Ednei Giovenazzi Dono da sua Emoção Ednei Giovenazzi Dono da sua Emoção Tania Carvalho Imprensa Oficial São Paulo, 2010 GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO Governador Alberto Goldman Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Diretor-presidente Hubert Alquéres Coleção Aplauso Coordenador Geral Rubens Ewald Filho No Passado Está a História do Futuro A Imprensa Oficial muito tem contribuído com a sociedade no papel que lhe cabe: a democratização de conhecimento por meio da leitura. A Coleção Aplauso, lançada em 2004, é um exemplo bem-sucedido desse intento. Os temas nela abordados, como biografias de atores, diretores e dramaturgos, são garantia de que um fragmento da memória cultural do país será preservado. Por meio de conversas informais com jornalistas, a história dos artistas é transcrita em primeira pessoa, o que confere grande fluidez ao texto, conquistando mais e mais leitores. Assim, muitas dessas figuras que tiveram importância fundamental para as artes cênicas brasileiras têm sido resgatadas do esquecimento. Mesmo o nome daqueles que já partiram são frequentemente evocados pela voz de seus companheiros de palco ou de seus biógrafos. Ou seja, nessas histórias que se cruzam, verdadeiros mitos são redescobertos e imortalizados. E não só o público tem reconhecido a importância e a qualidade da Aplauso. Em 2008, a Coleção foi laureada com o mais importante prêmio da área editorial do Brasil: o Jabuti. Concedido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), a edição especial sobre Raul Cortez ganhou na categoria biografia. Mas o que começou modestamente tomou vulto e novos temas passaram a integrar a Coleção ao longo desses anos. Hoje, a Aplauso inclui inúmeros outros temas correlatos como a história das pioneiras TVs brasileiras, companhias de dança, roteiros de filmes, peças de teatro e uma parte dedicada à música, com biografias de compositores, cantores, maestros, etc. Para o final deste ano de 2010, está previsto o lançamento de 80 títulos, que se juntarão aos 220 já lançados até aqui. Destes, a maioria foi disponibilizada em acervo digital que pode ser acessado pela internet gratuitamente. Sem dúvida, essa ação constitui grande passo para difusão da nossa cultura entre estudantes, pesquisadores e leitores simplesmente interessados nas histórias. Com tudo isso, a Coleção Aplauso passa a fazer parte ela própria de uma história na qual personagens ficcionais se misturam à daqueles que os criaram, e que por sua vez compõe algumas páginas de outra muito maior: a história do Brasil. Boa leitura. Alberto Goldman Governador do Estado de São Paulo Coleção Aplauso O que lembro, tenho. Guimarães Rosa A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa Oficial, visa resgatar a memória da cultura nacional, biografando atores, atrizes e diretores que compõem a cena brasileira nas áreas de cinema, teatro e televisão. Foram selecionados escritores com largo currículo em jornalismo culturalparaesse trabalho em que a história cênica e audiovisual brasileiras vem sendo reconstituída de maneira singular. Em entrevistas e encontros sucessivos estreita-se o contato entre biógrafos e biografados. Arquivos de documentos e imagens são pesquisados, e o universo que se reconstitui a partir do cotidiano e do fazer dessas personalidades permite reconstruir sua trajetória. A decisão sobre o depoimento de cada um na primeira pessoa mantém o aspecto de tradição oral dos relatos, tornando o texto coloquial, como se o biografado falasse diretamente ao leitor. Um aspecto importante da Coleção é que os resultados obtidos ultrapassam simples registros biográficos, revelando ao leitor facetas que também caracterizam o artista e seu ofício. Biógrafo e biografado se colocaram em reflexões que se estenderam sobre a formação intelectual e ideológica do artista, contextualizada na história brasileira. São inúmeros os artistas a apontar o importante papel que tiveram os livros e a leitura em sua vida, deixando transparecer a firmeza do pensamento crítico ou denunciando preconceitos seculares que atrasaram e continuam atrasando nosso país. Muitos mostraram a importância para a sua formação terem atuado tanto no teatro quanto no cinema e na televisão, adquirindo, linguagens diferenciadas – analisando-as com suas particularidades. Muitos títulos exploram o universo íntimo e psicológico do artista, revelando as circunstâncias que o conduziram à arte, como se abrigasse em si mesmo desde sempre, a complexidade dos personagens. São livros que, além de atrair o grande público, interessarão igualmente aos estudiosos das artes cênicas, pois na Coleção Aplauso foi discutido o processo de criação que concerne ao teatro, ao cinema e à televisão. Foram abordadas a construção dos personagens, a análise, a história, a importância e a atualidade de alguns deles. Também foram examinados o relacionamento dos artistas com seus pares e diretores, os processos e as possibilidades de correção de erros no exercício do teatro e do cinema, a diferença entre esses veículos e a expressão de suas linguagens. Se algum fator específico conduziu ao sucesso da Coleção Aplauso – e merece ser destacado –, é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o percurso cultural de seu país. À Imprensa Oficial e sua equipe coube reunir um bom time de jornalistas, organizar com eficácia a pesquisa documental e iconográfica e contar com a disposição e o empenho dos artistas, diretores, dramaturgos e roteiristas. Com a Coleção em curso, configurada e com identidade consolidada, constatamos que os sortilégios que envolvem palco, cenas, coxias, sets de filmagem, textos, imagens e palavras conjugados, e todos esses seres especiais – que neste universo transitam, transmutam e vivem – também nos tomaram e sensibilizaram. É esse material cultural e de reflexão que pode ser agora compartilhado com os leitores de todo o Brasil. Hubert Alquéres Diretor-presidente Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Para Bia Radunsky, que já comeu muito bolinho de chuva comigo. E de sol, de vento, de tempestade e de bonança. Tania Carvalho Introdução Ednei Giovenazzi é uma pessoa muito especial. Doce, calmo, afetivo, apaixonado pelo que faz e pelas pessoas amigas que o cercam. E para elas, tem sempre um mimo: uma palavra carinhosa quando necessário, um agrado, quando a carência bate, uma ida à cozinha para fazer algo especial só para adoçar a vida do outro. E ele faz isso com muita naturalidade, não por carência, para ganhar pontos. Faz porque é assim, e não é agora, na oitava década da vida, que vai mudar. E, de verdade, acho que ele nem conseguiria. Meus amigos dizem que sou uma pessoa afetiva. Juro que não tenho muita consciência disso. Faço porque só sei ser assim. Por isso ele vive cercado de amigos queridos e tem orgulho de dizer que não tem inimigos, apenas pessoas que não simpatizam comigo, com todo direito, inclusive. Conheço Ednei há muitos anos, chegamos a trabalhar juntos uma época, quando eu e Bia Radunsky fazíamos divulgação de teatro e fomos convidadas para a montagem de Caixa de Sombras. A primeira reunião foi feita na casa de Ednei, no Tambá, condomínio badalado de artistas, no Vidigal, em tempos onde o tráfico não dominava a região e todos eram muito felizes nos pequenos apartamentos dúplex, com vista espetacular para a praia. Ednei nos recebeu para a conversa com canecas de café e bolinhos de chuva, feitos especialmente por ele. Claro que isso virou folclore na nossa história. Sempre que nos encontrávamos eu fazia questão de lembrar a gentileza e podia sentir de volta o gosto da canela na boca. Não que tenhamos nos perdido, nos vimos várias vezes em casas de amigos, nos corredores das televisões, em espetáculos teatrais, mas papo mesmo aconteceu agora, quase 30 anos depois, quando nos reencontramos para começar este livro. Desta vez, no apartamento de Ednei em Copacabana. Um lugar bonito, amplo, com muito vento entrando pelas inúmeras janelas, de onde se vislumbra a praia mais famosa do Rio de Janeiro. Conversamos bastante e quando o gravador foi desligado, ele pôs a mesa, esquentou a água para um chá e tirou os bolinhos de chuva do for-no, onde estavam guardados para não esfriar. Um delírio! Sua empregada havia perguntado porque Ednei estava tão atarefado na cozinha fazendo bolinho de chuva. E ele respondeu casualmente: ora, porque está chovendo. Que mentira, ele só queria me ver feliz. E conseguiu. A partir daí, o ritual se repetiu: sempre havia um chazinho de cidreira depois das entrevistas e uns biscoitinhos – os bolinhos de chuva foram proibidos em função da silhueta. E uma conversa gostosa, daquelas que dá saudades quando termina. Nossos encontros foram semanais, durante os meses de outubro e novembro de 2009, às vezes duas sessões para adiantar o trabalho – Ednei estava se preparando para uma temporada em São Paulo, para as gravações de Uma Rosa com Amor e estava bem animado com a possibilidade. Aliás, uma constante é sua empolgação pelo trabalho que, segundo ele, o rejuvenesce. Pode ser isso então que faz com que este senhor de 79 anos pareça bem menos – não tanto no rosto ou no corpo, embora sua postura seja absolutamente perfeita, de um jovem de 30 anos, mas na maneira de ser: atento, vivo, antenado, ligado nas novidades. Eu sou velho, mas um velho atuante e isso me deixa muito feliz – garante. É... Ednei sabe mesmo o segredo da eterna juventude da alma. E talvez isso tenha a ver com tanta gentileza. É um caso a pensar. Ednei se formou dentista, trabalhou muitos anos na carreira, da qual até hoje se orgulha muito. Um dia começou no teatro amador, foi convidado a virar profissional e por muitos anos permaneceu equilibrando as duas atividades. Um dia desmaiou na rua de exaustão. Seguindo o conselho do pai de fazer aquilo que realmente amava, virou um homem de teatro, um ator para sempre. Não pergunte para ele, porém, quando isso aconteceu. Ele não se lembra mesmo, nem do ano, nem da peça que estava fazendo. Digamos que foi em qualquer mês do final dos anos 1960 que ele realmente optou pela arte. Embora tenha uma ótima memória, Ednei não faz questão de gravar datas, nem mesmo no seu currículo. É como se seu trabalho estivesse sempre em permanente renovação e o passado seja uma referência, mas não o mote de sua vida. O melhor está no presente e, com certeza, no futuro para este homem que não tem medo de encarar personagens diversos, trabalhos ousados e muito esforço para conseguir o resultado que deseja deles. Ator característico, com um típico físico muito propício a isso, pois camaleonicamente pode mudar completamente – seus olhos amendoados permitem que ele faça um oriental com tranqui lidade – Ednei mais do que nunca escolhe o que vai fazer, em especial no teatro. E se orgulha disso e também de ter largado muitas vezes um contrato na televisão – que o projetou nacionalmente – por uma aventura no teatro. O palco é sua vida e viver a ilusão o mais profundamente possível é a sua meta. Em meio a nossas con versas surgiu o título – o ator tem que ser dono da sua emoção. Escolhi sem hesitação: Dono da sua Emoção – é isso que ele é, alguém que domina a própria emoção e captura a do público tornando-a sua. E é disso que ele gosta: construir sentimento por sentimento, como em uma casa que um tijolo é colocado após o outro, e com toda emoção dar vida àqueles personagens tão diferentes dele que vão invadir o imaginário das pessoas. Ou alguém se esqueceu de Chico Treva, o coveiro estranho, meio Nosferatu, da novela Felicidade? Ou da figura trágica do confessor em Mary Stuart, um de seus mais recentes trabalhos no teatro? Eu jamais esqueci os personagens que ele fez ao longo dessas décadas e é bastante prazeroso poder recordá-los neste livro. E que venham muitas tardes de chá e bolinho de chuva... Sempre. Tania Carvalho Janeiro de 2010 Para todos que partilharam de minha vida artística: autores, diretores, técnicos e, especialmente, meus colegas atores e atrizes, minha família e Tania, que soube me ouvir pacientemente! Ednei Giovenazzi Capítulo I Um Homem Gentil Se eu tivesse que me definir em uma só palavra eu diria que sou uma pessoa conciliadora. Adoro fazer as pazes de todo mundo. Rezo sempre um Pai Nosso, em determinada hora a oração é assim: perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido. Essa frase é definitiva, você tem que perdoar mesmo, e no perdoar vem uma paz. Eu acho que a gente reza e não pensa, não sabe o que está falando, mas eu sei bem. E procuro agir assim. E continuando religioso, uma citação bíblica: amar o próximo como a si mesmo. Acredito de verdade nisso. Há quem ache que a esperteza é a melhor coisa que se pode ter, outros, a inteligência, para mim o mais importante é a sensibilidade de saber respeitar o outro, pois isso permite uma vida mais plena e cercada por pessoas que realmente gostam de você. Mas, tenha certeza, não sou bonzinho. Outro dia até me irritei ao ver uma frase de um diretor sobre uma atriz, até Ednei Giovenazzi brigou com ela, como se eu fosse o ser mais bonzinho do mundo. Eu sou tolerante, mas existe o outro lado da moeda, de repente posso ficar violento quando ultrapassam o limite, perco a compostura mesmo. Não prefiro, mas se necessário for, vão ver este meu lado. Minhas amizades são a razão do meu viver. Minha irmã caçula, Terezinha, é uma amiga presente em todos os momentos: nós não nos casamos, somos avulsos na vida, não temos filhos e somos confidentes um do outro, herdeiros um do outro, tudo mesmo. Nós somos quatro irmãos: minha irmã mais velha, Edna; um irmão, Sidney, que já faleceu; eu e a caçulinha, a Terezinha, sete anos mais nova do que eu. Engraçado chamá-la de caçulinha quando ela já tem 72 anos, mas ela é e sempre será a mais novinha. Ela mora longe, em Londrina, mas nos falamos muitas vezes por dia. Se eu pegar meu celular, está lá: dez ligações da minha queridíssima Telô. Quando nossa mãe morreu, Edna ficou sendo a matriarca da família. Hoje está com 83 anos e Terezinha cuida dela com o maior desvelo, do mesmo jeito que cuidou da minha mãe, a história se repete, são ciclos. Com os dois filhos da minha irmã tenho uma relação de afeto e carinho: Paulo Roberto, professor, médico obstetra e ginecologista e Carlos, o Jr., que é engenheiro, estão sempre ligados à minha vida. A relação mais complicada foi com meu irmão, uma pessoa terna, mas que com o casamento acabou se afastando um pouco de nós. Não tenho com seus cinco filhos uma relação muito próxima e me ressinto disso, a exceção é o caçula, Sidinho, músico, que depois de adulto aproximou-se de mim e por quem tenho o maior carinho. Mas o importante é que ele foi feliz, mesmo um pouco distanciado de nós. De verdade nunca houve rancores na minha família, e isso acontece frequentemente, especialmente quando entra discussão de herança. Dinheiro pode afastar uma família, mas na nossa isso não aconteceu. Sempre converso isso com Terezinha, se necessário seremos magnânimos, mas não deixaremos nunca que dinheiro interfira nos sentimentos. Sou conciliador, não sei mesmo ser de outra forma. Aracy Balabanian é aquela amiga com quem divido tudo: nossas dores, nossos prazeres, nossas alegrias, nossas decepções. Quando está acontecendo alguma coisa um procura o outro para contar. E existe entre nós um respeito único, ninguém invade o espaço do outro, uma coisa muito especial. Engraçado é que nossas vidas são cheias de coincidências: nossos nomes têm 13 letras, nossos pais tinham uma casa de calçados, o pai dela se chamava Rafael, nome de um dos meus avôs, um dos meus sobrinhos, o Carlos, morou comigo e fez a Politécnica em São Paulo, e tenho certeza que tive muita influência em sua vida; Aracy também tem uma sobrinha, Marisa, que morou anos com ela quando fazia Oftalmologia. Nós dois somos apaixonados por essas pessoas que vimos crescer, ajudamos a construir a vida e que hoje dão um banho na gente e nos enchem de orgulho. Temos tantas afinidades que a felicidade de Aracy se mistura com a minha, assim como os problemas. Dividimos tudo, mas sem estardalhaço, sem exagero e, principalmente, sem invasão. Marcos Toledo é meu mais antigo amigo. E é aquele amigo de todas as horas há mais de 60 anos. Lilian Lemmertz foi uma grande amiga. Ela sempre teve um temperamento muito especial, mas comigo em todos os momentos foi doce, educada e respeitosa. Lilian gostava ou não gostava das coisas, das pessoas, tinha lá as razões dela, às vezes eram claras, noutras meio obscuras. Ela era muito inteligente, tinha muito humor, e com o humor vinha o sarcasmo também, aquela coisa meio ácida. Mas havia um respeito entre a gente fantástico e uma admiração muito grande. Vivemos muitas coisas juntos, nossa! Uma vez ela foi passar uma semana comigo, viajamos para o Guarujá e ela percebeu que eu estava especialmente bem. – O quê você fez, por que está tão leve, tão agradável. E eu: – Eu não fiz nada. Ela insistiu tanto, que decidi contar, desde que ela não debochasse. Imagina se eu vou debochar. Aí contei que tinha ido a uma mãe de santo maravilhosa. Mas você não é católico? Sou ecumênico. Me leva, me leva, me leva. Argumentei que ela era uma debochada, que iria ridicularizar, rir na cara da mãe de santo e que precisava estar de coração aberto para en-tender as coisas que não entendemos. Juro por Deus que eu vou me comportar direitinho. Levei a Lilian para conhecer Marina, a mãe de santo. Ela realmente se comportou muito bem e saímos de lá abençoados. Quando a Lilian voltou para o Rio de Janeiro, Marina me disse: Lilian tem pouco tempo de vida. Não está doente não, não tem nada, mas seu espírito já está se afastando do corpo. Pouco tempo depois, ela morreu. Eu estava em Londrina e ouvi no jornal da noite na televisão que Júlia tinha encontrado a mãe morta, um infarto fulminante. Foi uma dor absoluta. Meu Deus do céu, preciso marcar uma passagem para ir para lá imediatamente – essa foi a minha reação. Marquei o voo para de manhã bem cedinho, fui dormir e sonhei com a Lilian. Tenho certeza de que ela veio se despedir de mim. Foi um sonho tão lindo, ela estava tão bonita, com uma blusa azul claro, com florzinhas cor de rosa – nada a ver com ela, quem a conhecia sabia que essa blusa não era dela, era coisa de outro nível... Eu olhei para ela e falei: – Meu amor, vai com Deus, você já morreu! Você tem que ir, vai, segue o seu caminho. – Ah! Ednei, vê se não me enche o saco! Eu olho e vejo a Juju chegando, mas não era a Julia adulta, era a Júlia menina. E a Júlia vem vindo, olha o susto que ela vai levar! Pelo amor de Deus, você vai matar essa menina de susto. Ela deu uma respirada funda e falou: Que saco! E deu as costas e foi embora. Temperamental, como sempre! Quando eu virei para onde ela tinha ido, havia um paredão de pedras, e dos vazios entre elas jorrava um líquido esbranquiçado, e eu sabia que era ela. Olha que coisa forte! Lineu Dias, com quem Lilian foi casada, também foi um amigo muito profundo. Curioso que nas minhas relações afetivas tenho uma tendência a ser feminista, porque acho que a mulher não está tão corrompida quanto o homem, que tem uma atitude um pouco arrogante em relação ao poder, eu pago, eu ganho, eu sou o chefe, eu comando, a esposa tem que aprová-lo, os filhos têm que obedecê-lo. Ao mesmo tempo eles dão as costas com a maior facilidade para esses filhos, e a mulher não, toma para si a responsabilidade total sobre aquelas crianças. Todas as minhas empregadas são mães solteiras, mas responsáveis pela educação de seus filhos. Eu acho os homens meio irresponsáveis, muito machistas, meio chatos. Mas se eu tivesse de dar o exemplo de um grande amigo homem, esse seria Lineu. Lineu tinha uma doçura enorme, além de uma inteligência privilegiada. Bem informado, sabia muito da vida, das coisas, de tudo, era letrado mesmo, uma coisa incrível, mas ao mesmo tempo de uma liberdade absoluta. No final da vida, ele estava louco para aprender alemão, assim era ele, interessado em saber, em transmitir. Sua generosidade era imensa, enfim, uma pessoa muito especial. De verdade, eu não consigo ser amigo se não tiver admiração em primeiro lugar, depois vem o gostar. E admirar significa ver no outro aquilo que você não é e não tem. Em vez de invejar caio de paixão pela pessoa. Eu sinto uma falta imensa dos dois. Ficou um vazio enorme na minha vida. Mas a vida é feita de ciclos. Tenho a Júlia Lemmertz, filha dos dois, a quem amo profundamente, ela é a filha que não tive, se ela não está bem, fico péssimo, ela é uma pessoa muito especial, que tem o melhor da Lilian e o melhor do Lineu. Eu me emociono todas as vezes que leio seus cartões onde me chama de meu pai, minha mãe, meu amigo e colega de trabalho. Ela me ensina muitas coisas e tenho o maior prazer em dividir o palco com ela, uma atriz cada vez melhor, mais completa, mais séria, mais definida. Eu vi a estreia da Juju de mãos dadas com a Lilian. A peça era Lição de Anatomia. A Lilian agarrou na minha mão, apertava tanto que chegava a doer. Ficamos lá sofrendo, torcendo para aquela menina se sair bem, estávamos aflitíssimos para que ela acertasse. Juju aparecia nua na peça, era um nu muito artístico, com luzes disfarçando, bem cuidado, mas isso aumentava a nossa aflição. Não que tivéssemos preocupados com isso, nossa apreensão era com o estado de sua alma, se ela ia ficar feliz, se ela ia encontrar seu caminho. Pois não é que a vida se repete mesmo, há poucos meses fui ver a estreia da Luiza, filha da Júlia, na peça do Zé Celso sobre Cacilda Becker. Luiza fazia Maria Della Costa. Sofri tudo de novo ao lado da Juju, torcendo pela Luiza. E para completar, ela também aparecia nua no palco. Acho a nudez linda, os corpos são uma obra de arte, mas mesmo assim não aguentei e falei para a Juju: Tudo bem repetir a dose. Mas tinha que ser nua outra vez? E rimos juntos. Às vezes penso comigo mesmo que estou vivendo demais, porque já estou vendo coisas se repetirem. E também porque estou acompanhando pessoas queridas morrerem. Ao mesmo tempo em que isso me entristece, vejo como a morte pode ser uma coisa fantástica, quando ela significa o encerramento de um ciclo de maturidade, de sensibilidade, de encontro. Maria Augusta Mattos, a Guta, diretora de elenco da Globo por muitos anos, foi minha amiga do coração. Estive muito perto dela durante toda a sua vida, até o final. Ela tinha um temperamento muito forte, mas evoluiu como ser humano, morreu muito melhor do que era, quase beatificada. No final de sua vida, fechou o seu ciclo com uma maturidade e sensibilidade absolutas: sua última frase foi Lola, eu te amo. Lola era sua irmã com quem ela não tinha afinidade de temperamento. Guta tinha problemas com a sua família, mas encerrou seu ciclo ao se despedir com essas palavras de amor. Lineu também terminou o seu ciclo, solucionou o amor e morreu em paz. Isso me consola e torna a morte mais amável. No mundo ocidental, o conceito de morte, em função da religião, em especial o catolicismo, está revestido de medo, uma coisa pesada que nem se fala. Eu acho que, como o nascimento, devia se falar da morte com a mesma naturalidade. Você vive para morrer. Eu, por exemplo, estou num período de fim de vida em termos de idade, mas não estou me importando. Eu sou velho, mas um velho atuante, e fico feliz, estou trabalhando e me sinto premiado pela vida. Nada cai do céu, então eu acho que se você se dedica ao seu trabalho, tem prazer, nunca tem certeza da sua capacidade, duvida, procura soluções para resolver os problemas que surgem, faz com prazer o que aparece pela sua frente, encara com honestidade a sua profissão, faz o melhor que pode fazer. A morte um dia vai chegar, como chega para todos, mas a certeza de ter vivido uma vida integralmente só pode te deixar feliz. Outro dia encontrei um velho amigo, a quem não via há muito tempo, e ele me disse: você tem uma alegria que já não tenho mais. E eu acho que essa alegria advém do fato de você estar trabalhando, de você não parar, de você seguir o teu coração. Ele estava certíssimo. Cada vez que vejo um personagem na frente, para mim começa tudo de novo. Alguns acham que os anos de carreira me deram conhecimento suficiente para não ter inseguranças. Não sei nada, cada personagem novo é outro homem, outra pessoa, outro ser humano, outra situação política, social, econômica e isso me mantém alerta. E ter consciência da própria ignorância faz com que se resolva com sabedoria o personagem. Eu acho ótimo esse desafio, é ele que me faz estar VIVO. Capítulo II A Gênese Minha origem está na Itália. Meus quatro avôs eram italianos. E os nomes não me deixam mentir: Orsi, Borsetto, Giovenazzi e Santa Croce. Meu avô paterno, Raphael Giovenazzi, veio para o Brasil, já militar, casado com uma jovem de família essencialmente religiosa e montou uma grande loja daquelas em que havia de máquina de costura a vinho. Era enorme, um casarão imenso, que existe até hoje na cidade de Pederneiras: hoje tem um açougue, uma padaria e uma fábrica de bala tudo no casarão. Já o meu avô materno, Romeo Orsi, veio para o Brasil para ser operário, foi trabalhar em uma olaria em Pederneiras, se apaixonou pela filha do dono da fábrica de tijolos e os dois se casaram. Com o tempo a situação se inverteu: meu avô paterno, que era rico, acabou na pobreza, com somente uma portinha do imenso casarão vendendo frutas. O outro estava morando num sobrado requintadíssimo, maravilhoso, com jar-dim na frente, pomar no fundo do quintal que ia até o outro quarteirão. Eu nasci em Pederneiras no dia 12 de agosto de 1930. Tenho algumas recordações dessa infância na cidade. O Rio Tietê passava a uns 4 km da cidade e por isso nós nadávamos em um ribeirão que era mais perto. Mas era aquela coisa terrível, de repente você estava nadando, e se deparava com todo o tipo de dejetos, cocô inclusive, porque lá era despejado o esgoto da cidade. Meu sonho era nadar no Tietê e um dia eu e meus amigos decidimos ir lá. Fomos andando e quando estávamos chegando, ouço uma buzina: era a minha mãe num táxi, um Ford antigo, que me deu uma bronca, me bateu ali mesmo e me fez voltar para casa, porque era muito perigoso nadar no Rio Tietê. Fiquei tão frustrado e sinto mágoa até hoje de nunca ter nadado naquele riozão. Acho que naquele momento era importante para eu me sentir mais maduro, mais homem, mais dono do meu nariz. Eu acho que não tinha consciência de que a nossa educação era repressora, mas era. Claro que por zelo. Naquela época não sentia não, porque fugia muito de casa, a minha mãe me colocava de castigo, se tinha um jeito de escapar eu pulava o muro da casa e me mandava. Tinha a pressão, mas a gente reagia a ela. Minha mãe dizia assim no dia do meu aniversário: Por favor, se comporte, porque hoje eu não posso bater em você. Precisa dizer mais? No fundo, hoje pensando, eu fiz tudo o que eu queria fa zer desde pequeno. E também a minha relação com minha mãe era muito forte. Ela sempre me apoiou, havia uma paixão muito grande dela por mim, apesar das broncas, dos castigos e das palmadas. E eu sabia disso. De vez em quando, saía todo mundo, meu pai ia para jogar xadrez com os amigos, meus irmãos tinham seus pro-gramas e eu perguntava: Quem vai ficar com a mamãe? Se não fosse ficar ninguém em casa eu desistia de sair. E ficava com ela, que, para me compensar, mandava comprar sorvete. Nós fomos muito amigos a vida inteira. No final de sua vida ela estava em Londrina na casa das minhas irmãs, Edna e Terezinha, tinha uma enfermeira diurna e uma enfermeira noturna, estava bem assessorada, mas eu pedi que minhas irmãs me avisassem quando ela estivesse mal. Um dia elas ligaram: eu acho que se você quiser, está na hora de vir para cá. Eu ia começar a ensaiar uma peça, já tinha feito umas leituras, e larguei tudo. Passei 35 dias com a minha mãe, os últimos dias de sua vida, dava até banho nela, e isso me fez muito bem. Ela tinha uma vontade de viver que eu nunca vi tão grande quanto a dela. Às vezes ela ficava muito nervosa, e a gente falava para ela rezar, então ela rezava: Ave Maria cheia de graça, o Senhor é convosco/ Bendita sois vós entre as mulheres/ Bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus/ Santa Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores, agora e... E ela não falava, e na hora de nossa morte, ela parava, não queria morrer, não queria nem falar a palavra morte. Meu Deus do céu, que coisa. Um dia, ela estava bem mal, eu a coloquei no meu colo, vieram as minhas duas irmãs, meu irmão, minha cunhada, e eu fiquei conversando com ela. Eu tive uma inspiração, e não parei de falar, fui falando, falando, aí ela deu um suspiro, um sorriso, e morreu. Sem medo, eu senti. Foi a coisa mais gratificante da minha vida, ter ajudado a minha mãe a morrer. Ela foi em paz, e a dor ficou menor. Voltando outra vez no tempo, à minha infância em Pederneiras, fiz o primário num colégio de freiras, que curiosamente para a época, era misto. Evidentemente a influência religiosa era enorme. Sempre fui teimosinho e meu irmão mais velho estava dois anos na minha frente e eu queria fazer tudo o que ele fazia. Quando chegou a época dele fazer a primeira comunhão, eu queria fazer também. Minha mãe me disse que eu não podia porque nem sabia ler. Fui falar com o padre: – Você pode fazer a primeira comunhão, desde que saiba todas as rezas, os atos de contrição, tudo. E como é que eu aprendo isso, se eu não sei ler? Você assiste às aulas de catecismo. Assisti, aprendi, e no dia da comunhão era o primeiro da fila, pequenininho, todo de branquinho. De repente a hóstia colou no céu da boca, eu fiquei desesperado, porque não podia bater no meu dente, senão sangrava o corpo de Cristo. Me deu um desespero, comecei a chorar, e chamar a minha mãe, que estava lá no fundo da igreja. Foi ela que me acalmou: Calma filho, calma, com a língua você pode tirar a hóstia, vai tirando devagarzinho. E eu, preocupadíssimo: Jesus não vai para o meu coração, desse jeito ele não desce. Olha que coisa de louco! Acho que Jesus foi tanto para o meu coração que eu ia todo domingo à missa, virei coroinha e em determinado momento decidi que ia ser padre. Um dia recebi em casa a visita de padres de outra ordem, que estavam passando pela cidade para ver se havia crianças com vocação sacerdotal. No meio da conversa falei assim: – Só tem uma coisa, eu quero ser padre, mas quero ter a minha casa e a minha mãe comigo, quero ser paroquial. – Mas nós somos ordem jesuítica, não temos assim. É por esta razão que eu não sou padre hoje. Olha do que me livrei! Mas a religiosidade, a espiritualidade, são muito fortes em mim. Da minha formação cristã sobrou muita coisa. Fiz o ginásio também em Pederneiras. De novo a idade foi um problema, tiveram que aumentá-la para que eu fosse matriculado. Eu era considerado a pessoa mais burra da sala. Um dia ouvi o professor de matemática dizer: Mas aquele Giovenazzi, como é burro! Como tinha pulado a quarta série e ido direto para o admissão não tinha base, não acompanhava, não tinha raciocínio. Fiquei muito triste, chateado, mas não falei nada, só decidi que ia estudar muito. Fui o último da classe quando entrei no ginásio, 24º lugar. Terminei a primeira série como primeiro da classe. Tinhoso! Terminei o ginásio no quadro de honra. Nessa época meu pai decidiu que nos mudaríamos para São Paulo para ter maiores chances profissionais. Meu pai tinha uma casa de calçados e chapéus, vivíamos bem, havia fartura na alimentação, mas se economizava nas roupas. Quando me mudei para a capital tinha uma roupinha, um terninho, que era para domingo, para festa, o resto era calça com suspensório, feita em casa, tudo muito simples. Só os sapatos eram impecáveis, afinal meu pai tinha uma loja. Aliás, ele odiava que eu andasse descalço, o que adoro. O que vão pensar de você na calçada descalço? Filho de sapateiro sem sapato! Em 1945 eu, meu pai e meu irmão fomos para São Paulo. Minha mãe ficou em Pederneiras ainda um tempo. Ficamos morando em um ho tel por um ano até minha mãe e minhas irmãs se juntarem a nós. Meu pai estava bem de vida, havia vendido a loja e a casa e decidira ser sócio do meu padrinho de batismo em um entreposto de mercadorias por atacado na capital. Como não queria que perdêssemos o ano letivo, fomos imediatamente matriculados no colégio Alfredo Puca. Meu irmão queria ser contador; eu queria fazer o científico para depois cursar odontologia. Para mim era certo: eu ia ser dentista. Por quê? Porque a minha família tinha muito problema de dente, era uma coisa, tinha sempre alguém com o dente quebrado, com dor de dente, e os dentistas da minha terra eram de péssima qualidade. Não tinha nem consciência disso, mas sabia que alguma coisa estava errada e isso me fez tomar a decisão. Quando falei para meu pai que gostaria de fazer odontologia ele concordou imediatamente. Na época, faculdade era ainda algo elitista, pouca gente fazia curso superior, mas, tinhoso como sempre, fiz o científico, fiz o vestibular para a faculdade de odontologia e passei em 13º lugar. Disso não esqueço. Até que o burro em matemática tinha se saído bem, não é mesmo? Fui muito aplicado e me formei com 21 anos. Devo muito a meu pai, porque eu achava que precisava trabalhar e ele insistiu que eu me concentrasse nos estudos. Eu passava o dia inteiro na faculdade, a USP, naquele tempo, era tudo espalhado. Farmácia e Odontologia ficavam no Bom Retiro, em frente ao colégio de freiras Santa Inês. Era muito divertido porque nós, de jaleco, fazíamos o maior sucesso com as meninas, e namorávamos muito, era uma farra. Uma farra nos anos 1940, ou seja, com muito respeito. Tudo era tão diferente naquele tempo, imagina que eu adorava usar camisa esporte e os professores implicavam comigo, porque o normal era assistir as aulas de terno e gravata. Senhor Giovenazzi, o senhor pensa que isso é uma praça de esporte? – eles me diziam. Eu argumentava que estava calor, que ia colocar o jaleco, mas causava certa confusão com a minha rebeldia. Os primeiros colocados na faculdade tiveram como prêmio um emprego no Sesi. Eu escolhi fazer cirurgia como especialidade, porque havia feito pouquíssimas cirurgias na faculdade, e optei por trabalhar no Hospital do Ipiranga, que havia uma parte forte na área. Os pacientes relutavam em se submeter a mim, que era tão jovenzinho. Esse garoto vai me operar? Fui muito feliz nessa época, porque o hospital me deu um conhecimento mais amplo de odontologia. Logo depois abri meu próprio consultório na Vila Mariana, onde morávamos. Meu pai me emprestou o dinheiro e eu prometi que ia pagá-lo – e assim o fiz. Paguei tudo. Quando precisei de um aparelho de raios-X, a mesma coisa. Eu ia financiar o equipa mento, mas ele me deu o dinheiro, que depois foi reembolsado. Sempre fui muito sério nessas coisas relacionadas a dinheiro, emprestou, vai ter de volta com certeza. Calote para mim não é só material, é humano também. É desagradável porque envolve o emocional, os sentimentos, o respeito e a confiança. Enfim paguei tudo a meu pai, assim como pago a todas as pessoas. Se houve uma paixão a vida inteira entre mim e minha mãe, com meu pai foi diferente. Eu o conquistei ao longo da vida. Eu não fui o primeiro filho homem, nem o caçula. Estava no meio, no limbo. E decidi que ia conquistá-lo e consegui. O primeiro dinheiro que juntei comprei uma casa para os meus pais. Mobiliei, coloquei cortinas, tapetes e ele sabia que tudo aquilo era fruto do meu trabalho, que ele tinha me ajudado a conquistar. – Vou colocar o imóvel no seu nome, pai. – Não senhor, eu não quero, tem que estar no seu nome. Ele me fez ficar com a casa, eu queria dar mesmo, mas ele não aceitou, e ele tinha razão. Meu pai reconheceu o meu comportamento em relação a ele, viu que sempre estive próximo e atento. Quando ele morreu, deixou o seu relógio de ouro para mim. Aí tive certeza que eu o havia conquistado. Nossa!!!... Quantas lembranças... Sempre amei a odontologia, tinha um prazer enorme de devolver uma parte da vida perdida a alguns pacientes em virtude de problemas bucais. Tive um paciente chamado Elias, que, aos 18 anos, era completamente desdentado. Fiz uma dentadura para ele tão bonita, que mudou a sua vida, até namorar, coisa que não havia feito até então. Esses pequenos prazeres me faziam muito feliz. Aí caiu uma bomba na minha vida. Comecei a namorar Netinha, gerente de um ateliê de modas que pertencia a uma italiana, Madame Taranto. Um dia nós estávamos dançando num bailinho da tarde, e ela falou assim: – Ah! Ednei, eu tenho uma vontade de fazer teatro. Então porque você não faz? É, mas eu queria teatro amador, não queria pro-fissional. Poderíamos até ganhar algum dinheirinho para ajudar uma instituição de caridade. Achei a ideia interessante, ela foi na EAD, Es-cola de Arte Dramática, procurar alguém que a ajudasse na direção, mas acabou não dando em nada. Depois ela foi convidada por um clube de teatro, existiam muitos na época, para fazer uma peça. Eu nem me interessei porque não tinha tempo. Um dia fui pegá-la no ensaio, num sábado, e havia faltado um ator. Você não quer ler o papel de um ator, só para ajudar a gente a ensaiar? Fui lendo, as pessoas me elogiaram e no final alguém falou: O cara adoeceu, disse que não quer mais fazer o papel. Fui convidado e aceitei. E era assim, você ensaiava muito e fazia uma apresentação só, acabou. As pessoas pagavam uma mensalidade para o clube e viam os espetáculos. No dia da minha performance, convidei meus pais para assistir. Quando cheguei em casa: – Que tal pai, gostou? – Por que você estava todo curvado daquele jeito? Ué pai, o cara tem 60 anos. Eu tenho 60 e sou curvo daquele jeito? Foi a minha primeira crítica, eu tinha 23 anos e resolvi interpretar um velho de 60 bem tortinho. Depois disso aprendi a entrar em cena sempre ereto. E continuo assim nos meus 79 anos. Agora é hora de uma confissão: na verdade, esta não foi a minha estreia de fato. Na faculdade de odontologia havia um show no dia 25 de janeiro (o centro acadêmico se chama 25 de janeiro) e a gente competia com a turma da Medicina. Eles já se consideravam superiores à gente, apesar de médico e dentista terem a mesma importância, se um dos dois não fizer bem seu trabalho é um caos. A diferença é que dentista não mata seu paciente. Bem, mas disputas à parte, havia um calouro, Pascoal Amirate, que entendia de teatro, falava sobre Shakespeare, tinha bastante informação e decidiu que ia dirigir o show. Tenho fotos desse Romeu e Julieta, onde eu fazia... a Julieta. Era uma época tão pudica que as meninas não podiam fazer os shows. Depois fiz a Rainha Gertrudes, mãe do Hamlet. Aliás, na hora que Gertrudes caiu morta no palco e o rei também, quando eu mexi o meu dedão senti uma coisa molhada. O rei havia caído com a boca aberta no meu dedão. Na verdade tudo era uma farra, uma brincadeira, uma coisa sem compromisso, mas muito divertida. Não me sentia também compromissado com o teatro amador, embora levasse a sério. Eu tinha a minha profissão e muito me orgulhava dela. O teatro amador era muito forte nessa época, era nele que os diretores que estavam começando, como Zé Celso, Antunes, iam procurar atores para suas montagens. Eu era muito convidado, mas deixava claro que fazia teatro por hobby, para me divertir. Eles ficavam furiosos comigo, mas não havia maldade quando eu dizia que buscava diversão. Aliás, para dizer a verdade, até hoje se eu não me divertir, se eu não relaxar, não dá para atuar bem. Gosto de me emocionar, jouer, como se diz em francês, é um eterno brincar mesmo que a sério. Mas, enfim, depois trabalhei com todos eles. Mas quem despertou mesmo a minha vontade de ser ator, foi Antônio Abujamra, e ele é uma pessoa muito importante na minha vida. Com ele, aprendi a valorizar o teatro e saber da sua importância social. Eu achava a minha profissão, como odontólogo, algo construtivo, que me permitia resolver problemas das pessoas: elas riam, falavam, mastigavam e se relacionavam melhor depois que eu entrava na vida delas. Eu sabia que tinha uma função na sociedade. Especialmente quando me especializei em ortodontia preventiva, quando tive a oportunidade de trabalhar com o coletivo, largar um pouco o atendimento individual, e isso muda muito a cabeça da gente, porque você passa a ser uma pessoa mais preocupada com o social. Já o teatro eu achava que era estranha essa necessidade de se expor como um macaquinho amestrado. Achava meio uma vaidade louca ficar me expondo. Vou ser ator só por vaidade? Com Abujamra percebi que o teatro bem feito e com bom texto não era só vaidade e sim uma profissão digna. Foi pela minha relação com Abu jamra – diretor –, que percebi que podia ser feliz no teatro e trazer felicidade para as pessoas. Aí veio uma grande dúvida: meu pai batalhou para eu ser dentista, não me deixou trabalhar, bancou tudo. Como é que eu vou jogar fora uma posição, como é que vou poder dar uma força para o meu pai, para os meus irmãos que eram mais velhos, eu não tenho esse direito de dar esse calote, o tal calote, na minha família. Aí eu conciliei por alguns anos o teatro com a odontologia. Conciliei tanto, que comecei a adoecer, não tinha dor alguma, mas desmaiava. Um dia eu desmaiei na rua, e fui socorrido pelo meu amigo Marcos Toledo que estava passando. Meu pai foi um dia no consultório, Ana Maria, minha secretária, que é amiga minha até hoje lá em São Paulo, me avisou: Dr. Ednei, o Seu Salvador está aí. Eu falei: O quê ele veio fazer? Não sei, diz que quer falar com o senhor. Está bom, depois desse paciente você pede para ele entrar. Ele entrou, pediu desculpas por estar interrompendo meu trabalho, garantiu que ia ser breve e me perguntou: – Você gosta de teatro verdadeiramente? Gosto verdadeiramente. Por que você não vai fazer teatro verdadeiramente? Você tem que viver a sua vida, tem que ser só feliz. Busca a sua felicidade. E eu fiz isso, fui dispensando os clientes, mandando para colegas meus, para não deixar ninguém descalço, aluguei o consultório, pedi demissão do emprego do INPS, onde eu era concursado. Por isso que ser ator para mim é muito importante, é razão da minha vida. Eu paguei um preço alto para ser ator, e ninguém tem a obrigação de saber, mas disso não me arrependo. Fui buscar a minha felicidade e a encontrei. Capítulo III Vanitas, Vanitas, Vanitas Sou imune à vaidade? Claro que não. Eu sou vaidoso de ser reconhecido como um bom ator. Já a questão de ser reconhecido porque trabalho na televisão, eu dispenso. Continuo achando que ser ator só por vaidade é meio mixuruca. Há que se domar a vaidade. Muitos anos se passaram desde que optei pela arte, mas o pensamento continua o mesmo. Não demorei muito para descobrir que a minha função como ator era tão importante quanto a de sanitarista. Bastou ler um pouquinho de Brecht. Hoje tenho certeza de que tenho uma missão como ator, embora nem sempre os textos propiciem isso. Por muitas vezes você cai no terreno da banalidade. Agora que estou velho venho evitando ao máximo isso. Por isso prefiro o teatro, porque nele escolho mais o que vou fazer. No cinema e na televisão eu sou escolhido e nem sempre fico feliz. No momento, optei pela televisão, porque o SBT me quis para fazer Uma Rosa com Amor: meu personagem é um velho italiano e isso me proporciona o prazer de me reencontrar com as minhas origens, além de ser um bom texto de Vicente Sesso e adaptação de Thiago Santiago. Sei que é hora de voltar à televisão, porque muitos jovens não sabem quem eu sou, e preciso despertar o interesse deles para que apareçam para me ver no teatro. Para a velha-guarda não preciso mostrar mais nada, ela me conhece bem, já sabe tudo da minha vida, se interessa, vai ver os meus espetáculos e acha ruim quando demoro a aparecer na TV. Em viagem recente, sentei ao lado de um casal do Paraná que estava indo para Búzios em lua de mel. Desejei felicidades para eles, que não me conheciam. Vocês não me conhecem mesmo, jovenzinhos assim, mas seus pais me conhecem. Quando descemos no saguão fizemos uma foto juntos para eles levarem para seus pais. Se fico magoado? Claro que não. Absolutamente. Eu tenho consciência da realidade e não me deixo enlouquecer por causa da vaidade. Em momento algum. Moro em Copacabana, quem faz as compras da casa sou eu, e não quero ser o artista, quero ser o vizinho, adoro a convivência com as pessoas sem o distanciamento, é gostoso, me enriquece, me inspira e me desafia. Não sou o falso humilde que diz: sou uma pessoa tão simples. Sou complicadíssimo, e qual ator não é? Mas sei distanciar meus personagens da minha pessoa e fico até meio irritado com quem coloca confetes e serpentinas na própria vida. Se o trabalho não é suficiente para suprir a vaidade há quem precise ser endeusado na vida. Não é o meu caso. Definitivamente. Falo com tranquilidade, para quem me perguntar, a minha idade: 79 anos muito bem vividos. Na verdade eu nunca menti idade, mas em determinado período da minha vida, na virada dos 50, comecei a não gostar muito de falar sobre o assunto. Nunca me considerei bonito e nem fiz a minha carreira em cima disso. As pessoas diziam que eu era charmoso. Com certeza, até os 50 anos você mantém um toque sensual, pode não ser bonito, mas permanece atraente. Depois dos 50 entra numa fase meio indeterminada, não é jovem para fazer par romântico, nem velho para ser o pai e começa a perder papéis. Nesse momento queria falar sobre tudo, menos sobre idade. Se não mentia, mudava de assunto, desconversava. Depois dos 60 anos, relaxei e comecei a falar abertamente a minha idade, até com certo orgulho. Hoje não tenho obrigação alguma de fotografar bem. Não preciso ser bonitinho, nem ao menos charmoso, só não posso ser um velho caquético, malcuidado, com os dentes estragados, aí vira falta de higiene. Eu me recuso a ser um velho caído. Eu acho tão bonito ver velhinhos, meus companheiros de idade, bem empinadinhos e cuidadinhos. Outro dia fiquei feliz da vida, porque estava no shopping Frei Caneca – meu apartamento em São Paulo é bem pertinho de lá – quando Ferrara, um diretor de teatro que dá aula na escola do Wolf Maia, gritou meu nome e quando me aproximei ele comentou que estava impressionado por me ver andando tão ereto, jovial. Contei então, meu segredo, aliás da dra. Mariana Jacob, uma grande geriatra, com quem fui me tratar na faixa dos 50 e quando estava me achando muito velho. Ela me disse que uma das obrigações era caminhar sempre ereto, para quem me visse por trás tivesse a certeza que era um jovem. Quando eu me virasse, surgiria o velho. Aí me lembrei do meu pai, me repreendendo por fazer um homem da sua idade todo curvo – já até contei esta história, lembra? – juntei os dois conselhos e uso-os para o resto da vida. Ninguém vai descobrir que sou um velho se me vir por trás, andando empinado. Vaidoso, sim. Eu me questiono muito com relação à vaidade. Estou sempre tentando refletir sobre o meu comportamento. Há momentos em que me sinto vaidoso por estar realizando bem o meu trabalho, saem as críticas e meu nome não é nem citado – isso aconteceu recentemente em Maria Stuart. Eu me perguntei muito se o que sentia era somente vaidade ferida, mas depois de muito pensar, cheguei à conclusão que não era um problema de ego, mas sim de se sentir desrespeitado. Eu não tenho inimigos, mas tem gente que não gosta de mim, tenho consciência disso. Acho que os críticos estão nessa categoria. Eles não têm muita simpatia por mim. O que posso fazer? Tenho de aceitar. Mas prefiro que eles falem mal de mim, porque têm todo o direito de não gostar do meu trabalho, mas não podem ignorar a minha presença. Isso realmente me magoa. É um ato de amor abrir o teu coração, tua alma, teu corpo em público, e isso precisa ser compreendido assim. Gosto quando me criticam, mesmo que negativamente, porque paro, penso, reestudo e mudo. Não sou monolítico, não estou pronto nunca, nunca algo está acabado para mim. Mas acho que não quero mais falar sobre isso. De uma coisa tenho certeza, vaidade demais atrapalha. É uma doença que pega, muito perigosa, essa que faz o ator e a atriz quererem ser sempre os belos e os bons. O artista em nome de “defender” (bem entre aspas) o persona-gem, não o faz, ignora o seu lado negro, o lado maldito. Não estão defendendo o personagem, e sim a sua imagem pessoal. Isso é um alerta para as atrizes e os atores mais jovens. Cuidado, porque esses vícios estão na televisão. E não dá certo, todas as más que se fizeram na televisão, absorveram completamente a maldade, isso é o certo, você tem que se entregar. Se te dão a megera, cai dentro. Se você é o vilão, mergulha. Tem de fazer, e bem, como Patrícia Pillar em A Favorita, que assumiu a loucura, o prazer em ser má. Já fiz um personagem assim, Paulo Bacelar, na novela A Grande Mentira, ele tinha tanto prazer na maldade que ria. E o público vivia me pedindo para dar a risada dele. Werner Herzog em uma entrevista recente disse que lutou muito para que determinado ator fizesse um personagem do mal com prazer. Segundo ele, e concordo inteiramente, quando a maldade é feita com prazer ela libera, porque tira de você o que existe de pior, faz com que você a sublime. Não estou me vangloriando, mas fico feliz e vaidoso, por que não?, em ver um diretor do tamanho do Herzog avalizando – sem saber, é claro – algo que fiz há 40 anos. Não tenho medo de ir fundo nos meus personagens – seja para que lado eles penderem. Essa falsa defesa do personagem é ainda uma injustiça com seus companheiros de cena, com o autor que ficou horas escrevendo uma cena e com o público que quer ver uma obra com todas as características do ser humano. Mesmo no teatro hoje se vê muita gente não fazendo os personagens, preferindo disfarçar a barra pesada. Que engano! Isso é péssimo para o espetáculo e horrível para a pessoa, que fica limitada, chata, desagradável, porque não é honesta. Atores, hora de acordar! Se não gosta do personagem, se recuse a interpretá-lo. Não vale ficar camuflando, escamoteando, porque é imaturo e de uma vaidade boba, pequena. Experimentamos as grandes vaidades e deixamos a mixaria de lado. Eu, com certeza, enquanto e onde puder escolher meus personagens vou preferir os vilões, os maus, os angustiados. Não é à toa que meus ídolos sempre foram Orson Welles e Paul Muni. Já Clark Gable e Cary Grant faziam sempre o mesmo pa-pel: de Gable e Grant. Neles, jamais me espelhei. Já me perguntaram muitas vezes porque eu não dirijo. Porque na realidade não satisfaz o meu ego a posição passiva do diretor. Vanitas Vanitatum Et Omnia Vanitas – tudo é vaidade, para usar mais uma citação bíblica. Não posso ter vergonha de confessar isso, mas eu quero ser desafiado na frente do público, e receber vaias ou aplausos, prefiro isso, que me excita, me estimula a viver, assim eu me sinto VIVO. Capítulo IV A Vida no Teatro Minha estreia no teatro amador foi na peça O Sábio, de Joracy Camargo. A partir daí não parei mais: fiz Pirandello (O Homem da Flor na Boca e A Morsa), Rachel de Queiroz (Beata Maria do Egito), Antonio Callado (A Cidade Assassinada), Tennesse Williams (Demorado Adeus) entre tantos outros. Ganhei até prêmio de melhor ator no Festival de Teatro Amador na TV, realizado pela Tupi. Teatro amador era uma coisa muito séria, todas as peças que eram encenadas no TBC, depois eram montadas por grupos de teatro amador. Havia muitos, dentre eles, o Teatro Experimental do Sesi onde fiz vários trabalhos. Foi lá que conheci Osmar Rodrigues Cruz, um grande idealista, que vivia, respirava e fazia tudo pelo teatro. Eu devo muito a ele a minha formação de ator e certo bom gosto na escolha de textos. O teatro amador foi, sem dúvida, um grande exercício que me deu estofo para seguir adiante. Eu gostava do que fazia, me divertia, mas ao mesmo tempo pensava que estava em terra de cego e era rei porque tinha um olho. Um lado meu não queria se profissionalizar, mas havia outro que gostaria de ser testado no teatro pro fissional. Comecei a fazer aulas de voz com Alice Pincherle, mãe da Nydia Licia, sogra de Sérgio Cardoso e de corpo com Márika Gidali. Estava cada vez mais interessado em testar os meus li-mites. Nesse momento de indecisão sobre seguir ou não carreira no teatro profissional surgiu um convite para fazer uma peça no Teatro de Arena – A Mulher do Próximo, de Sidney Howard, com direção do Zé Renato. Chico de Assis era o protagonista, Sadi Cabral fazia um velho e eu, um padre. Naquela época estava na moda falar mal da religião, o ópio do povo, dos padres, a igreja católica ainda não tinha se aproximado dos movimentos de esquerda e decidiram que, para criticar meu personagem, ele estaria sempre bêbado em cena. Eu achei bem engraçado e me divertia muito. Eu não tinha um real engajamento político na época e era considerado pelos meus pares um burguesão: dentista, consultório, emprego público, um burguês com todos os defeitos. Ao mesmo tempo eu via tudo com olhos muito críticos: Chico de Assis era o protagonista e ganhava quase nada, dormia no teatro, ao mesmo tempo chegava a esposa de alguém com um anel de brilhantes que havia ganhado do marido. Isso me revoltava. Quando terminou a temporada queriam que eu permanecesse no grupo e fizesse Laerte em Hamlet. E até me ofereceram um salário muito maior do que pagavam aos outros, o que me irritou mais ainda. Não aceitei, saí do Arena e confesso que fiquei meio desgostoso com o teatro profissional. Se é isso, não quero fazer mais. O burguês, de certa forma, naquele momento tinha mais consciência do que muitos engajados. Quando estava decidido a continuar na minha vida de dentista, Abujamra apareceu na minha vida e me convidou para fazer Sorocaba Senhor, uma adaptação feita por ele de Fuente Ovejuna, de Lope de La Vega. Era também uma peça politizada, que criticava o poder – e podia ser diferente na época? – com Berta Zemel, Emílio di Biasi, Sérgio Mamberti, Antonio Gighoneto, Volnei de Assis. Eu fazia o protagonista, o Coronel. Estreamos no Teatro Leopoldo Fróes e Abujamra, que também dirigia o espetáculo, veio com uma inovação, um palco giratório, com motores. No dia da estreia ele simplesmente não girou. Nós ficamos com um pé em cima, outro embaixo, girando o palco, como se estivéssemos andando de patinete. Mas naquele momento, por causa do Abujamra, eu comecei a amar o teatro e por isso ele é tão fundamental na minha vida. Em seguida, José Celso Martinez Corrêa me convidou para fazer Andorra, de Max Frisch. Eu não estreei a peça – inclusive vi a primeira noite com Fauzi Arap, maravilhoso em cena, um ator grandioso. Quando Fauzi saiu para filmar O Padre e a Moça com Joaquim Pedro de Andrade, Zé Celso me convidou para fazer o espetáculo. Era um personagem lindo, o mestre-escola, que me deu muito prazer. E foi delicioso também dividir o palco com Miriam Mehler, aí ficamos amigos. Foi um espetáculo enriquecedor. Já havia trabalhado com Zé Renato, com Zé Celso, era hora de encarar Antunes Filho: A Megera Domada, de Shakespeare, com produção de outro grande diretor, paixão de Aracy Balabanian, Ademar Guerra. A montagem era uma obra-prima, cenários e figurinos de Maria Bonomi. Eu fazia o prólogo, junto com Armando Bógus e Odavlas Petti, depois um criado que entrava em cena pendurado em uma corda e também o pai de Catarina e Bianca, interpretadas por Irina Grecco e Regina Duarte, estreando no teatro. Seu Jesus, pai da Regina, me deu uma missão: levar todos os dias Regina para casa, ela era uma menininha frágil, com um sorriso lindo, encantadora, uma queridinha e a tarefa foi muito agradável. Foi nessa época que comecei a ter sintomas de estafa, comecei a desmaiar. Um dia não teve espetáculo por minha causa, os neurologistas me encheram de remédios, tomava um para dormir de noite e outro para acordar, ficar vivo, pela manhã. Fui obrigado a pedir substituição. Mas como já contei, meu pai me empurrou na direção certa e logo depois eu estava dedicado ao teatro com todo o meu corpo e minha alma. Não sei dizer exatamente quando parei de vez com a odontologia, nem sei mesmo que peça estava fazendo, talvez tenha apagado da minha memória – que, mesmo com a idade, é muito boa. Às vezes me pergunto se até hoje ainda tenho dúvidas. Não, tenho não! Queria abrir um parêntese aqui para falar de Antunes Filho. Ele talvez seja o diretor que mais influenciou toda a minha carreira. Para mim, ele é o melhor diretor do Brasil. Vivia me fazendo perguntas – por quê? – que me surpreendiam porque eu não tinha as respostas. Ele me dizia que eu não podia ter dúvidas quanto à minha inflexão. Precisava saber por quê. Não podia levantar a mão impunemente sem que aquilo tivesse um sentido. Isso me fez ser um melhor ator e seus questionamentos permanecem comigo até hoje. Eu me questiono muito a cada dia. Na hora de dormir, quando estou fazendo uma peça, repasso mentalmente todas as cenas para ver se eu fiz bem, se fui correto, se foi bom. Aí vem tudo, o que eu senti, o que eu falei, como é que eu falei. Depois dou uma rezadinha, uma coisa curta, e durmo. Pronto para um novo dia. Os Inimigos, de Máximo Gorki, foi meu próximo trabalho em teatro, mais uma vez com Zé Celso. Já na leitura aconteceu algo inesperado: eu faria um dos dois industriais, Lineu Dias era o outro. Hoje não faria o que fiz, mas quando acabou a leitura eu disse para Zé Celso: eu não tenho nada a ver com esse personagem, eu vou ter de fazer algo construído, não tenho temperamento para interpretá-lo. Ele me perguntou o que eu gostaria de fazer e eu disse que queria interpretar o Iacov, irmão de um dos donos de indústria, casado com uma atriz, por quem é apaixonadíssimo, alcoólatra e impotente. Quando a peça começava, em um amanhecer, Iacov saía rolando pelo palco, passara a noite bêbado, uma maravilha. Zé Celso topou e mandou que eu fizesse uma leitura com a Célia Helena, já no novo personagem. Quando começamos a ensaiar via o Zé Celso balançar a cabeça negativamente nas minhas cenas. Ele olhava para o Renatinho Borghi, que nem estava no elenco e fazia uma expressão de Ai saco! O quê esse cara está fazendo? Ele brigava comigo e dizia: Porra, você está fazendo demais, você está sofrendo muito, cara. Não é nada disso, é terceira pessoa, é Brecht, é ele, não você. Eu não sabia como fazer aquele homem, com tanta carga emocional, na terceira pessoa. Um dia pedi pelo amor de Deus que Fauzi me ajudasse, expliquei que estava desesperado e que o Zé Celso estava muito impaciente comigo. Fauzi foi ver o ensaio, saímos caminhando da Major Diogo até o Teatro Municipal, sentamos na escadaria, fazia um frio danado e o Fauzi foi me dando uns toques para ver se eu acertava o personagem. Quando faltava uma semana para a estreia, o Zé Celso falou: gente, o espetáculo não anda, está ruim, vamos fazer um laboratório. Ou seja, ele ia passar tudo para a primeira pessoa, saía Brecht e entrava Stanislavski, exatamente o que eu estava fazendo desde o começo, aí relaxei. Na pré-estreia da peça para estudantes, Miriam Muniz, que fazia a produção, distribuiu uma pesquisa para a plateia, com várias perguntas: O que você acha do autor? E da direção? E dos atores? Quando terminou o espetáculo eu estava no camarim com Lineu Dias quando ouço gritar do topo da escada – no TBC os camarins são no subterrâneo. Era Miriam gritando lá de cima, com seu jeitão debochado: Gente, imagine de quem eles mais gostaram? Do Ednei. Era real-mente um deboche, e eu fiquei tão triste, tão machucado, que mesmo fazendo sucesso – na hora do agradecimento, as pessoas da primeira fila se levantavam e vinham me cumprimentar – quando acabou a temporada eu precisei fazer análise. Você acredita nisso? Eu fiz um sucesso e não foi me dado o direito de usufruir dele. Eu preferi acreditar neles e não no público. Ator é bicho esquisito mesmo, 99 pessoas gostam de você, mas se uma não gosta, basta para desencadear uma infelicidade sem fim. Aliás, achei análise uma coisa bem interessante, mas fiquei pouco tempo porque sempre tive uma cabeça muito boa. Duvido que meus colegas de Os Inimigos se lembrem disso, mas posso dizer que foi algo que me marcou profundamente. Na realidade eu era um vencedor, só que não tinha consciência disso, eles conseguiram destruir o meu sucesso. E o que se quer mais na vida? É o sucesso. Estava tão envolvido com teatro que decidi ser sócio do Emílio Fontana em uma casa de espetáculos. Compramos uma loja em uma galeria na Rua Augusta, que transformamos em um teatro – o Teatro da Rua. Estreamos dois espetáculos lá – Dois Perdidos em Uma Noite Suja, de Plínio Marcos, e Zoo Story de Edward Albee. Eu estava no elenco desta última, junto com Libero Ripoli. As pessoas viam as duas peças em seguida uma da outra e saíam de quatro com tanta barra pesada – ambas tinham um ato, mas eram longas. Quando vendi a minha parte no teatro fui pago com notas promissórias, que jamais foram recebidas. Encerra aí a minha pequena carreira como dono de teatro. Eu me reencontrei com Emílio Fontana quando ele decidiu dirigir O Santo Inquérito e me convidou para ser o protagonista, o padre. Não foi um sucesso, em especial pela escolha da atriz para fazer Branca Dias, ela jamais podia ter feito o personagem. E eu tinha um problema especial nesta montagem, o produtor era aquele que não havia honrado as promissórias quando vendi minha parte no teatro. Eu tinha medo que ele não me pagasse o porcentual da bilheteria que havíamos combi nado – eu tinha razões de sobra para desconfiar. Sabe o que eu fazia? Ficava pronto para entrar em cena, esperava chegar o meu dinheiro, não entrava até receber. Até eu me surpreendo com esse meu temperamento. E todo o dia vinha um garoto, me entregava o porcentual, eu conferia, colocava no bolso da batina e só aí a peça começava. Que temporada horrível! Mas eu precisava dar uma lição naquele que havia me dado um calote – novamente falamos de calote! Aquela minha imposição fazia com que ele todos os dias recebesse a mesma mensagem: eu não confio em você. Sou um homem gentil, mas tudo tem um limite. Ah, um ponto positivo, que me fez adorar alguns momentos: o texto belíssimo do Dias Gomes. Só por isso valeu a pena tanto constrangimento. A primeira e única vez que trabalhei com Ruth Escobar foi em O Versátil mr. Sloane, de Joe Or-ton, com direção de Antonio Gighoneto. Como atriz, Ruth era bem interessante. Em linhas gerais, a peça fala de dois irmãos: uma mulher cinquentona, mas metida a garotinha, ninfomaníaca, e um homem, homossexual, que não mora na mesma casa, mas aparece de vez em quando por lá. Aí surge na vida deles um homem lindo – e era mesmo, Fúlvio Stefanini, louro de olhos azuis, deslumbrante – que começa a perturbar os dois irmãos, ambos querem namorá-lo. Mas o velho pai reconhece o visitante como o assassino de um fotógrafo e a violência se instaura na casa. O velho acaba morto, mas os irmãos fazem um pacto de não denunciar o assassino, desde que ele se alterne seis meses com cada um deles. Olha que coisa mais louca! Totalmente amoral e atual. Ruth estava muito insegura e convidou Cacilda Becker – a grande Cacilda! – para ir ver um ensaio. Cacilda foi, deu a maior força para Ruth, uma colega incentivando outra. Todos os grandes têm um lado maravilhoso. Podem ter até um lado podre, mas a grandiosidade ofusca isso, não é mesmo? Ruth fez o personagem brilhantemente e sempre que nos encontramos rola um frisson por termos partilhado de um momento tão intenso e bom. Em Os Últimos, de Gorki, voltei a trabalhar com Abujamra. Era um papel pequenininho, uma participação. Os protagonistas eram Nicete Bruno e Paulo Goulart. A temporada foi no Teatro Cacilda Becker, que era na Federação Paulista de Futebol. Tudo correu muito bem, Paulo e Nicete são um casal do bem, da paz, da tranquilidade, tudo corre suavemente quando eles estão por perto. E o Abujamra? Sempre quero trabalhar com ele. Naquela época ele era menos enlouquecido do que é hoje. Enlouquecido no melhor sentido, eu amo Abujamra, admiro seu imenso talento criador e quero estar sempre próximo dele e da Belinha, o perfeito exemplo de que sempre por trás de um grande homem tem uma grande mulher. Belinha merece uma estátua em praça pública, uma homenagem mais do que merecida. Abujamra fica um bebê ao lado dela, que calça suas meias, faz carinho, coloca-o no colo e brinca de casinha. Ela é de uma entrega absoluta, mas de uma entrega feliz, isso que eu acho lindo nela. Belinha está além de todos os preconceitos. Se ela faz com que ele seja mais feliz, ele também dá uma puta alegria para ela, com seu intelecto brilhante, seu raciocínio lúcido, seu despudor e irreverência. Viver com Belinha é um privilégio para Abujamra. Conviver com Abujamra é um privilégio para Belinha. E os dois sabem disso muito bem. Eu amo loucamente os dois. A eles, o meu carinho eterno. Mas nem tudo são só amores. Às vezes há dores. Participei de uma remontagem de A Alma Boa de Setsuan, com direção de Benjamim Catan. Na verdade, foram mantidos todos os elementos da montagem anterior de Flaminio Bollini com Maria Della Costa e Eugênio Kusnet. Eu fui fazer o mesmo papel do grande mestre Kusnet, um dos deuses. O outro deus era o Celso Nunes, ator recém saído da EAD, antes de se tornar o brilhante diretor mais tarde. Havia ainda um terceiro deus, que era feito por um ator que faço questão de não me lembrar o nome. Ele se tornou o meu inferno nesta peça. Os três reis saíam meio combalidos de cena em determinado momento, um se apoiando no outro. Este garotinho, o terceiro rei, me pegava pela gola na altura do pescoço, se apoiando totalmente e isso me sufocava. Pedi encarecidamente que ele pegasse na manga, na altura da cintura, qualquer coisa, menos que me deixasse sem respiração. No dia seguinte, ele fez igual. E no terceiro dia. Aí resolvi avisar: se você hoje em cena fizer outra vez, eu vou te dar um soco na cara. E ele fez. E eu dei um soco na cara dele. Foi a primeira e única vez que tive uma atitude violenta no teatro. Maria Della Costa não falou nada, nem seu marido, também dono da companhia, Sandro Polônio. Eles me conheciam bem e sabiam que eu não poderia tolerar aquele desrespeito. O Balcão foi meu primeiro espetáculo no Rio de Janeiro. Já havia sido montado em São Paulo lindamente, com direção de Victor Garcia e produção de Ruth Escobar. Martin Gonçalves, um homem brilhante, bem informado, sabia tudo de teatro, me convidou para participar da montagem carioca. Na verdade, o espetáculo já estava praticamente montado quando entrei, faltavam 15 dias para a estreia. Quando cheguei para o ensaio, estavam lá Maria Fernanda, Oswaldo Loureiro e Carlos Vereza que me contaram que o ator que faria o emissário não conseguia decorar imensos monólogos. E que por isso tinham pensado em chamar um ator de televisão. Olha que curioso! Em São Paulo era considerado um ator eminentemente do teatro e é realmente o que sou, profundamente ligado ao palco, mas aqui no Rio fiquei sendo um homem de televisão. Acho que isso perdura até hoje. Bem, comecei a ensaiar, foi um pega para capar, uma loucura absoluta. Estava fazendo uma novela ao mesmo tempo e avisei ao diretor, Régis Cardoso, o dia da estreia e ele me garantiu que não haveria problema, seria liberado a tempo. Sete horas, eu estava no estúdio. Meia hora depois, a mesma coisa. Comecei a ficar muito nervoso e decidi ir à sala de corte falar para o Régis que não ia gravar mais. Quando abri a boca, a voz não saiu, estava completamente afônico, tamanha a tensão. Cheguei no teatro, mais tenso ainda, me sentei na bancada para fazer a maquiagem: o diretor queria que eu fizesse um risco preto em volta do rosto, como uma máscara. Fui me maquiando, sem saber o que iria acontecer. Vereza se aproximou com um copo de leite morno na mão, vai te fazer bem, tomei, comecei a fazer uns exercícios e a voz voltou. Na hora não percebi direito, mas logo depois entendi que aquele gesto de carinho do Vereza tinha sido fundamental. Eu havia sido tão maltratado na televisão que aquele pequeno gesto de um colega tinha feito com que eu rejuvenescesse. Eu não sabia muito bem como era o espetáculo inteiro, nem mesmo quando acabava um ato e começava o outro, sabia mesmo a minha deixa. Na estreia, já com a voz recomposta, entrei, fiz o meu monólogo e quando saí de cena ouvi os aplausos. Pensei que havia acabado um ato. Só depois fui saber que havia sido aplaudido em cena aberta. Quando a crítica saiu, o espetáculo foi classificado como arrastado e que meu monólogo era a razão para a plateia acordar. Um colega ficou bem chateado comigo, mas Maria Fernanda me defendeu com veemência. Nesse espetáculo conheci Hélio Eichbauer e me apaixonei por seu trabalho. Acho um privilégio ter esse menino aqui no Brasil. Ele não é mais menino, mas não importa, para mim será sempre jovem, de tanto talento que tem. Meu trabalho seguinte foi também com Martin Gonçalves. A peça era O China, de Shisgall Murray. A história era muito louca, um casal de chineses que tinha um filho louro de olhos azuis. Minha mulher era Jurema Penna, uma atriz baiana, de olhos amendoados como os meus. Nosso filho era o Heleno Prestes. Passei um mês frequentando a Embaixada da China, onde eles fizeram a gentileza de me apresentar a uma pessoa que pudesse me ajudar na leitura e na pronúncia do texto. O chinês não tem letras como no nosso alfabeto, eu precisava decorar os sons, e estes sons variam de sentido de acordo com a entonação e a expressão do rosto. Que coisa linda! É uma língua emocional. Se você falar sorrindo tem um sentido. Se falar de cara amarrada, outro. Enfim, passei um mês em cima disso. No dia da estreia a primeira pessoa que entrou no camarim foi meu querido Jardel Filho: nossa, que maravilha. Você inventou um sotaque que parece até que você está falando chinês... Apesar do meu esforço, de um elenco delicioso, muito queridinho, a peça foi um enorme fracasso, talvez o maior da minha carreira, não ficou nem um mês em cartaz. O público não embarcou na história, não entrou no jogo, mas foi uma grande experiência em todos os sentidos. Um Bonde Chamado Desejo foi uma grande oportunidade de firmar a minha amizade com a queridíssima Eva Wilma. Nós havíamos feito juntos a novela Barba-Azul, quando Kiko Jaess me chamou para fazer o Mitch na peça de Tennesse Williams. Nuno Leal Maia era Kowalski e Vivinha, Blanche Dubois. Sabe quem era assistente de direção na peça? Denise Stoklos. Eu gosto muito de perguntar sobre o meu personagem para os assistentes, pessoas que assistem a todos os ensaios, mas faço isso um pouco distante dos diretores, porque senão eles ficam enciumados. Em Um Bonde eu buscava esse feedback com Denise, cada dado novo que colocava no personagem perguntava o que ela tinha achado. Quando achava legal, ela me dizia; noutras vezes me orientava. Foi uma relação muito legal. Passaram-se uns anos e ela se tornou a maravilhosa artista que é, e tenho o maior orgulho de ter percebido que aquela garotinha a quem pedia conselhos tinha uma sensibilidade extraordinária. Eva Wilma é uma pessoa muito especial, bacana, sensível, educada ao extremo e educação é bom e como gosto. Quando terminou a temporada de Um Bonde Chamado Desejo, Vivinha me convidou para ir com ela num fim de semana a Buenos Aires. E lá fomos nós, felicíssimos. E quem apareceu por lá? Carlos Zara. O namoro deles estava começando a ficar público e partilhei muitos momentos do casal, dois amigos muito queridos que muitas vezes se encontravam no meu apartamento da Rua Frei Caneca. Ficávamos lá, conversando, tomando vinho até tarde da noite. Ai, que saudade! Eu não havia me desligado totalmente da odontologia nessa época. Fazia um trabalho que adorava: uns filmetes na TV Cultura com mensagens sobre prevenção de problemas bucais. Economicamente ser funcionário público era um caos, mas era um trabalho muito interessante, que me empolgava, me interessava, era prazeroso, eu redigia, inventava historinhas, dirigia e punha no ar. Às vezes eu apresentava, noutras mostrava uma criança para dar mais veracidade. Ganhava quase nada, mas ficava feliz em colocar os tapes debaixo do braço e convencer os diretores comerciais a exibir os programetes em datas como o Dia das Crianças e Semana dos Bons Dentes. Cheguei a conseguir um patrocínio para fazer uma campanha de seis meses, com três inserções diárias em cadeia nacional na Globo, mas a Secretaria de Cultura, por problemas políticos, me proibiu. Tenho uma birra com governos em geral por causa disso, são incapazes de abandonar briguinhas partidárias e problemas políticos por um bem maior. Mas eu contei tudo isso só para chegar no meu trabalho seguinte no teatro. Em uma das vezes em que estive no departamento comercial da Globo, o diretor me disse que tinha visto uma peça em Londres que é a sua cara. O nome: Equus, de Peter Shaffer. Consegui a peça em inglês, meu amigo Lineu Dias traduziu o primeiro ato e fiquei enlouquecido com o texto. Era realmente a minha cara. Fui na Sbat, na Avenida Ipiranga em São Paulo, saber sobre os direitos da peça e descobri que eles já haviam sido comprados pelo Celso Nunes. E Paulo Autran convidado para o espetáculo. Em resumo, eu estava ferrado. A peça estreou, era um espetáculo magnífico e nada me restava. O que podia fazer? Um dia toca o telefone da minha casa, era Celso: Você ainda está interessado em fazer Equus? Paulo está cansado, quer parar... Aceitei imediatamente. Fui com o maior prazer viver o psiquiatra; Ricardinho Blat substituiu Ewerton de Castro, que fazia com Paulo Autran. Cristina Pereira também estava no elenco. Substituir Paulo Autran, é claro, foi um peso, eu respeitava muito seu trabalho e o admirava como ator. Ele foi ver depois da substituição, mas não foi falar comigo, acho que ele não gostou, e era um direito dele. Problema mesmo eu tive com Karin Rodrigues, mulher do Paulo, que não me aceitava na peça. Enquanto eu estava em cena ela ficava lá no fundo tomando café e desembrulhando um bombom. Anos depois, na comemoração da centésima apresentação de Esperando Godot, ouvi alguém me chamar. Quando virei, era Karin, que disse: Você deve me achar uma filha da puta. Eu fui mesmo, mas me perdoe. É que eu não conseguia imaginar alguém fazendo o personagem do Paulo. Olha que paixão! O amor dela pelo Paulo falava mais alto. Abracei-a com carinho e ficamos amigos para sempre. E o Equus? Foi um sucesso enorme durante toda a temporada. Sucesso é bom e eu gosto, acho maravilhoso, um prazer imenso e uma sorte danada. Um espetáculo não basta ser bom, precisa ter sorte e agradeço muito a Deus quando ele é um sucesso. A Noite dos Campeões foi também um momento maravilhoso da minha carreira. A peça de Jason Miller, com direção de Cecil Thiré, tinha feito o maior sucesso no Rio. Quando a montagem se transferiu para São Paulo, Cecil decidiu montar novo elenco: chamou a mim, um ator meio carioca, meio paulista, Jonas Mello, Sérgio Mamberti, Raul Cortez e Cláudio Corrêa e Castro. O elenco era muito coeso e o espetáculo, muito bonito. O comentário do público e da crítica era que havia a sensação de estar espiando aqueles homens e seus conflitos pelo buraco da fechadura. Eram muito sinceras as interpretações, verdadeiras, sem muita teatralidade. Essa era a grande chave da peça, porque na realidade eram cinco depoimentos que mostravam a fraqueza, a arrogância, as falhas, os valores de cada um. Era uma coisa muito bonita, porque machuca, depois de certa idade, refletir sobre o seu passado e pensar que ser humano que fomos. Se você for sincero em relação ao seu passado, vai perceber que errou muito, e também foi muito magoado. Na peça, cada personagem tinha o seu momento, era muito lindo, fiquei encantado. Outro dia recebi um telefonema e quando perguntei quem estava falando recebi uma resposta estranhíssima: Pô, eu dava tanta porrada na tua cara e você não lembra de mim? Parei e pensei, onde que eu levei porrada no teatro? Na hora: Jonas Mello. Eu apanhava do Jonas em A Noite dos Campeões, era uma cena terrível, ele me dava uns tapas, a minha dentadura voava – fiz uma prótese especial para o espetáculo – e eu colocava a mão na boca como se estivesse sem dentes, uma coisa muito violenta, mas bela. Fizemos uma temporada de muito sucesso, mas uma só. Os choques dos personagens viraram desentendimentos reais na vida, o que é uma pena. Mas queria dizer uma coisa muito importante aqui e que fique gravado para sempre: adorei trabalhar com o Cecil Thiré, pena que nunca mais voltei a me encontrar com ele como diretor, e lastimo que hoje ele seja só ator e professor. Talvez Cecil se sinta mais pleno sendo ator, e só tem que dar satisfação para ele mesmo, para mais ninguém, e ter a liberdade de escolher. Só sinto porque ele é um diretor excepcional, daqueles que diz uma palavra e faz com que o ator resolva a cena inteira. O teatro sente falta de um diretor do calibre de Cecil Thiré. Sou um ator que respeita ou briga com diretor? Os dois, com certeza. Eu não sei fazer uma coisa que não acredito, que não acho certo, ou que não me dê pedal para eu fazer outras coisas. Com certeza vou experimentar, mas se não der, vou me rebelar. Uma peça de teatro é uma obra fechada – e por isso prefiro à televisão – e é preciso engendrar desde o começo algumas características, determinados comportamentos, que preparem o espectador para aceitar tudo o que vier depois. Se a visão do diretor não me permite isso, vou lutar com todas as armas para validar a minha posição. Mas não sou de grandes conflitos, isso é verdade. Nem com o diretor, nem com o restante do elenco. Sou conciliador por natureza. Não digo que não sofri pressão dos colegas, claro que sim. Fui tão aplaudido na noite de estreia de um espetáculo, que mudaram a ordem de entrada do elenco, só para eu não ficar sozinho em cena. E eu pensava que quanto melhor fizesse, mais deveria ser querido, mas parece que não é bem essa a verdade, às vezes. Eu não consigo agir assim, acho até que para isso é necessário ter muita personalidade, uma coragem extrema, confesso que sou covarde para fazer alguma maldade. Coisa da minha formação cristã, ser justo, acreditar no bem e no mal e no pecado. Talvez nem seja mérito meu ser um bom companheiro, e sim da minha formação. Não vou me liberar nunca do menino que queria ser padre. Capítulo V A Solidão do Ator Quando vi a montagem de O Assalto, de José Vicente, com Rubens Corrêa e Ivan de Albuquerque, dirigidos pelo Fauzi Arap, enlouqueci. Amei o espetáculo. O Assalto foi montada várias vezes, Francisco Cuoco fez um dos papéis; Paulo César Peréio, em outra montagem. Mas eu continuava com a ideia de fazer o espetáculo. Em uma época que tinha voltado para a Tupi e estava muito próximo do Zara e da Vivinha, como já contei. Resolvi mostrar o texto para o Zara e ele imediatamente falou: vamos conversar com Antunes. Antunes leu, ficou encantado e falou: Vamos fazer um jogo, uma semana um faz um papel, e na outra semana troca. E vamos assim trocando os papéis até o final da temporada. Foi apaixonante, só que ficou nos ensaios e não deu certo. Nós nos dávamos tanto para um personagem, que não conseguíamos fazer o outro: eram trabalhos muito viscerais. Ficou definido que eu faria o bancário e Zara, o faxineiro do banco. Antunes tirou o nosso couro, exigiu demais, como sempre, sempre me fazendo muitas perguntas, o porquê de tantas pausas, gestos, até conseguir uma interpretação limpa, que não houvesse lugar para mais nada que não fosse realmente o personagem. Um dia o Zara ficou puto e mandou-o para aquele lugar. Eu engoli tudo, queria que ele me desse mais e mais, não achava nada ruim, era um santo. E acho que foi um dos melhores momentos de ator que eu tive na minha vida. Sou muito grato ao Antunes e acho que O Assalto foi o meu melhor trabalho, o mais honesto. Ensaiamos no Clube Sírio Libanês e fizemos a estreia lá – tenho até uma comenda que recebi nesse dia. Depois desse primeiro dia, saímos em excursão. O espetáculo era belíssimo, José de Anchieta fez um cenário maravilhoso, meio expressionista, com paredes de lâminas de persianas, muito fáceis para transportar e montar em qualquer lugar. Começamos em Manaus, num teatro imenso, passamos por Belém e fomos descendo. Nossa excursão passou por todo o Vale do Aço e numa dessas cidades mineiras nos apresentamos em um colégio de freiras. Ai, meu Deus, elas vão nos matar! Embora não ficássemos nus – eu até queria, mas Zara era mais cheio de pudor – , usávamos uma cuequinha transparente que dava para ver tudo, o sexo e os pelos pubianos. Quando terminou, eu falei: É agora Zara, vem bordoada aí! As freiras nos convidaram para tomar um chá, havia uma mesa enorme posta com salgadinhos, doces, uma verdadeira festa. E elas conversaram horas com a gente sobre a peça, que haviam achado linda, porque falava da incomunicabilidade entre os seres humanos. Elas tiveram a maior compreensão da peça e eu, confesso, me arrependi de ter sido tão preconceituoso. Quando chegamos em Belo Horizonte, aconteceu algo maravilhoso para o Zara e terrível para mim. Ele foi chamado para ser superintendente na Tupi e precisaria parar a excursão. Ele foi e eu fiquei. Sem saber o que fazer. Antunes insistiu que eu devia achar um substituto e continuar: esse é seu carro-chefe, mas não tive forças para fazer isso. Tinha acabado de perder meu pai, estava muito fragilizado. E aumentava mais ainda a minha dor fazer a peça, porque em determinado momento o faxineiro perguntava para o bancário: o que você tem em sua casa. E o bancário, ou seja eu, respondia: tenho livros, uns discos velhos, tenho modernos também, ah! tenho um relógio de ouro que o meu pai me deu quando morreu. Eu também havia herdado o relógio do meu pai. Repetir isso todos os dias era muito duro. Sofri muito com a morte do meu pai. E foi uma dor de uma solidão profunda. Antunes tem pavor de doença, detesta a ideia da morte e não quis falar nada sobre o assunto. Não teve um gesto de carinho, de atenção, nada. Ele é uma pessoa muito delicada, mas se tem morte no meio, ele vira grosseiro. Zara também não queria conversa sobre isso. Ele tinha uma persona, um homem duro, que falava grosso, mas era de uma delicadeza de sentimentos também surpreendente. Era uma manteiga e por isso não queria falar comigo sobre o tema morte. Eu me emociono ao falar do Zara, muito. Sei que ele gostava muito de mim. Fernando de Sousa, que também já morreu, era assistente de direção, e acompanhou O Assalto por toda a excursão, foi um grande companheiro, mas também não me consolou. Não os recrimino, nem guardei mágoas, imagina!, eu amo os três para sempre, e entendo que as pessoas têm fragilidades insuperáveis diante da morte. De certa forma, Fernando, Zara e Antunes eram mais frágeis naquele momento do que eu que estava sentindo a dor. Eu me surpreendi um dia num táxi em Fortaleza, contando a história da morte do meu pai para o motorista, que falou: Não fique tão chateado não, que eu estou com o meu avô também passando muito mal no hospital. E choramos juntos. Novamente Abujamra surgiu na minha vida no projeto Cacilda Becker, totalmente idealizado por ele. Sua ideia era genial, não queria trabalhar na formação de atores e por isso pegou três com experiência: eu, Fagundes e Clarice Abujamra. Ele queria mesmo era formar diretores, cenógrafos e técnicos. Fiz duas peças dentro desse projeto, a primeira foi Arte Final, de Carlos Queiroz Telles e a segunda, O Senhor dos Cachorros. Esta era uma peça eminentemente política, que falava sobre o abuso do poder. Fagundes era Ernest, o poder (uma referência mais do que direta a Geisel); Clarice era Volpa, o povo; e eu fazia Polts, a política. Quando fomos fazer a peça em Brasília, nos apresentamos na quarta-feira, na quinta, na sexta o teatro pegou fogo. Incendiaram o teatro, para ser mais preciso. Foram descobertos pelos bombeiros sete pontos de início de fogo, foi provocado mesmo. Os cenários e objetos de cena foram queimados. Eu usava em cena um saco de veludo vermelho, que ficou totalmente queimados. Sabe quem costurou o novo saco de veludo? Dulcina de Moraes. Que coisa linda, a pessoa quando é grande sempre fica maior ainda quando necessário. Ela passou o dia inteiro nos ajudando a refazer tudo e trazendo leite para a gente tomar. Fagundes ficou fulo e teve alguém para dizer: mas também, vocês vieram fazer a peça na boca do lobo? Eu admiro muito a sua determinação: não vamos parar o espetáculo. E não paramos, refizemos o necessário, colocamos ventiladores para tirar a fumaça e não deixamos de fazer uma sessão. A gente se sentiu meio herói, por estar resistindo à ditadura. Eu confesso que tinha muito medo nos anos de chumbo. Participava como podia, dava dinheiro – inclusive Maria Alice Vergueiro foi um dia ao meu consultório para que eu ajudasse Zé Celso a escapar do país e dei um cheque na hora. Também fui muito com Célia Helena nas cadeias, quando sabíamos que alguém tinha sido preso. Levávamos biscoitos para fingir que era somente uma visitinha, mas o que queríamos era deixar claro que sabíamos que um dos nossos estava naquele lugar preso. Senão as pessoas sumiam. Não posso dizer que fui um militante como tantos companheiros, mas o inimigo comum fez com que a classe artística inteira se unisse. Caixa de Sombras foi outro momento mágico da minha carreira. Foi meu primeiro e único trabalho no teatro ao lado da minha amada Lilian Lemmertz. Era uma peça dura, sobre a morte, de Michel Cristofer, dirigida pelo Emílio di Biase. Estreamos no Teatro da Faap, em São Paulo, fizemos uma temporada de muito sucesso e prestígio – ganhei o prêmio Governador do Estado de São Paulo como melhor ator; Lilian Lemmertz, o de melhor atriz. Eu adoro prêmio, embora não tenha ganhado muitos na minha vida. Sempre me acho menos do que sou e os prêmios ajudam a dar uma segurança. Quando ganho um tenho certeza do que sou. Ele me avaliza. Ator é assim mesmo, inseguro. Ainda não tenho até hoje a certeza de que sou um bom ator. E acho que jamais terei. Nesse espetáculo conheci a maravilhosa Henriqueta Brieba, atriz que carregava consigo a história do teatro. Ela estava na ativa desde que o teatro ainda seguia os parâmetros do teatro português. Quando ela chegou em São Paulo, ela falou assim: – Ednei, você que conhece melhor o esquema, a gente tem que trazer roupa? – Não, não precisa não, vai ter figurinista. Olha que candura! Depois, ela tinha que falar um palavrão em cena e foi uma luta: eu não estou acostumada a falar palavrão, como é que vai ser? Yolanda Cardoso, uma querida também, fazia lindamente seu personagem; Ivan Mesquita era seu marido e Sônia Guedes fazia a filha da Brieba. Um elencaço! O sucesso foi tão grande que decidimos montar no Rio de Janeiro, Lilian e eu compramos a parte de Odilon Wagner – um dos produtores – e entramos na sociedade com Emílio, que aliás, dirigiu lindamente o espetáculo. Alguns diziam que era um espetáculo muito pesado, muito sombrio. Era triste mesmo, pois falava de três pacientes terminais. Sérgio Brito assistiu e falou: Muito bonita, mas muito triste, não? É, mais a vida é triste e a peça foi um sucesso enorme. Engraçado, é que a gente não considerava assim na época. Colocamos até um aviãozinho percorrendo a praia com uma faixa: Não fique por fora. Veja Caixa de Sombras. Imagina, uma cidade praiana, ensolarada, e fazer o pessoal ir ao teatro para ouvir falar sobre morte. Foi um trabalho insano, mas a gente conseguiu. Hoje, em retrospectiva, vemos que era o máximo: colocávamos de quarta-feira a domingo, uma média de 300 pessoas por sessão. Eu tocava a produção aqui no Rio de Janeiro e era uma coisa bem estressante. Detesto ser patrão, gosto de ser mandado, prefiro não ter responsabilidade, mas quando eu assumo, é para valer. De verdade, não gosto e não é uma questão de vagabundagem ou preguiça, mas não nasci para lidar com dinheiro. Sabe quando eu relaxava? Quando entrava em cena. Aí eu dava tudo, porque tinha tanto medo de perder o personagem por estar envolvido com problemas corriqueiros, que entrava com tudo. Acho um desperdício entrar e jogar fora um personagem. Tônia Carrero entrou na minha vida em Teu Nome é Mulher, de Marcel Mitois, dirigida por Adolfo Celi. Um luxo só! Tônia, além de bela como só ela sabe ser, é uma comediante maravilhosa. Eu fazia dois papéis, um deles era um inspetor de polícia. Em determinada cena ela jogava um charme em cima do inspetor, por que queria manipulá-lo, eu entrava no jogo de sedução, mas na maior simplicidade dizia: – Eu sou casado, tenho filhos. Quantos? Sete. Ela me olhava, fazia uma carinha de susto: Seeeeeete! E arrematava : Não pode deixar por menos não? O público morria de rir, um dia a gente começou a rir junto e isso não havia sido combinado. No dia seguinte pensei se Tônia ia repetir a brincadeira, ela fez e mantivemos até o final da temporada. Era muito divertido esse jogo que se estabeleceu entre nós, o público adora ver quando o ator desmonta e nós fazíamos isso com o maior prazer. Ríamos muito. E o público ria junto. Delícias do teatro. Nessa temporada com Tônia me aproximei de Luiz de Lima, um grande conhecedor do teatro, pena ter morrido tão cedo. Ele era daquelas cabeças privilegiadas e pessoas assim não podiam morrer, devia haver um jeito de pegar toda aquela cultura e armazenar para um dia passar para outra cabeça, um banco de cérebros inteligentes e cultos. Foi Luiz de Lima que dirigiu As Tias, de Aguinaldo Silva e Doc Comparato e eu estava no elenco, ao lado de Ítalo Rossi, Paulo César Peréio e Nilton Parente. Nós fazíamos quatro tias, umas senhoras bichas, sustentadas por uma mulher muito rica, que adorava os quatro, vivida pela Suzana Vieira, depois substituída pela Débora Duarte. A peça era muito divertida. Eu fazia literalmente a minha mãe, me inspirei nos seus momentos do cotidiano e colocava no personagem: seu jeito de se movimentar, sentar, cruzar as pernas. Uma bicha finíssima. Claro que jamais contei para ela. Havia uma coisa ótima na peça: cada uma das tias precisava fazer um número para ver quem agradava mais à ricaça. Então, era uma competição, cada uma puxando o tapete da outra. Eu decidi que ia cantar uma ária da ópera Madame Butterfly, fiz até aulas de canto, porque não conseguia, é claro. Imagina eu de peruca, maquiagem de japonesa, meio mal pintada cantando óóóóóóóóó!!!!!! Era uma palhaçada maravilhosa. Não tenho pudor algum ao fazer qualquer personagem. Como dizia An-tunes, tem que ser artístico. Se for, topo tudo. Sempre tive uma intuição forte e comecei a perceber que As Tias estava degringolando. Nesse momento Jorge Takla me convidou para fazer O Jardim das Cerejeiras. Pedi substituição e fui para São Paulo viver Lopakhine. O espetáculo fortaleceu meus laços com Cleide Yáconis, o que foi ótimo. Jorge Takla é um gentleman, delicado, educado, finésimo e tinha uma concepção muito linda do espetáculo. Eu fiquei encantado com o que a Cleide estava fazendo com sua Liuba: simples e despojada. Desse espetáculo tirei uma lição. Kalma Murtinho era a figurinista, aliás, uma das profissionais mais talentosas e conceituadas do teatro nacional, adoro seu trabalho, mas nessa peça ela me colocou como um parisiense chique. Mas eu fazia um homem do povo, que havia ascendido socialmente, e ficara rico a ponto de comprar o jardim das cerejeiras. Tinha que ter algo ainda de proleta nele. Mas eu entrava em cena de terno de linho, chapéu, gravata, colete, relógio, um luxo. Conversei com Kalma e ela decidiu fazer uma camisa para mim, sem gola, estilo cossaco e assim eu começava a peça. Foi fantástica a mudança, só me encontrei no personagem depois disso. Teatro é realmente uma arte colaborativa, onde todos são importantes e um pequeno detalhe é capaz de mudar tudo. Há quem diga que Tchecov é melhor para os atores fazerem do que para o público assistir. Pode ser verdade. Os personagens pensam muito... É preciso pensar sempre em cena, mas pense rápido. Isso dá agilidade, senão acontecem aquelas pausas quilométricas que entediam o público. Em Hedda Gabler, de Ibsen, dirigida pelo Gilles Gwisdeck, tive a oportunidade de trabalhar com outra atriz de temperamento forte: Dina Sfat. E passamos a nos amar. Quando começaram os ensaios achei que ela implicava comigo, até reclamei com Aracy. Ela, sempre ela, a minha confidente. Ela me dá umas cutucadas que me fazem perder o chão. Um dia ela me mandou ficar com Cláudio Marzo antes do ensaio tomando um chopinho. Relaxa, que você vai ver que vai dar certo. Sempre gostei muito do Cláudio, um gentleman disfarçado de mal–humorado, e acatei o conselho. Fui para o botequim, Cláudio não entendeu nada quando cheguei, mas me convidou para um copo de cerveja. Tomei um, tomei outro e cheguei no teatro embalado, soltei os cachorros e o ensaio foi ótimo. Na véspera da estreia morreu a irmã da Dina, o que abalou-a muito, mas ela fez o espetáculo, uma dignidade impressionante. Mas ainda havia entre nós alguma cerimônia. Quando saímos em excursão, tivemos um problema em Salvador, era época dos festejos juninos e o som da festa invadia o Teatro Castro Alves. Dina avisou ao elenco: vamos ter que colocar gogó, porque temos que ser ouvidos. Os colegas não se importaram muito com a recomendação, mas eu fiz questão de usar toda a potência da minha voz. Quando acabou ela me agradeceu e falou na frente de todos que somente eu havia sido solidário. Nesse momento senti que ela havia aberto um flancozinho, estava mais amigável. Quando chegou em Fortaleza nós fizemos o último espetáculo. Em sua cena comigo, Dina me entregava um revólver, para que eu me matasse. Nesse dia se aproximou de mim com a mão baixada, estranhei, e me deu um beijo na boca antes de entregar o revólver com os olhos cheios d’água. Ela estava se despedindo da peça. Foi uma cena linda de amor. Comovente. Depois disso ficamos muito ligados, acompanhei todo o processo de sua doença, embora completamente impotente. Ela era uma guerreira, mas perdeu essa grande batalha contra o câncer. Quando estava fazendo Hedda, Fernanda Montenegro foi ver, me cumprimentou, e falou assim: Engraçado, você é um ator interessante, com aquele jeitinho dela de falar. Você só faz coisas boas. E respondi: É porque aprendi a dizer não. Ela não deve se lembrar disso, mas eu me lembro. Um dia Osmar Rodrigues Cruz, com quem havia trabalhado tanto no teatro amador e que admirava muito, me liga para me dar um presente: a peça Rei do Riso – Ator Vasques, de Luiz Alberto de Abreu. Que personagem! Vasques foi um ator do século 19, protegido de João Caetano – enquanto o mentor envelhecia, o pupilo se tornava um grande astro. Mas Vasques sempre foi grato ao mestre tendo encomendado uma estátua quando ele morreu, até hoje em frente ao Teatro João Caetano – em 2010 a estátua completou 120 anos. Fiquei enlouquecido com a possibilidade de fazer esse trabalho. Nesse momento estava em negociação para renovar o meu contrato com a TV Globo e fui conversar com Paulo Ubiratan pedindo que meu contrato fosse suspenso. Ao sair encontrei um ator, veterano como eu, que se espantou quando disse que não ia renovar: você é louco cara! Você não pode fazer isso. Isso aqui é uma vitrine, você não vai fazer mais comercial. Agradeci o conselho, disse que estava em outra: eu vou fazer um personagem pelo qual estou apaixonado e isso me basta. E foi assim que, de um dia para o outro, interrompi a minha carreira global. E não me arrependo. Queria contar um segredo dos bastidores: houve um certo frisson com a minha chegada no Sesi, porque havia um elenco fixo e eu era a pessoa que tinha vindo de fora para protagonizar, isso não é muito simpático. Por que ele? Nós não podemos fazer o papel dele? Não se falava, mas se pensava. Osmar foi irredutível, ele fazia o que queria, e tinha razão. Eu tinha qualidades para fazer, e antecedentes com ele, sei que fui muito útil para o seu movimento anos antes, porque eu era um ator que fazia teatro amador com uma certa qualidade, sem ganhar absolutamente nada, e nem querendo ganhar nada. Gostaria de dizer que Osmar Rodrigues Cruz é, na minha opinião, uma das pessoas mais importantes do teatro brasileiro. Era um homem sério, consciente, que fez muito pela dramaturgia no Brasil. Acho que a classe não o reverencia tanto quanto ele merece. Ele foi um homem muito importante em termos culturais na cidade de São Paulo. Mas é assim mesmo, é a vida. Vasques foi realmente um presente que Osmar me deu: um trabalho lindo, feito no Teatro Popular do Sesi, com entrada gratuita. Uma grande retomada da história do teatro. Além do texto maravilhoso, um elenco muito bom, havia a cenografia e figurinos do Flávio Império, que eram obras-primas. Flávio Império era um artista, que rondava a genialidade em termos plásticos. Também era um bom diretor, mas era melhor cenógrafo e figurinista, era um artista mais plástico do que humano. Como sempre faço, observo bem as reações de quem acompanha o espetáculo desde os ensaios, nesta peça me fixei no Flávio. Eu vivia pedindo que ele me desse toques. Ele meio que interferia na direção, me dava algumas dicas fantásticas, sábio que era. Ele foi meu anjo da guarda durante essa montagem, mas adoeceu e teve que viajar na semana da estreia, e eu fiquei desarvorado. Você vai embora justo na estreia, vou ficar tão desamparado. Ele foi para os Estados Unidos se tratar, mas me dei xou um quadro seu, uma telinha pequenininha, sem moldura, uma coisa linda e um bilhete: eu não vou estar, mas esse trabalho vai ficar aí com você e vai te acompanhar nessa estreia. Eu fico muito feliz de ter sido amigo dele, mesmo que por pouco tempo. Eu tenho muita saudade dele. Fizemos uma temporada de muito sucesso, eu era muito feliz quando estava no palco, mas me sentia sozinho quando acabava o espetáculo. Não fui mal recebido pelos colegas, mas também não fui bem: nunca alguém me convidou para comer uma pizza. Um dia uma amiga querida entrou no meu camarim e disse que estava ali só para falar comigo. Eu sei que você não está bem, você tem que se benzer. E ela me propôs que eu fosse conhecer sua mãe de santo, Marina, uma pessoa encantadora. Fui de coração aberto, me submeti a tudo, fiz tudo que ela mandou, toma banho disso, toma banho daquilo, e fui melhorando cada vez mais, até readquirir a minha paz interior. Foi aí que Lilian veio passar uns dias comigo e a levei para conhecer Marina, mas essa história já contei. A vida afasta a gente de muita coisa, e eu me afastei lá do centro, mas sempre quando mergulho em mim mesmo, me lembro de Marina com muito carinho, muita afeição, desejo que ela seja feliz, e que possa dar felicidade e luz para outras pessoas, como ela deu a mim. Capítulo VI Teatro é Duro Folias no Box foi a primeira e única peça que fiz com Aracy Balabanian. Já estivemos em muitas novelas juntos, mas em teatro somente nessa peça de Flávio de Souza, dirigida pela Denise Saraceni. Foi um imenso fracasso, o que me deixou muito triste porque estava trabalhando com pessoas que amo muito. Por sorte, em seguida fui fazer Descalços no Parque, de Neil Simon, e também encontrei pessoas muito queridas no elenco: Lídia Brondi, Thales Pan Chacon e Míriam Pires. Viajamos muito com a peça e era como uma família. Adoro viajar, mambembar pelo Brasil. Gosto dos pequenos desafios diários em uma excursão: a acústica do teatro, o tamanho do palco, o estado das coxias. Tarcísio Meira e Glória Menezes foram meus companheiros de cena em O Duplo, escrita e dirigida por Domingos de Oliveira. Tarcísio fazia um homem com dupla personalidade, que é levado pela mulher, uma atriz, a Glória naturalmente, para fazer psicanálise. Eu vivia o médico, que era também apaixonado pela atriz. A trama era boa, mas não funcionou. Inclusive, Bibi Ferreira foi chamada para reensaiar o meu personagem. A primeira coisa que a Bibi Ferreira falou para mim foi: fala com naturalidade, como estivesse ao telefone, não seja teatral. Domingos de Oliveira pedira que eu usasse a teatralidade: você é um homem recluso, um psicanalista, muito introspectivo, intelectual, muito bem articulado. Eu me surpreendi com a Bibi me pedindo para fazer uma coisa mais suave, mais light, mas fiz. Quando terminou o espetáculo, Glória foi no meu camarim me abraçar, me beijar e dizer que eu era um ator maravilhoso. Aumentou o público? Não, não aconteceu absolutamente nada. Acho que de certa forma fui o bode expiatório do fracasso. Sucesso tem fórmula? Claro que não. Acho que existem ingredientes importantes para o sucesso: um texto que suscite uma curiosidade intelectual, humana, cômica ou trágica, um dire-tor que amarre o espetáculo para que ele tenha uma unidade e, evidentemente, a empatia do público com os atores. Mas, mesmo com tudo isso, o bolo desanda e resulta em fracasso. Esse será sempre o grande mistério do teatro. Shakespeare é sempre um desafio. O Mercador de Veneza não foi exceção. Em especial porque meu personagem era Shylock e eu tinha muitos problemas com ele. Quando Cláudio Torres Gonzaga foi me convidar para interpretá-lo, reagi: acho que não é o momento de fazer nada antissemita, aliás antinada, eu não quero fazer também anticristão, antirreligioso, antihomossexual, enfim, não quero fazer um espetáculo preconceituoso. Cláudio me garantiu que não seria assim, inclusive que o julgamento de Shylock, quando ele faz seu grande discurso seria no final da peça. Topei fazer e foi muito bom. Logo depois, houve outra montagem com Pedro Paulo Rangel no papel. Um dia encontrei com ele, que me confessou achar não ter feito tão bem porque havia ficado muito na comédia. Eu pensei com os meus botões: quase caí nessa mesma armadilha, mas percebi e me safei. Fui felizardo nessa peça com a indicação do Prêmio Shell de melhor ator. Perdi para Rubens Corrêa em O Futuro Dura Muito Tempo, de Louis Althusser, adaptação e direção de Márcio Vianna. Bem perdido não? Ele merecia ganhar, pois era, sem dúvida, o melhor ator brasileiro no momento. Rubens tinha um tempo interior de raciocínio, de sensibilidade, de entendimento que era impossível não acompanhá-lo. O público ia junto com ele. Era de uma verdade, de uma pureza artística inominável, um ator realmente inesquecível. Depois de um clássico, nada como outro clássico. Saiu Shakespeare e entrou Molière na minha vida. Fui convidado por José Rubens Siqueira, que traduziu, adaptou e dirigiu Tartufo. Fizemos a primeira leitura no Teatro Sérgio Cardoso e eu dei uma puxadinha para a comédia, algo muito suave. O Rubens parou a leitura e me disse: não é nada deste caminho que você está ameaçando fazer. Ponderei que ainda não havia feito nada. Você está indo para a comédia, e esse persona-gem não tem humor, é sério, sisudo... E deu-se o diálogo: – Zé Rubens, você vai me desculpar, não se aborreça, mas eu quero que você aceite a minha retirada do elenco. Porque realmente esse caminho que você está querendo não vai dar para mim, eu não sei fazer isso. – Para com isso, Ednei. É só uma conversa, o começo de uma discussão... – Você acha mesmo que vale a pena a gente continuar? – Claro que sim, somos adultos, somos artistas, é só uma questão de conversar. Eu devia ter seguido o meu impulso, mas como sou conciliador, fiquei. O elenco se entrosou bem, a gente ria muito e se estabeleceu um cli-ma bem legal no palco. Na semana da estreia, o diretor me chamou para mais uma conversa. – É o seguinte meu querido, a luz está ótima, o figurino perfeito, a sonoplastia genial, mas o que você faz não tem nada a ver com isso tudo, você está fazendo um trabalho que não tem nada a ver com a montagem. Voltei para a casa e passei uma noite de cão. Largo ou não largo? E o que faço com as minhas contas? Resolvi ficar. Ensaiamos cena por cena com a norma estabelecida por Zé Rubens: eu não posso ver um dente seu, nem meio sorriso. Estreamos, o público também não deu meio sorriso. A crítica acabou, dizendo que minha interpretação era maniqueísta. Mandei um recado para o Zé Rubens, pelo seu assistente, que ele não fosse nunca mais ao meu camarim, porque ia fazer o Tartufo como eu queria. E nunca mais falei com ele na minha vida. A rebeldia valeu, porque as pessoas passaram a gostar do espetáculo. Teatro é duro! Esse era o slogan que Alfredo Mesquita criou para o teatro na EAD, que não tinha poltronas estofadas, somente uns bancos de madeira. Mas é claro que ele sabia das outras conotações: teatro é duro mesmo! Capítulo VII A Maldição e a Redenção Quando me convidaram para fazer Frankenstein, hesitei: eu me achava velho para o personagem. Como ele é criado, na minha cabeça, devia ter uma jovialidade, e eu sabia que não tinha mais essa juventude. Depois vi que era um absurdo, reconsiderei e fui fazer a peça. Confesso também que tinha um pouco de medo da maldição de Mary Shelley – parece que todas as montagens de Frankenstein tiveram problemas. Até no filme parece que rolou um clima horrível. Mas como sou cristão, acreditei e não acreditei. Começamos a ensaiar e o diretor morreu. Veio outra diretora, Ângela Leite Lopes, uma pessoa muito bacana. Fizemos um lindo estudo de maquiagem, mas o maquiador morreu. Marcelo Escorel, que fazia o médico que criava o monstro, teve uma ruptura de menisco. Quando a temporada acabou, pen-sei: Graças a Deus saí ileso da maldição. Eu estava muito feliz de ter terminado. Eu adoro uma caipirosca, caipirinha de vodka de lima da Pérsia e fiz uma bela jarra no domingo à noite. Toca o telefone, era um jornalista da Baixada Fluminense que queria fazer uma entrevista comigo. Eu não tenho condição, porque estou meio bêbado. Vou, não vem, vou, não vem, ele apareceu na minha casa, começou a beber comigo, e acabei dormindo na sala. Quando acordei, claro que o cara tinha ido embora, tomei banho, e me preparei para viajar e passar o Natal com a minha família no Guarujá. Enchi a mala do carro com frutas secas, champanhe, as compras que havia feito e me mandei, muito alegre, refeito depois do banho. Duas horas depois foi me dando um sono, decidi parar num posto e tomar um café com Coca-Cola para acordar. O café era tão ruim, intragável, que tomei só o refrigerante e comprei um pacote de balas para me distrair pelo caminho e me manter acordado. Que bobagem! Não adiantou, a certa altura eu dormi e sonhei que estava em uma lancha atravessando marolas. O que eu estava atravessando era o canteiro central da Dutra. Quando eu abri o olho, vi uma pedra enorme na minha frente, virei a direção o máximo possível, e gritei: Meu Deus do céu, não me deixa morrer, que eu tenho muita coisa para fazer. E desmaiei. Quando acordei, estava deitado na beira da estrada, e ouvi uma voz dizer: Fica mais para cá, para não deixar o sol bater no rosto dele. E desmaiei outra vez. Quando abri os olhos de novo já estava no hospital em uma maca, aquela típica cena de filme, vendo um teto se movendo. Mary Shelley havia me pegado também! Alguns anos depois quando estava fazendo Alan Kardec no vídeo O Espiritismo de Kardec aos Dias de Hoje, dirigido por Marcelo Taranto, o presidente da Federação Espírita, José Iosan, que patrocinava o trabalho, começou a ir às gravações. Ele olhava para mim fixamente. Fiquei inseguro, claro! Perguntei ao diretor por que ele me olhava tanto. Será que ele está com medo que eu não faça bem o personagem? No dia seguinte , ele apareceu de novo e levou a mulher. No intervalo eles vieram falar comigo e me disseram que sentiram a presença de Alan Kardec durante as gravações. Curiosamente, Alan Kardec era um matemático, pedagogo, um dos donos de uma escola, um homem frio, calculista. Eu queria fazer esse personagem assim, seco, objetivo, duro. Não conseguia, porém, fazê-lo como tinha estudado, por incrível que pareça eu sentia essa coisa espiritual, e, ao mesmo tempo, não acreditava, porque sou racional e tive uma formação científica. Mas havia algo... Ficamos amigos depois disso, contei a história da minha vida e falei do acidente. Eles fizeram um estudo sobre mim e me disseram: – Você é um dos casos raros de reencarnação em vida. – Como assim, reencarnação em vida? – Geralmente uma pessoa morre, o seu espírito é liberado, e vem um novo espírito para você em outra encarnação. Só que isso aconteceu sem você ter morrido. Não é uma loucura? Digamos que em vez de maldição foi uma redenção. Capítulo VIII E mais teatro... Já disse que não gosto de ser patrão, não gosto mesmo, mas vi uma peça em Buenos Aires e alucinei: Vermelhos Balões Vermelhos, de Eduardo Pavlowsky. Era a história bonita de um ator e duas atrizes já maduros, no fim da carreira, lutando pelo espaço para preservar o teatro vivo. Comprei os direitos, resolvi produzir, chamei inicialmente Ivan de Albuquerque para dirigir, mas ele não podia e me indicou Marcus Alvisi, que fez um trabalho bem bonito. Estreamos no horário alternativo, das segundas, terças e quartas-feiras, no Teatro Cândido Mendes e a peça fazia uma boa temporada. Eu estava malassessorado e aceitei quando nos propuseram mudar para o horário nobre. Caí na esparrela! Não era uma peça para sábado e domingo, era um teatro que discutia teatro, não uma coisa que pudesse interessar ao público que frequenta no fim de semana e depois vai comer uma pizza. E quando o público diminui, o espetáculo esfria, não tem jeito. É impressionante a importância da comunhão do público, se ele não está presente, há uma baixa de energia imediata, não é uma opção dos atores fazerem menos, mas sem troca não há espetáculo bom. Para comemorar os 160 anos de nascimento de Machado de Assis e os 100 anos de lançamento de Dom Casmurro, a Academia Brasileira de Letras montou Capitu, Olhos de Ressaca, adaptada por Marcus Vinícius Faustini e Walter Daguerre. Eles sofreram bastante para adaptar a obra de Machado de Assis, que é um romancista preciosíssimo, mas não um dramaturgo. Acho que pude ajudá-los bastante, porque na primeira vez que eles me mostraram a peça, dei várias sugestões, porque mais parecia uma aula sobre Machado. Disse que eles deviam colocar mais personagens, a família, os agregados e eles reescreveram muitas coisas. Foi uma temporada de muito sucesso, a terceira idade compareceu em peso, tomava um chazinho e depois via a peça. Bel Kutner, e depois Maria Ribeiro, fizeram Capitu; eu e Leonardo Netto nos dividíamos como Bento. E mais uma vez, Abujamra. Devia ter um capítulo só sobre ele, não é mesmo? Não, melhor assim, um pouco dele em cada um, bem onipresente. Fui convidado para fazer um dos padres na montagem de Michelangelo (mais um padre na minha vida... foram tantos), mas Cláudio Marzo, que seria o protagonista, desistiu e Abujamra me perguntou se eu não queria fazer o Papa Julius II. Claro! O texto do Doc Comparato é maravilhoso: uma discussão muito divertida e curiosa sobre os imigrantes. Um padre vem do Vaticano aqui para o Brasil, e se encanta tanto, fica tão feliz que, ao voltar para Roma, diz que encontrou o paraíso terrestre. O Papa fica furioso: Não fala essa blasfêmia! Paraíso terrestre não pode ter, temos que destruir esse paraíso. O Papa telefona para o rei de Portugal e pede um favor: manda lá para esse lugar chamado Brasil todos os sifilíticos, doentes, prostitutas, ladrões, precisamos corromper essa gente, porque não pode ter Paraíso na Terra. Michelangelo era só uma figura que passeava pelo Vaticano, uma bicha, papel do Leon Góes. Tudo era enorme em Michelangelo: o Teatro João Caetano, os cenários, lindíssimos com uns afrescos pintados, os figurinos – Camila Amado, minha queridíssima Camila, fazia uma madre superiora que caminhava pelo Vaticano, com uma cauda de dez metros. Abujamra, porém, começou a implicar com o texto desde os ensaios e reescreveu várias cenas. Aí virava um vaudeville quando Doc aparecia nos ensaios. Abujamra não queria mostrar para ele o que havia feito e ficávamos parados algumas horas, inventando coisas, até o autor ir embora. Na véspera da estreia, eu e Abujamra estávamos voltando juntos e ele me disse: acho que eu piorei o espetáculo. E eu, muito solidário, amigo dele: Não, não pio rou não. Ele insistiu que estava meio acéfalo, eu ponderei que precisávamos ir em frente, porque não dava mais tempo de mudar nada. Estreamos, e, de repente, no final do espetáculo ouve-se um barulho lá no balcão, onde estavam as câmeras de televisão filmando. Era o Doc desesperado: Essa não é a minha peça, não filmem isso. Ai meu Deus do céu, até hoje não falei com o Doc Comparato, queria me encontrar com ele e pedir perdão. Digamos que Michelangelo foi um happening desde a estreia. Um dia, Camila chega no teatro com um cachorrinho. Olha, vem conhecer uma das minhas cachorrinhas, porque ela está muito triste, olha o olhar dela. Estava triste mesmo. Quando ela entrou em cena, levou a cachorrinha para que não ficasse sozinha no camarim. Não é maravilhoso? Happening total. Ela era a única mulher no elenco e Abujamra de cara colocou assim: Camila, você sabe muito, sabe mais do que eu, faça o que você quiser. Imagina! E ela fez. Mas ela fazia muito bem. Nós nos conhecemos nessa montagem e sou apaixonadíssimo por ela, deliciosa Camila. Adoro a sua loucura e assino embaixo. Digo e repito que se um ator não gosta do papel que lhe oferecem, recuse. Foi o que aconteceu quando fui convidado para fazer a remontagem de A Visita da Velha Senhora em São Paulo. Só faço se for o protagonista, Schill, ou o professor. Os outros não me interessavam. Francisco Cuoco já estava convidado para viver Schill e fiquei com o professor. Logo depois que começaram as leituras, me avisaram que André Valli, que havia feito no Rio de Janeiro, ia continuar na temporada em São Paulo, como o professor. Agradeci, garanti que não estava chateado – e não estava mesmo – e me despedi. Uma semana depois fui avisado que Cuoco não ia fazer, se eu ainda queria viver Schill. Liguei para o Chico: você é louco de largar esse papel, é maravilhoso. Mas ele não queria mesmo e abriu o caminho para mim. Ivone Hoffman, que fazia minha mulher na peça, me ajudou muito nos ensaios, ela foi uma espécie de assistente de direção de Moacyr Góes, que estava envolvido com as filmagens com Xuxa. Ivone vinha diariamente na minha casa, eu passava as cenas com ela, de vez em quando ia na casa da Tônia ensaiar com ela. Só ensaiei mesmo com todo mundo na semana da estreia. Preocupante. Mas os deuses do teatro nos abençoaram e tudo correu muito bem. Quando terminou o espetáculo, Paulo Autran veio falar comigo carinhosamente: Sabe que com você eu consegui entender melhor a peça? Acho que pela primeira vez o Paulo me viu como um colega. É bonito isso, um homem de uma estatura como ele, cumprimentar um colega de igual para igual. Foi comovente. Com Tônia estreitei minha amizade nesta peça. Criou-se uma intimidade maior entre a gente. Nós saíamos muito à noite, ela me convidava sempre para ir com ela nos inúmeros compromissos sociais que tinha. Era muito agradável sempre estar com ela. Um dia, Tônia, falou assim: – Você é danadinho Ednei. Por quê? Eu falo, dou palpite, você ouve tudinho, mas só faz o que você quer. Ela, não. Havia uma cena em que Tônia ficava atrás de mim, que estava sentado em um tronco de uma árvore. Era um momento muito lindo, a redenção do seu personagem, uma mulher meio maldita, vingativa. Neste momento ela contava por que havia chegado a este ponto. Observei que Tônia falava com tanta naturalidade, como não se importasse. – Acho que é o momento de você mostrar toda a sua dor. Você acha mesmo que eu estou desperdiçando? Eu acho. No espetáculo seguinte senti que ela estava diferente, mas não olhei para trás para ver. No segundo dia resolvi olhar porque ela estava me comovendo, quando me virei vi aquele dorso fenomenal, aqueles olhos azuis cheios de lágrimas, era de uma beleza extraordinária, um momento verdadeiramente mágico. Ela começou a sentir tanto prazer em fazer o espetáculo, que não que-ria mais parar. O final da temporada já havia sido marcado, eu tinha compromissos, precisava fazer um tratamento dentário – o que jamais adio – mas Tônia não queria de jeito algum deixar de viver aquela magia. Norma Thiré que era a produtora dizia: Ednei, pelo amor de Deus, nós não temos como manter o espetáculo, são 23 personagens, não dá. Tônia estava apaixonada pelo espetáculo. Que coisa linda! Um dia ela me pegou pela mão, vamos lá para o camarim dos meninos. E disse: Olha aqui, eu quero falar na presença de vocês, na presença do Ednei, que nós vamos terminar com a temporada agora, porque ele não quer continuar. Que bonitinho, que coisa fofa. Ela é muito especial, fiquei gostando cada vez mais dela. Outra presença forte feminina na minha carreira: Beatriz Segall. Nós nos conhecemos quando estávamos juntos no elenco de Andorra, no Teatro Oficina. Ela era uma pessoa muito inteligente, carinhosa, simpática, ficamos amigos. Quando seu marido Maurício foi preso, nos anos de chumbo, imediatamente fui para a sua casa na Vila Mariana. Um dia ela até falou sobre isso no Programa do Faustão, que tinha sido uma grande prova de amizade minha ter estado ao lado dela naquele momento muito complicado. Enfim, havia um relacionamento bonito com ela no passado. Quando fui convidado para fazer Pequenas Raposas, com direção de Naum Alves de Souza e soube que ela estava no elenco, imediatamente liguei para desejar felicidade e dizer que estava muito contente em reencontrá-la. O elenco era maravilhoso: Rogério Fróes, Patrícia Werneck, Pedro Osório. Naum Alves de Souza, um diretor de uma delicadeza e de uma paciência ímpares. Beatriz foi se revelando uma pessoa impertinente, intolerante com todo mundo, começou a criar climas e tudo foi ficando insuportável. Eu de certa forma era poupado, mas um dia ela veio me dar uma ordem em um tom arrogante e eu a mandei para o inferno. Desacatei-a mesmo em alto e bom tom. Foi uma coisa triste, porque eu senti que perdi uma amiga. E a gente não está no mundo para perder pessoas. Vou dar um beijo nela na próxima vez que encontrá-la, quem sabe tudo isso acaba – está feita a promessa. Um etapa nova começou na minha vida em Molly Sweeney -Um Rastro de Luz. A etapa Júlia Lemmertz. Foi meu primeiro trabalho junto com a minha filha, que estava esplendorosa como a protagonista. Molly é uma cega que recupera a visão. Eu e Orã Figueiredo – que estava ma ravilhoso também – éramos os coadjuvantes. Orã fazia o marido e eu o médico, que operava Molly. Coadjuvantes privilegiados, porque a peça é armada em cima dos depoimentos dos personagens, que não interagem, e quando você está diante do microfone, sem ninguém para contestá-lo, torna-se o protagonista daquele momento. Celso Nunes, que dirigiu brilhantemente o espetáculo não concordava muito, para ele só interessava a cegueira da Molly. Isso quase quebrou as minhas asas, nem fiz uma boa estreia em Porto Alegre, mas pouco a pouco fui virando o jogo e dando ao meu personagem a importância que ele realmente tinha. A oportunidade de dividir o palco com Julinha aconteceu de novo em Maria Stuart, meu espetáculo mais recente. Um texto lindo de Schiller, com direção de Antonio Gilberto. A tradução é de Manuel Bandeira e foi um tour de force: depois de aprendida e assimilada bem fica deliciosa de ouvir. Mas no começo, foi duro. Bandeira fez uma tradução para ser lida, não encenada. Foram necessários horas, dias, semanas para que o texto ficasse fluido, soasse como coloquial, e isso é fundamental em um clássico, refletir o passado no presente. Mas essa foi uma briga comprada pelo elenco, em especial pelas rainhas Júlia e Clarice Niskier, depois Lígia Cortez, todas absolutamente maravilhosas em personagens tão difíceis e densos. Antonio Gilberto gostava de brincar comigo pois eu era o que mais trabalhava no elenco, porque entrava no teatro no sábado à meia-noite e só pisava no palco no domingo. É verdade, não que eu trabalhasse mais, isso é a brincadeira, mas meu personagem, o confessor de Maria Stuart só entrava no finalzinho, numa participação especial, especial mesmo para mim. O confessor é um personagem lindo, é um súdito, o mordomo de Maria Stuart, que é afastado dela depois de sua prisão pela Rainha Elizabeth. Como era de se prever que ela iria ser condenada e ter decepada a cabeça, esse homem resolve ir para Roma estudar para ser padre. Ele diz ao Papa que seu objetivo é dar a confissão e a comunhão para a sua rainha. Não é lindo demais? Eu me dediquei a ele nos mínimos detalhes: des-de o figurino, que precisava ser adaptado, porque ele entrava disfarçado e somente quando está com a rainha ele se revelava padre. Conversei muito com Marcelo Pies e disse que precisava de algo que não fosse de abotoar. Ele pensou em velcro, mas faria barulho, e conversamos tanto que ele chegou a conclusão mais brilhante possível. Eu usava um paletó que era fechado com pequenos imãs. Quando abria, sem ruído algum, revelava o crucifixo. Depois da confissão, fechava tudo de novo. Parece frescura, vaidade, mas não, é uma adequação ao personagem fundamental. Minha cena era muito bonita com Maria Stuart. Ele entrava, se revelava e devia benzer o vinho para dar a comunhão. Como é que vou benzer o vinho? Antonio não queria gestos, que o confessor fizesse o sinal da cruz em cima do copo. Pensei em rezar a Ave Maria em latim, mas demorava muito. Aí me lembrei das aulas de um professor de latim que tive em Pederneiras, Jean Tous Saints, que era chamado João de Todos os Santos, Deus o tenha, já deve ter morrido há muito tempo. Ele havia me ensinado três frases em latim, não era uma oração, que sempre me recordava. E enganei todo mundo, inclusive o diretor, dizendo as palavras pagãs em latim, enquanto benzia o vinho, quase um mantra. Camila Amado viu na estreia no CCBB, no Rio de Janeiro e me falou assim: Eu já passei por tudo na vida em termos religiosos, até Santo Daime tomei. Mas quando eu vi a cena, pensei: Meu Deus, como eu sou católica! Que gratificação ouvir isso. No fundo era o que sentia em cena também: embora cristão, quase padre, passeei por outras religiões, me considero ecumênico, mas a força daquela comunhão me emocionava todas as noites. Era um espetáculo fácil? Claro que não. Germânico, absolutamente clean, diversos praticáveis e atores – 15 atores em cena! Os atores, porém, humanizaram de tal forma seus personagens, que a grande discussão política que era o centro da peça, tornou-se um debate sobre o ser humano e todas as suas dimensões. Daí o sucesso. Três horas e mais quinze minutos de intervalo – mas as pessoas foram ver. Algumas reclamaram, claro. Quando estava querendo levar o espetáculo para Campo Grande, onde mora uma parte da minha família, ouvi a seguinte resposta: Três horas de espetáculo e drama! Não dá mesmo, querido. Um ator amigo me pediu para ver o espetáculo e na saída quando perguntei por ele, me disseram: ele saiu no intervalo. Mas acho que fizemos bem em não ceder, não podemos abrir mais flancos do que já estão inevitavelmente abertos. Não fazemos mais teatro às segundas, terças e quartas-feiras e privilegiamos as comédias. Temos de contrabalançar esse jogo. Achar que o público, o povão, só quer comédia é uma bobagem, porque se o espetáculo conseguir tocar a alma das pessoas ele fará sucesso. Maria Stuart foi um exemplo disso. Para mim foi uma experiência linda, não só no palco, mas também na convivência com mais de 20 pessoas diariamente. Conheço a qualidade, a característica de todos eles, sei como falar com um, como falar com o outro. Eram pessoas de várias idades. De alguns colegas precisava cuidar. Vamos entrar agora para receber os aplausos, e vamos juntos. Tinha a molecada que fazia barulho, aí psiu, não pode fazer isso. Sem imposição. Algumas vezes fui severo, meio impaciente, quando via vaidadezinhas inúteis, mas refletia e via que eram jovens que tinham muito ainda a aprender e a todos eles amo de paixão. Eu acho que um ator velho como eu tem que ser espelho para os jovens. E um espelho bom e justo. O futuro? Sempre tenho planos, pena que a vida me obrigue a certas limitações. Já perdi alguns personagens que não posso fazer mais: Ricardo III, por exemplo, de Shakespeare, não é mais para mim. Adoraria fazer aquele tirano defeituoso, deformado. Mas não tenho mais idade, ficaria ridículo. Ricardo III precisa ter a vida pela frente, a paixão, o tesão. Há quem diga que eu posso fazer Rei Lear, e posso mesmo. Vou dar um tempo porque os meus colegas, os velhinhos todos já fizeram, Raul Cortez, Sérgio Brito, posso ser o próximo daqui a alguns anos. Se quiserem me chamar, aceito. Meu próximo sonho – eu nunca deixo de sonhar – é montar O Pai, de Strindberg. Se não acontecer, seja o que Deus quiser, mas não quero nem pensar. Os sonhos têm que permanecer vivos, assim como eu. Capítulo IX A Trajetória na Televisão Para mim, a televisão é uma das grandes criações da Idade Moderna. Acho uma beleza incrível, uma verdadeira maravilha ligar um botão e ver imagens transportadas por satélite do outro lado do mundo, em tempo real. A TV é, sem dúvida, o melhor veículo para educar, formar o caráter e divertir as pessoas. Nem sempre ela é bem usada. Nem sempre se tem, também, o respeito que lhe é devido: a TV tem uma força muito maior do que o teatro, do que o cinema, porque vai diretamente a todas as classes sociais. Eu sou encantado pela televisão. Comecei na TV em São Paulo, e confesso que era até meio blasé no começo, tinha certa arrogância, mas à medida que fui vivendo e convivendo com a televisão, fui percebendo a importância desse veículo. Minha primeira experiência em televisão foi terrível. Célia Helena, Walmor Chagas, Wanda Kosmos e eu encenamos uma peça baseada em Cronin na TV Paulista. Ensaiamos bastante porque era uma apresentação ao vivo. Durante os ensaios, Walmor falava normalmente, e eu também respondia coloquialmente, sem maiores emoções. Na hora, Walmor veio com uma violência, falou coisas tão duras, tão fortes, que eu não esperava, fiquei embasbacado, me deu um branco, eu não sabia o que fazer. Eu olhei para ele, virei as costas e fui embora, saí de cena porque não tinha o que fazer lá. Wanda Kosmos para não parar a cena, inventou uma desculpa para meu personagem ter se retirado. Ela era muito versátil, tinha uma grande experiência como atriz e diretora e salvou a parada. Walmor não estava errado, era assim que se fazia mesmo, não se dava tudo no ensaio para não gastar. A minha primeira experiência de televisão foi a pior possível. Fiquei arrasado, a minha estreia foi um fracasso total e absoluto. Minha primeira novela foi na TV Tupi, Yoshico, um Poema de Amor, dirigida por Antonio Abujamra, sempre o Abujamra me mostrando novos caminhos e novas opções. Ele me escolheu porque eu tinha cara de japonês. Meu personagem era Kawabata San, um japonês. Para fazê-lo encontrei um sotaque, usava uma maquiagem pesada para acentuar mais o formato amendoado dos meus olhos e me sentia como se estivesse no palco. A Tupi já tinha um cast famoso e, de verdade, não fomos muito bem recebidos, porque éramos de teatro. O pessoal da televisão achava que éramos arrogantes e talvez fôssemos mesmo. A turma do teatro era intelectualizada, adorava falar de Beckett e Shakespeare e menosprezava um pouco o novo veículo, até que coisas maravilhosas começaram a ser feitas e todo mundo se bandeou para a televisão – até mesmo o Deus do teatro Sérgio Cardoso. Depois que entrei na televisão, não saí mais. Fiz várias novelas na Tupi de bastante sucesso. É claro que a repercussão na época era completamente diferente. As novelas não eram exibidas em rede nacional. O capítulo passava em São Paulo e depois os rolos iam de avião para as outras capitais. Em todo avião tinha alguém da televisão carregando rolos, era bem engraçado. Minha estreia na TV Globo foi em O Santo Mestiço, que foi inteiramente gravada em São Paulo, nos estúdios da TV Paulista. Sérgio Cardoso era o protagonista e ele era a minha referência de ator. Admirava Paulo Autran, mas gostava mais do Sérgio, que tinha uma técnica fabulosa aliada a uma paixão. Para mim, ele foi o melhor ator do TBC, no teatro ele era soberbo. Para mim, foi um prazer, uma honra, uma inspiração fazer tantos trabalhos ao seu lado. A primeira vez que eu fui gravar com ele, fiquei com as pernas bambas de emoção. Logo depois da minha estreia, fiz A Grande Mentira, escrita por Hedy Maia, aquela que contei que assumi a vilania de Paulo Bacelar. Walter Clark um dia me disse que esta novela havia feito o horário das 7 para a Globo. Naquela época aconteciam coisas maravilhosas, a novela deveria ter seis meses. Mas repercutiu tanto que decidiram esticar. Nós gravávamos em São Paulo e os protagonistas, Cláudio Marzo e Míriam Pérsia, estavam cansados da ponte aérea e decidiram que não queriam continuar. O que a autora fez? Colocou os dois viajando para a Europa, e a novela recomeçou com outros protagonistas. Eu e Neuza Amaral, que fazíamos os perversos, fizemos todos os capítulos, mais de 300, uma loucura verdadeira. Voltei a trabalhar com Sérgio em A Cabana do Pai Tomás, que causou uma revolução. Muita gente reclamou de um branco pintado fazer o papel de um negro. E não contente com isso, Sérgio fazia também outro papel, o galã da novela. Eram outros tempos, mais politicamente incorretos. Mas ele podia. Eu fazia um bandidão, mr. Legree, o algoz, que batia e dava chicotadas nele. Minha amizade com Sérgio se estreitou muito nesse trabalho. Ficamos amigos e tínhamos a mesma protetora, Guta. Ela morava numa cobertura no Jardim de Alah, entre Ipanema e Leblon, e dava muitas festas, era uma pessoa muito agradável e simpática. Eu, Sérgio, Ruth de Souza e Jacira Silva gravávamos juntos saíamos, éramos muito felizes, quase uma família. Em Pigmalião 70, que Sérgio fazia par com Tônia Carrero, fiz um malandrão, par da Célia Biar. E em A Próxima Atração, também protagonizada por Sérgio, eu fazia um japonês. Boni havia visto Yoshico e minha interpretação tinha ficado em sua cabeça e pediu ao Walter Negrão: Eu quero um personagem de japonês para o Ednei. O Negrão me pediu uma força, porque não tinha referências sobre o assunto. Fiz contato com o professor Takeshi Suzuki, um grande arquiteto e pintor, que já morreu, e sua ajuda foi fundamental. Ele lia todo o meu texto, com seu sotaque muito particular, eu gravava e depois estudava. Pedi para ele ainda uma relação de ditados e, de acordo com a situação, eu falava em japonês o ditado. Como as pessoas não entendiam, é claro, meu personagem explicava, dando a tradução. Até hoje sei esses ditados em japonês de cor. Se caíres sete vezes, levanta-te oito. Foi muito prazeroso, criar junto com o autor, um verdadeiro privilégio. Sérgio, quando estrelava a novela seguinte, O Primeiro Amor, morreu. Nessa época, ele estava projetando um espetáculo com monólogos de peças que havia feito. Guta, querendo fazer uma homenagem ao Sérgio, a quem adorava, deu o texto para mim, para que eu montasse. Eu não posso fazer, eu não fiz essas peças, então não tem sentido! Mas é uma homenagem para o Sérgio. Mas eu me senti incapaz, seria um prazer, mas eu não consegui suportar o sentimento de estar usurpando o papel de alguém que admirava tanto. E as novelas continuaram na minha vida: O Homem que Deve Morrer, na qual fazia o pai de Tarcísio Meira, mais uma daquelas loucuras da TV. Somos contemporâneos, começamos juntos no teatro amador em São Paulo. Já em Partido Alto eu fazia par com a Beth Goulart. Televisão tem cada coisa! Alguns trabalhos na televisão foram muito especiais para mim: Ossos do Barão, de Jorge de Andrade, um dos momentos marcantes da dramaturgia brasileira; Selva de Pedra, da querida Janete Clair. Avancini foi um carrasco nessa novela, ele colocava um banco duro sem encosto dentro do estúdio, para os atores esperarem o momento da cena. Sem ter onde encostar, tínhamos que colocar a coluna no lugar e ficar ali quieto, ninguém podia falar nada. Mas a gente não resistia não, contava as piadas baixinho, Regina, Cuoco, eu. Eu me lembro que a gente ria para dentro, que nem criança em colégio interno. Ele tratava a gente como garotos de grupo escolar, uma severidade absoluta. Eu achava aquilo uma inutilidade, uma bobagem, mas ele gostava, e a gente seguia. Mas o trabalho foi lindo, lindo, lindo, eu gostei muito de fazer. E como tudo não se resume à TV Globo, voltei para a Tupi em determinado momento para fazer quatro novelas: Barba Azul, Ovelha Negra, Xeque-Mate e Salário Mínimo, todas elas, com mulheres incríveis: Eva Wilma, Cleide Yáconis, Lilian Lemmertz e Nicette Bruno. Que time! Eu era feliz e não sabia. Na Tupi não era trabalho, era prazer. Trabalhar significava se divertir, tudo era descontraído, calmo, tranquilo. E nós atores procurávamos fazer o melhor possível dentro daquela precariedade de recursos técnicos. E conseguíamos nos superar. Havia uma vontade tão grande que um dia o diretor de Xeque- -Mate pediu que eu dirigisse uma cena. Foi tão prazeroso o exercício de algo novo, que bom é trabalhar sem pressão. Eu dirigi uma cena da Lilian e aproveitei bem: só a mão dela pegando uma taça, a taça ia subindo até chegar aos lábios dela, em close. Ficou interessante, confesso. E jamais me esqueci desse momento mágico, que só o clima ameno na Tupi permitiu. Chegou um momento, porém, que a Tupi já estava completamente decadente, os salários atrasavam e decidi tomar outro rumo. Fui para a Rede Bandeirantes em Pé-de-Vento, uma tentativa de fazer dramaturgia lá, que não deu certo. Fiz minhas malas e me mudei para o SBT para fazer Uma Esperança no Ar, Brasileiros e Brasileiras, com Walter Avancini, que tentou levantar a emissora por meio de novelas. Era hora de voltar para a Globo em Livre para Voar, em que fiz um alcoólatra, um trabalho que considero bem interessante. Em seguida fui ser o pai de Glória Pires em O Direito de Amar, fiquei muito amigo dela e seu eterno admirador. O queridinho Lauro Corona estava também na novela, que saudade! Felicidade, de Manoel Carlos, é, sem dúvida, um dos melhores trabalhos que fiz na televisão. Meu personagem Chico Treva me permitiu vôos inimagináveis. Um ser bizarro, doce, abobalhado e perseguido pelos habitantes de Vila Feliz. Fiz uma prótese especial, que acentuava mais ainda a estranheza do personagem. Ele não falava nada, era tudo no olho. Mas haveria um momento na história, em um julgamento, que ele falaria. Fiz um levantamento de depoimentos de violeiros, que falavam um linguajar muito curioso, não era bem um caipira paulista convencional. Peguei um desses depoimentos, fiquei estudando a voz desse cara, e decidi que ia chupar para ser a voz do Chico Treva. Manoel Carlos me ligou um dia: Ednei, você não vai falar, porque o seu personagem não precisa falar, é um pecado colocar uma palavra no teu personagem, não é justo, não acho legal. Faz o que você achar melhor. E aí não falei. Tropicaliente, na Globo, e Antônio Alves, Taxista, no SBT, me deram prazer pelos mesmos motivos: trabalhar viajando. Todas as externas de Tropicaliente eram feitas no Nordeste e amei. Já Antônio Alves foi toda gravada em Buenos Aires, conhecia bem a cidade, fiz amigos e tive a oportunidade de trabalhar em uma emissora estrangeira, com valores, conceitos e relações muito diferentes das que estava acostumado. Ainda no capítulo experiências, fiz Perdidos de Amor na Bandeirantes, que não deu nada certo e Brida, mais uma vez chamado pelo Avancini, que dessa vez tentava salvar a Manchete. Dois fracassos absolutos. Brida, então, foi uma tristeza, eu fazia um cego, estudei tanto para fazê-lo, frequentei o Instituto Benjamin Constant, mergulhei na cegueira, mas não durou um mês a novela, descambou totalmente, Avancini tentou salvar mudando a história, mas Brida foi para o espaço. Outras novelas estão no meu currículo e me deram prazer, como Sabor da Paixão, em que era par do Serginho Mamberti, uma dupla divertida, sem dúvida. E muitas outras estarão, disso não tenho dúvida. A televisão me trouxe muito reconhecimento, não posso negar. Fui capa de revista, viajei muito, fui a muitos bailes de carnaval como convidado de honra, que delícia, éramos jovens e rolava de tudo. Dizem que hoje existe uma invasão da vida privada, nunca vivenciei isso. Tenho a impressão, porém, que nós artistas precisamos relaxar, ir ao supermercado, caminhar na praia, e não contribuir para criar essa aura de endeusamento. Esconder-se estimula mais ainda essa invasão. Se você se expuser, o que mais o fotógrafo pode fazer do que tirar fotografia? Tenho a impressão que as pessoas gostam de se tornar mitos, alimentam um pouco essa loucura, e gostam de dar um rolê exatamente onde tem paparazzo. Ninguém invade a vida da Aracy Balabanian, por exemplo. E tem atriz que tenha tido uma trajetória tão bela e com sucesso como a dela? Ela foi estrela da Tupi, assinou contrato com a Globo no Jornal Nacional, e nunca foi invadida. Seu comportamento jamais permitiu. Mais importante que isso, a televisão me ensinou a ser ágil, rápido e usar toda a técnica de forma instantânea, como se fosse mágica. De cara, entendi algo: nós, atores, não temos muita influência nos desígnios da televisão, não determinamos nada. Fazemos nosso trabalho da melhor maneira possível, mas somos apenas instrumentos, bem usados às vezes, mal-usados em outras; bem pagos às vezes, e muito mal-pagos em outras com maior frequência; dirigidos às vezes, quase sempre não-dirigidos. É sempre um pega para capar! Mas quer saber de uma coisa? Sempre gostei deste frisson, porque podia ver o resultado imediato, em teatro o ator fica ensaiando três meses, estreia e, se não der certo o que imaginou pode só acertar o personagem no último dia da temporada. Televisão não: é preciso ir com a cara e com a coragem, meter os peitos, é uma corda bamba em cima de um precipício. Não pode ter medo de cair. Para me defender sempre segui os ensinamentos do mestre Eugênio Kusnet: tudo tem que ser feito para valer, pensa, pensa, pensa e faz. E quando não tiver emoção para fazer a cena, pense em alguma coisa sua do passado que causou emoção, e diz a sua fala. Pode parecer que se usou uma mentira, mas o resultado vai ser bom. Eu usei isso sempre na televisão. Decoro o texto, busco os sentimentos certos, o sentido das cenas e vou aberto para a gravação. Em TV não se sabe com que roupa vai estar, se ficará sentado ou em pé, porque as marcações são sempre dadas na hora. A solução é descontrair, deixar a sensibilidade molinha, flexível, para en carar a cena na hora, arriscar e fazer para valer. E se necessário, tome de memória afetiva. Viva Stanilavski! Viva Kusnet! É muito gratificante buscar algo em sua memória e se tornar o dono da sua emoção. Funciona, garanto! Isso me torna completamente seguro com relação aos meus personagens na televisão? Ora, claro que não! Insegurança é meu lema. Por mais que você se arme sempre haverá o frisson na hora de encarar o precipício. E como me armo! Tenho minhas manias. Agora mesmo, para criar Giovanni Petrone poderia usar somente o referencial dos meus avós, fazer um sotaque, que também me é familiar, e pronto. Podia simplesmente copiar o excelente trabalho de Felipe Carone, na primeira versão de Uma Rosa com Amor. Ao contrário, não quis nem ver capítulo algum, com todo o respeito que o elenco merece. Precisava buscar este meu italiano. Na sinopse estava escrito que ele é abrutalhado, fala alto e gesticula muito. Mas por quê? Salve Antunes! Será que o avô dele era surdo e ele só aprendeu a falar alto? Será que ele sofreu tanto por emigrar, deixar a terra que conhecia, onde macerava a uva, fazia vinho? Ele admira a fartura que encontrou no Brasil e por isso se irrita tanto com o desperdício? Sou capaz de ficar horas imerso nessas conjecturas, buscando respostas para o meu Giovanni. Depois disso entrei em outra nóia: vendo somente filmes italianos. Aracy, que também fará uma italiana, Gema, na novela de Sílvio de Abreu, virou a minha cúmplice. Trocamos filmes diariamente. Hoje mesmo revi Oito e Meio de Fellini, uma obra-prima, nunca vi um filme que coloque tão bem o processo de criação, as ambiguidades de um criador, a sua capacidade de manipular as pessoas, que chega às raias da neurose, da doença. Vi filmes de Vittório De Sica, Visconti, Belochio – nenhum deles tinha um italiano que veio para o Brasil. Podem não ter me ajudado muito, mas abriram mais ainda a minha imaginação, a minha busca pelo meu Giovanni. Hoje à noite vou escrever a história de sua vida, seu passado, sua família, e as conversas com a minha irmã têm me ajudado muito, pois ela fez o levantamento de nossa árvore genealógica. Vou procurar todos os antecedentes do meu personagem e isso me ajudará a achar a sua rudeza, a sua impaciência, o seu senso de retidão, sua severidade. Ele não está dentro de mim, sou muito diferente dele, mas o meu amor por ele fará com que eu entenda seus caminhos. Posso não achá-lo em sua plenitude, sempre haverá o Ednei, e não quero fazer de menos, nem de mais. Não sei e nem estou interessado se esse trabalho garante o sucesso, pode ser que não sirva para nada na hora da gravação, existe este risco. Mas não faço tudo isso para que meu personagem brilhe, mais uma vez seria uma vaidade mixa. Faço para domar a minha insegurança sempre presente e me sentir à vontade naquela pele e poder usar toda a minha sensibilidade, a minha dor, a minha fúria. Mais uma vez, é isso que me mantém VIVO. E dono da própria emoção. Cronologia de Uma Carreira Teatro É para o teatro que volto sempre, ele é minha fonte. Teatro Profissional Ordem decrescente a partir de 2009 • Maria Stuart, de Schiller Tradução: Manuel Bandeira – Direção: Antonio Gilberto – Personagem: Confessor • Molly Sweeney – Um Rastro de Luz, de Brian Friel Direção: Celso Nunes – Teatro Centro Cultural Banco do Brasil – Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília – Personagem: dr. Rice • Pequenas Raposas, de Lilian Hellman Direção: Naum Alves de Souza – Teatro Centro Cultural Banco do Brasil-Rio de Janeiro e Brasília – Personagem: Oscar • A Visita da Velha Senhora, de Friedrich Durrenmatt Direção: Moacir Góes – Teatro Sérgio Cardoso/ SP – Personagem: Antônio Schill • Michelangelo, de Doc Comparatto Direção: Antônio Abujamra – Teatro João Caetano/RJ – Personagem: Papa Julius II • Capitu – Olhos de Ressaca, da obra Dom Casmurro, de Machado de Assis Adaptação: Marcus Vinícius Faustini e Walter Daquerre – Direção: Marcus Vinícius Faustini – Teatro da Academia Brasileira de Letras e Teatro da Cidade/RJ – Personagem: Dom Casmurro • Vermelhos Balões Vermelhos, de Eduardo Pavlowsky Direção: Marcus Alvisi – Teatro Cândido Mendes/ RJ – Personagem: Cardeal • Frankenstein, de Mary Shelley Direção: Angela Leite Lopes – Tradução e Adaptação: Sidney Cruz – Centro Cultural Banco do Brasil/RJ – Personagem: A criatura • Tartufo, de Moliére Direção, Tradução e Adaptação: José Rubens Siqueira – Teatro Sérgio Cardoso e Teatro Brasileiro de Comédia/SP – Personagem: Tartufo • O Mercador de Veneza, de W. Shakespeare Direção: Cláudio Torres Gonzaga – Teatro Glauce Rocha/RJ – Personagem: Shylock Indicação para o prêmio Shell de Melhor Ator • O Duplo, de Domingos de Oliveira Direção: Domingos de Oliveira – Teatro dos Quatro/RJ – Personagem: Psicanalista Marco Aurélio • Descalços no Parque, de Neil Simon Tradução: Flávio Marinho – Direção: Ricardo Waddington – Teatro Clara Nunes/RJ – Personagem: Vitor Velasco • Folias no Box, de Flávio de Souza Direção: Denise Saraceni e Fernando de Souza – Teatro da Lagoa/RJ • Rei do Riso, de Luiz Alberto Abreu Direção: Osmar Rodrigues Cruz – Teatro Popular do SESI/SP – Personagem: Ator Vasques • Dona Flor e Seus Dois Maridos, de Jorge Amado Direção e Adaptação: José Maria Paoloantonio – Personagem: Farmacêutico • Hedda Gabler, de Ibsen Direção: Gilles Gwizdeck – Teatro Gláucio Gil/ RJ - Personagem: Lovborg • O Jardim das Cerejeiras, de Tchekov Direção: Jorge Takla – Teatro Anchieta (Sesc) – Personagem: Lopakhine • As Tias, de Aguinaldo Silva e Doc Comparato Direção: Luiz de Lima – Teatro da Lagoa/RJ – Personagem: Arlindo • Teu Nome é Mulher, de Marcel Mitois Direção: Adolfo Celi – Teatro Maison de France/ RJ – Personagem: Inspetor • Caixa de Sombras, de Michael Cristofer Direção: Emílio Di Biasi – Teatro da Faap/SP e Teatro Villa Lobos/RJ – Personagem: Brian Prêmio Governador do Estado de São Paulo de Melhor Ator • Senhor dos Cachorros Projeto Cacilda Becker – Teatro Brasileiro de Comédia/SP – Personagem: Polts • Arte-Final, de Queiroz Teles Projeto Cacilda Becker – Teatro Brasileiro de Comédia/SP – Personagem: Dono da Empresa • O Assalto, de José Vicente Direção: Antunes Filho – Turnê pelo Norte e Nordeste – Personagem: Bancário • A Noite dos Campeões, de Jason Miller Direção: Cecil Thiré – Teatro Augusta/SP – Personagem: Peter • Equus, de Peter Shaffer Direção: Celso Nunes – Teatro Maria Della Costa/ SP - Personagem: Dr. Dysart • Um Bonde Chamado Desejo, de Tenneesse Williams Direção: Kiko Jaess – Teatro Anchieta/SP – Personagem: Mitch • O China, de Shisgall Murray Direção: Martin Gonçalves – Teatro da Cidade/ RJ – Personagem: Senhor Ho Hing Lee • O Balcão, de Jean Genet Direção: Martin Gonçalves – Teatro João Caeta-no/RJ – Personagem: O mensageiro • A Alma Boa de Setsuan, de Bertolt Brecht Direção: Benjamim Catan – Teatro Maria Della Costa/SP – Personagem: Primeiro Deus • Humilhados e Ofendidos, de Dostoiewski Direção: Vignat – Teatro Ruth Escobar/SP • Os Últimos, de M. Gorki Direção: Antônio Abujamra – Teatro Cacilda Becker/SP – Personagem: O médico • O Santo Inquérito, de Dias Gomes Direção: Emílio Fontana – Teatro Nações Unidas/ SP – Personagem: Padre Bernardo • O Versátil mr. Sloane, de Joe Orton Direção: Antônio Gighoneto – Teatro Ruth Escobar (Balcão)/SP – Personagem: Ed • Zoo Story, de E. Albee Direção: Emílio Fontana – Teatro da Rua/SP – Personagem: Jerry • Os Inimigos, de M. Gorki Direção: José Celso Martinez Corrêa – Teatro Oficina e Teatro Brasileiro de Comédia/SP – Personagem: Iakov • A Megera Domada, de W. Shakespeare Direção: Antunes Filho – Teatro Aliança Francesa/ SP – Personagens: Lord do Prólogo e Pai Batista • Andorra, de Max Frisch Direção: José Celso Martinez Corrêa – Teatro Oficina/SP – Personagem: Mestre-Escola • Sorocaba Senhor, de Lope de Vega Direção e Adaptação: Antônio Abujamra – Teatro Leopoldo Fróes/SP – Personagem: Coronel • A Mulher do Outro, de Sidney Howard Direção: José Renato – Teatro de Arena/SP – Personagem: O padre Teatro Amador • O Sábio, de Joracy Camargo (estreia) • O Sol Poente, de Ramada Curto • O Homem da Flor na Boca, de L. Pirandello • Tragédia em Nova York, de Maxwell Anderson Prêmio Arlequim de Melhor Ator • A Noite de 16 de Janeiro, de Ayn Rand • Espelho da Ilusão -Kinuta -Hagoromo: Nôs Japoneses • Demorado Adeus, de Tennesse Williams Prêmio de melhor ator no Festival de Teatro Amador na TV Tupi • O Fazedor de Chuvas, de Richard Nash -Teatro Experimental do Sesi • A Beata Maria do Egito, de Raquel de Queiroz – Teatro Experimental do Sesi • A Cidade Assassinada, de Antônio Callado – Teatro Experimental do Sesi • A Morsa, de L. Pirandello entre outras peças Vídeo • O Espiritismo de Kardec aos Dias de Hoje Televisão Para mim, a televisão é uma das grandes criações da Idade Moderna. Novelas 2010 • Uma Rosa com Amor, de Tiago Santiago, baseada em novela de Vicente Sesso, direção-geral de Del Rangel, como Giovanni Petroni – SBT. 2008 • Ciranda de Pedra, de Alcides Nogueira, dirigida por Maria de Médicis, Natalia Grimberg, André Luiz Câmara, e Allan Fitterman, direção-geral de Carlos Araújo, núcleo Denise Saraceni, como dr. Madeira – Rede Globo. 2002 • Sabor da Paixão, de Ana Maria Moretzsohn, dirigida por Fabrício Mamberti, Ulysses Cruz, Maria de Médicis e Vinícius Coimbra, direção-geral e de núcleo de Denise Saraceni, como Quintino – Rede Globo. 1998 • Brida, 1998, de Jayme Camargo, baseada em romance de Paulo Coelho, dirigida por Walter Avancini, Sérgio Mattar, Lizâneas Azevedo e Luiz Antônio Pilar, como Patrick O´Neil – Rede Manchete 1996 • Antonio Alves – Taxista, de Ronaldo Ciambroni, como Ariovaldo – SBT. • Perdidos de Amor, de Ana Maria Moretzsohn, dirigida por José Carlos Pieri e Mauro Farias, direção-geral de Mauro Waisman, como Fabiano Caldas – Rede Bandeirantes. 1994 • Tropicaliente, de Walter Negrão, dirigida por Gonzaga Blota, Marcelo Travesso e Rogério Go mes, como Bonfim – Rede Globo. 1991 • Felicidade, de Manoel Carlos, dirigida por Denise Saraceni, Fermando de Souza e Ignácio Coqueiro, como Chico Treva – Rede Globo. 1990 • Brasileiros e Brasileiras, novela de Carlos Alfredo Sofredini e Walter Avancini, dirigida por Walter Avancini – SBT. 1989 • Que Rei Sou Eu?, de Cassiano Gabus Mendes, dirigida por Jorge Fernando, Lucas Bueno, Mário Márcio Bandarra e Fábio Sabag, como François Gaillard – Rede Globo. 1987 • Direito de Amar, de Walter Negrão, Alcides Nogueira, Marilu Saldanha e Ana Maria Moretzshon, dirigida por Jayme Monjardim e José Carlos Pieri, como Augusto Medeiros – Rede Globo. 1985 • Uma Esperança no Ar, de Amilton Monteiro e Ismael Fernandes, dirigida por Jardel Mello, como Daniel – SBT. 1984 • Partido Alto, de Aguinaldo Silva e Glória Perez, dirigida por Roberto Talma, Luiz Antônio Piá, Carlos Magalhães, Jayme Monjardim e Helmar Sérgio, supervisão Roberto Talma, como Alceu – Rede Globo. • Livre para Voar, de Walter Negrão e Alcides Nogueira, dirigida por Wolf Maya e Fred Con falonieri, como Álvaro – Rede Globo. 1980 • Pé de vento, de Benedito Ruy Barbosa, direção de Arlindo Barreto e Plínio Fernandes, como Edmundo – Rede Bandeirantes. 1978 • Salário Mínimo, de Chico de Assis, direção Antônio Abujamra, como Hércules – TV Tupi. 1976 • Xeque-Mate, de Walter Negrão e Chico de Assis, dirigida por David Grimberg, como Rodolfo Bastos – TV Tupi. 1975 • Ovelha Negra, de Walter Negrão e Chico de Assis, dirigida por Edson Braga e Atilio Riccó, como Padre Jonas – TV Tupi. 1974 • A Barba Azul, de Ivani Ribeiro, dirigida por Henrique Martins e Antônio de Moura Mattos, como Vitorio, Conde de Parma – TV Tupi. 1973 • Os Ossos do Barão, de Jorge de Andrade, dirigida por Régis Cardoso e Gonzaga Blota, supervisão de Daniel Filho, como Vicente – Rede Globo. 1972 • Selva de Pedra, de Janete Clair, dirigida por Daniel Filho, Régis Cardoso e Reynaldo Boury, como Jorge Moreno – Rede Globo. 1971 • O Homem Que Deve Morrer, de Janete Clair, dirigida por Daniel Filho e Mílton Gonçalves, como Ricardo Lopes – Rede Globo. 1970 • Pigmalião 70, de Vicente Sesso, dirigida por Régis Cardoso, como Carlito - Rede Globo. • A Próxima Atração, de Walter Negrão, dirigida por Régis Cardoso, como Mário Yamashita – Rede Globo. 1969 • A Grande Mentira, de Hedy Maia, direção de Fábio Sabag e Marlos Andreucci, como Paulo Bacelar – Rede Globo. • A Cabana do Pai Tomás, de Hedy Maia, Walter Negrão e Péricles Leal, baseado em romance de Harriet Stower, dirigida por Fábio Sabag, Daniel Filho, Walter Campos e Régis Cardoso, como mr. Legree – Rede Globo. 1968 • O Santo Mestiço, de Glória Magadan, dirigida por Fábio Sabag, como Gerardo - Rede Globo. 1967 • Yoshico, Um Poema de Amor, de Lúcia Lambertini, dirigida por Antônio Abujamra, como Kawabata San – TV Tupi. • O Pequeno Lord, de Tatiana Belinky, baseada em romance de Frances Burnett, dirigida por Antônio Abujamra – TV Tupi. • O Jardineiro Espanhol, de Tatiana Belinky, baseada em romance de A.J. Cronin, dirigida por Antônio Abujamra, como Garcia – TV Tupi. Especiais (entre outros): • Queridos Amigos – Rede Globo • Abolição – Rede Globo • Mulher – Rede Globo • Dibuk – Rede Globo • Hugo, o boneco – TV Cultura • A Carta – TV Cultura • Reveillon – TV Cultura • Em Família – Rede Globo • O Campeão – TV Excelsior • Esta Gente Simpática (seriado) - TV Tupi Cinema Acho que não vai ser nessa vida que eu vou ser um ator de cinema, o cinema não entrou verdadeiramente dentro da minha vida, embora eu o ame. 1999 • No Coração dos Deuses, de Geraldo Moraes. 1990 • Círculo de Fogo, de Geraldo Moraes. 1974 • Um Homem Célebre, de Miguel Faria Jr. • O Marginal, de Carlos Manga. 1973 • Êxtase de Sádicos, de C. Adolpho Chadler. 1971 • Mãos Vazias, de Luiz Carlos Lacerda. Índice No Passado Está a História do Futuro – Alberto Goldman 5 Coleção Aplauso – Hubert Alquéres 7 Introdução – Tania Carvalho 13 Um Homem Gentil 21 A Gênese 33 Vanitas, Vanitas, Vanitas 53 A Vida no Teatro 63 A Solidão do Ator 101 Teatro é Duro 129 A Maldição e a Redenção 139 E mais teatro.... 145 A Trajetória na Televisão 169 Cronologia de Uma Carreira 199 Crédito das Fotografias Ary Brandi 95 Bik Press 191 Christina F. Carvalho 93 Cláudia Ribeiro 150, 151, 153, 154 Frederico Mendes 110 Leonardo Aversa 146 Márcio RM 57, 165 Paulo Jabur 122 Peddro 117, 208 Scrafide 60, 174 A despeito dos esforços de pesquisa empreendidos pela Editora para identificar a autoria das fotos expostas nesta obra, parte delas não é de autoria conhecida de seus organizadores. Agradecemos o envio ou comunicação de toda informação relativa à autoria e/ou a outros dados que porventura estejam incompletos, para que sejam devidamente creditados. Coleção Aplauso Série Cinema Brasil Alain Fresnot – Um Cineasta sem Alma Alain Fresnot Agostinho Martins Pereira – Um Idealista Máximo Barro Alfredo Sternheim – Um Insólito Destino Alfredo Sternheim O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias Roteiro de Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert e Cao Hamburger Anselmo Duarte – O Homem da Palma de Ouro Luiz Carlos Merten Antonio Carlos da Fontoura – Espelho da Alma Rodrigo Murat Ary Fernandes – Sua Fascinante História Antônio Leão da Silva Neto O Bandido da Luz Vermelha Roteiro de Rogério Sganzerla Batismo de Sangue Roteiro de Dani Patarra e Helvécio Ratton Bens Confiscados Roteiro comentado pelos seus autores Daniel Chaia e Carlos Reichenbach Braz Chediak – Fragmentos de uma Vida Sérgio Rodrigo Reis Cabra-Cega Roteiro de Di Moretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo Kauffman O Caçador de Diamantes Roteiro de Vittorio Capellaro, comentado por Máximo Barro Carlos Coimbra – Um Homem Raro Luiz Carlos Merten Carlos Reichenbach – O Cinema Como Razão de Viver Marcelo Lyra A Cartomante Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis Casa de Meninas Romance original e roteiro de Inácio Araújo O Caso dos Irmãos Naves Roteiro de Jean-Claude Bernardet e Luis Sérgio Person O Céu de Suely Roteiro de Karim Aïnouz, Felipe Bragança e Maurício Zacharias Chega de Saudade Roteiro de Luiz Bolognesi Cidade dos Homens Roteiro de Elena Soárez Como Fazer um Filme de Amor Roteiro escrito e comentado por Luiz Moura e José Roberto Torero O Contador de Histórias Roteiro de Luiz Villaça, Mariana Veríssimo, Maurício Arruda e José Roberto Torero Críticas de B.J. Duarte – Paixão, Polêmica e Generosidade Luiz Antonio Souza Lima de Macedo Críticas de Edmar Pereira – Razão e Sensibilidade Org. Luiz Carlos Merten Críticas de Jairo Ferreira – Críticas de invenção: Os Anos do São Paulo Shimbun Org. Alessandro Gamo Críticas de Luiz Geraldo de Miranda Leão – Analisando Cinema: Críticas de LG Org. Aurora Miranda Leão Críticas de Ruben Biáfora – A Coragem de Ser Org. Carlos M. Motta e José Júlio Spiewak De Passagem Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias Desmundo Roteiro de Alain Fresnot, Anna Muylaert e Sabina Anzuategui Djalma Limongi Batista – Livre Pensador Marcel Nadale Dogma Feijoada: O Cinema Negro Brasileiro Jeferson De Dois Córregos Roteiro de Carlos Reichenbach A Dona da História Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho Os 12 Trabalhos Roteiro de Cláudio Yosida e Ricardo Elias Estômago Roteiro de Lusa Silvestre, Marcos Jorge e Cláudia da Natividade Feliz Natal Roteiro de Selton Mello e Marcelo Vindicatto Fernando Meirelles – Biografia Prematura Maria do Rosário Caetano Fim da Linha Roteiro de Gustavo Steinberg e Guilherme Werneck; Storyboards de Fábio Moon e Gabriel Bá Fome de Bola – Cinema e Futebol no Brasil Luiz Zanin Oricchio Francisco Ramalho Jr. – Éramos Apenas Paulistas Celso Sabadin Geraldo Moraes – O Cineasta do Interior Klecius Henrique Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta Cinéfilo Luiz Zanin Oricchio Helvécio Ratton – O Cinema Além das Montanhas Pablo Villaça O Homem que Virou Suco Roteiro de João Batista de Andrade, organização de Ariane Abdallah e Newton Cannito Ivan Cardoso – O Mestre do Terrir Remier João Batista de Andrade – Alguma Solidão e Muitas Histórias Maria do Rosário Caetano Jorge Bodanzky – O Homem com a Câmera Carlos Alberto Mattos José Antonio Garcia – Em Busca da Alma Feminina Marcel Nadale José Carlos Burle – Drama na Chanchada Máximo Barro Liberdade de Imprensa – O Cinema de Intervenção Renata Fortes e João Batista de Andrade Luiz Carlos Lacerda – Prazer & Cinema Alfredo Sternheim Maurice Capovilla – A Imagem Crítica Carlos Alberto Mattos Mauro Alice – Um Operário do Filme Sheila Schvarzman Máximo Barro – Talento e Altruísmo Alfredo Sternheim Miguel Borges – Um Lobisomem Sai da Sombra Antônio Leão da Silva Neto Não por Acaso Roteiro de Philippe Barcinski, Fabiana Werneck Barcinski e Eugênio Puppo Narradores de Javé Roteiro de Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu Olhos Azuis Argumento de José Joffily e Jorge Duran Roteiro de Jorge Duran e Melanie Dimantas Onde Andará Dulce Veiga Roteiro de Guilherme de Almeida Prado Orlando Senna – O Homem da Montanha Hermes Leal Pedro Jorge de Castro – O Calor da Tela Rogério Menezes Quanto Vale ou É por Quilo Roteiro de Eduardo Benaim, Newton Cannito e Sergio Bianchi Ricardo Pinto e Silva – Rir ou Chorar Rodrigo Capella Rodolfo Nanni – Um Realizador Persistente Neusa Barbosa Salve Geral Roteiro de Sergio Rezende e Patrícia Andrade O Signo da Cidade Roteiro de Bruna Lombardi Ugo Giorgetti – O Sonho Intacto Rosane Pavam Viva-Voz Roteiro de Márcio Alemão Vladimir Carvalho – Pedras na Lua e Pelejas no Planalto Carlos Alberto Mattos Vlado – 30 Anos Depois Roteiro de João Batista de Andrade Zuzu Angel Roteiro de Marcos Bernstein e Sergio Rezende Série Cinema Bastidores – Um Outro Lado do Cinema Elaine Guerini Série Ciência & Tecnologia Cinema Digital – Um Novo Começo? Luiz Gonzaga Assis de Luca A Hora do Cinema Digital – Democratização e Globalização do Audiovisual Luiz Gonzaga Assis De Luca Série Crônicas Crônicas de Maria Lúcia Dahl – O Quebra-cabeças Maria Lúcia Dahl Série Dança Rodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo – Dança Universal Sérgio Rodrigo Reis Série Música Maestro Diogo Pacheco – Um Maestro para Todos Alfredo Sternheim Rogério Duprat – Ecletismo Musical Máximo Barro Sérgio Ricardo – Canto Vadio Eliana Pace Wagner Tiso – Som, Imagem, Ação Beatriz Coelho Silva Série Teatro Brasil Alcides Nogueira – Alma de Cetim Tuna Dwek Antenor Pimenta – Circo e Poesia Danielle Pimenta Cia de Teatro Os Satyros – Um Palco Visceral Alberto Guzik Críticas de Clóvis Garcia – A Crítica Como Oficio Org. Carmelinda Guimarães Críticas de Maria Lucia Candeias – Duas Tábuas e Uma Paixão Org. José Simões de Almeida Júnior Federico Garcia Lorca – Pequeno Poema Infinito Antonio Gilberto e José Mauro Brant Ilo Krugli – Poesia Rasgada Ieda de Abreu João Bethencourt – O Locatário da Comédia Rodrigo Murat José Renato – Energia Eterna Hersch Basbaum Leilah Assumpção – A Consciência da Mulher Eliana Pace Luís Alberto de Abreu – Até a Última Sílaba Adélia Nicolete Maurice Vaneau – Artista Múltiplo Leila Corrêa Renata Palottini – Cumprimenta e Pede Passagem Rita Ribeiro Guimarães Teatro Brasileiro de Comédia – Eu Vivi o TBC Nydia Licia O Teatro de Abílio Pereira de Almeida Abílio Pereira de Almeida O Teatro de Aimar Labaki Aimar Labaki O Teatro de Alberto Guzik Alberto Guzik O Teatro de Antonio Rocco Antonio Rocco O Teatro de Cordel de Chico de Assis Chico de Assis O Teatro de Emílio Boechat Emílio Boechat O Teatro de Germano Pereira – Reescrevendo Clássicos Germano Pereira O Teatro de José Saffioti Filho José Saffioti Filho O Teatro de Alcides Nogueira – Trilogia: Ópera Joyce – Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso – Pólvora e Poesia Alcides Nogueira O Teatro de Ivam Cabral – Quatro textos para um teatro veloz: Faz de Conta que tem Sol lá Fora – Os Cantos de Maldoror – De Profundis – A Herança do Teatro Ivam Cabral O Teatro de Noemi Marinho: Fulaninha e Dona Coisa, Homeless, Cor de Chá, Plantonista Vilma Noemi Marinho Teatro de Revista em São Paulo – De Pernas para o Ar Neyde Veneziano O Teatro de Samir Yazbek: A Entrevista – O Fingidor – A Terra Prometida Samir Yazbek O Teatro de Sérgio Roveri Sérgio Roveri Teresa Aguiar e o Grupo Rotunda – Quatro Décadas em Cena Ariane Porto Série Perfil Analy Alvarez – De Corpo e Alma Nicolau Radamés Creti Aracy Balabanian – Nunca Fui Anjo Tania Carvalho Arllete Montenegro – Fé, Amor e Emoção Alfredo Sternheim Ary Fontoura – Entre Rios e Janeiros Rogério Menezes Berta Zemel – A Alma das Pedras Rodrigo Antunes Corrêa Bete Mendes – O Cão e a Rosa Rogério Menezes Betty Faria – Rebelde por Natureza Tania Carvalho Carla Camurati – Luz Natural Carlos Alberto Mattos Cecil Thiré – Mestre do seu Ofício Tania Carvalho Celso Nunes – Sem Amarras Eliana Rocha Cleyde Yaconis – Dama Discreta Vilmar Ledesma David Cardoso – Persistência e Paixão Alfredo Sternheim Débora Duarte – Filha da Televisão Laura Malin Denise Del Vecchio – Memórias da Lua Tuna Dwek Elisabeth Hartmann – A Sarah dos Pampas Reinaldo Braga Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida Maria Leticia Emilio Di Biasi – O Tempo e a Vida de um Aprendiz Erika Riedel Etty Fraser – Virada Pra Lua Vilmar Ledesma Ewerton de Castro – Minha Vida na Arte: Memória e Poética Reni Cardoso Fernanda Montenegro – A Defesa do Mistério Neusa Barbosa Fernando Peixoto – Em Cena Aberta Marília Balbi Geórgia Gomide – Uma Atriz Brasileira Eliana Pace Gianfrancesco Guarnieri – Um Grito Solto no Ar Sérgio Roveri Glauco Mirko Laurelli – Um Artesão do Cinema Maria Angela de Jesus Ilka Soares – A Bela da Tela Wagner de Assis Irene Ravache – Caçadora de Emoções Tania Carvalho Irene Stefania – Arte e Psicoterapia Germano Pereira Isabel Ribeiro – Iluminada Luis Sergio Lima e Silva Isolda Cresta – Zozô Vulcão Luis Sérgio Lima e Silva Joana Fomm – Momento de Decisão Vilmar Ledesma John Herbert – Um Gentleman no Palco e na Vida Neusa Barbosa Jonas Bloch – O Ofício de uma Paixão Nilu Lebert Jorge Loredo – O Perigote do Brasil Cláudio Fragata José Dumont – Do Cordel às Telas Klecius Henrique Leonardo Villar – Garra e Paixão Nydia Licia Lília Cabral – Descobrindo Lília Cabral Analu Ribeiro Lolita Rodrigues – De Carne e Osso Eliana Castro Louise Cardoso – A Mulher do Barbosa Vilmar Ledesma Marcos Caruso – Um Obstinado Eliana Rocha Maria Adelaide Amaral – A Emoção Libertária Tuna Dwek Marisa Prado – A Estrela, O Mistério Luiz Carlos Lisboa Mauro Mendonça – Em Busca da Perfeição Renato Sérgio Miriam Mehler – Sensibilidade e Paixão Vilmar Ledesma Naum Alves de Souza: Imagem, Cena, Palavra Alberto Guzik Nicette Bruno e Paulo Goulart – Tudo em Família Elaine Guerrini Nívea Maria – Uma Atriz Real Mauro Alencar e Eliana Pace Niza de Castro Tank – Niza, Apesar das Outras Sara Lopes Paulo Betti – Na Carreira de um Sonhador Teté Ribeiro Paulo José – Memórias Substantivas Tania Carvalho Paulo Hesse – A Vida Fez de Mim um Livro e Eu Não Sei Ler Eliana Pace Pedro Paulo Rangel – O Samba e o Fado Tania Carvalho Regina Braga – Talento é um Aprendizado Marta Góes Reginaldo Faria – O Solo de Um Inquieto Wagner de Assis Renata Fronzi – Chorar de Rir Wagner de Assis Renato Borghi – Borghi em Revista Élcio Nogueira Seixas Renato Consorte – Contestador por Índole Eliana Pace Rolando Boldrin – Palco Brasil Ieda de Abreu Rosamaria Murtinho – Simples Magia Tania Carvalho Rubens de Falco – Um Internacional Ator Brasileiro Nydia Licia Ruth de Souza – Estrela Negra Maria Ângela de Jesus Sérgio Hingst – Um Ator de Cinema Máximo Barro Sérgio Viotti – O Cavalheiro das Artes Nilu Lebert Silnei Siqueira – A Palavra em Cena Ieda de Abreu Silvio de Abreu – Um Homem de Sorte Vilmar Ledesma Sônia Guedes – Chá das Cinco Adélia Nicolete Sonia Maria Dorce – A Queridinha do meu Bairro Sonia Maria Dorce Armonia Sonia Oiticica – Uma Atriz Rodriguiana? Maria Thereza Vargas Stênio Garcia – Força da Natureza Wagner Assis Suely Franco – A Alegria de Representar Alfredo Sternheim Tatiana Belinky – ... E Quem Quiser Que Conte Outra Sérgio Roveri Theresa Amayo – Ficção e Realidade Theresa Amayo Tony Ramos – No Tempo da Delicadeza Tania Carvalho Umberto Magnani – Um Rio de Memórias Adélia Nicolete Vera Holtz – O Gosto da Vera Analu Ribeiro Vera Nunes – Raro Talento Eliana Pace Walderez de Barros – Voz e Silêncios Rogério Menezes Walter George Durst – Doce Guerreiro Nilu Lebert Zezé Motta – Muito Prazer Rodrigo Murat Especial Agildo Ribeiro – O Capitão do Riso Wagner de Assis Av. Paulista, 900 – a História da TV Gazeta Elmo Francfort Beatriz Segall – Além das Aparências Nilu Lebert Carlos Zara – Paixão em Quatro Atos Tania Carvalho Célia Helena – Uma Atriz Visceral Nydia Licia Charles Möeller e Claudio Botelho – Os Reis dos Musicais Tania Carvalho Cinema da Boca – Dicionário de Diretores Alfredo Sternheim Dina Sfat – Retratos de uma Guerreira Antonio Gilberto Eva Todor – O Teatro de Minha Vida Maria Angela de Jesus Eva Wilma – Arte e Vida Edla van Steen Gloria in Excelsior – Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira Álvaro Moya Lembranças de Hollywood Dulce Damasceno de Britto, organizado por Alfredo Sternheim Maria Della Costa – Seu Teatro, Sua Vida Warde Marx Mazzaropi – Uma Antologia de Risos Paulo Duarte Ney Latorraca – Uma Celebração Tania Carvalho Odorico Paraguaçu: O Bem-amado de Dias Gomes – História de um Personagem Larapista e Maquiavelento José Dias Raul Cortez – Sem Medo de se Expor Nydia Licia Rede Manchete – Aconteceu, Virou História Elmo Francfort Sérgio Cardoso – Imagens de Sua Arte Nydia Licia Tônia Carrero – Movida pela Paixão Tania Carvalho TV Tupi – Uma Linda História de Amor Vida Alves Victor Berbara – O Homem das Mil Faces Tania Carvalho Walmor Chagas – Ensaio Aberto para Um Homem Indignado Djalma Limongi Batista © 2010 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Carvalho, Tania Ednei Giovenazzi : dono da sua emoção / Tania Carvalho – São Paulo : Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010. 256. : il. – (Coleção aplauso. Série perfil / Coordenador geral Rubens Ewald Filho) ISBN 978-85-7060-836-9 1. Atores e atrizes de televisão – Biografia1. Atores e atrizes de cinema – Biografia 2. 2. I. Ewald Filho, Rubens. II. Título. III. Série. CDD 791.092 Índice para catálogo sistemático: 1. Atores brasileiros : Biografia : Representações públicas : Artes 791.092 Proibida reprodução total ou parcial sem autorização prévia do autor ou dos editores Lei nº 9.610 de 19/02/1998 Foi feito o depósito legal Lei nº 10.994, de 14/12/2004 Impresso no Brasil / 2010 Todos os direitos reservados. 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