente: perdeu-se no incêndio que destruiu o primeiro e improvisado estúdio da Atlântida, juntamente com diversos filmes indispensáveis à compreensão do cinema brasileiro dos anos 1940. Índice No Passado Está a História do Futuro – Alberto Goldman 5 Coleção Aplauso – Hubert Alquéres 7 Introdução – Ely Azeredo 11 Cinema na Escola da Crítica 21 Baluarte de um Novo Cinema 31 Com a Câmera na Mão 35 Na Visão de Sternheim 39 Dossiê Amei um Bicheiro 43 Dossiê Mulheres e Milhões 61 Dossiê Viver de Morrer 75 Dossiê O Mundo em que Getúlio Viveu 95 Dossiê Cinejornais 139 De JK a Aracelli, meu Amor 143 A Visão Crítica de Ileli 147 Crítica de Terra Violenta 153 Crítica de E o Mundo se Diverte 157 Premiografia 161 Filmografia 164 Situação do Acervo Ileli 169 Réquiem pelas Imagens 173 Crédito das Fotografias Coleção Nancy Ileli 20, 77, 142 As demais fotografias pertencem ao acervo de Jorge Ileli A despeito dos esforços de pesquisa empreendidos pela Editora para identificar a autoria das fotos expostas nesta obra, parte delas não é de autoria conhecida de seus organizadores. Agradecemos o envio ou comunicação de toda informação relativa à autoria e/ou a outros dados que porventura estejam incompletos, para que sejam devidamente creditados. Coleção Aplauso Série Cinema Brasil Alain Fresnot – Um Cineasta sem Alma Alain Fresnot Agostinho Martins Pereira – Um Idealista Máximo Barro Alfredo Sternheim – Um Insólito Destino Alfredo Sternheim Ana Carolina – Ana Carolina Teixeira Soares – Cineasta Brasileira Evaldo Morcazel O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias Roteiro de Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert e Cao Hamburger Anselmo Duarte – O Homem da Palma de Ouro Luiz Carlos Merten Antes Que o Mundo Acabe Roteiro de Ana Luiza Azevedo Antonio Carlos da Fontoura – Espelho da Alma Rodrigo Murat Ary Fernandes – Sua Fascinante História Antônio Leão da Silva Neto O Bandido da Luz Vermelha Roteiro de Rogério Sganzerla Batismo de Sangue Roteiro de Dani Patarra e Helvécio Ratton Bens Confiscados Roteiro comentado pelos seus autores Daniel Chaia e Carlos Reichenbach Braz Chediak – Fragmentos de uma Vida Sérgio Rodrigo Reis Cabra-Cega Roteiro de Di Moretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo Kauffman O Caçador de Diamantes Roteiro de Vittorio Capellaro, comentado por Máximo Barro Carlos Coimbra – Um Homem Raro Luiz Carlos Merten Carlos Reichenbach – O Cinema Como Razão de Viver Marcelo Lyra A Cartomante Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis Casa de Meninas Romance original e roteiro de Inácio Araújo O Caso dos Irmãos Naves Roteiro de Jean-Claude Bernardet e Luis Sérgio Person O Céu de Suely Roteiro de Karim Aïnouz, Felipe Bragança e Maurício Zacharias Chega de Saudade Roteiro de Luiz Bolognesi Cidade dos Homens Roteiro de Elena Soárez Como Fazer um Filme de Amor Roteiro escrito e comentado por Luiz Moura e José Roberto Torero O Contador de Histórias Roteiro de Luiz Villaça, Mariana Veríssimo, Maurício Arruda e José Roberto Torero Críticas de B.J. Duarte – Paixão, Polêmica e Generosidade Luiz Antonio Souza Lima de Macedo Críticas de Edmar Pereira – Razão e Sensibilidade Org. Luiz Carlos Merten Críticas de Inácio Araújo – Cinema de Boca em Boca: Escritos Sobre Cinema Juliano Tosi Críticas de Jairo Ferreira – Críticas de invenção: Os Anos do São Paulo Shimbun Org. Alessandro Gamo Críticas de Luiz Geraldo de Miranda Leão – Analisando Cinema: Críticas de LG Org. Aurora Miranda Leão Críticas de Ruben Biáfora – A Coragem de Ser Org. Carlos M. Motta e José Júlio Spiewak De Passagem Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias Desmundo Roteiro de Alain Fresnot, Anna Muylaert e Sabina Anzuategui Djalma Limongi Batista – Livre Pensador Marcel Nadale Dogma Feijoada: O Cinema Negro Brasileiro Jeferson De Dois Córregos Roteiro de Carlos Reichenbach A Dona da História Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho Os 12 Trabalhos Roteiro de Cláudio Yosida e Ricardo Elias É Proibido Fumar Roteiro de Anna Muylaert Estômago Roteiro de Lusa Silvestre, Marcos Jorge e Cláudia da Natividade Feliz Ano Velho Roteiro de Roberto Gervitz Feliz Natal Roteiro de Selton Mello e Marcelo Vindicatto Fernando Meirelles – Biografia Prematura Maria do Rosário Caetano Fim da Linha Roteiro de Gustavo Steinberg e Guilherme Werneck; Storyboards de Fábio Moon e Gabriel Bá Fome de Bola – Cinema e Futebol no Brasil Luiz Zanin Oricchio Francisco Ramalho Jr. – Éramos Apenas Paulistas Celso Sabadin Geraldo Moraes – O Cineasta do Interior Klecius Henrique Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta Cinéfilo Luiz Zanin Oricchio Helvécio Ratton – O Cinema Além das Montanhas Pablo Villaça O Homem que Virou Suco Roteiro de João Batista de Andrade, organização de Ariane Abdallah e Newton Cannito Ivan Cardoso – O Mestre do Terrir Remier Jeremias Moreira – O Cinema como Ofício Celso Sabadin João Batista de Andrade – Alguma Solidão e Muitas Histórias Maria do Rosário Caetano Jogo Subterrâneo Roteiro de Roberto Gervitz Jorge Bodanzky – O Homem com a Câmera Carlos Alberto Mattos José Antonio Garcia – Em Busca da Alma Feminina Marcel Nadale José Carlos Burle – Drama na Chanchada Máximo Barro Leila Diniz Roteiro de Luiz Carlos Lacerda Liberdade de Imprensa – O Cinema de Intervenção Renata Fortes e João Batista de Andrade Luiz Carlos Lacerda – Prazer & Cinema Alfredo Sternheim Maurice Capovilla – A Imagem Crítica Carlos Alberto Mattos Mauro Alice – Um Operário do Filme Sheila Schvarzman Máximo Barro – Talento e Altruísmo Alfredo Sternheim Miguel Borges – Um Lobisomem Sai da Sombra Antônio Leão da Silva Neto Não por Acaso Roteiro de Philippe Barcinski, Fabiana Werneck Barcinski e Eugênio Puppo Narradores de Javé Roteiro de Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu Olhos Azuis Argumento de José Joffily e Jorge Duran Roteiro de Jorge Duran e Melanie Dimantas Onde Andará Dulce Veiga Roteiro de Guilherme de Almeida Prado Orlando Senna – O Homem da Montanha Hermes Leal Ozualdo Candeias – Pedras e Sonhos no Cineboca Moura Reis Pedro Jorge de Castro – O Calor da Tela Rogério Menezes Quanto Vale ou É por Quilo Roteiro de Eduardo Benaim, Newton Cannito e Sergio Bianchi Radiografia de um Filme: São Paulo Sociedade Anônima Ninho Moraes Ricardo Pinto e Silva – Rir ou Chorar Rodrigo Capella Roberto Gervitz – Brincando de Deus Evaldo Mocarzel Rodolfo Nanni – Um Realizador Persistente Neusa Barbosa Salve Geral Roteiro de Sergio Rezende e Patrícia Andrade O Signo da Cidade Roteiro de Bruna Lombardi Ugo Giorgetti – O Sonho Intacto Rosane Pavam Viva-Voz Roteiro de Márcio Alemão Vladimir Carvalho – Pedras na Lua e Pelejas no Planalto Carlos Alberto Mattos Vlado – 30 Anos Depois Roteiro de João Batista de Andrade Zuzu Angel Roteiro de Marcos Bernstein e Sergio Rezende Série Cinema Bastidores – Um Outro Lado do Cinema Elaine Guerini Série Ciência & Tecnologia Cinema Digital – Um Novo Começo? Luiz Gonzaga Assis de Luca A Hora do Cinema Digital – Democratização e Globalização do Audiovisual Luiz Gonzaga Assis De Luca Série Crônicas Crônicas de Maria Lúcia Dahl – O Quebra-cabeças Maria Lúcia Dahl Série Dança Luis Arrieta – Poeta do Movimento Roberto Pereira Rodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo – Dança Universal Sérgio Rodrigo Reis Série Música Maestro Diogo Pacheco – Um Maestro para Todos Alfredo Sternheim Rogério Duprat – Ecletismo Musical Máximo Barro Sérgio Ricardo – Canto Vadio Eliana Pace Wagner Tiso – Som, Imagem, Ação Beatriz Coelho Silva Série Teatro Brasil Alcides Nogueira – Alma de Cetim Tuna Dwek Antenor Pimenta – Circo e Poesia Danielle Pimenta Bivar – O Explorador de Sensações Peregrinas Maria Lucia Dahl A Carroça dos Sonhos e os Últimos Saltimbancos Roberto Nogueira Cia de Teatro Os Satyros – Um Palco Visceral Alberto Guzik Críticas de Clóvis Garcia – A Crítica Como Oficio Org. Carmelinda Guimarães Críticas de Jefferson Del Rios – Volume I – Crítica Teatral Org. Jefferson Del Rios Críticas de Jefferson Del Rios – Volume II – Crítica Teatral Org. Jefferson Del Rios Críticas de Maria Lucia Candeias – Duas Tábuas e Uma Paixão Org. José Simões de Almeida Júnior Federico Garcia Lorca – Pequeno Poema Infinito Antonio Gilberto e José Mauro Brant Ilo Krugli – Poesia Rasgada Ieda de Abreu João Bethencourt – O Locatário da Comédia Rodrigo Murat José Renato – Energia Eterna Hersch Basbaum Leilah Assumpção – A Consciência da Mulher Eliana Pace Luís Alberto de Abreu – Até a Última Sílaba Adélia Nicolete Maurice Vaneau – Artista Múltiplo Leila Corrêa Renata Palottini – Cumprimenta e Pede Passagem Rita Ribeiro Guimarães Teatro Brasileiro de Comédia – Eu Vivi o TBC Nydia Licia O Teatro de Abílio Pereira de Almeida Abílio Pereira de Almeida O Teatro de Aimar Labaki Aimar Labaki O Teatro de Alberto Guzik Alberto Guzik O Teatro de Antonio Rocco Antonio Rocco O Teatro de Cordel de Chico de Assis Chico de Assis O Teatro de Emílio Boechat Emílio Boechat O Teatro de Germano Pereira – Reescrevendo Clássicos Germano Pereira O Teatro de José Saffioti Filho José Saffioti Filho O Teatro de Alcides Nogueira – Trilogia: Ópera Joyce – Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso – Pólvora e Poesia Alcides Nogueira O Teatro de Antonio Bivar: As Três Primeiras Peças Antonio Bivar O Teatro de Eduardo Rieche & Gustavo Gasparani – Em Busca de um Teatro Musical Carioca Eduardo Rieche & Gustavo Gasparani O Teatro de Ivam Cabral – Quatro textos para um teatro veloz: Faz de Conta que tem Sol lá Fora – Os Cantos de Maldoror – De Profundis – A Herança do Teatro Ivam Cabral O Teatro de Marici Salomão Marici Salomão O Teatro de Noemi Marinho: Fulaninha e Dona Coisa, Homeless, Cor de Chá, Plantonista Vilma Noemi Marinho Teatro de Revista em São Paulo – De Pernas para o Ar Neyde Veneziano O Teatro de Rodolfo Garcia Vasquez – Quatro Textos e Um Roteiro Rodolfo Garcia Vasquez O Teatro de Samir Yazbek: A Entrevista – O Fingidor – A Terra Prometida Samir Yazbek O Teatro de Sérgio Roveri Sérgio Roveri Teresa Aguiar e o Grupo Rotunda – Quatro Décadas em Cena Ariane Porto Série Perfil Analy Alvarez – De Corpo e Alma Nicolau Radamés Creti Antônio Petrin – Ser Ator Orlando Margarido Aracy Balabanian – Nunca Fui Anjo Tania Carvalho Arllete Montenegro – Fé, Amor e Emoção Alfredo Sternheim Ary Fontoura – Entre Rios e Janeiros Rogério Menezes Aurora Duarte – Faca de Ponta Aurora Duarte Berta Zemel – A Alma das Pedras Rodrigo Antunes Corrêa Bete Mendes – O Cão e a Rosa Rogério Menezes Betty Faria – Rebelde por Natureza Tania Carvalho Carla Camurati – Luz Natural Carlos Alberto Mattos Carmem Verônica – O Riso com Glamour Claudio Fragata Cecil Thiré – Mestre do seu Ofício Tania Carvalho Celso Nunes – Sem Amarras Eliana Rocha Cleyde Yaconis – Dama Discreta Vilmar Ledesma David Cardoso – Persistência e Paixão Alfredo Sternheim Débora Duarte – Filha da Televisão Laura Malin Denise Del Vecchio – Memórias da Lua Tuna Dwek Dionísio Azevedo e Flora Geni - Dionísio e Flora: Uma Vida na Arte Dionísio Jacob Ednei Giovenazzi – Dono da Sua Emoção Tania Carvalho Elisabeth Hartmann – A Sarah dos Pampas Reinaldo Braga Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida Maria Leticia Emilio Di Biasi – O Tempo e a Vida de um Aprendiz Erika Riedel Etty Fraser – Virada Pra Lua Vilmar Ledesma Ewerton de Castro – Minha Vida na Arte: Memória e Poética Reni Cardoso Fernanda Montenegro – A Defesa do Mistério Neusa Barbosa Fernando Peixoto – Em Cena Aberta Marília Balbi Geórgia Gomide – Uma Atriz Brasileira Eliana Pace Gianfrancesco Guarnieri – Um Grito Solto no Ar Sérgio Roveri Glauco Mirko Laurelli – Um Artesão do Cinema Maria Angela de Jesus Haydée Bittencourt – O Esplendor do Teatro Gabriel Federicci Ilka Soares – A Bela da Tela Wagner de Assis Irene Ravache – Caçadora de Emoções Tania Carvalho Irene Stefania – Arte e Psicoterapia Germano Pereira Isabel Ribeiro – Iluminada Luis Sergio Lima e Silva Isolda Cresta – Zozô Vulcão Luis Sérgio Lima e Silva Jece Valadão - Também Somos Irmãos Apoenam Rodrigues Joana Fomm – Momento de Decisão Vilmar Ledesma John Herbert – Um Gentleman no Palco e na Vida Neusa Barbosa Jonas Bloch – O Ofício de uma Paixão Nilu Lebert Jorge Loredo – O Perigote do Brasil Cláudio Fragata José Dumont – Do Cordel às Telas Klecius Henrique Laura Cardoso – Contadora de Histórias Julia Laks Leonardo Villar – Garra e Paixão Nydia Licia Lília Cabral – Descobrindo Lília Cabral Analu Ribeiro Lolita Rodrigues – De Carne e Osso Eliana Castro Louise Cardoso – A Mulher do Barbosa Vilmar Ledesma Marcos Caruso – Um Obstinado Eliana Rocha Maria Adelaide Amaral – A Emoção Libertária Tuna Dwek Marisa Prado – A Estrela, O Mistério Luiz Carlos Lisboa Marlene França – Do Sertão da Bahia ao Clã Matarazzo Maria Do Rosário Caetano Mauro Mendonça – Em Busca da Perfeição Renato Sérgio Miguel Magno - O Pregador De Peças Andréa Bassitt Miriam Mehler – Sensibilidade e Paixão Vilmar Ledesma Naum Alves de Souza: Imagem, Cena, Palavra Alberto Guzik Nicette Bruno e Paulo Goulart – Tudo em Família Elaine Guerrini Nívea Maria – Uma Atriz Real Mauro Alencar e Eliana Pace Niza de Castro Tank – Niza, Apesar das Outras Sara Lopes Norma Blum - Muitas Vidas: Vida e Carreira de Norma Blum Norma Blum Paulo Betti – Na Carreira de um Sonhador Teté Ribeiro Paulo José – Memórias Substantivas Tania Carvalho Paulo Hesse – A Vida Fez de Mim um Livro e Eu Não Sei Ler Eliana Pace Pedro Paulo Rangel – O Samba e o Fado Tania Carvalho Regina Braga – Talento é um Aprendizado Marta Góes Reginaldo Faria – O Solo de Um Inquieto Wagner de Assis Renata Fronzi – Chorar de Rir Wagner de Assis Renato Borghi – Borghi em Revista Élcio Nogueira Seixas Renato Consorte – Contestador por Índole Eliana Pace Rolando Boldrin – Palco Brasil Ieda de Abreu Rosamaria Murtinho – Simples Magia Tania Carvalho Rubens de Falco – Um Internacional Ator Brasileiro Nydia Licia Ruth de Souza – Estrela Negra Maria Ângela de Jesus Sérgio Hingst – Um Ator de Cinema Máximo Barro Sérgio Viotti – O Cavalheiro das Artes Nilu Lebert Silnei Siqueira – A Palavra em Cena Ieda de Abreu Silvio de Abreu – Um Homem de Sorte Vilmar Ledesma Sônia Guedes – Chá das Cinco Adélia Nicolete Sonia Maria Dorce – A Queridinha do meu Bairro Sonia Maria Dorce Armonia Sonia Oiticica – Uma Atriz Rodriguiana? Maria Thereza Vargas Stênio Garcia – Força da Natureza Wagner Assis Suely Franco – A Alegria de Representar Alfredo Sternheim Tania Alves – Tânia Maria Bonita Alves Fernando Cardoso Tatiana Belinky – ... E Quem Quiser Que Conte Outra Sérgio Roveri Theresa Amayo – Ficção e Realidade Theresa Amayo Tonico Pereira – Um Ator Improvável, uma Autobiografia não Autorizada Eliana Bueno Ribeiro Tony Ramos – No Tempo da Delicadeza Tania Carvalho Umberto Magnani – Um Rio de Memórias Adélia Nicolete Vera Holtz – O Gosto da Vera Analu Ribeiro Vera Nunes – Raro Talento Eliana Pace Walderez de Barros – Voz e Silêncios Rogério Menezes Walter George Durst – Doce Guerreiro Nilu Lebert Zezé Motta – Muito Prazer Rodrigo Murat Especial Agildo Ribeiro – O Capitão do Riso Wagner de Assis Av. Paulista, 900 – a História da TV Gazeta Elmo Francfort Beatriz Segall – Além das Aparências Nilu Lebert Carlos Zara – Paixão em Quatro Atos Tania Carvalho Célia Helena – Uma Atriz Visceral Nydia Licia Charles Möeller e Claudio Botelho – Os Reis dos Musicais Tania Carvalho Cinema da Boca – Dicionário de Diretores Alfredo Sternheim Dicionário de Astros e Estrelas do Cinema Brasileiro Antonio Leão Dina Sfat – Retratos de uma Guerreira Antonio Gilberto Eva Todor – O Teatro de Minha Vida Maria Angela de Jesus Eva Wilma – Arte e Vida Edla van Steen Gloria in Excelsior – Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira – TV Excelsior 2a Edição Álvaro Moya As Grandes Vedetes do Brasil Neyde Veneziano Ítalo Rossi – Ítalo Rossi, Isso é Tudo Antônio Gilberto e Ester Jablonski Lembranças de Hollywood Dulce Damasceno de Britto, organizado por Alfredo Sternheim Lilian Lemmertz - Sem Rede de Proteção Cleodon Coelho Marcos Flaksman – Universos Paralelos Wagner de Assis Maria Della Costa – Seu Teatro, Sua Vida Warde Marx Mazzaropi – Uma Antologia de Risos Paulo Duarte Ney Latorraca – Uma Celebração Tania Carvalho Odorico Paraguaçu: O Bem-amado de Dias Gomes – História de um Personagem Larapista e Maquiavelento José Dias Raul Cortez – Sem Medo de se Expor Nydia Licia Rede Manchete – Aconteceu, Virou História Elmo Francfort Sérgio Cardoso – Imagens de Sua Arte Nydia Licia Tônia Carrero – Movida pela Paixão Tania Carvalho TV Tupi – Uma Linda História de Amor Vida Alves Victor Berbara – O Homem das Mil Faces Tania Carvalho Walmor Chagas – Ensaio Aberto para Um Homem Indignado Djalma Limongi Batista © 2010 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Azeredo, Ely Jorge Ileli, o suspense de viver / Ely Azeredo – São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010. 204p. : il. – (Coleção Aplauso. Série Cinema Brasil / Coordenador geral Rubens Ewald Filho) ) ISBN 978-85-7060-895-6 1. Cinema – Brasil – História e crítica 2. Roteiros Cinematográficos – História e crítica 3. Ileli, Jorge, 1925 – Crítica e interpretação I. Azeredo, Ely II. Ewald Filho, Rubens III. Série. CDD 791.4370981 Índices para catálogo sistemático: 1. Brasil : Cinema : História e crítica 791.437 098 1 Proibida reprodução total ou parcial sem autorização prévia do autor ou dos editores Lei nº 9.610 de 19/02/1998 Foi feito o depósito legal Lei nº 10.994, de 14/12/2004 Impresso no Brasil / 2010 Todos os direitos reservados. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Rua da Mooca, 1921 Mooca 03103-902 São Paulo SP www.imprensaoficial.com.br/livraria livros@imprensaoficial.com.br SAC 0800 01234 01 sac@imprensaoficial.com.br Formato: 12 x 18 cm Tipologia: Frutiger Papel miolo: Offset LD 90 g/m2 Papel capa: Triplex 250 g/m2 Número de páginas: 204 Editoração, CTP, impressão e acabamento: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Nesta edição, respeitou-se o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa Coleção Aplauso | em todas as livrarias e no site www.imprensaoficial.com.br/livraria