Ilo Krugli Poesia Rasgada Ieda de Abreu Imprensa Oficial São Paulo, 2009 Governador José Serra Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Diretor-presidente Hubert Alquéres Coleção Aplauso Coordenador Geral Rubens Ewald Filho Apresentação Segundo o catalão Gaudí, Não se deve erguer monumentos aos artistas porque eles já o fize­ram com suas obras. De fato, muitos artistas são imortalizados e reverenciados diariamente por meio de suas obras eternas. Mas como reconhecer o trabalho de artistas geniais de outrora, que para exercer seu ofício muniram-se simplesmente de suas próprias emo­ções, de seu próprio corpo? Como manter vivo o nome daqueles que se dedicaram à mais volátil das artes, escrevendo, dirigindo e interpretan­do obras-primas, que têm a efêmera duração de um ato? Mesmo artistas da TV pós-videoteipe seguem esquecidos, quando os registros de seu trabalho ou se perderam ou são muitas vezes inacessíveis ao grande público. A Coleção Aplauso, de iniciativa da Imprensa Oficial, pretende resgatar um pouco da memória de figuras do Teatro, TV e Cinema que tiveram participação na história recente do País, tanto dentro quanto fora de cena. Ao contar suas histórias pessoais, esses artistas dão-nos a conhecer o meio em que vivia toda uma classe que representa a consciência crítica da sociedade. Suas histórias tratam do contexto social no qual estavam inseridos e seu inevitá­vel reflexo na arte. Falam do seu engajamento político em épocas adversas à livre expressão e as consequências disso em suas próprias vidas e no destino da nação. Paralelamente, as histórias de seus familiares se entrelaçam, quase que invariavelmente, à saga dos milhares de imigrantes do começo do século passado no Brasil, vindos das mais va­riadas origens. Enfim, o mosaico formado pelos depoimentos compõe um quadro que reflete a identidade e a imagem nacional, bem como o processo político e cultural pelo qual passou o país nas últimas décadas. Ao perpetuar a voz daqueles que já foram a pró­pria voz da sociedade, a Coleção Aplauso cumpre um dever de gratidão a esses grandes símbo­los da cultura nacional. Publicar suas histórias e personagens, trazendo-os de volta à cena, também cumpre função social, pois garante a preservação de parte de uma memória artística genuinamente brasileira, e constitui mais que justa homenagem àqueles que merecem ser aplaudidos de pé. José Serra Governador do Estado de São Paulo Coleção Aplauso O que lembro, tenho. Guimarães Rosa A Coleção Aplauso, concebida pela Imprensa Oficial, visa resgatar a memória da cultura nacional, biografando atores, atrizes e diretores que compõem a cena brasileira nas áreas de cinema, teatro e televisão. Foram selecionados escritores com largo currículo em jornalismo culturalparaesse trabalho em que a história cênica e audiovisual brasileiras vem sendo reconstituída de maneira singular. Em entrevistas e encontros sucessivos estreita-se o contato entre biógrafos e biografados. Arquivos de documentos e imagens são pesquisados, e o universo que se recons­titui a partir do cotidiano e do fazer dessas personalidades permite reconstruir sua trajetória. A decisão sobre o depoimento de cada um na pri­meira pessoa mantém o aspecto de tradição oral dos relatos, tornando o texto coloquial, como se o biografado falasse diretamente ao leitor. Um aspecto importante da Coleção é que os resul­tados obtidos ultrapassam simples registros bio­gráficos, revelando ao leitor facetas que também caracterizam o artista e seu ofício. Biógrafo e bio­grafado se colocaram em reflexões que se esten­deram sobre a formação intelectual e ideológica do artista, contextualizada na história brasileira. São inúmeros os artistas a apontar o importante papel que tiveram os livros e a leitura em sua vida, deixando transparecer a firmeza do pen­samento crítico ou denunciando preconceitos seculares que atrasaram e continuam atrasando nosso país. Muitos mostraram a importância para a sua formação terem atuado tanto no teatro quanto no cinema e na televisão, adquirindo, linguagens diferenciadas – analisando-as com suas particularidades. Muitos títulos exploram o universo íntimo e psicológico do artista, revelando as circunstâncias que o conduziram à arte, como se abrigasse em si mesmo desde sempre, a complexidade dos personagens. São livros que, além de atrair o grande público, interessarão igualmente aos estudiosos das artes cênicas, pois na Coleção Aplauso foi discutido o processo de criação que concerne ao teatro, ao cinema e à televisão. Foram abordadas a construção dos personagens, a análise, a história, a importância e a atualidade de alguns deles. Também foram examinados o relacionamento dos artistas com seus pares e diretores, os processos e as possibilidades de correção de erros no exercício do teatro e do cinema, a diferença entre esses veículos e a expressão de suas linguagens. Se algum fator específico conduziu ao sucesso da Coleção Aplauso – e merece ser destacado –, é o interesse do leitor brasileiro em conhecer o percurso cultural de seu país. À Imprensa Oficial e sua equipe coube reunir um bom time de jornalistas, organizar com eficácia a pesquisa documental e iconográfica e contar com a disposição e o empenho dos artistas, diretores, dramaturgos e roteiristas. Com a Coleção em curso, configurada e com identida­de consolidada, constatamos que os sortilégios que envolvem palco, cenas, coxias, sets de filma­gem, textos, imagens e palavras conjugados, e todos esses seres especiais – que neste universo transitam, transmutam e vivem – também nos tomaram e sensibilizaram. É esse material cultural e de reflexão que pode ser agora compartilhado com os leitores de todo o Brasil. Hubert Alquéres Diretor-presidente Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Para Nise da Silveira e Augusto Rodrigues Introdução Ilo Krugli e o Teatroventoforte se misturam. Ao se deter sobre a vida do argentino naturali­zado brasileiro Ilo Krugli, 78 anos, fundador e diretor do Teatro Ventoforte, a Imprensa Oficial expõe ao público uma referência para todos os grupos que trabalham com a linguagem da animação e a arte-educação no Brasil. Instalado com seu teatro no tombado Parque do Povo, no bairro paulistano do Itaim, Ilo Krugli, nascido Elias Kruglianski, está no Brasil há mais de 30 anos. Filho de judeus poloneses que imi­graram para a Argentina, passou a adolescência em Buenos Aires. Com uma vida plena de aventuras e descobertas, deixou seu país em 1959 para, como muitos de sua geração, fugir do eurocentrismo. Percorreu a América Latina, escolheu ficar no Brasil, mas não abandonou as periódicas viagens pela Eu­ropa e Américas. Esteve no Chile dirigindo o grupo de teatro Manos, dissolvido pelo exército de Augusto Pi­nochet. Às vésperas do golpe, ouviu de Salvador Allende em conversa rápida: Eu gosto muito de crianças, também sou uma criança que às vezes gosta de jogos perigosos. Embora reconheça que em todos os países latino-americanos houve golpes de Estado, espera não ver jamais o que se passou no Chile em 1973. Anos depois, no Rio de Janeiro que sempre o encantou, contava a História de um Barquinho basicamente com as mãos, mostrando a flor Irupê e a breve vida da borboleta. No Rio conviveu e trabalhou com intelectuais que contribuíram para fortalecer seus talentos, como os educadores Augusto Rodrigues e Anísio Teixeira, o poeta Ferreira Gullar, a psiquiatra Nise da Silveira, todos em volta da Escola de Arte do Brasil (EAB). Foram as apresentações do Teatro de Ilo e Pedro, em 1966, durante os festejos de inauguração do Parque do Aterro do Flamengo, que deram origem ao Teatro de Fantoches e Marionetes Carlos Werneck de Carvalho. Ilo Krugli orientou a construção desse teatro, criando um palco adap­tável a diferentes técnicas de bonecos, de acordo com a época. O Carlos Werneck foi reinaugurado em 1995 e o sucesso de seus projetos levou a Secretaria da Cultura a criar a Coordenadoria de Teatro de Bonecos e Animação. Foi também no Rio que o dramaturgo inau­gurou uma nova maneira de pensar o teatro, que considera, antes de tudo, uma forma de conhecimento. Tudo começou com o trabalho em educação que realizou na periferia do Méier, no Centro de Arte e Criatividade Infanto-juvenil. Mais interessado em cruzar os portões da escola, Ilo e seu grupo vão para a comunidade e fazem a festa, na tentativa de eliminar a distância entre quem faz e quem vê. Os espetáculos do Ventoforte sempre abrem em direção ao público, à festa popular. Algumas montagens de As Pequenas Histórias de Lorca terminavam na rua. O Mistério das Nove Luas começava na porta dos teatros. Nos anos da ditadura militar, Ilo está no palco com Histórias de Lenços e Ventos, peça que mar­cou a trajetória do teatro para crianças no Brasil. Utilizando bonecos, lenços, latas, instrumentos musicais e objetos, o grupo conta a história de Azulzinha (um lenço) e seu amigo Papel (um pedaço de jornal) que enfrentam o poder do rei Metal Mau. Sem impostação e ambientada nos quintais da infância, a peça fala de liberdade, afetividade e uma vida melhor, baseando-se em textos de autores como Federico García Lorca e Victor Hugo. A aventura de Ilo Krugli e o Teatro Ventoforte é, principalmente, estética. Foi a sua força poética transportada para o palco que introduziu um jei­to de conversar com crianças e adultos, circulan­do com naturalidade nos dois universos. E esse jeito tornou-se um exemplo e uma referência para várias gerações de artistas e educadores. A busca das raízes do homem sempre foi uma preocupação do Ventoforte. Como a nossa socie­dade é fruto da união das mais diversas culturas e povos, a criança pode ser a raiz, porque é uma coisa verdadeira, é a cultura arcaica, primitiva do homem, diz Ilo. Seguindo essa linha, o trabalho com crianças e jovens tem sido alimento para as encenações, elemento de ligação entre o homem e o mundo. Com isto, conquisto o fundamental para sobreviver e continuar. Em meio às circunstâncias políticas e à trajetória pessoal do seu fundador, o Ventoforte surgiu em 1974 como um teatro de resistência. Suas peças falam das realidades mais cruéis e agitam sempre a bandeira da liberdade. Mas sem panfletismo e sim como metáfora poética, esclarece o diretor, que cita Lenços e Ventos, História de um Barqui­nho e as Quatro Chaves como exemplos dessa escolha temática. Foi o caráter de resistência que fez o Vento­forte ser um dos ganhadores do Prêmio Teatro Cidadão (2002), instituído pelo Departamento Municipal de Teatros. São mais de 40 prêmios ganhos ao longo de três décadas, 30 peças, inúmeras viagens por países da América Latina, Europa e Estados Unidos. Premiado em Cuba, o grupo irá representar o Brasil nos palcos da Holanda, Bélgica e Itália, entre março e abril de 2006. A premiada Bodas de Sangue será apresentada no Wereld Musiek Theater Festi­val (WMTF), evento europeu que ocorre desde 1996 e mostra produções de músicos e artistas de outros continentes. Enfrentando constantes dificuldades para manter o espaço no Itaim, cedido pela Caixa Econômica Federal, Ilo Krugli realiza ali oficinas para formação de novos talentos, acolhe outras trupes, atende à comunidade em volta, e ainda faz apresentações grátis de seu premiado reper­tório. Nesses 50 anos de carreira, por suas mãos já passaram mais de 300 atores. Nesses tempos em que cada vez mais os espaços são determinados e condicionados por processos econômicos dependentes e produtos culturais impostos e massificados, o Ventoforte consegue produzir peças em um cenário independente. Música, dança, invenções e poesias compõem o teatro desse diretor, dramaturgo, ator, poeta e artista plástico. Em meio a retalhos, sucatas, bor­dados, bonecos, atores e público, ele vai tecendo o espírito de festa que caracteriza suas apresen­tações. Cada peça é uma aventura que envolve, diverte e faz pensar. Como poucos, Ilo realiza a magia do teatro de animação, seres inanimados criam alma e vida, sejam bonecos sofisticados no palco e na platéia, ou simples objetos como uma folha de papel à mercê dos ventos ou da mão pesada do homem. Suas palavras, ao contrário da elaboração estereotipada de alguns textos infantis, falam da vida com vitalidade. De forma simples e delicada, o Ventoforte trabalha com a substância intrínseca (e muitas vezes esquecida) de cada um de nós, abordando questões difíceis, como as desigualdades, os sonhos e as angústias dos humanos, chamando as crianças (principal­mente elas) para uma participação especial na construção de um mundo melhor. Como Lorca, Villafane e outros famosos poetas andarilhos, Ilo Krugli é o artesão paciente, o criador de verdadeiras jóias onde se esconde a alma das coisas e dos seres. Como costuma dizer, fazemos teatro para que os nossos pés e mãos não esqueçam sua longa e maravilhosa história de artesãos do movimento da alma do homem no amar e criar. Ieda de Abreu Capítulo I Infância Nasci em dezembro de 1930, em Buenos Aires. Sou filho de imigrantes judeus poloneses; meu pai, Jaime Kruglianski, era tecelão; minha mãe, Rosa Zacharias, fazia de tudo em casa, costu­rava pra fora, bordava, fazia crochê. Mas eles já chegaram na Argentina politizados, depois da Primeira Guerra. Participavam de um clube de trabalhadores com idéias socialistas, e, às vezes, a polícia os acusava dizendo que o local servia de refúgio. Tenho uma lembrança, a po­lícia na casa do lado, de amigos nossos. Houve uma reunião e todos tinham sido dedados; a polícia apareceu, e minha mãe dizia pra mim e pra minha irmã: Fiquem lá (era um sobrado) na sacada brincando, fiquem olhando e rindo.E ela na cozinha acendia o fogão e ia queimando revistas, jornaizinhos... suspeitos. Então, isso eu sabia, que frente à polícia tinha de ser muito co­medido, fui criado nisso, o nazismo, o fascismo, a repressão muito presentes. Eu estudava numa escola judia considerada de esquerda, e um dia a polícia veio, fechou a escola, pegou nossos livros de alfabetização e só liberaram a gente quando os pais chegaram e eles todos foram fichados. A família dos meus pais foi morta em campos de concentração; então, por tudo isso, era difícil se alienar e fugir, e pensávamos muito que algum dia as coisas mudariam, era quase uma idealiza­ção de um conto de fadas. Meu pai tinha asma e nunca lhe disseram, nem o médico, que para um asmático ser tecelão era a pior coisa do mundo, porque o tecido vai soltando poeira da lã ou do algodão. E numa madrugada muito fria de inverno, ele ficou mal e se foi, ainda bem novo. Sofreu bastante, os homens sofrem mais que as mulheres, se desgastam mais. Minha mãe era uma mulher muito bonita, apai­xonada pela União Soviética e antiamericana. Na última vez que a vi, me disse que tem russo que vive até 130 anos. Pensei comigo: ela está querendo chegar lá, mas morreu naquele ano, com 86 anos. Comunicava-me muito com ela, tro­cava cartas. Depois que saí de Buenos Aires, ela escrevia assim: Vocês sabem, as coisas não estão muito boas, porque enquanto estiver mandando aquele país do norte... E estava trabalhando bastante com direitos humanos, cuidava de um clube de crianças, assistia shows daquela cantora argentina, folclórica, a Mercedes Sosa. Eu ainda a visitei, já com o Ventoforte, quando levei o Sonho de um Coração Brejeiro Naufragado de Ilusão, um folguedo. Tivemos uma ligação muito forte, de grande carinho. Nas cartas, minha irmã reclamava que eu tinha abandonado a família e isso me pesava muito, mas a amiga escritora Fanny Abramovich falava: Que nada, você foi mais coerente com a história da tua familia, vocês viviam na biblioteca judia fazendo teatro, brincando e desenhando, foi tão coerente que acabou criando, recriando esse mesmo lugar de encontro, você agora mora den­tro dele, desse núcleo de trabalho. Pois é, e até hoje acolhendo, escondendo outros subversivos, como a Companhia São Jorge de Variedades. Ainda me comunico com essa irmã mais velha, so­brinhas e sobrinhos netos, mas pouco, o presente me absorve. Faz algum tempo fui fazer teatro na cidade dos meus pais, Bialistok, na Polônia. Afetos, Uniões As primeiras pessoas que a gente ama são os pais e o que vamos repetindo pela vida são desdo­bramentos, estamos sempre querendo recuperar esse núcleo familiar original. Não é à toa que Freud fala de édipos e electras, esse olhar para o pai e a mãe que depois se desdobra. Acredito que as pessoas das quais a gente se aproxima têm a ver com experiências vividas anteriormente. As pessoas com quem me relacionei afetivamente, amigos, amores, todos tinham muito a ver com o que estava fazendo no momento. Às vezes me perguntam se sou casado e digo que não, mas é relativo esse não, acho que a gente tem casamentos. Um casamento meu muito claro foi depois que fiz cinco anos de psicanálise e nos últimos sonhos aparecia alguém que falava que eu tinha de casar comigo mesmo e que colocasse uma aliança no dedo e eu sempre uso, se perco fico preocupado. Amei e amo muitas pessoas, tive mulheres e homens fundamentais na vida, amei de qualquer forma que se entenda o amor. Acho isso importante. Há uma pressão para se levar uma vida oculta porque às vezes ela sai um pouco fora de certos padrões e do convencional. O Chagall é que se perguntava: O que é mais importante na vida? E respondia: Ora, é o amor. Desde cedo fiquei sabendo que tem coisas que, por razões políticas, morais, pessoais, etc. não se pode dizer, isso sempre me incomodou, mas entendi que todos têm o direito de escolher a sua sexualidade, sua visão política, religiosa, e tudo é uma situação única. A minha grande re­lação é com o grupo que coordeno, dirijo e sou o fundador, mas continuo aberto para gostar, ser acarinhado. Buenos Aires nessa época tinha muitos imi­grantes judeus, eram uns 200 mil, sobretudo poloneses, e judeu gosta muito de teatro. Então eles faziam teatro. Na minha rua tinha gente de dez países diferentes: armênios, espanhóis, ita­lianos, galegos que pareciam com portugueses, ucranianos, judeus, todos eles se falavam e isso era muito rico. Desde pequeno eu fazia figuração, teatro com bonequinhos, com coisinhas, sempre estava ocupado. Minha primeira peça foi um drama de Ibsen, Os Espectros. Eu fazia um pintor pintando quadros na rua, tinha um cavalete e rabiscava. O primeiro espetáculo que fiz brincando com outras crianças foi O Príncipe Feliz. Só na ado­lescência é que descobri que o autor era Oscar Wilde. Na escola nos levavam regularmente para ver espetáculos, que hoje seriam recomendados apenas para adultos. Deve ter sido programado um do Oscar Wilde e não pude ir, acho que por falta de dinheiro; os alunos é que pagavam os ingressos e a passagem. Um aluno me contou como tinha sido a peça e a partir daí comecei a representar (brincando) O Príncipe Feliz, que era até bastante fiel ao original; eu dirigia e fazia o papel principal. Depois li, assisti várias peças do Oscar Wilde, Retrato de Dorian Gray, claro. Em Buenos Aires tinha quatro salas de teatro em que sempre eram encenadas peças na língua que o judeu do leste fala, o ídiche, dialeto de alemão medieval misturado com palavras do polonês e do russo. Nos Estados Unidos, eles misturam com inglês; a raiz era do alemão, mas a escrita vinha do hebraico. Nesses teatros tinha companhias dos Estados Unidos, da Polônia e grupos argen­tinos também, e passavam três, quatro meses fazendo teatro. E meu pai ia ver algumas dessas representações, gostava muito dos autores rus­sos, Tolstói, Dostoiévski, Máximo Gorki. Depois que estourou a guerra, alguns grupos não con­seguiram voltar para seus países e ficaram em Buenos Aires. Organizavam recitais de canções e poemas, andavam pelos bairros vendendo os ingressos das apresentações. Assisti vários espe­táculos com poemas de Bertold Brecht, Schiller e outros autores alemães. Assimilei por outro lado uma série de experiências, assistindo aos espetáculos no Teatro Experimental Judeu, de caráter popular. Esta talvez tenha sido minha experiência fundamental pelos hábitos de disci­plina que adquiri e propósitos renovadores que me colocaram em contato com o teatro clássico e moderno. A vivência de arte popular e contato com comunidades indígenas no Peru e na Bolívia deixaram marcas muito fortes também. Eu desenhava muito, sem parar. Mas acho que a criança faz tudo, ela traz isso, não sou só eu que diz, a expressão é a natureza do ser humano: expressão verbal, plástica, a imagem, o desenho, a vontade de cantar, de dançar, tudo é o ser hu­mano se expressando. Quando morei no Chile, na época do Allende, tinha um grupo de psiquiatras gestaltistas,ea gestalt diz que nenhuma situação pode ser compreendida se você não olha o que an­tecedeu e o que talvez possa acontecer depois. Ela valoriza o presente, assim não tenho porque sofrer nada neste momento, não sei o que vai acontecer; sei que tenho de ter consciência desse momento em que estou contando a minha história. Lorca Revisitado Quando o poeta espanhol Federico García Lor­ca esteve em Buenos Aires, em 1936, eu tinha quatro anos. Ele adorava teatro de bonecos e se apresentava em companhia de artistas plásticos, poetas e atores no saguão do teatro onde tinha seu espetáculo noturno. Isso deflagrou um movi­mento de teatro de bonecos. Lorca ficou quase um ano na cidade, mas lamentavelmente teve que voltar para Espanha, e pouco tempo depois foi fuzilado. Tinha vindo para estrear alguns es­petáculos, inclusive Bodas de Sangue, no Teatro Avenida. A visita dele determinou um surto de fantoche, e, quando partiu, o poeta Javier Villa­fañe deu continuidade ao trabalho ao lado de outros. Meus primeiros contatos teatrais foram com os trabalhos dele. Sua linha de experiência era a criação poética através dos bonecos. Quando estive na Argentina em 2004, fui ao hotel onde Lorca morou, na Avenida Maio, fizeram do apartamento um pequeno museu. Percorri os lugares onde ele ficava, os cafés que freqüentava. Na Espanha ele já tinha o grupo universitário La Barraca, que andava pelas ci­dades fazendo teatro. Dizem que o Lorca era muito interessante, fantástico na animação. Então isso criou uma tradição, e quando ele foi embora, toda essa gente continuou fazendo bonecos na sua linha poética e popular. República do Brasil Nessa viagem estive também com minha irmã Zina, com uma das sobrinhas e os filhos dela, voltei ao bairro onde me criei, a praça, a escola. A primeira vez que o Brasil apareceu pra mim foi através de uma colega que eu tinha na escola, que me disse que o país chamava República do Brasil. Era Estela dos Reis, uma mulata filha de brasileiros, cabelo todo cacheado. A mãe, a tia e os primos estavam todo dia na porta da escola. Meu imaginário indagava o que essa gente fazia numa periferia de Buenos Aires. Eu fantasiava que tinham deixado a Coluna Prestes e se re­fugiado na Argentina. Meu pai falava sempre da Coluna, dizia que o exército brasileiro tinha uma raiz mais popular que o argentino. E isso era muito exótico para os imigrantes italianos, espanhóis, armênios, irlandeses, poloneses. A Estela devia ser carioca, os rr dela eram gene­rosos, assim como os da Elizete Cardoso, e me fascinavam. Eu pensava que todos os brasileiros falavam assim. Tempos depois complementei a sonoridade que gostava com a cidade do Rio de Janeiro. Cheguei a conhecer o embaixador do Brasil na época, o Rodrigues Alves. Ele vinha na escola pra uns festejos, eu carregava a bandei­ra, eles passavam a mão na minha cabeça, mas nunca consegui carregar a bandeira do Brasil por preconceito dos professores; diziam que brasileiro tinha que ser mais moreno, eu era muito clarinho, como se os argentinos fossem todos brancos. Quando pequeno, andava de mãos dadas com minha mãe, de noite, numa esquina, e vi um rapaz de 14, 15 anos, negro, tinha poucos em Buenos Aires, então falei: Eu quero! E minha mãe: Quer o quê? Quero que me pintem assim! E minha mãe: Não pode! E como foi que pin­taram ele?, perguntei. Durante anos em casa, quando chegava visita, contava-se essa piadinha de filho. Loucos por Jazz Dividíamos nossas vidas entre o iídiche (dialeto germânico) e o spanich. Eu lia tudo, com 12, 13 anos li Eça de Queiroz, Vítor Hugo, li todo Os Mi­seráveis. Vivia na periferia, me refugiava nela, mas saía muito também, ia para o centro da cidade. Tinha uma biblioteca perto da minha casa e ali li autores Anatole France, Emile Zola, franceses; os alemães Stephan Zweig, Thomas Mann, Goethe, e, mais tarde, Herbert Read, sir Herbert Read, o nobre anarquista, teórico da arte do século 20.. Lia ele também quando mambembava pela Bo­lívia, levava-o debaixo do braço e García Lorca no coração. Quando cheguei ao Brasil, perdi, ou alguém o levou. Herbert Read esteve aqui com o pessoal da Escolinha de Arte do Brasil. Eu ia bastante ao cinema, nesse tempo era o neo­realismo, lembro de O Encouraçado Potenkin, do ícone sagrado para os russos, o Eienstein. Tam­bém ouvia a música e a dança contemporânea. Minha irmã mais velha escutava muito jazz e costumava dizer que nossa família era comunis­ta, antiimperialista, mas louca por jazz, éramos americanizados nesse sentido. Hoje leio muito jornal, os cadernos de literatura todos, às vezes nem dou conta. Fui muito influenciado também pela arte popular com a qual convivi nas viagens pela América Latina. A Criança Anima, a Raiz do Teatro Está Nela Eu fazia teatro com bolinhas de gude. Tinha umas latas grandes de doce de batata doce, a tampa de metal, e eu colocava bolinhas na tam-pa e ficava agitando. Lembro de uma situação, uma relação curiosa de adultos e crianças. Eu fazia esse meu teatro com bolas de gude, no chão, e perto de mim estavam minha mãe, meu pai e uma parente que vivia em conflitos com o marido, o casamento, e passava uns dias com a gente. Falava desse problema, chorava um pouco, e lembro que falou: Olha como ele está brincando, queria ser igual a ele, não entende nada dessas coisas que estamos falando. E eu estava ali criando outros jogos, dramas, com as bolinhas de gude. Tinha 8 anos quando a professora do primário me ensinou a fazer bonecos. Ela me deu de presente um livro do poeta e bonequeiro, Javier Villafañe, que tinha trabalhado com o Lorca e foi professor dessa minha professora. Javier per­correu toda a América Latina, inclusive o Brasil, fazendo principalmente teatro para crianças, ele também ensinou a Maria Clara Machado a fazer bonecos, quando a conheceu nas famosas domingueiras do pai dela, o Aníbal Machado. Foi a partir daí que comecei a fazer bonecos. A base era uma cabaça que trabalhávamos com papel machê. A impaciência de apresentar um espetáculo no mesmo dia fazia com que bo­lássemos tudo e nem deixássemos a massa do boneco secar. No final da tarde despencava o nariz, despencava tudo. A grande brincadeira era fazer teatro mesmo. Acho que a primeira peça que vi foi de Tolstói. Eu morava numa espécie de cortiço, no segundo andar de um sobrado, a gente se apresentava na escada. Às vezes, eu invertia e o público sentava na escada e nós ficávamos embaixo fazendo o espetáculo, e por isso a gente chamava de Teatro ao Pé da Escada. O nome Ilo fui eu que escolhi, é meu nome artístico, o nome jurídico é Elias Kruglianski. O Ilo eu inventei na adolescência, assinava as pin­turas, desenhos, a primeira vez que assinei foi num mural que fiz com uma amiga numa escola. Minha mãe mandava cartas para o Ilo Krugli e ainda me criava situações constrangedoras. Como receber cartas de Cuba para enviar para uma amiga que tinha um filho lá, botava noutro envelope. Minha irmã não aceitou, mandava carta para o Elias Kruglianski. Veio 1964 e eu ainda recebia cartas de Cuba... sem saber o que fazer com tudo aquilo. Dos 14 aos 16 anos minha formação profissional foi uma escola técnica de artes gráficas que não acabei, fiz dois dos três anos necessários para o diploma. Fiz também litografia e freqüentei alguns ateliês de escultura, pintura e cerâmica. Num dos ateliês, trabalhei com uma escultora e pintora chamada Cecília Marcovith, romena, ligada a um grupo de artistas plásticos neocu­bistas. Ela tinha estudado em Paris com André Loth, que não foi um pintor brilhante, mas muita gente estudou com ele. Depois fui para uma oficina de artes plásticas onde se fazia e se discutia realismo socialista como um dogma; nesse fiquei só uma semana e saí correndo, e, a partir daí, resolvi trabalhar sozinho. Entre os cubistas procurei mais o Picasso. Aliás, Picasso e Charles Chaplin (Carlitos), pra mim, são os artis­tas definitivos do século 20. Entre 16 e 18 anos trabalhei muito com cerâmi­ca e teatro de bonecos. Eu e mais uns amigos montamos um grupo e fizemos algumas peças do Javier Villafañe. Também trabalhei com bo­necos na periferia de Buenos Aires, durante uns dez anos. Éramos um grupo pequeno e teve uma pessoa que trabalhou comigo durante muito tempo, o Pedro Domingues. Capítulo II Com Pedro e os Bonecos pela América Latina Com 20 anos eu tinha uma oficina de cerâmica e coloquei um cartaz na porta procurando um aprendiz. E foi o Pedro que apareceu. Ele devia ter uns 15 anos, era um rapaz de família gale­ga muito pobre, morava num bairro operário, como eu, mas parecia saber escrever, desenhar, modelar o barro, esculpir, porque rapidamente fazia tudo, inclusive bonecos. O Pedro já chegou sabendo. O mestre Augusto Rodrigues dizia que a gente ensina para os outros aquilo que eles já sabem, ou que a gente mostra o caminho daquilo que já corre por dentro. E passamos a trabalhar com bonecos durante uns cinco, sete anos. Eu já tinha um grupo chamado Ta Te Ti, que é o jogo-da-velha, depois o nome mudou para Cocuyo, palavra indígena que se traduz por um besouro, um vagalume grande. E depois passou a se chamar Teatro de Bonecos de Ilo e Pedro. Nunca fiz espetáculos usando o nome Elias, e o Pedro não era Pedro, se chamava João, mas resolveu mudar. Trabalhávamos num desses teatros experimentais que na época tinha muito em Buenos Aires. Quando recebemos um convite para trabalhar no norte do país, num estado chamado Jujuy, fronteira com a Bolívia, acabamos passando para o outro lado e para mim foi uma experiência rica e reveladora que mudou minha cabeça. Nessa época tinha uma corrente de jovens, uns carinhas como nós que saíam de Buenos Aires e tomavam o caminho do México em busca de identidade, não queríamos ser europeus. Acho que saímos alguns anos depois que o Che Gue­vara fez aquela viagem de moto pela Bolívia com o amigo dele. Poderíamos até ter escrito um diário, não de motocicleta, mas de teatro de bonecos... Quando aconteceu a revolução cubana nós estávamos viajando. Eu não estava renunciando nem negando quem eu era, minhas influências, a vida numa metrópo­le, só queria descobrir culturas menos determi­nadas pela grande cultura urbana ocidental. Isso foi a nossa universidade, o doutorado foi feito aqui no Brasil no mesmo ritmo itinerante. Com a expectativa de viajar pela América Latina, atravessamos a Bolívia, paramos numa cidade fantástica chamada São Luiz de Potosí, a mais antiga das Américas. Devíamos ficar uns dias e passamos mais de mês. Ganhamos tanto dinheiro que deu até pra juntar algum. Na época tinha ocorrido uma revolução na Bolí­via e o pessoal do sindicato mineiro nos adotou com a Universidade e começamos a fazer espetá­culos nas minas e nos sindicatos. Era lindo, todos os mestiços, as índias com crianças sentavam no chão ou em cadeiras pra assistir. Às vezes, no meio de uma apresentação, todo mundo saía correndo porque alguém dizia que não sei quem estava vindo com armas na mão, depois desco­briam que tinha sido alarme falso e voltavam todos. Coincidiu que a Universidade também ia receber um forno para cerâmica e nos ofereceu trabalho. Eu e Pedro voltamos então a Buenos Aires para fechar o ateliê de cerâmica, repassei tudo pra minha mãe. Ficamos lá uns oito meses e acabamos não retornando para São Luiz de Potosí. Os Estados Unidos que iam doar o forno recuaram por problemas com o reitor. Só que eu já tinha recebido outro convite de uma escola em La Paz, para ocupar o lugar de uma pessoa que estava viajando para a Europa. Também não assumi o posto nessa escola, pois se ganhava muito pouco. Acabamos mesmo mambembando e rodando por toda a região. No início éramos umas quatro pessoas, mas no final ficamos só eu e o Pedro. Fomos para o Peru, em Cuzco trabalhamos durante quase um ano, até sermos expulso do país por falta de documentação. Nessas viagens, nosso trabalho foi tomando uma forma mais orgânica, era praticamente uma escola em movimento. Em Cuzco, trabalhamos com crian­ças de várias escolas do município. Quando che­gávamos numa comunidade, o primeiro contato era com as crianças, às vezes até com intérpretes, porque eles falavam em quéchua. Eram experiên­cias mais plásticas, desenhávamos com eles. Depois fazíamos um trabalho também criativo com as professores. Após o almoço, montávamos o palco para o espetáculo, e, no final da tarde, toda a co­munidade vinha assistir, e sempre conversávamos com algumas pessoas sobre o que tinham achado. Recolhíamos todos os desenhos, eu trouxe uma coleção que se perdeu ao longo do tempo. Fizemos grandes descobertas. A relação da crian­ça indígena com a natureza e o mundo era mais tridimensional. Durante muito tempo guardei um desenho que era um avião passando por cima da minha cabeça. E para mostrar o que ele significava – um traço com duas rodelas coladas -, a menina passava a folha por cima da cabeça, sonorizava o barulho do avião, só tinha signifi­cado assim, se colocasse na parede ninguém ia entender que era um avião. Essa foi uma das grandes descobertas. A nossa cultura ocidental, a escola coloca um mundo muito racional e in­telectual que é bidimensional. Fazíamos tudo junto, os bonecos, os textos. Em alguns lugares, fazíamos os bonecos com mui­tas vozes masculinas e femininas atrás de um biombo. Quando terminava, algumas pessoas, homens, principalmente, ficavam na porta es­perando e perguntavam pelas moças que tra­balhavam com a gente. O Pedro morreu no Natal de 2004. O teatro do Jockey Clube do Rio de Janeiro vai inaugurar um banco de dados de textos infanto-juvenis que terá o nome dele, escrevi um texto falando das nossas viagens para homenageá-lo. Na Contramão Ao nos apresentarmos em aldeias, povoados, não existia a preocupação com o sucesso, quería­mos era descobrir o mundo que intuíamos e que não podíamos experimentar em Buenos Aires. Essa reflexão é como uma revelação para mim, porque a partir de certo momento a gente co­meça de alguma forma a trabalhar pelo sucesso, a pensar nele, pois toda a nossa vida vai sendo condicionada a isso: a que as coisas funcionem, a sermos aceitos, não sermos esquecidos. Não pen­sávamos em sucesso, mas adorávamos o que es­távamos fazendo. Bonecos de cabaça e papelão, papel machê, eram eles nossos patrocinadores, que bancavam todas as nossas viagens. E era tão bom! Isso não quer dizer que não possamos ter sonhos, ou que tenhamos de fazer sucesso. Pior é o medo de ficar derrotado sem ele. Apesar de ter sido agraciado com mais de 50 prêmios, bem, não consegui embarcar nessa, não sou um artista de sucesso com a mídia, o Prêmio Shell 2004 foi uma grande surpresa. Sempre fui na contramão. O Danilo Miranda, diretor do Sesc, me disse uma vez que eu era muito outsider. Pensei: marginal, é isso? Não sei se me elogiou ou me xingou, com certeza foi um elogio. Acho que de alguma forma, os que produzem arte e cul­tura nesse país muitas vezes são marginais. Mas tem gente que vive de sucesso. Uma atriz veio pra mim dizendo: Vamos montar um espetáculo juntos, me faz ganhar um prêmio. Eu disse: Sinto muito, não tenho a fórmula. A Arte Tem que Ser Retomada Dia a dia Muitas vezes me pesa o descaso com a cultura, com os criadores de cultura. O nosso trabalho vem evoluindo, são muitos anos de teatro, e foi uma Lei do Fomento que mostrou a necessidade da existência de grupos e de continuidade desse processo cultural. Na minha experiência de Bra­sil, essa lei foi a mais interessante que aconteceu, que aponta para índices de desenvolvimento cultural como em países do Primeiro Mundo: França, Espanha, Portugal e Estados Unidos, que têm leis parecidas, países em que o poder público apóia grupos que realizam projetos. Nessas terras, uma vez que o grupo entra, existe continuidade, nós aqui todos os anos temos que concorrer para ter o apoio. Penso que os que administram as políticas cul­turais devem perguntar aos artistas: O que está acontecendo com vocês? Ninguém nos pergunta, só em tese. Precisam saber, perceber o que é um trabalho de continuidade, a importância de um grupo que nasce e um grupo histórico, dos diálogos com essas comunidades. Integrar-nos em projetos seria fundamentalmente desenvol­vimento cultural e social. Acho que poderia devolver muito mais do que estou devolvendo, contribuir repassando expe­riências, conhecimento acumulado. Conheço a força do meu trabalho. Quando surgiu o Ven­toforte, sinceramente, foi assim uma explosão, ainda hoje as pessoas me encontram na rua, em estréias e outros lugares e falam: Foi sua culpa! É por sua culpa que eu faço teatro. Vi cinco vezes, seis vezes, isso é uma escola viva! Sim, o teatro é uma escola viva! Mas, para continuar, essa escola precisa ter condições de se manter. Se você não tem condições de manter um grupo na sua continuidade, você inventa e se reinventa a cada dia. Todos os dias recomeço o Ventoforte, eu acredito nisso, que o centro de formação de uma sociedade, da evolução do ser humano é a arte, não a guerra, não o lucro, não o capital, é a arte. E tem que ser retomada dia a dia, como se fôssemos lavradores. É uma verdadeira ecologia da alma humana. Capítulo III A Chegada ao Brasil Na Bolívia, tínhamos ficado amigos do pessoal da embaixada brasileira, na época o adido cultural era o Thiago de Mello. Quando voltamos de uma das viagens, o adido era um jornalista chamado Carlos David, ele sugeriu que viéssemos para o Brasil trabalhar com o Augusto Rodrigues, na Escolinha de Arte do Brasil, que ele conhecia. Ele conseguiu uma passagem bem barata, naquele trem da morte e assim chegamos neste país com local e indicação certa. Estou no Brasil há mais de 40 anos, cheguei de vez nos anos 1960. Na verdade houve duas che­gadas. Uma em 1955, em São Paulo, vindo de Buenos Aires para um encontro latino-americano de estudantes os quais estavam se preparando para os festivais internacionais que aconteciam na Europa. Aqui foi considerado ilegal, comunis­ta, e aconteceu parcialmente em alguns lugares. A sede era no prédio dos Diários Associados, na Rua 7 de Abril, de lá saíamos para os encontros, para ver espetáculos. Lembro do Teatro de Are­na novinho em folha, cheirando a tinta. A Eva Vilma fazia uma peça com outros atores. Fiquei num hotel perto da Estação da Luz, então via descer uns retirantes na estação Júlio Prestes, uma criança quase nua, descalça, segurando a saia da mãe, e isso me lembrou uma pintura do Portinari, foi essa a imagem que guardei da cidade. Ficamos uns dez dias. Tímidos, Argentinos... Na chegada definitiva, em 1961, passamos nova­mente por São Paulo, a caminho do Rio de Janei­ro, assustados com o movimento, depois de dois anos nas cordilheiras, viajando pelas florestas. Eu estava com a barba crescida, era como se tivesse saído da selva e chegado na civilização. Ficamos impressionados com o Vale do Anhangabaú, o Ibirapuera, a cidade já era muito grande. Voltamos a São Paulo periodicamente. Uma vez dormimos no Teatro de Arena e quem nos cice­roneava era o Paulo José. Éramos meio tímidos, argentinos... Ainda hoje me envolvem nesse debate e não consigo saber se o brasileiro gosta ou não gosta dos argentinos. O povo brasileiro é o único na América Latina que fala outra língua e a língua separa e seduz ao mesmo tempo. Os argentinos portenhos têm fama de arrogantes, mas nem todos, são também abertos para o mundo, como o Che. Nas outras vindas, depois do golpe militar, expus na Bienal Internacional de São Paulo duas vezes, uma com artes plásticas, outra com bonecos e objetos cenográficos. Em 1964 vim novamente para uma oficina no Teatro Taib, a convite da Fanny Abramovich, e fiquei no mesmo hotelzi­nho do centro, em frente ao prédio do DOPS. Nos anos 1970 vim fazer um espetáculo, Ubu Rei, com direção do Gianni Ratto, no Teatro Itália. Fiz os bonecos, o cenário, movimentava os bonecos e outros objetos em cena, mas não tinha papel definido. Já tinha sido dirigido por ele na ópera El Retábulo, de Manuel De Falla, texto do Miguel de Cervantes reelaborado pelo Lorca, com a Or­questra Sinfônica Municipal do Rio de Janeiro, cantores, bonecos, muito lindo. Essas foram as únicas vezes em que fui dirigido e exatamente por uma pessoa como o Gianni Ratto. Capítulo IV O Rio de Sempre Lembro a entrada no Rio de Janeiro de trem, muito especial, a Central do Brasil, aquela coisa de parar pra todo mundo, via o nome de cada estação. Sempre me chamava a atenção lugares como o Encantado, que associava com a cantora Araci de Almeida, ela era a Dama do Encantado; Engenho de Dentro, Méier...A gente passava à tardinha, aquelas luzinhas brilhando. O Rio é um espaço fantástico, desde pequeno meu pai me falava muito dessa cidade, dizia que parecia uma entrada por arcos, pórticos; ele conheceu a Avenida Rio Branco quando era novinho e se encantou. Esse encantamento fazia da cidade a Terra Prometida. E quando voltei a segunda vez, também senti isso, era fascinado pelo Rio. Na primeira semana eu ia e voltava da Central do Brasil pela Avenida Presidente Vargas, até a Cinelândia onde trabalhava. Chegamos ao Rio uns dois, três dias depois do carnaval. Primeiro procuramos a embaixada da Argentina e eles conheciam o Augusto Ro­drigues. Acabei no dia seguinte conhecendo o ateliê de gravura do Museu de Arte Moderna (MAM) e me informaram que o Augusto estava lá. Enquanto assistíamos à Portela se apresentar cantando Um Rio que Passou em Minha Vida, falamos com o Augusto e já no sábado seguinte estávamos fazendo o primeiro espetáculo na Es­cola de Arte do Brasil (EAB), que ficava pertinho da Cinelândia. O momento era muito interessante. O Jânio tinha assumido. Participei de almoços na embaixada brasileira e já discutiam sobre o Jânio e o Jusceli­no, eram os janistas e os juscelinistas. Os janistas apostavam que os tempos seriam transformado­res e trariam a modernidade. Respirava-se toda essa história, e o Rio, de certa forma, ainda era a capital, Brasília era uma experiência. Circuláva­mos muito em volta da UNE, íamos a encontros na Associação Brasileira de Imprensa (ABI) com grupos marcantes, como o Grupo Popular Solano Trindade; depois conheci a mulher do Solano, a Margarida, uma pessoa muito importante pra mim nesse tempo, foi aluna minha e depois das aulas me ensinava dança afro. Capítulo V EAB A Escola de Arte do Brasil ficava a alguns quar­teirões da Cinelândia, do Passeio, que me impres­sionava muito com aquelas árvores, não estava acostumado com tanta exuberância, a vegetação generosa, as raízes entrando na terra. E toda a população que circulava por ali. Fiquei uns tempos num hotelzinho no Largo do Machado, morava lá a cantora Araci Cortes, ela fez um show chamado A Rosa de Ouro, que era ela. Depois fui pra Botafogo e de lá pra outro en­cantamento que era a Urca, debaixo do Pão de Açúcar, na Avenida São Sebastião. No final de semana parecia estar numa cidadezinha peque­na, ia à Praia Vermelha, pertinho, tudo muito encantador. E humanamente, os contrastes, as misturas, tanto na praia como no centro da cida­de, a população misturada com os estrangeiros que passam, que vêm para o carnaval. Parece que sempre tinha morado no Rio. Na escolinha ia muita gente, artistas plásticos, intelectuais como Ferreira Gullar, Darcy Ribeiro; músicos, artistas, Heitor dos Prazeres, a Vanja Orico, a Glauce Rocha. Almoçavam lá, havia sempre uma mesa aberta. A Nara Leão costu­mava ter aulas de gravura, depois vieram alguns baianos da Escola Parque da Bahia, amigos do Caetano, Bethânia, Gal; eles até foram cantar umas vezes na Escolinha. A Gal tão tímida que ninguém acreditava que essa mulher podia vir a ser tão intensa no palco. A Bethânia eu já co­nhecia do show Opinião, a força dela, os gestos e o cabelão, curiosamente, continua assim, não se transformou. Eu lia bastante e era o momento em que ex­plodia a bossa nova. Eu não desgostava, tinha um pequeno rádio e curiosamente escutava um programa apresentado pelo compositor nordes­tino Gordurinha, aonde vinham todos; o Luiz Gonzaga eu ouvia muito. E o pessoal que vinha da zona norte era um público especial. A cozinheira da escolinha passava a semana lá e nos finais de semana eu frequentava a casa dela. Depois veio uma que era mãe-de-santo e também convivi com ela. Eram mundos particulares, mas tinha espaço para se misturarem. Buenos Aires também tem muitos imigrantes, mas no Rio é uma coisa muito generosa. Sem querer fazer uma alegoria com isso, tudo sempre estava acompanhado de um sentimento de festa, bem mais que agora. O Bra­sil parecia estar caminhando, querendo chegar ao seu futuro. Eu sentia um encantamento pela rua, pela arte popular. A Escolinha concentrava gente de vários Estados, estudantes, estagiários, professores, co­mecei a viajar para o Nordeste, para o Sul, mas com o Rio sempre teve esse envolvimento. Ideário Modernista Na Escola de Arte do Brasil foi criado o primeiro espaço de trabalho, onde eu e o Pedro Domin­gues iniciamos um curso de teatro de bonecos. Muita gente participou. Foram alunas Lúcia Coelho, que era professora do Bennet, Sílvia Aderne e a irmã, Laís Aderne, a Cecília Conde. Teve gente do Museu do Inconsciente, que a Nise da Silveira enviou. Ficamos amigos da esposa do economista Celso Furtado, que era argentina e bem próxima do Augusto Rodrigues. Sobre os cursos que ministrei na Escolinha, à medida que se desenvolviam ou que fazíamos experiências com crianças e adolescentes, fomos sentindo que o primeiro curso fora em nível de iniciação profissional, e começamos a separar dois aspectos do teatro: o feito para crianças e o teatro feito com a criança. Nos cursos para adultos, na maioria professores, foi necessário desenvolver toda uma pesquisa para sistematizar o trabalho de formação de educadores na área do teatro na educação. Busquei também per­ceber o teatro feito para crianças, fomentando nos alunos-professores a busca pela qualidade da produção teatral para a infância. O teatro oferece amplas possibilidades catárti­cas, e o sucesso do trabalho como da motivação depende justamente dessa possibilidade de cada um poder expressar seus conteúdos particulares. Grande parte das experiências de dramatização se desenvolve tendo em vista a expressão ple­na do indivíduo. Muitos dos exercícios são de caráter não-verbal, o que exige do aluno uma conscientização e uma reflexão maior de seus conteúdos interiores. Poucas vezes partimos de histórias conhecidas e menos ainda de textos elaborados para o teatro. Pra que Serve a Arte? Trabalhei 11 anos na Escolinha e desde esse tempo acompanho todas as experiências novas de arte-educação, mas ainda não fecharam essas teorias, a importância que deve ter a arte na educação e formação do povo, na vida, no coti­diano. Não tem que ser assim: eventualmente, um dia vou ver um filme, um concerto, ou sei lá o quê, eventualmente vou pegar num livro... Nossa cultura tem que ser rotina, no dia-a-dia. Pra que serve a arte? Sem dúvida para o desenvolvimento e amadurecimento do ser humano, para ele se identificar e até ser o contrário e sentir como tudo isso é transitório e se transforma, a história da humanidade. Aqui é diferente a relação do Estado com a cultura, falta uma compreensão da sua importância. O Lorca diz que a maturidade de um país vem muito da sua expressão artística, e um país que não tem teatro, de alguma forma está se degradando; a poesia, a literatura, todas essas artes têm de estar em crescimento. Acredito muito nessa coisa de educação pela arte, sempre penso no tanto que se poderia fazer colocando o processo da arte na frente até das informações intelectuais. E quanta gen­te talentosa e criativa apareceria. A educação oficial imobiliza, engessa. É comum ouvirmos: Ah, na minha família quem faz teatro é fulano, quem desenha e pinta é.. Não! Todos nós temos o potencial da linguagem de expressão, que é desenhar, falar, pintar, dançar, mas o que vemos é tudo endurecido, engessado, só aquele que tem talento. Isso é equivocado. Tem o talento­so nato, mas talento também se conquista, eu conquistei muita coisa trabalhando. Quando era pequeno, minha mãe tinha medo que eu fosse mudo porque com 4 anos não falava nada; en­tão, acho que venci isso, minha timidez. Penso muito na criança, e o que me preocupa mais no campo da educação é que não se avance. Estava fazendo um espetáculo em Belo Horizonte e num ensaio chamaram as crianças pra assistir. Uma chegou até a cena, se aproximou de uma atriz que também tocava flauta e perguntou: É de verdade? Então, pergunto: a televisão não é de verdade? Um brinquedo, se não permite um jogo que a criança participe, invente, não é de verdade. Já o teatro é de verdade, não é? E só pode ser de verdade porque tem essa humani­dade, a respiração, o toque, o suor. Sobretudo esse teatro em que nós acreditamos. Capítulo VI Amigos, Influências O Augusto Rodrigues foi um autodidata que tinha paixão pela arte-educação; ele deflagrou o movimento arte-educação no Brasil. Quando o Javier Villafañe saiu viajando pela América Latina e esteve no Rio, os dois ficaram ami­gos, viajaram juntos. Vendo-o trabalhar com bonecos, com crianças, depois dos espetáculos fazendo as crianças desenharem, o Augusto dis-se que queria fazer uma coisa parecida e assim começou o movimento. Mas ele não esquecia suas raízes nordestinas, tinha uma coleção de bonecos típicos do mamulengo, destacando-se os fantoches de Cheiroso, um dos mestres do ma­mulengo pernambucano por quem sentia muita admiração. Era também caricaturista, chargista e pensador nato, nasceu pra pensar. Lembro da discussão dele com uma diretora da Escolinha, uma pessoa incrível, mas com valores diferen­tes. Ela convidava pessoas para frequentarem o espaço, pedia currículos, alguns não tinham, ela reclamava. E o Augusto dizia que nesse caso nem ele poderia dirigir a escola, pois não tinha formação acadêmica nenhuma. Eu diria que ele me acarinhou, me respeitou (porque o respeito é uma forma de carinho, não é?), enxergou al­ guma coisa interessante no meu trabalho. Era muito crítico, discutia muito com as pessoas, comigo raramente, me observava e me escutava. Com ele também aprendi a falar, a soltar a voz e a escutar, a encontrar nisso um caminho para transitar também na preocupação do outro. Na Escolinha eu era professor e aluno, partici­pava de tudo, escutava muito. As aulas de arte do Ferreira Gullar eram bem interessantes, não tinham ranço acadêmico; ele falava de coisas que eram preocupações suas com o momento que o país atravessava, como agora, que con­tinua escrevendo, e eu sempre me emocionava ouvindo-o falar da arte da poesia. Teve um ciclo chamado Arte da Criança e do Adulto, Arte dos Diferentes, onde a Nise da Silveira falou do trabalho dela com os internos do Hospital Psiquiátrico Pedro II, no bairro do Engenho de Dentro. Aí tive um sonho afetivo, eu via a Nise com uma luz em volta e falava: Eu te amo, eu te amo, foi assim uma paixão. Ela viu o espetáculo de bonecos que eu fazia com o Pedro e se interessou muito, disse que era um conto de fadas do século 20. A peça tratava de um cavaleiro e seu cavalo. A história tentava ser simpática, engraçada, ou o cavaleiro avançava demais e o cavalo ficava medroso, escondido por uma cortininha, ou o cavalo avançava muito e o cavaleiro de repente recuava. O cavalo se chamava Sonada e libertava a princesa que se chamava Amapoula. Essa relação - poucas vezes o cavaleiro montava - mostra o drama, a divisão que sempre existe entre o instinto e a criação, nunca é uma ação integrada. A Nise da Silveira me influenciou totalmente, deu uma abertura maior à minha visão de mun­do. Eu era uma pessoa tímida e ousada, fiz coisas ousadas porque queria quebrar com uma série de preconceitos. A Nise também me influenciou nesse aspecto. Ela tinha formação mas era uma rebelde, falava que gostava de mim por eu não ter me transformado com o tempo. O artista tem que ter uma identidade e defendê-la ... elaborar, tem de ser muito fiel a si mesmo, sobretudo. Quando fiz Sete Corações – Poesia Rasgada, no Rio, em 1998, peça que falava do fuzilamento do Lorca antes do golpe no Chile, ela estava lá, de cadeira de rodas, e disse: Que amizade a nossa, quase 40 anos!. Ela se ligava em tudo o que eu fazia, mas antes de falarmos de qualquer coisa, precisava saber que bichos eu tinha por perto, trocávamos idéias sobre eles, eu conheço vários. Se fosse agora, aqui, perguntaria pela cadelinha Estrela, pelo Hércules, um cachorro que eu tinha, uma gata, a Olho D’água. Ela falava que os gatos, depois dos três anos, entram num estado filo­ sófico. Tinha um gato chamado Vivaldo e dizia: Daqui um tempo ele vai mudar e quando entrar no estado filosófico vou chamá-lo de Vivaldi. No livro dela, Imagens do Inconsciente, tem agrade­cimentos a duas colaboradoras. A Nise me confi­denciou que são duas gatas, Narcisa e Mafalda, que um dia rasgaram várias páginas do livro e ela entendeu que era pra fazer uma revisão. Os Erros do meu Português Nos cinemas da Cinelândia onde passavam chan­chadas, via aqueles filmes com o Oscarito, Grande Otelo, o pessoal ria comigo, achava engraçado, eu ia também para aprender a falar o português, as gírias. As pessoas diziam para eu não me pre­ocupar com o sotaque, achavam simpático. Era um portunhol, mas já aprendi a pensar e escrevo em português, cometo alguns erros, mas me viro bem. No geral são muito indulgentes com meu sotaque e acham até curioso. Observo que a partir de certo momento nossa língua começou a ficar mesquinha, as pessoas estão lendo menos, os jovens principalmente. Às vezes, diante de cer­tas palavras me pergunto se é mesmo português. O espanhol é uma língua muito rica, elaborada, mas o português tem uma coisa gostosa, senti isso quando percebi as origens comuns e as outras, dos índios, dos africanos... Capítulo VII História de Barco e Rio Segundo a Lúcia Coelho, foi em 1963, durante uma aula na Escolinha para desenvolver uma experiência de bonecos sem bonecos, que eu criei o que seria a base do espetáculo História de um Barquinho ou Um Rio que Vem de Lon­ge, que até hoje apresento com animação de mãos. Primeiro brincamos, procuramos descobrir algum personagem para ser feito com as mãos, um pássaro, um bicho, com isso preparei a aula com os diferentes personagens, e numa tarde preparei o texto para os alunos trabalharem em cima. Veio de vez e resgata sempre alguma coisa da infância, como o nome da flor Irupê. Muito cedo na Argentina a história de Irupê mexia co­migo, tinha visto um filme que era a índia Irupê, aparecia um índio de outra tribo, se aproxima, ela foge, ele vai atrás e eles se relacionam, ela fica envergonhada. As histórias, as lendas sem­pre exprimem situações limites, de ruptura, de passagem. A Irupê então se joga na água que vai cobrindo ela, cobrindo, depois reaparece e é a nossa vitória-régia, que eu sempre achei linda. Esse ano já estou meio querendo voltar a fazer essa peça. A estrutura toda permanece, a repe­tição, no nosso trabalho, serve para polir. No Rio fizemos O Barquinho também na Casa das Palmeiras, uma clínica que a Nise da Silveira coordenava. Uma parte da música foi pesquisada pela Cecília Conde, a outra é criação do Ronaldo Motta. Só em 1972 é que realmente virou um espetáculo. A Secretaria de Cultura realizou um Festival no Teatro Gláucio Gill e ganhamos o pri­meiro lugar. Depois desse festival, mais uma vez resolvi viajar e fui para o Chile. Quando atravessei a fronteira, ainda teve uma confusão com os do­cumentos, os policiais puxaram minha barba para ver se era verdadeira, então senti medo mesmo. Brinquedos Perigosos Eram tempos difíceis de suspeição e perseguição na fronteira entre Brasil e Bolívia. No Chile eu tinha o compromisso de colaborar com o projeto de uma escola que não foi pra frente, mas dei um curso, criei um grupo que depois se transfor­mou num grupo de teatro que demos o nome de Manos, Mãos, Irmãos, formado por chilenos e brasileiros exilados. Montamos O Barquinho, fi­zemos uma temporada no Museu de Belas Artes e também ia com alguns atores em comunidades fazer oficinas. Aí teve a queda do Allende. Na semana do golpe vi-o discursar numa praça e pensei: esse homem está muito só. Convidei-o para assistir nosso espetáculo, ele disse que o neto iria com as filhas, não garantiu ir e falou: Eu gosto muito de crianças, sou uma criança e como elas às vezes brinco com brinquedos perigosos. Ele sabia o que estava vindo. Dois dias antes do golpe, estive num pequeno apartamento onde tinha morado o Geraldo Vandré e estava morando um rapaz carioca chamado Luiz Martins, que fazia parte do grupo Manos. Tinha na parede uma bandeira brasileira, debaixo um cartaz com as frases Pátria amada, salve, salve, texto de uma música do Vandré que fala da pátria como se fosse uma mulher amada. Quando aconteceu o golpe, nas primeiras horas me apresentei, porque meus papéis não estavam muito em ordem, dois dias depois me soltaram, mas não me deram nenhum papel e eu podia ser preso a qualquer momento. Logo depois prenderam o Luiz, a polícia e o exército foram ao seu apartamento e o arrastaram pelas ruas com os pulsos amarrados. No fundo procuravam o Vandré. Só sabia que ele era do Rio de Janeiro, tinha mãe e uma irmã, mas nunca consegui saber do seu destino. Tentei na Anistia Internacional, fui no Ministério das Relações Exteriores com um amigo professor de inglês – os ingleses eram mais respeitados que os brasileiros. Eu não falava que morava no Brasil, dizia que era argentino; para eles, os brasileiros eram todos fugidos, subversivos, enquanto que entre os argentinos tinha um pouco de tudo, mas no interrogatório descobriram que eu morava aqui. Desse tempo guardo uma imagem muito forte: a guarda do Allende deitada no chão do quartel onde eu estava preso. Horas depois foram todos fuzilados com silenciadores. Os operários eram trazidos para o quartel e os guardas quebravam fuzis nas costas deles. Já livre, vi muitos corpos boiando no Rio Mapocho. O grupo Manos se dispersou, resgatei do Museu de Belas Artes dois bonecos que ainda aparecem em Lenços e Ven­tos. Os sobreviventes são Manuel e Manuela. Quando voltei do Chile e fizemos Lenços e Ven­tos, tinha uns painéis, que agora não faço mais, onde anotava os nomes de pessoas que querí­amos lembrar, e em cima de jornais também. Agora, se colocasse os painéis com os jornais, sem dúvida poria o nome de amigos ou poetas importantes, mas de repente botava o nome da freira americana que foi assassinada no Pará, Dorothy Stang, ou de pessoas que vinham as­sistir ao espetáculo, como se fosse grafite, e na época colocaria o nome do Luiz Martins, como uma homenagem. É esse o tipo de teatro que eu faço. Anos mais tarde coloquei tudo isso numa cena do Portal das Maravilhas. Falava do Chile, do 11 de setembro de 1973; começa com dois jovens, um rapaz e uma moça que cantam e andam com duas bandeiras, uma brasileira e outra chilena, e se escuta eles gemerem e dizerem: Ai, ai, nossa mãe está parindo, nossa mãe vai parir... Depois aparecem com duas crianças feitas com as duas bandeiras, a mãe fala do teatro. É uma home­nagem à Mãe Coragem, do Brecht, e a menina que cantava, filha da Mãe Coragem, passa a ser muda. Tem um fuzilamento, vão todos presos. E na Rua Havia uma Guerra O oficial chileno que me interrogou disse que se o que eu estava falando não fosse verdade, ia ficar muito tempo preso no quartel fazendo teatro. Logo que entrei para o interrogatório, ele disse pra eu falar rápido porque era muito nervoso, respondi que se me deixasse falar ele não ficaria nervoso. Outro oficial mais culto viu meu passaporte, meus documentos, na época eu não era cidadão brasileiro, era residente, e quis saber por que tinha sido emitido no Rio de Ja­neiro. Eu disse que no Rio tinha uma escola onde eu trabalhava, participava de um curso chamado Arte na Educação, e todos os anos vinha para o Rio. Ele viu que eu já tinha viajado por outros países e perguntou por que uma pessoa como eu estava com os papéis fora de ordem. Depois disse que ia me deixar sair pra arrumar os papéis e que se eu quisesse podia ficar na cidade por­que naquele momento mais do que nunca iam precisar de gente instruída. Eu agradeci e saí, e na rua havia uma guerra. Foi difícil sair do Chile, tive que pedir a ajuda de amigos que trabalhavam nas Nações Unidas e me acompanharam até o aeroporto. Fui a Buenos Aires, fiquei um tempinho querendo saber o que ia fazer da vida, com um pouco de medo de voltar para o Brasil, porque a situação política também estava difícil, mas no Chile era dez vezes pior. A minha participação era apenas de ser humano que a qualquer momento pode perceber para onde aponta tudo que eu faço. Acho que o artista é político sem precisar estar em partidos ou facções. Capítulo VIII Nasce o Grupo Ventoforte No final de 1973 decidi voltar para o Brasil pela fronteira, como cidadão argentino, entrei na fila dos estrangeiros com o coração disparado. Vim de ônibus, fiz amizade com algumas pessoas e percebi que várias vinham do Chile, mas quase não falavam sobre o assunto. Viajei num vagão que tinha muitos contraban­distas. Numa parada se aproximaram do trem vários índios; índias de peito nu se penduravam na locomotiva; índios pediam coisas nos cha­mando tio! tio! Alguns passageiros pediram pra um deles cantar, e o canto do índio era cheio de onomatopéias, expressões guturais, respirações diferentes. Os contrabandistas riam, riam, mas o índio não conseguia parar, parecia estar em transe, fazendo um ritual. Bateu-me uma emo­ção forte e comecei a chorar. Aí, lá do fundo do vagão surgiu um frade, acho que franciscano, chegou perto do índio, falou alguma coisa bai­xinho, o índio calou, baixou a cabeça, não pegou mais o dinheiro que tinham dado e foi sentar com o frade no fundo do vagão. Cheguei ao Rio impressionado com a viagem, tinha vivido uma situação em que o inconsciente coletivo falara muito forte. Na primeira noite no hotelzinho do Largo do Machado, pensei em escrever para minha mãe contando, mas não em espanhol e sim na minha primeira língua, o iídiche. Minha mãe ficou preocupada. O Começo Mágico Quando cheguei ao Rio, comecei a fazer um trabalho numa escolinha que tinha no Aterro do Flamengo, no Pavilhão Japonês. Aí recebo um telefonema de Curitiba me pedindo para participar de um festival de teatro de bonecos para crianças. Eu disse que não tinha nada para apresentar, não tinha grupo, tinha acabado de voltar do Chile. Devia ser alguém que conhecia meu trabalho, porque me disse para levar um boneco e improvisar algo. Comentei com o Caíque Botkay, que tinha sido meu aluno no Conservatório de Música e ficado meu amigo, e ele me incentivou a fazer alguma coisa. A verdade é que eu estava carente de teatro e resolvi fazer. Juntamos outros amigos, a Alice Reis, o Beto Coimbra, que trabalhava como fotógrafo, o Caíque, e foi assim de uma manei­ra pouco pretensiosa -não que agora eu seja pretensioso, era espontâneo -que começamos o trabalho, os cinco. Um dia o ensaio era na minha casa, outro dia na casa do Beto. No primeiro dia não tínhamos nada. Reunimos alguns objetos, papéis, latas, panos, lenços... alguns bonecos -que quase nem foram usados -e começamos a improvisar. No se­gundo dia eu já tinha escrito as primeiras cenas. No décimo primeiro dia a história estava comple­ta e chamamos de História de Lenços e Ventos. Até as canções estavam prontas, pois o Caíque começou a compor logo nos primeiros ensaios e o Beto se somou à experiência musical. Foi um trabalho lindo. No décimo segundo dia apresentamos na escolinha do Pavilhão Japonês e no décimo terceiro estávamos a caminho de Curitiba. De repente, percebemos que o grupo ia apresentar um espetáculo e não tinha sequer nome. Tentamos descobrir um nome durante a viagem, pensamos em Geomagia, mas real­mente não vingou. Apresentamo-nos no Centro de Criatividade, forramos o chão com papéis e jornais, deixamos algumas cadeiras em volta, mas a maioria sentava mesmo no chão. Quando as músicas começaram e o público acompanhou batendo palma, eu interrompi o espetáculo e disse que não batessem palmas, pois não era um programa de auditório. (Às vezes ainda uso esse argumento.) Pensei até que iriam me odiar por interromper a alegria deles. Mas o espetáculo foi muito bem até o final e aplaudiram muito. Ficaram entusiasmados, inclusive gente do Ser­viço Nacional de Teatro (SNT) que lá estava. Fez tanto sucesso que, quando voltamos, decidimos continuar apresentando. Nessa época era assim, era quase como quando eu era criança, fazia os bonecos de manhã e apresentava à tarde. Bastava a vontade de fazer e o grupo me estimulava. Fortes Ventos Agitam o Teatro O Ventoforte começou em 1974, foi a escritora e acadêmica Ana Maria Machado que inspirou esse nome. Ela escreveu pra adultos também e é a primeira autora de livros para crianças a entrar para a academia e a fazer crítica de teatro. Quando voltamos de Curitiba, a Sílvia Aderne se integrou ao grupo, pois a Bel queria sair. Ensaia­mos ainda um mês e Histórias de Lenços e Ventos estreou no Museu de Arte Moderna. O programa era de papel de jornal, só com o nome do espe­táculo e dos atores, mas o sucesso foi enorme, a Ana Maria assistiu e comentou o espetáculo em duas páginas com fotos. O título da matéria era Vento forte no teatro para crianças do Brasil. Era uma época em que se dava mais espaço na im­prensa para o teatro em geral. Ela dizia no texto que o teatro infantil no Brasil estava dividido em antes e depois de Histórias de Lenços e Ventos. E assim ficou Ventoforte, que, aliás, é o tema do espetáculo...ventos fortes que levam Azulzinha que sai voando. Ficamos no MAM o ano todo. Passaram por lá mais de cem mil espectadores. Depois fizemos uma temporada de dois ou três meses no Teatro Opinião e voltamos em 1976 para o Teatro Gláucio Gil. O tema do personagem central desse espetáculo, a Azulzinha (Alice Reis), significa a liberdade. Ela sai voando e fica prisioneira no castelo do rei Metal Mau. Também os guardas do rei mandam prender os lenços de todos os quintais, que ficam presos na caixa estratosférica, lá no alto. Outro personagem, uma folha de jornal que chamamos de Papel (interpretado por mim), tenta resgatar Azulzinha. Depois de ser perseguido por solda­dos, está amassado, apanhou, chega num quintal onde alguns amigos o recebem. Papel tem a ver com a censura. Nessa época eu morava perto da praia de Ipanema, e de manhã as pessoas levam o jornal para a praia e deixam lá; no final da tarde eu via o jornal todo amassado E tem a música: Se é de papel, voa no céu, se é de metal, me faz chorar, aí eu misturo com outra música brasileira: Deixa-me ir, preciso andar, vou por aí a procurar, pra não chorar.. Minha cultura é latino-americana e brasileira, a poética popular nossa é muito linda. Eu fiz esse papel como fazia há 30 anos, porque para esse nosso teatro, os atores podem ser crianças, jovens e adultos ou velhos mesmo. Capítulo IX Primeiros Prêmios História de Lenços e Ventos foi premiado em 1974, pela Associação de Críticos do Rio de Ja­neiro, e em 1976, quando voltamos a fazer, ga­nhamos o Molière de Incentivo ao Teatro Infantil, que havia sido criado um ano antes. Na primeira premiação quem ganhou foi o Grupo Quintal. Eu soube pela Ana Maria Machado, que fazia parte do júri, que eles não queriam me dar o prêmio, alegando que a peça era de 1974. Na­quele ano eu tinha sido indicado a um prêmio numa categoria especial, mas quem ganhou foi o Orlando Miranda, pelo trabalho frente ao SNT. Em 1976, a Ana Maria discute com o júri até conseguir que premiassem Lenços e Ventos pela sua importância. Em 1975, também no MAM, estreamos Da Metade do Caminho ao País do Último Círculo, que rece­beu o Prêmio SNT. O trabalho ganhou o Concurso de Textos da Fundação Guairá e foi publicado em Curitiba. Foi uma história que eu escrevi e depois virou texto teatral para ser desenvolvido em dois espetáculos, o público deveria voltar para a segunda parte. Logo percebemos quanto essa novidade era difícil para o público, tanto para eles voltarem no dia seguinte, como para os que chegavam e estávamos na segunda parte. Como a peça teve muito sucesso -tínhamos dois horários à tarde -acrescentamos mais um horário noturno para o público adulto. Foi daí que surgiu a idéia de fazer uma versão para crianças e outra para adultos, com uma proposta que fosse diferente. A diferença é que à tarde não tinha a persona-gem Morte, e também a seqüência de cenas era outra. Tínhamos que ter na cabeça duas peças diferentes. Um dos atores que ficava sentado na platéia -o Pedro Veras, já falecido -comentava, discutia e questionava sobre o espetáculo. Numa sessão vespertina, uma mulher da platéia foi até a bilheteria e mandou chamar a polícia; ela achava que tinha um homem atrapalhando o espetáculo. Esse tipo de intervenção era novidade. A seguir veio Frederico García Lorca e suas Pe­quenas Histórias, que, com o tempo, acabamos chamando de Pequenas Histórias de Lorca. Um espetáculo adulto, falando de Lorca de quem eu já era admirador. O Mistério das Nove Luas Debaixo da água tem terra... Debaixo da terra tem água... O processo de trabalho dessa peça foi um pouco diferente. O grupo começou a reivindicar uma criação coletiva. Ninguém tem dúvida que real­mente eu centralizo muito o trabalho. Coloquei algumas idéias de um novo espetáculo que eu queria fazer. Mas o Beto e a Sílvia não queriam mais fazer teatro adulto, não queriam viajar com o Lorca pelo país, e acabaram se afastan­do e montando um outro grupo, o Hombu. O Caíque já tinha saído porque ficou doente. Eu tinha a idéia sobre O Mistério, mesmo assim ficou essa história de criação coletiva e chamei duas pessoas do grupo, o Paulo César Brito e a Sônia Piccinin, e com os dois comecei a elaborar o texto. Achava que mais coletivo que isso não daria certo. Acho que teatro é sempre coletivo, mas tem que ter algumas afinidades para se trabalhar em conjunto no texto. A divisão do grupo foi muito sentida, difícil, e propus elaborar essa separação de uma forma mítica, assim como elaboraria uma comunidade, a coisa pessoal não interessava. O texto inicial foi criado num trabalho com crian­ças e jovens, no Méier, bairro do Rio de Janeiro, e o nome foi dado por uma adolescente. Dentro de cada criança existe um homem de olhos abertos olhando os mistérios entre o dia e a noite. Dentro de cada homem existe uma criança recolhida numa sombra de crepúsculo que teima em evocar eu era... Debaixo do asfalto tem muita terra e água, dentro dos prédios de concreto há muitos ho­mens e crianças que mal conjugam os passados e futuros imperfeitos. A nossa caminhada com este folguedo, inspirado nessas estruturas milenares, é um caminho de continuidade por dentro ou por fora de nós, adultos e crianças, atores e público. Os primeiros folguedos de que participamos aconteceram nos anos 1960, em vales e praças antigas dos Andes: camponeses, mineiros, bran­cos, negros, caboclos, guerras, revoluções e as grandes utopias, que nos levaram até as raízes do teatro. No Brasil, integramos e devoramos a lin­guagem deste teatro místico e mítico, que acon­tecia em cidades grandes e pequenas, em ruas, vilas, praças e até em algum teatro de elite. Desenhamos uma caminhada e uma procura das pegadas, ao longo das estradas da vida e da alma – as marcas, ressonância de tambores e flautas, que lembravam o pisar forte no chão ou a batida do coração, ressurgia assim a ressonân­cia coletiva em que se vai construindo o teatro. Estreamos no final de 1977, no Teatro Ginástico, mas não deu certo. Tivemos problemas com o espetáculo adulto. No começo do ano seguinte voltamos a estrear no teatro do Sesc Tijuca e foi uma temporada maravilhosa. Depois começamos a viajar por várias cidades em Goiás, Minas, Brasília, Maranhão. Quando estávamos em São Luiz, o Humberto Braga me telefonou para dizer que havíamos sido premia­dos pelo SNT e queria saber se poderia chamar a Vanderléia para receber o prêmio. A Vanderléia tinha visto O Mistério das Nove Luas e se apaixonado pelo trabalho, e queria que eu dirigisse um show para ela -coisa que nunca aconteceu, que pena. Ficamos horas papeando -é uma pessoa incrível e tem uma boa cabeça. Um dia ela me convida para ir ver o show do Caetano e da Bethânia no Canecão. Quando entramos é que pude notar quanta popularidade ela tinha. O Humberto estava lá e nos viu. Quando ele falou na Vanderléia, fiquei meio receoso, me parecia exploração. Mas eles acabaram convidando-a e ela foi receber os meus prêmios. O Mistério rece­beu várias indicações, prêmio de direção e figuri­no e foi um dos cinco melhores espetáculos. Em 1999 fizemos uma temporada no Teatro Popular do Sesi, em São Paulo, e dediquei o espetáculo às gentes e brincantes da nossa existência: minha mãe Rosa Zacharias, Nise da Silveira, Augusto Rodrigues, o grupo Hombu, Cecília Conde – que nos iniciou em cantigas e cirandas -, e Margarida Trindade: dos primeiros passos em pé e ritmo dos folguedos e danças. Sonho de um Coração Brejeiro Logo em seguida me convidaram para montar um texto de teatro de bonecos chamado Sonhos de um Coração Brejeiro Naufragado de Ilusão, do pernambucano Ernesto de Albuquerque, primeiro prêmio num concurso de teatro de bonecos, onde eu fui um dos jurados e que o Inacen iria produzir. O Humberto queria que essa montagem fosse apresentada num festival no Uruguai. Era um cordel que apresentávamos tanto para crianças como para adultos, à tarde e à noite. Montamos em um mês. Estreamos em 1978, no Uruguai, numa cidade perto da fronteira cha­mada Artigas, muito linda. Depois fomos para Montevidéu, Buenos Aires, Porto Alegre, Curitiba, e ao voltar ao Rio fiquei doente, peguei hepatite, e não conseguimos estrear. Finalmente estreamos no Rio, no Teatro Glauce Rocha, e recebemos convite para irmos aos Estados Unidos, num fes­ tival em Washington. Lá, O Sonho de um Coração ia acompanhado de um programa traduzido, com alguns desenhos meus, os quais recriavam cena por cena. Fizemos cinco cidades. Na época, também recebemos convite para apresentar O Mistério das Nove Luas no Festival Horizonte, na Alemanha. Aproveitamos para ir a Portugal e levamos o Coração Brejeiro. A repercussão na Alemanha foi muito boa, pediram para fazer mais espetáculos além do que tinha sido combinado. Eram cenas, o que facilitava a compreensão. Prêmio Tempo Ventoforte Criamos esse prêmio há 16 anos para homena­gear pessoas ou grupos por sua contribuição no plano da continuidade. Na primeira versão premiamos várias linguagens, tinha gente de teatro, de dança, como o Grupo Stagium. Na en­trega servimos um coquetel e tinha pão caseiro. Lembro que a Márika Gidali disse: Este é o pão que o Ilo amassou. Premiamos o Paulo Moura, o Plínio Marcos, que um tempo colaborou com a gente na parte de texto, pessoas da área da educação. Tentamos continuar, mas passamos 15 anos sem fazer nada. Em 2004, retomamos e só premiamos gente de teatro. Durante um mês, todo sábado após o espetáculo, entregamos prêmios para vários grupos e artistas individuais, foram 29 prêmios em São Paulo e 21 em uma temporada que fize­mos no Rio de Janeiro. Na primeira vez o prêmio individual era uma estatueta que tinha a forma de uma árvore que cresce, e, para o grupo, um jarro de cerâmica cheio de sementes. O ano passado, além desse prêmio, entregamos o que chamamos de bordados inacabados, feitos pelas crianças que freqüentam o teatro, fazem as ofici­nas, e elas mesmo que entregam. Quem recebia o prêmio recebia também o bordado inacabado para continuar bordando no bastidor. Em 2005 premiamos várias áreas de criação e mantemos os jarros com sementes e os bordados. Senti uma emoção muito grande ao premiar a Cleyde Yáconis, por quem tenho profunda admiração. Ela me abraçou e me pediu desculpas várias ve­zes, dizendo: Ilo, me desculpe, me desculpe, por nunca ter visto um espetáculo seu! Mais um Argentino no Grupo Quando estivemos em Buenos Aires com Sonho de um Coração Brejeiro, o Osvaldo Gabriele trabalhava como contratado num dos melho­res grupos de teatro de bonecos da capital - o do Teatro San Martín. Ele se aproximou do Ventoforte, ficou amigo, e, quando voltamos, começou a se corresponder principalmente com a Sônia Piccinin e comigo, e numa ocasião nos escreveu dizendo que estava servindo o Exérci­to e que depois disso queria sair da Argentina e vir trabalhar com a gente no Brasil. Chegou e já começou a trabalhar. No espetáculo Luzes e Sombras, ele chegou a substituir atores. Em 1982, dirigiu O Misterioso Pássaro de Barro, um espetáculo totalmente dele, mas produzido pelo Ventoforte. Em 1983, resolvemos fazer outra peça adulta, História de Fuga, Paixão e Fogo. Foi um trabalho maluco e não deu muito certo, a montagem levou um ano para ficar pronta e foi complicado, tinha muita gente trabalhando, quase 20 pessoas. Estreamos no Sesc Pompéia. Voltamos para o infantil e, em 1984, comemo­ramos os nove anos do Ventoforte montando Estou Fazendo uma Flor, três histórias, adapta­ções de textos meus e do Osvaldo, de quando éramos pequenos na Argentina. Levamos duas semanas para montar. Tem uma música linda, do maranhense Tião de Carvalho com letra minha: Estou fazendo uma flor. Com quê? Com quê? Com as minhas mãos, com o meu violão, a minha emoção e o meu coração e a saudade de você. Com depoimentos dos alunos sobre cantigas e canções da infância deles montamos Brinquedo da Noite, uma espécie de continuação de Luzes e Sombras, só que a temática era sobre o que as crianças faziam de noite, mostrava a questão da desobediência, dos pais... a idéia e o roteiro são meus, com direção do Paulo César Brito. Escrevemos o texto em parceria com os alunos e foi uma experiência tão boa que tenho vontade de refazer com uma nova turma. Também com os alunos fizemos As Quatro Cha­ves, montado em uma semana. Era mais um ro­teiro que se desenvolvia perante o público. Mas tinha uma seqüência certa, com a apresentação dos personagens, fazíamos o público organizar as vontades e desejos dos personagens. Era um espetáculo completamente participativo e foi apresentado durante anos. Paramos há uns cin­co anos e agora voltamos a fazê-lo e vimos que cresceu o sucesso e talvez o conteúdo. Caminhadas é teatro-dança, fiz com a Graziela Rodrigues, coreógrafa, o Tião de Carvalho e um grupo de músicos. São poemas meus, em cima deles desenvolvi um tema que são sete cami­nhadas, a migração de um casal de algum lugar perdido no mapa e o desencontro deles, por fim, na cidade. Apóia-se muito nas cantigas, na movimentação do Boi. Começou de um impro­viso entre a Graziela e o Tião, eles brincavam de dançar o Boi e eu disse: Carrega ela, e aí surgiu a idéia de carregá-la porque ela estava grávida. Aí já existia o parto, ia nascer uma criança, tinha uma tempestade e ele saía carregando ela nas costas como se carrega a figura do Boi. Na hora pensei: ela ainda vai carregar ele. A história se desenvolve e, no final, estão na cidade, se se­param, não se sabe se ele é guerrilheiro, polícia ou bandido, é um homem com uma arma na mão que aparece onde ela trabalha, faz strip­tease. Tem um flor que simboliza o amor dele pra ela, tem o filho. O casal se reencontra, ele tem a arma, acontecem tiros; ele morre, ela se cobre com um pano preto; pega o homem morto e carrega nas costas até o trilho do trem. Quando vai subir, o filho pega a flor e diz pra ela não esquecer. Junto ao Muro é um exercício com alunos, im­provisações feitas ao ar livre em vilas, praças, sobre trechos de poemas do Lorca. Capítulo X A Mudança para São Paulo Depois da viagem a Portugal e à Alemanha, em 1980, retornando ao Rio de Janeiro, pensei em mudar para São Paulo. Em Portugal estava no auge a Revolução dos Cravos. Todos os grupos de teatro que a gente conhecia ocuparam diversos espaços que estavam desativados, um antigo hospital, depois uma escola alemã desativada na época da guerra, A Comuna ocupou esse espaço, A Barraca ocupou outro, enfim, vários grupos. Achamos bonito e eles puderam desenvolver um trabalho nesses locais. Toda vez que a gente vinha a São Paulo, era um sucesso. As pessoas diziam, venham pra cá, porque vai ser tudo melhor, vamos conseguir espaço para vocês trabalharem. Então resolve­mos vir e começamos a sonhar em ter um lugar. Alugamos uma casa nesse mesmo bairro, na Rua Tabapuã, demos o nome de Casa Vento­forte e a razão social chamava-se e continua se chamando Casa Ventoforte – Centro de Arte e Cultura Integrada. Mas o aluguel era alto, tive­mos muitas dificuldades e o espaço não era tão bom, um pequeno barracão onde construímos uma arquibancada. Mesmo assim apresentamos O Mistério das Nove Luas, que trouxemos do Rio, e montamos Lenços e Ventos, que voltou a ganhar como um dos cinco melhores espetáculos do SNT, prêmio de direção no Mambembe e Prê­mio APCA de melhor espetáculo e um especial Grande Prêmio da Crítica. Começamos a trabalhar com oficinas, vieram os alunos e, em 1981, montamos Luzes e Sombras, uma peça com brincadeiras, cirandas e jogos participativos. Paralelamente, A História de um Barquinho seguia seu percurso, ganhando como um dos cinco melhores espetáculos do SNT e direção no Mambembe. Também ganhei o Prêmio APCA como diretor pelo O Barquinho e Luzes e Sombras. Viajamos pelo país todo com peças e oficinas. Mesmo que a democracia não tivesse retornado, tinha o Ministério da Cultura, o trabalho na Fundação de Artes Cênicas. Mas como estávamos insatisfeitos com o local, começamos a procurar outro que nos permitisse talvez realizar aquela utopia como tinham feito os grupos portugueses. Alguém sugeriu esse es­paço, o Parque do Povo, onde existiam grupos, clube de futebol de várzea e estava se instalando o Circo Picadeiro. O prefeito era o Mário Covas, mas o terreno era da Previdência, e o ministro na época era Valdir Pires. Ele tinha viajado para a Espanha e viu que o ministério da previdência espanhol instalava experiências de desenvolvi­mento cultural e social em todos os lugares onde havia espaço, terrenos. Então havia uma promes­sa de que tão logo ele voltasse se definiria por quanto tempo poderíamos ficar aqui. Quando ocupamos fomos ver o secretário da Cultura, que era o Gianfrancesco Guarnieri, ele levou um susto, pois não sabia da história. Em 1984, final de junho, dia de São Pedro, re­solvemos nos instalar. Fizemos mais ou menos como os romanos, acendemos uma fogueira, montamos uma mesa com uma toalha branca, comida dedicada a São Pedro e colocamos um cartaz que dizia: Aqui será construída a Casa Ventoforte, centro de arte e cultura integrada. Dois ou três dias depois o cartaz estava no chão, todo rasgado. Teatro dos Olhos, das Mãos e dos Pés Aqui não havia nada, mas descobrimos a possibi­lidade de um apoio da Petrobras para criar esta casa e foi muito rápido, deram uma verba para nós, nem me lembro mais o valor, e começamos a construir. Eu ia bastante para Florianópolis e vi muitas casas pré-fabricadas, e assim as primei­ras construções foram pré-fabricadas, para ter escritório, salinha de trabalho. Depois fizemos um projeto com fundações, colunas de concreto para formar galpões, alguns tradicionais, outros nós mesmos elaboramos a forma, como o bloco que chamamos de teatro dos olhos, que tem uma forma de elipse e é onde atualmente levamos os espetáculos. Os outros dois chamamos teatro das mãos, pequeno, com um ateliê de artes plásticas do lado, e o teatro dos pés, ao fundo. Todos são meio arena e podem ser transformados. No meio fica o coreto onde às vezes realizamos espetácu­los em volta também. Água, Terra, Fogo, Ar Aqui tem quatro portões. No início, planejamos fazer os quatro pontos cardeais – você entrou pela entrada que chamamos do Ar. O lado mais perto da ponte é o da Água, e nos fundos, o da Terra, e esse aqui é o lado do Fogo. No portão da Terra queria uma escultura de uma vaca e o escultor Jean Jacques Vidal disse que vai fazer, mas primeiro criou a Iguana, um grande lagarto perto do portão do Fogo. Há uns três anos estávamos fazendo oficinas com mitos, experiências com as pessoas que pas­savam na rua, e elas sempre se envolvem muito. Nas leituras, o pessoal começou a ler sobre o mito da Ilíada e do rei que se chamava Ilo (eu nunca tinha lido isso, a Ilíada, sim). A história do Ilo é que ele foi numa competição, ganhou de presente dos deuses sete rapazes e sete moças para acompanhá-lo e fundar uma família, um reino. E ganhou também uma vaca e onde ela parasse aí seria o seu reino. Daí vem a Ilíada. Parece que eu estava mexendo com esse mito antes de conhecê-lo. Censura no Palco e na Platéia Nosso primeiro espetáculo no novo local foi La­birinto de Januário, em 1985. No ano anterior, o texto já havia sido premiado no Concurso de Textos do Inacen. A montagem recebeu o Molière e o APCA de 1985, e em 1986, o Prêmio Inacen, como um dos cinco melhores do ano, além do Mambembe pela produção e música. Foi uma adaptação de texto dos Irmãos Grimm. Fazíamos em vários espaços, simultaneamente, aqui no Ventoforte; o público se movimentava com os atores, entrava, saía, passava pelos fun­dos, atravessava o palco. É a história de um menino da cidade, que sonha em andar de cavalo e ir às festas de mouros e cristãos. Foi inspirado nas cavalhadas. Antes de começar o espetáculo, eu contava para as crianças que as roupas penduradas no varal eram de pessoas muito pobres que estavam es­perando que as roupas secassem para se vestir e começar o teatro, pois era a única roupa que tinham. Só que alguém rouba as roupas e eles são obrigados a vir para o palco enrolados em panos. Então a personagem Censura que está sentada junto ao público diz que eles não vão poder ficar, pois os panos podem cair e eles ficarão nus e ela não ia autorizar que eles par­ticipassem do espetáculo. Nessa época tínhamos que apresentar o espetá­culo para os censores da Polícia Federal. Vinham sempre duas mulheres para ver o que podia ou não ser mostrado ao público. A personagem Censura chegou a conversar muito com elas an­tes de se apresentar. Foi muito engraçada essa mistura de realidade e teatro. Histórias que o Eco Canta são várias histórias do Oscar Wilde, a peça foi montada com atores e alunos. Transgressões e Benfeitorias A partir daí houve uma mudança, o ministro Valdir Pires saiu, o Ministério da Previdência ficou minoritário e foi transferido para a Caixa Econômica Federal. Nunca tivemos problemas com eles, tivemos com a prefeitura, dependen­do do prefeito. Para termos recursos fazíamos uns bailes, uns forrós que chamávamos Forró do Ventoforte, isso de certa forma nos sustentava e era muito gostoso, ainda hoje são lembrados. No tempo do Jânio, recebemos um telefonema da Secretaria de Cultura da Prefeitura, dizendo que a vizinhança estava reclamando do barulho, que o trabalho com as crianças poderia conti­nuar, mas queriam que a gente parasse com as festas. Durante anos foi uma luta, ora fecháva­mos, ora abríamos, e também trabalhávamos com a prefeitura, como no tempo do Paulo Maluf, acho que na segunda gestão. Chegaram a falar em fazer passar uma avenida por cima desse espaço e ao mesmo tempo eu participava de seminários em que se discutia arte, cultura e comunidade. Na mesma prefeitura, de um lado eu era considerado até transgressor e do outro era o benfeitor da cultura e das artes. Patrimônio Cultural As grandes empresas cobiçavam esse espaço e co­meçaram uma perseguição simpática e antipática ao mesmo tempo, nos prometiam qualquer coisa para sairmos daqui. Por volta de 1988, um gru­po de intelectuais, artistas, educadores, achou que seria interessante tombar todo o Parque do Povo como uma experiência dentro da cidade. Fizeram um movimento, colheram milhares de assinaturas por todo o país de gente preocupada com nosso destino. A lista era encabeçada pela Fernanda Montenegro. Quando as empresas vie-ram dialogar comigo, diziam: Olha aí o homem do teatro, porque o movimento pesou para elas. No início dos anos 1990, o Parque foi tombado com tudo que ele tem. O tombamento foi bom, mas não se criaram condições de se administrar esse local, porque a manutenção é complexa, são 4 mil metros quadrados. Freqüentemente, a Associação de Amigos do Bairro do Itaim, que indiretamente defende os interesses dessas grandes empresas, entra na justiça contra nós. Dizem que ameaçamos o meio ambiente e tal. Quando chegamos aqui tinha quatro ou cinco árvores, fomos nós que plantamos tudo isso. Quem passa de avião por cima do Ventoforte vê uma ilha verde. As em­presas já me procuraram para que eu assinasse uma carta concordando com os planos delas de construir aqui um grande centro empresarial, um shopping center e nós iríamos para outro espaço, sabe Deus onde. Às vezes, a associação me chama pra reuniões, faz reclamações e eu digo que eles têm que li­dar com isso como uma situação especial. Não é apenas um grupo, nós somos uma comunidade, um patrimônio, muitos de nós fazemos parte do patrimônio cultural do Brasil. Lugar de Resistência O Ventoforte é um lugar que não foi planejado para um resultado definitivo, é um lugar onde cabem as descobertas, onde se procura ideali­zar coisas que não foram idealizadas, integrar os sonhos das pessoas. É, sim, um espaço de resistência, mas resistência a quê? Para depois virarmos uma grande empresa que vai ganhar... vai ficar cada vez mais rica? Não, não passa pela nossa cabeça que mude, que se crie aqui um grande investimento pra entretenimento. Entre­tenimento, divertimento não é igual a teatro, é outra coisa. Espaços que vendem consumo logo são substituídos, aí vem outro que derruba a parede, constrói um pouco diferente... e não deixa lastros, não deixa herança, não deixa nada, a arte deixa. Até certa época tínhamos oficinas permanentes de formação. Duravam quase dois anos e depois integravam espetáculos, mas agora fazemos ofi­cinas periódicas que têm a ver com o projeto em andamento. Quando fazia o espetáculo Victor Hugo, Onde Você Está?, era tudo em volta da li­teratura dele, da história da Revolução Francesa, para termos uma temática comum de trabalho. Sempre que voltamos ao Lorca, fazemos uma oficina lorquiana. Capítulo XI Museu do Inconsciente Desde 2005 temos trabalhado com um projeto que tem apoio da Lei do Fomento, e vai ho­menagear o Museu do Inconsciente, da Nise da Silveira, que hoje estaria com mais de 100 anos. Já estamos realizando uma idéia que não estava no projeto original, que são oficinas do sonho ou dos contos de fadas e os mitos ou histórias verdadeiras ou de mentira, tudo incluído. Inicialmente esse projeto, que se chama Engenho de Dentro, ia se chamar As Flores do Abismo. O nome vem de quando o Museu do Inconsciente, no Rio de Janeiro, fez a primeira exposição com pinturas dos internos. Na ocasião, o crítico Mário Pedrosa, do jornal carioca Correio da Manhã, fez um artigo intitulado As Flores do Abismo. Depois tive a intuição de que Engenho de Dentro seria um nome mais simples e adequado, como alguma coisa que acontece dentro da gente. So­bretudo estando eu no Rio e indo para o museu, que fica no bairro que tem esse nome, um bairro muito especial, com um hospital psiquiátrico e um bloco carnavalesco que sai na Quarta-Feira­de-Cinzas, o Chave de Ouro. Então achei que esse nome não era ao acaso. O projeto também se mistura dramaticamente com o bloco. Antigamente a polícia o proibia de sair, porque o carnaval acaba na terça-feira. O bloco tinha sua força justamente por essa trans­gressão, o pessoal brincava, quando a polícia aparecia, todos saíam correndo e reapareciam em outro canto do bairro. Isso me inspirou na temática do espetáculo, porque tenho muitas lembranças, muitas experiências sobre a Nise da Silveira, leio sobre ela e sobre o que pensam do trabalho dela. Mas preferi alguma coisa que me permitisse certa dinâmica, por ser um espetáculo. E ele deverá ser assim: Numa semana de carnaval, mais ou menos em 1975, um grupo de teatro que está sendo perse­guido pela polícia se refugia dentro do Museu do Inconsciente. O grupo faz um espetáculo criado em 1974 – é minha biografia, embora eu não a coloque objetivamente, meu nome também não aparece. Um personagem era queimado pelos guardas, fizemos essa peça em vários lugares, a censura sempre implicou um pouco, mas não sabia por onde nos pegar. A cena mais violenta de Lenços e Ventos, por exemplo, evitávamos mostrar para o censor, mas fizemos por cida­dezinhas do interior do Estado do Rio e nos denunciaram, dizendo que ridicularizávamos o presidente Geisel, que ele era o rei Metal Mau. E que a personagem Azulzinha, no fundo, também ridicularizava a filha do Geisel. Tudo isso tem a ver com Engenho de Dentro. Atores e Internos, um Bloco Só Os atores refugiados no Museu não sabem como sair, o diretor manda expulsar todo mundo, mas enquanto não saem, eles vão representando cenas e lembranças, sobretudo do meu contato com a Nise da Silveira e com a repressão daquela época. Aí há uma mistura proposital. Os guardas, a tropa de choque e as torturas ao mesmo tem­po simbolizam o choque elétrico que se dá nos internos do hospital e que a Nise combatia. No final, quando o grupo tem de achar uma solução, uma saída, esta é totalmente imaginária, como se fizesse parte de um sonho. Inclusive entram cenas que não são de 1975, talvez sejam dos últi­mos anos da Nise, quando ela já está em cadeira de rodas. Finalmente, os atores escapam com os internos que estão presos, se misturam com o bloco Chave de Ouro e se perdem no tempo. Na peça eu coloco, de um lado, o Rio de Janeiro; do outro, Brasília, e tem o Jânio Quadros como personagem. Uma vez ele perguntou ao Ferreira Gullar o que tinha de interessante no país que podia se desenvolver. O poeta falou que tinha um trabalho do Museu do Inconsciente com a Nise da Silveira. E o Jânio quis falar com a Nise naquele dia mesmo. Ainda éramos outro país. E pelo rádio e pelos noticiários circulou a co­municação: O presidente da República precisa falar com a doutora Nise da Silveira, do Hospital Psiquiátrico Pedro II. Acho que ela ficou saben­do, pegou um avião para Brasília e falou com o Jânio. Mas ficou nisso mesmo. A temática é linda, e estamos agora trabalhan­do o caminho estético, temos muito o que fa­zer, principalmente a parte plástica, colocando, não o processo de cura, mas o do encontro com a essência da realidade do ser humano e com o inconsciente. Capítulo XII Rotina e Continuidade ou Música, Dança, Morte e Renascimento Estamos agora celebrando os 31 anos do Vento­forte, retomando o trabalho de vários espetácu­los, continuando com o nosso repertório, moder­nizando. De qualquer forma, o Ventoforte daqui a pouco vai se transformar em várias pequenas oficinas que terão atividades parecidas. O grupo vem se renovando. O único que ficou da primeira fase sou eu. O pessoal do Hombu, que mora no Rio de Janeiro, é da primeira época do Ventoforte, eles formaram um novo grupo, têm uma casa na Lapa. Aqui fazemos uns exercícios, a gente solta bas­tante, libera o insconsciente, tem uns que, a partir de certa sensibilização, saem à procura de um oráculo, e, muitas vezes, o material que trazem tem a ver com material mítico em que fazemos até leituras muito fortes e claras. Temos sempre projetos em andamento e esta­mos numa rotina que é a da continuidade, não paramos nunca. Trabalhamos de dia e de noite também, eu até sonho com o que faço, procuro ficar atento aos meus sonhos, como está no espa­ço real e como ocorre na psique, na alma. Agora está assim: podemos partir para uma nova etapa e ao mesmo tempo dar continuidade, daí a nossa diferença em relação a outro tipo de teatro. O teatro que fazemos sempre usa bastante mú­sica, canções, nossa linguagem usa a poesia can­tada, narrada, como em Sete Corações – Poesia Rasgada. É a história de um poeta que é fuzilado, o Lorca, e usamos um poema dele. O espetáculo se comunicava muito com o público. Era uma brincadeira. Dividíamos a platéia em duas alas, poetas ou guardas, e cada grupo decidia o que queria ser. Uma vez ouvi na platéia uma mãe perguntar ao filho se ele não queria ser poeta e chamava o garoto para a ala dos poetas. O filho respondia que não, que queria ser guarda. E falava pra ou­tro que era guarda: Guarda, prende essa mulher, leva ela presa! Teatro, para a criança, é uma experiência muito forte, quase terapêutica. Na peça teve também um garoto filho de um psiquiatra (sabíamos por­que conhecíamos o pai)... e esse menino mandou prender o pai para que fosse fuzilado. Sendo psi­quiatra, ele deve ter chegado a alguma conclusão. Mas era tudo uma brincadeira. Tinha um momen­to em que todos os poetas -o elenco e parte do público -eram fuzilados e ficavam no chão, e o jogo era o público restante vir inventar poemas e falar no ouvido dos fuzilados para que renas­cessem. Eu estava no chão morrendo ou já tinha morrido, e uma criança que se debatia me dizia: Você não poderá matar todos os poetas porque não pode matar o poeta que ainda não nasceu. Isso era texto do público que a gente levava ele a dizer. Claro que não era só com a gente que isso podia acontecer, mas nós motivávamos as crianças por tudo que acontecia no espetáculo. Capítulo XIII O Método: Reflexão, Cubismo Escrevo muito, anoto muito, mas sou desorde­nado. Neste caderno tem folha colada porque descubro que uma anotação tem a ver com o que tem aqui dentro, e pra não perder, colo. Vem a inspiração, anoto e deixo em cima da mesa, depois aproximo de outro texto para ter material mais presente. Poderia ter um caderno onde anotasse tudo. Tenho um pensa­mento reflexivo e meu diálogo é meio cubista, falo uma coisa, pulo rapidamente pra outra. Quanto ao processo, dou muita importância ao trabalho individual e coletivo, coletivo, sem dúvida, pela vivência. Trabalho sempre procurando certa espontaneidade, pra mim é muito difícil substituir um ator, porque acabo construindo em cima desse ator um persona-gem. Claro que quando tem que substituir é inevitável, mas aí parte do trabalho já foi realizada. Teve uma época em que se agitou muito a criação coletiva, alguns entendiam que era todo mundo criando o espetáculo. Todo mundo criando, sim, mas cada um participando com o que tem para contribuir, até os atores têm participações diferentes. Um Pouco Stanislavsky, Grotowisky... Eu nunca disse: Agora é isso! Tanto que eu ria quando me perguntavam em Cuba: Você é mais Stanislavsky ou Grotowisky? E alguém dizia: Ah, ele é ele mesmo... A gente deve ser um pouco Stanislavsky, Grotowisky e cada vez entendê-los melhor. Quando fui ver o pessoal do Berliner Ensemble em Berlim, vi um distanciamento que não era o que as pessoas falavam, que quando tem que chorar em cena olha ao largo, mas isso não está no jeito de expressar, está em como conduzir a máscara, isso que se oferece para os outros e o que ocorre por dentro. Tem uns processos de continuidade e vários ou­tros. Em alguns eu faço o texto, em outros pouco, menos, pego o texto pronto, nesse eu mexo bem dentro dele. Fazer o texto é complicado, às vezes escolho muitos caminhos ... como se escalasse uma montanha, não sei o que tem lá em cima e nem do outro lado. Gosto muito de citações, de usar frases. No Lenços e Ventos que reapresentamos no final de 2004, musicalmente eu aproximei (fiz isso também com Bodas) por razões intuitivas e ou­tras. Quando estava traduzindo o Lorca, tinha um verso que dizia Ai, linda pastora..., ai, ai, ai, rapaz, pega teu chapéu, vai para o olival. Mas eu traduzi assim: Ai, linda pastora... e acrescentei e...as pastorinhas, pra consolo da Lua... Tenho dificuldade de tocar qualquer instrumento, mas faço música, corrijo os atores, não suporto um desafinado, procuro até ensinar como cantar. Nesse trabalho que faço aqui com os atores e as crianças - tem aquelas que bordam -, lido muito com o avesso, digo vamos ver o avesso disso, é para dar uma virada no que está-se fazendo, olhar mais interiormente. Tem aquela música do Caetano Veloso que fala do avesso do avesso, quando se refere a São Paulo. Já escutei muitas vezes e acho tão maravilhosa. Incrível como um artista se adianta ao tempo e à compreensão. Ah, improviso muito com os atores e costumo não racionalizar demais. Como trabalho com simbolismo, acho que tenho que ir na intuição. Não gosto quando paramos a cada momento para pensar se estamos certos ou errados em cima do significado de um personagem. Tem que desenvolver. Gosto de construir, às vezes sai numa tirada. Lenços e Ventos foi feita em 12 dias, no décimo terceiro já fomos para um festi­val. Cada dia escrevia uma cena, duas canções e dava pra musicar e íamos integrando aos poucos. No primeiro dia não sabia nada do que ia sair. Mas partia de uma coisa muito legal, que era o que eu fazia com os bonecos. O boneco tem a ver muito com... digamos... a Commédia dell’Arte, você trabalha com um repertório de respostas e situações e com isso improvisa. É uma espécie de fórmula de construir um espetáculo. O Teatro é a Raiz da Expressão Uso muito de prólogo, de folguedos, de situações iniciáticas, preparatórias da linguagem. Mas de tanto em tanto adoro ver os atores improvisando, isso me enriquece, me dá uma puxada, um fio, longos fios.. De tanto em tanto parece que está tudo muito estruturado e temos que desarmar, desconstruir, aí entramos no caos novamente para voltar a enriquecer com aquilo. Mas teatro não é uma coisa assim tão improvisada, é um trabalho artesanal e uma das artes mais antigas, é a raiz da expressão do ser humano. Uma palavra, uma frase que detesto é aquela marca, aquela marcação. Nunca fizemos o que se chama teatro comercial, mas a gente precisa de recursos para viver, a arte não pode se segurar apenas em projetos, tendo recursos é mais fácil se orientar para onde a gente está caminhando. A influência que pode ter um espetáculo meu nos outros me deixa feliz, claro. O processo da arte é uma continuidade. Eu já disse que sou neto do Lorca e bisneto de outros teatrólogos e pintores. Todo artista é influenciado por aqueles que o antecederam, é importante que tenha em quem o jovem se inspirar, não é? Sem mim no Ventoforte, não sei, acho que ha­verá desdobramentos. Tem gente da primeira época que saiu, uns quatro ou cinco. Acredito que tudo isso vai continuar existindo sem mim, mas não é esse meu sonho. Conquistei espaços e experiências e gostaria de repassar. A cada vez que tento repassar, abre mais uma resposta, cresce mais, parece que não tem fim. Quando já estava no Rio, viajando de avião com turbulências, morria de medo e dialogava com Deus (agora morro menos de medo): Meu Deus, ainda tenho que montar esse Lorca, preciso fazer não sei o quê, deixa eu acabar minhas coi­sas...Ainda quero fazer muito teatro e também pintar muito... Capítulo XIV Pelo Mundo Sou um viajante, acho que o caminho do teatro é andar, andar e andar... Já trabalhei em espaços não-oficiais, ao ar livre e também em salas sofisticadas daqui e de outros países, como nos Estados Unidos, onde fizemos Sonhos de um Coração Brejeiro Naufragando em Ilusão. Como esse espetáculo foi ao sul do Uruguai, à Argentina e as pessoas falavam Ah, essas coisas do Ilo, bem brasileiras, coloridas.. . Há muitos anos, na época em que mais viajei, antes do espetáculo fazíamos uma síntese, que, às vezes, era dividida em três partes, fizemos isso em Genebra, na Suíça; eu não gostava muito, mas facilitava a compreensão. Para os Estados Unidos foi elaborado um folheto com desenhos meus tal qual um cordel, com os personagens e as cenas. Passamos em Washington, Nova York, na universidade de Lawrence, perto de Tucson, no Arizona. Numa apresentação na universidade de Stanford, em Palo Alto, São Francisco, perto do palco tinha umas crianças com o livrinho, olhando e acompanhando o espetáculo, repas­sando as páginas. Em Berlim Ocidental partici­pamos do Festival Horizonte, que, naquele ano, era dedicado à África e aos países de influência africana, como o Brasil. Apresentamos O Misté­rio das Nove Luas, e também era lido um texto preliminar e depois seguíamos. Às vezes descobríamos algumas palavras-chaves que o público podia entender melhor e usáva­mos. Tinha estudantes de todo o mundo, um es­tudante africano conversou com a gente e disse: As palavras eu não entendi tudo, mas o tambor, o som e o movimento dos atores, entendi tudo. Então isso aconteceu muitas vezes, até na Ar­gentina, onde levei a História do Barquinho, no Festival de Córdoba. Em vez de usar a palavra borboleta, que é curiosa, usava mariposa, só para facilitar um pouco, mas o texto fluía e eu não me sentiria à vontade se fosse fazer tradução de mim mesmo. Trabalhei em três cidades da Polônia: em Var­sóvia e na cidade do meu pai, Bialistok. Fui re­cebido pela secretária de cultura da cidade, lá tem uma escola de teatro de animação, sabiam um pouco da minha história, passei por várias salas de aula onde os alunos me mostraram pe­quenas peças feitas com bonecos. Estive também numa cidade industrial de Lodz, onde parentes meus tinham morado antes da guerra. Tinha a Escola Internacional de Teatro e Cinema, depois encontrei pessoas aqui no Brasil que passaram por lá, o Fausto Fuser, crítico de teatro, estudou lá quando era bem jovem. Nessa cidade me con­vidaram para dar uma aula para uma turma. Eu estava acompanhado de uma ótima tradutora, uma jovem que estudava português na universi­dade. Pensei: se eu disser não, o que acontece? Melhor que aconteça alguma coisa. Fiquei um pouco amedrontado, mas deu tudo certo. Aí me juntaram com uma turma em cima do palco. Achei os jovens poloneses lindos, a maioria de cabelos louros, mas nem todos. Prêmios em Cuba Em 1986 estivemos numa cidadezinha próxima de Havana, Machurucutu, onde tem um hotel e se reúnem pessoas de todos os lugares para seminários e coisas assim. Convidaram-nos duas vezes para fazer um trabalho lá com a comu­nidade, fizemos um histórico do lugar para ser apresentado numa praça. Simultaneamente fiz trabalhos com turmas da escola de arte da uni­versidade. O único comentário dos cubanos foi que o meu português era mais fácil de entender que o dos outros atores. Eu percebia que havia ali processos de desen­volvimento, talvez esteja idealizando. É que politicamente tenho toda uma história ligada a movimentos de esquerda, a partir dos meus pais imigrantes poloneses. Minhas atividades e a própria realidade da América Latina me obriga­vam a ter um pensamento de resistência. E em Cuba todo esse processo ficou muito presente, percebíamos que lá havia uma possibilidade... Por exemplo, sabia que é complexa a história da re­volução cubana, a relação com os Estados Unidos, a União Soviética, a dependência dela. Mas dava um prazer ver crianças e jovens todos estudando, não ver extrema miséria, aquilo que parece que só por um milagre poderá acontecer no Brasil, com todos dignamente vestidos, sem fome. Apresentamos História de Lenços e Ventos, no Teatro Nacional; As Quatro Chaves, na Praça de Armas; e História do Barquinho. Foram três apre­sentações de cada espetáculo e com um elenco todo novo. Tempos depois soubemos que Lenços e Ventos ganhou o prêmio de melhor espetáculo visitante da temporada. Capítulo XV Crenças Criei-me numa família de judeus poloneses que eram ateus, marxistas, comunistas. Meus pais diziam que não passariam dos anos 1960/70 e todo mundo seria socialista. Meu pai faleceu bem antes e minha mãe falava assim: Ainda bem que ele faleceu, se visse toda a virada, depois a virada na União Soviética... Ela sempre era a heroína, assumia sofrer, estar viva num mundo que continuava capitalista e explorador. Existia uma tradição cultural, éramos judeus, mas, ao mesmo tempo, meu pai falava Deus não existe, Deus é isto, e mostrava as mãos, os pés, as duas mãos espalmadas, que acho até bonito e possi­velmente Deus é isso, ou seja, são as mãos do ho­mem que trabalha, e quando o homem começa a dar energia e a trabalhar com as mãos ele se humaniza. E isso tem a ver com meu trabalho, meus atores têm que mexer com as mãos, de­senhar, pintar, costurar, o teatro é um trabalho artesanal, porque muito primitivo. Quando era quase adolescente, tinha necessidade de procurar Deus. Subia no terraço da minha casa, no telhado, ao pôr-do-sol, e me deitava, olhava para o céu e as estrelas que estavam nascendo e fazia orações. Mas em casa ninguém sabia, eu escondia, sentia vergonha de estar fazendo isso, quando meus pais me colocavam outra coisa, era quase uma ofensa aos ideais deles. Viajando pela América Latina sempre fiquei muito atento aos costumes, à religião, a tudo que fala do ser humano: a relação com a terra na Bolívia, no Peru. Os índios com a Pacha Mama, a Mãe Terra, é uma coisa muito forte. Teatro, o Espaço do Sagrado No tempo em que fiquei na Escola de Arte do Brasil, a cozinheira era uma mãe-de-santo e passei a frequentar a casa dela. Ia como visita, assistia às sessões, depois passaram a me solicitar mais, fui até batizado, e aí fiquei preocupado, queriam que eu deitasse para o santo. Um amigo me levou em outro lugar onde a mãe-de-santo era um pouco diferente, era branca e me chama­va de cara-pálida. Fiquei nesse espaço um bom tempo, realizei todas as experiências possíveis, raspei para o santo e depois comecei a me dis­tanciar. A mãe-de-santo ficou doente e passou a me liberar, dizia pra eu não me preocupar, não ter pressa, é uma cultura muito diferente, nem sei se você vai se sentir bem nisso, e que o meu espaço do sagrado era mesmo o teatro. Essa mãe-de-santo branca, a Áurea, Aurinha, era irmã da Fernanda Montenegro, mas nunca tocava no assunto. Num tempo administrava a Companhia da Fernanda, e eu ia até o teatro pra conversar com ela. Cada vez que encontro com a Fernanda, relembro. Uma vez estava voltando de um festival em Porto Alegre, o vôo atrasou, e quando cheguei em Congonhas, alguém me disse que a Fernanda Montenegro estava lá, quando ela me viu, me abraçou e chorou pela irmã. Foi a Aurinha quem fez isso, ela queria que a gente se encontrasse e falasse dela e de tudo que ela gostava. As duas falavam que o pai já devia ser meio feiticeiro na Sardenha, de onde tinha vindo, e por parte de mãe eram bem brasileiras. A Aurinha era uma pessoa muito ampla. Foi muito importante na minha integração em re­alidades diferentes do Brasil e na compreensão de que essa cultura que estava se elaborando, era ligada à nação queto da Bahia. Penso que todos os brasileiros têm uma vivên­cia sincrética, até diria que todos somos um pouco místicos em qualquer lugar do mundo, porque não é apenas o presente, é o passado do ser humano. Acho importante falar da Aurinha, já que falo da Nise da Silveira. Com a Nise comecei a pensar livremente sobre aquelas minhas orações no telhado quando garoto. A Nise já dizia que a psi-que humana é como um terreno arqueológico, nela estão todas as etapas da humanidade. Energia como Metáfora Além do religioso e do sagrado, havia a procura de níveis espirituais. Nesse momento eu digo que o mistério da vida ainda não foi totalmente de­cifrado nem pela ciência nem pela religião. Isto quer dizer que o homem tenta criar metáforas que lhe permitem conviver com o mistério e a contradição. E como poeta eu tenho a metáfora mais e melhor elaborada, que é a energia que me ajuda a acreditar, a sobreviver, a dar conti­nuidade aos esforços. Assim, a poesia assegura a continuidade da espiritualidade do homem. Capítulo XVI A Cada Dez Anos, Lorca em Cena Respeitável público... não, respeitável, não, só público. Essas palavras foram ditas por Federico García Lorca, no prólogo de um espetáculo em Buenos Aires, em 1934, ano em que ele esteve lá também estreando Bodas de Sangue. Um ano depois voltaria para a Espanha, onde seu sangue foi derramado pelas tropas fascistas de Franco. Público. Não é que o autor não considere o público respeitável, é que por detrás dessas pa­lavras há como um ligeiro tremor de medo, uma súplica para que o público seja generoso com a mímica dos atores e os engenhos do espetácu­lo. O poeta não pede bondade, generosidade, só pede atenção. Porque faz muito tempo que ele atravessou a linha divisória entre o palco e o público, e por essa relação que se cria com a platéia, a crítica, o medo, esse absurdo medo. E também porque cada vez o teatro fica mais comercial, mais mercado, a poesia se afasta do palco, à procura de outros espaços, de outras perspectivas, aonde ninguém se assuste de que uma árvore de repente se transforme numa bola de fumaça, e que três peixes, por amor a uma mão e a uma palavra se transformem em três milhões de peixes para acalmar a fome da multidão. Podemos começar? O Ventoforte tem uma história muito intensa com a obra de Lorca. Já fizemos cinco espetácu­los e todos com muito sucesso, cheio de emoções e tensões. De volta a São Paulo, ainda em 1986, montamos Sete Corações, Qualquer Homem é Suspeito. A cada dez anos montamos algo baseado em Lorca. Qualquer Homem é Suspeito era para crianças, e para adultos montamos o Choro Lorca. Muita gente telefonava perguntando: Suspeito de quê? Porque na minha família não tem nin­guém suspeito! Esse título mexia com as pessoas, com a estrutura familiar, com a moral... Na ver­dade, o título inicial do espetáculo era Sete Co­rações - Qualquer Homem é Suspeito - Suspeito de ser Poeta, mas acabamos não usando tudo. Dez anos depois, voltamos com uma segunda versão chamada Sete Corações -Poesia Rasga­da. É mais uma homenagem ao Lorca. O texto não é dele. Escolhi alguns poemas, entre eles Sete Corações. Construí uma parábola em que o tenente-coronel vai se queixar ao rei contra o poeta e o rei manda acabar com ele, não o dei­xar fazer mais poemas. Quem é fuzilado é um boneco grande que cai no chão. Os guardas se aproximam, mexem nele para ver o que o poeta tinha de diferente e começam a tirar do peito um rio de pano, um pão, uma flor, um espelho, enfim, várias coisas, e os atores tiram tudo isso, cantam uma música e começam um movimento para fazer renascer o poeta. Neste momento tem uma divisão do público. Alguns querem ficar com os ciganos e o poeta, outros podem ficar com os soldados. Sempre tem um garoto mais levado que quer ser soldado. Metade da platéia fica dentro do espaço com os ciganos e a outra sai e vai fazendo exercícios similares. A censura também implicou com o fuzilamento, diziam que não era um espetáculo apropriado para crianças. Eu rebati dizendo que se fizésse­mos um espetáculo sobre a vida do Tiradentes, devíamos ocultar o que aconteceu com ele? Tem um valor histórico, só que nós não queríamos encher o palco de sangue nem usar nenhuma arma verdadeira. Vamos fazer como a criança que brinca com a vassoura. No final, os soldados vinham espiar o que os outros estavam fazendo. Os ciganos pediam para todo mundo esconder os poemas. Os soldados enfurecidos fuzilavam praticamente toda a platéia, Mas quem vivia, co­meçava a ressuscitar os outros, falando poemas no ouvido das pessoas. Em 1996/97 montamos Tragicomédia da Lua Branca, também do Lorca, e logo a seguir, o Círculo de Giz Caucasiano, de Bertold Brecht. Em 1988 recebemos uma indicação do Mam­bembe pela produção de Dois Irmãos - Pássaro de Ouro e um prêmio pelos 15 anos do trabalho cultural. Fizemos um outro espetáculo que teve uma pequena temporada, Mistério do Fundo do Pote. Foi importante nesta época A Tempesta­de, de Shakespeare, apresentado para jovens e adultos e participando de um festival em Cór­doba - Argentina. Capítulo XVII Outro Nome para o Barquinho Frequentemente alguém me pergunta se sou o autor de Panos e Lendas; não, sou o criador de Lenços e Ventos. Aí a Silvia Ortoff fez A Viagem de um Barquinho, e eu já tinha feito História de um Barquinho. As histórias são bem diferentes, mas me cansava um pouco essa repetição. O espetáculo escrito pelo Vladimir Capela, que gosto muito, chama–se Panos e Lendas, e está sempre em cartaz. Uma pessoa do teatro Guaíra, em Curitiba, fez até uma piada, quando nos encontramos certa vez com a Sílvia por lá. Ela apresentava Eu Chovo, Tu Choves, Ele Chove, e a pessoa dizia que meu próximo espetáculo seria Eu Vento, Tu Ventas, Ele Venta. Ela ria, eu ria, mas a verdade é que tem uma raiz comum, um movimento, uma intenção, como também existe algo em relação aos nomes dos grupos. O nosso não se insere, mas tem aí uma moda de colocar nomes agressivos, malcriados, alguns até feios. Ao mesmo tempo surgiram vários com a palavra Vento e o que mais se destaca é o Sobrevento, do eixo Rio-São Paulo. Voltando ao Barquinho, quando recebi o Mo­lière e fui para a Europa sozinho, minha amiga bailarina Maria Fux perguntou se eu ia levar alguma peça. Eu disse que não. Ela disse que viajava sozinha e fazia apresentações e que eu devia fazer algo parecido. Fiquei pensando, me deu vontade de fazer um solo, com uma fita gravada. Aproveitei e mudei o nome do espe­táculo para Um Rio que Vem de Longe. Foi uma excelente experiência, mas continuo preferindo trabalhar em grupo. Em 1998 remontei este espetáculo, dessa vez com música ao vivo, e a partir dessa montagem sempre procurei acrescentar algo de novo. Em 1999, montamos O Mistério das Nove Luas, que remontamos em 2002. O Público se Renova O público está sempre se renovando, e nós acha­mos que vale a pena fazer uma nova temporada de antigos espetáculos, mesmo que pequena. O grande problema é sempre o tempo que temos para ensaiar. Eu gosto de ensaiar, de criar, mas também acho importante resgatar espetáculos já montados. Capítulo XVIII Teatro para Todos Essa questão do que é teatro para crianças ou te­atro para adultos deve ser muito bem analisada. Acho que temas difíceis podem ser apresentados para crianças. A questão é como tratar esses as­suntos. Por exemplo, falar de fogo pode ser um problema, a criança pode ficar atraída a brincar com fogo. Assim como falar de morte. Muitos dos meus espetáculos propõem quase como um ritual da morte e da ressurreição. No Mistério das Nove Luas, as personagens morrem e renascem. Acho que quando a gente fala de morte deve sempre deixar uma possibilidade de voltar para a vida. Nesta última montagem de Sete Corações eu começava fazendo um prólogo onde dizia... hoje, tal data, nessa cidade, morreram 25 mil pes­soas, também caíram das arvores 800 mil folhas e outras tantas mil flores..., Mas em seguida eu falava não se preocupem, pois vão nascer mais crianças, mais folhas, mais flores. No final, havia uma cena de fuzilamento. Os militares matavam os ciganos e o povo. Eu nunca fazia parte dos militares, sempre estava do lado dos ciganos, dos poetas, e me fazia de morto, esperando o momento da ressurreição. Um dia escutei uma criança de uns 8 ou 9 anos brigando com os guardas, e ela gritava vocês não vão acabar com os poetas porque não vão conseguir matar os poetas que ainda não nasceram. Acho que isso ocorreu porque no principio do espetáculo a gente deixava claro o processo da natureza. A gente não pode negar a morte a uma criança. Acho que isso motiva, faz comque pensem que a vida prossegue. Sempre que posso, falo assim no começo do espetáculo: O menino que passou por aqui falou o seguinte... Quando morre alguém da família, como dizer isso para uma criança? Desde então, toda vez que eu encerro o espetáculo, conto o ocorrido com aquela criança que brigou com o soldado e faço uma reflexão junto ao público sobre todos os poetas que ainda vão nascer. E, como o poeta, nós vamos voltar um dia para contar novamente essa história. Crianças, uma Loucura de Emoção Pequenas Histórias de Lorca, as pessoas diziam que o grupo não devia fazer mais espetáculos para crianças, só para adultos. E eu dizia que não fiz essa peça para ver se conseguia montar um espetáculo para adultos. E digo mais, não é tão fácil fazer um bom espetáculo pra crianças. Para o adulto você pode pecar por excesso, para a criança, não. Então, quando falávamos que íamos continuar trabalhando para crianças, isso acabou nos criando alguns problemas, porque quando falavam do Ventoforte diziam Ah, esse pessoal do Ilo, eles fazem teatro infantil, não é? Não fazem teatro pra adulto. Uma vez eu convidei o Sábato Magaldi para um debate e ele me disse: Ilo, eu não entendo nada de teatro infantil, eu vou acabar falando alguma besteira. Um crítico! E bom crítico. Mas é uma incompreensão geral. Todo adulto tem que resgatar a criança que está dentro dele. O José Celso Martinez Corrêa disse uma vez, que não lembrava nada da infância dele. Eu acho isso impossível, tem que estar lá dentro, em algum canto. Com meus alunos, a gente faz um processo de trabalho em que damos uma sacudida neles, para resgatar o passado, os brinquedos, o espaço esquecido, para justamente fazer surgir a criança, que talvez esteja recolhida. Quando fiz O Rio Que Veio de Longe para levar a alguns festivais na Europa, as pessoas disseram é pra adulto, não é? Eu disse que era, é pra todo mundo!... e as pessoas insistiam que era pra adulto, a criança não ia entender a linguagem sofisticada e abs­tratamente corporal! Mas quando apresentamos aqui, antes de viajar, as crianças começaram logo a se aproximar e participar. Continuo interpretando, maquio-me sempre um pouco, e, quando acaba, a tinta já escorreu, fico suado, mas depois das palmas, tem muita criança que sobe para me dar um abraço e me pede um beijo. A reação do adulto é sempre mais distante, não quer se encostar, se molhar. Mas criança não se importa, isso é uma loucura de emoção. Televisão A televisão ocupa um espaço muito grande dentro do nosso contexto social e não quero que se dê mais importância do que ela tem. Ela determina muito. Publicidade não é teatro, não é arte teatral, cênica. Vejo os atores que fazem publicidade e não são nem personagens. Tem atores vendendo telefone, pelo amor de Deus! É muito incoerente. A televisão não tem fidelidade e nem compromisso, e é uma pena que o com­promisso seja tanto com o produto, de ser um bom vendedor do produto. Respeito totalmente a pessoa trabalhando, sobrevivendo, sei que a televisão pode ser e tem sido uma possibilidade de sobrevivência pra muita gente, mas é uma pena... atores de tanta qualidade sacrificados, rendidos a isso. Fiz televisão uma vez, O Pagador de Promessas, era o Galego. A Tizuka Yamazaki foi assistir uma peça minha, um Lorca, e me convidou, me convidaram. Foi difícil, não fiz teste, se tivesse que fazer aí é que não iria mesmo. Uma vez me enganaram, não sabia que era teste e deu uma confusão, saí correndo! Não se ensaiava, apenas se passava um pouco e vamos lá! Quando aca­bava, eu pensava: bom, amanhã eu vou fazer melhor, mas não tinha o amanhã. Tive uma relação muito boa com os atores, de afeto. Eles procuravam em mim talvez as origens, o Paraíso sempre inacabado do teatro, onde to­dos os dias (o amanhã) tudo começa novamente. Deste trabalho guardo uma amizade grande com a Joana Fomm. E também com a Tizuka. Mas é sem dúvida um trabalho industrial, na frente, a máquina, tempo e dinheiro. Minhas ferramentas são a imaginação e a criati­vidade, não acredito que a televisão possa amea­çar o teatro para crianças. São experiências dife­rentes e isso eu comprovo com o público. Muitas vezes fazemos espetáculos para crianças que nunca foram ao teatro. Quando assistem pela primeira vez, ficam fascinadas pelo que acontece na frente delas. A tela é um meio mecânico. De repente, a criança se defronta com aquela pessoa ali no palco, viva, e é um fascínio. Capítulo XIX A Trupe Tem gente que me acompanha há mais de 20 anos. Tem o Beto, Roberto Melo da Costa Pinto, arquite­to e iluminador, a mulher dele, a Marilda Alface, da área de dança. O Roberto colabora em toda a parte técnica do teatro, o projeto arquitetônico desse espaço é dele. Tem gente de outras etapas, o Dinho Lima Flor, ator, a Lizete Negreiros, atriz e cantora, que trabalha no Centro Cultural São Paulo. Gostaria de falar dos músicos que compar­tilharam minhas letras para elas virarem canções. Os músicos da época da criação do Ventoforte e que ano passado ganharam o Prêmio Shell: Caíque Botkay, que mora no Rio e periodicamente cola­bora, o Vanderlei Martins, que já trabalhou com o Celso Antunes, os mais novos saídos da EAD, o Paulo César Brito, autor, faz terapia corporal, mora aqui e no Rio. Tem mais o Beto Coimbra, Ronaldo Mota, Davi Thiguel, Edgar Lippo, Tião Carvalho, Pedrão do Maranhão, João Poletto, Ruy Weber, Evandro Palma, e os instrumentistas, musicistas e cantores Márcia Fernandez, Fabio Atorino, Wilker Soares, Marta Ozetti e outros. Aqui é um lugar onde passa muita gente. A Marisa Orth foi aluna minha numa oficina de interpretação e depois foi para a EAD. Ela sem­pre fala que aprendeu a mexer com pequenos objetos aqui. A cantora baiana Diana Pequeno fez oficinas. A Thaia Perez, irmã da Ariclê Perez, pessoa muito importante para a história do Ventoforte, é do tempo da Escolinha de Arte do Brasil. Atriz de muita sensibilidade, até pouco tempo dirigia a Escola de Iniciação Artística da Prefeitura, mas a vida foi complexa, vieram os filhos, ela sempre fazia algum trabalho corporal com a gente, o último foi no Lorca, em 1986, ela fazia a sapateira prodigiosa. É uma pessoa muito querida. Alguns vêm, trocamos idéias, a presença deles é muito rica para nós, parece que retoma­mos as energias. O grupo vem se renovando. O pessoal do Hombu, que mora numa casa da Lapa, no Rio, é da primeira época do Ventoforte, eles formaram um novo grupo. O Sonho e o Prazer de Fazer Teatro Será Sempre Coletivo A minha história foi construída por muitas cele­brações e encontros num trabalho coletivo, onde nos enriquecemos com as criações, descobertas e o crescimento dos participantes. Gostaria de lembrar todos, são tantos! De alguns já falei. Na expressão gestual e corporal das danças, bebi nas fontes e compartilhei com Ausonia Bernar­des, Maria Fux, bailarina argentina, Graziela Rodriguez, Marilda Alface e Mariana Muniz. Mas também me alimentei nos terreiros da Mãe Yolanda e Mãe Aurinha, Margarida Trindade e Raquel Trindade e o Grupo Cupuaçu de dan­ças do Maranhão, e em aldeias e caminhos da América Latina. As marcas e os rastros deixados também pelos atores nas suas improvisações às vezes se integram nos próprios textos que vou desenvolvendo; tam­bém estão presentes nas fichas técnicas,... vivos nas minhas vivências e lembranças: Sílvia Aderne, Alice Reis, Sônia Piccinin, Paulo César Brito, Xuxa Lopes, Neuza Navarro, Regina Costa, Rosa Com­porte, Fátima Campideli, Eliane Weinfürter, Lílian de Lima, Marcelo Airoldi, Paulo da Rosa (cabeça pensante e ainda afetivamente atuante). Na construção do Ventoforte no Itaim Bibi dos galpões e espaços cênicos, cenografia, figuri­nos, bonecos, visualidades, estruturas para o desenvolvimento de eventos culturais e sociais e linguagens populares, muitos. Eu mesmo sou um artesão, ator, dramaturgo e poeta polivalente. Muitos colaboradores sustentaram e ainda reno­vam esta utópica aventura: Jorginho de Carva­lho, que, por um bom tempo, nos iluminou, Ana Maria Carvalho, figurinista e bordadeira de Bois e outros folguedos, José Marcos, Paulo Farah, Luiz Laranjeiras, Cláudio Cabrera, Malu Borges, Ademir de Castro, bonecos, máscaras, bandeiras, bonecões, figuras diversas. Ultimamente, Lennon Gonçalves, além de ator iniciante, está florescen­do o quintal, o espaço dos quatro elementos do Ventoforte, onde também colhemos frutos. Ainda há muitos participantes não citados por falta de espaço, mas eles terão lugar no nosso céu, é só bater nas portas de São Pedro e dizer: Eu trabalhei no Ventoforte. Lá estão todos nominados. Depoimentos Teatro de Criação e Magia Como pode ao mesmo tempo um artista ser sim­ples e sofisticado, erudito e popular, rigoroso em seus valores e livre para criar? Como ele conse­gue fazer uma arte cênica dita para crianças e, de um modo mágico, tocar a infância de todos nós? Difícil ficar insensível diante das artes e manhas que ele inventa com os seus bonecos, fazendo com que a realidade e a fantasia misturem asas. Suas montagens e textos teatrais se adaptam a qualquer ambiente – em ruas e favelas, em teatros e palácios –, sem receio de trazer para a cena os nossos conteúdos simbólicos profundos. O nome desse mago é Ilo Krugli. Um argentino, filho de judeus poloneses refugiados, que faz teatro praticamente desde a adolescência, além de dedicar-se às artes plásticas e aos versos. Passou a viver no Brasil desde a segunda viagem que fez para cá, em 1961. O maior estímulo veio do ambiente que encontrou na Escola de Arte do Brasil, no Rio de Janeiro, onde travou contato com uma turma de criadores e intelectuais que estavam pensando a arte e a educação de forma integrada e dentro de novos moldes. Identificado com a causa, manteve colaboração com Augusto Rodrigues, Pedro Domingues, Nise da Silveira e outros. A partir dessa experiência, segue-se toda uma trajetória de trabalhos e interesses que vão mais tarde desembocar na criação do espetáculo Lenços e Ventos (1974), que dará origem ao grupo Teatro Vento Forte, entidade que dirige ainda hoje. Neste livro, compilado criteriosamente por Ieda de Abreu, ele nos conta justamente as andanças e pensamentos que teve ao longo de seu pro­cesso criativo. Faz um relato sobre as montagens que realizou, as preocupações estéticas que tinha, e cruza com informações biográficas que ajudam a entender o contexto. Ficamos então conhecendo um artista de rara sensibilidade, altamente conectado com o coletivo e os valores essenciais da arte. Com a palavra, um autêntico feiticeiro do teatro. Fernando Paixão Ilo Krugli, “Pequeno Larousse”, Há exatamente 31 anos vi Ilo Krugli pela primeira vez. Foi na década de 1970, em um festival de Teatro para Infância e Juventude que aconteceu em Curitiba (PR). Nesse festival, fiquei sabendo que o Ilo era uma personalidade importante do teatro infanto-juvenil, famoso no Rio de Janeiro, sendo reconhecido como o arte-educador que estava revolucionando os conceitos sobre o fazer teatro para crianças e era o diretor do Grupo Teatro Ventoforte. Nesses anos de nossas vidas não deixamos de ser cavaleiros andantes nessa odisseia quixotesca do teatro brasileiro. Temos histórias para contar. Acreditamos no que fazemos e, quer queira quer não, amparados pela nossa teimosia, como bons sagitarianos que somos, prosseguimos. A importância da arte-educação no teatro infantil, a forma e conteúdo desse teatro e a produção que era feita para crianças, estavam sendo questionados e passando por uma revi­são de postura ideológica e conceitual também em São Paulo. Dessa postura, nasceu em 1979 a Associação Paulista de Teatro para Infância e Juventude – APTIJ. Sua criação e as ideias que nasceram dentro dela e que se transformaram em ações práticas na questão do fazer teatro para crianças, foi fundamental para a evolução dessa atividade. Em 2003, recebi o convite para trabalhar no Teatro Ventoforte no espetáculo Victor Hugo - Onde É que Você Está? Falar sobre Ilo Krugli é como misturar estações, ele é tudo ao mesmo tempo em um só. Cabeça pensante do grupo, nada se faz sem consultá­lo. Exigente, centralizador, perspicaz e emotivo. Na sua vida de artista multifacetado, existe a adoração por crianças e os animais. O trabalho desenvolvido com as crianças que moravam no Parque do Povo gerou transfor­mação de vida tão intensa que foi e continuaria sendo se não tivessem que sair do parque. Ele sabe como atingir este ou aquele público sem medo e sem concessões de tempo e espaço, não faz para agradar a plateia, mas faz com que ela se divirta e saia pensando. Acredita naquilo que faz mesmo quando diz: não estou muito seguro. No espetáculo, Ilo não era o criador de uma só atividade, a multiplicidade ia de autor do texto, passando por diretor, cenógrafo, figurinista, ator, cantor, autor das letras das musicas, criador da arte gráfica, da luz junto com Roberto Mello e orientador da equipe de criação dos adereços e figurinos. Ele era assim; ou melhor, É assim. Ilo apostou em mim e consegui me sair bem como atriz, cantora e como pessoa que sabe viver em grupo. Em Bodas de Sangue eu interpretava a Mãe. Era a primeira vez que haviam me dado um perso­nagem tão importante, dramático, complexo, maravilhoso, e vi o grande desafio que foi posto em minhas mãos e que só poderia acontecer no Ventoforte, através da generosidade do Ilo. Foi com essa intensidade que Ilo nos dirigiu. Aliás, no Vento, tudo é muito intenso. Mesmo quando está calmo, é intenso. Às vezes penso que o agente criador dessa intensidade seja ele. Em 2005, houve o Engenho de Dentro – Flores do Abismo, uma homenagem ao Museu do In­consciente e à sua fundadora Nise da Silveira. Ilo propôs um início diferente dos espetáculos anteriores, pediu para cada um desenhar uma mandala e depois falar sobre ela. Estava conhe­cendo, naquele momento, uma outra maneira de iniciar um trabalho. Essas experimentações nos ensinaram a ter admiração e conhecer com mais profundidade o trabalho que foi realizado no Rio de Janeiro com os portadores de distúr­bios mentais por essa mulher valorosa. O texto era sobre a trajetória do Ilo, que começa na saída da Argentina até chegar ao Brasil, e se apelidou de “O Pequeno Larousse”, até chegar a Nise da Silveira. O elenco estava conhecendo a vida dos dois, a trajetória de cada um estava sendo lembrada e vivenciada e ele se emocionava por ambos. Talvez seja por isso que gosto de chamá­lo de “Pequeno Larousse”. Nesse trabalho, comecei a observar duas carac­terísticas suas e que fazem parte da sua perso­nalidade como encenador e pessoa: contar fatos e histórias para o elenco sempre que surge uma oportunidade. Em 2006, veio a montagem de A Centopéia e o Cavaleiro. Ele escreveu e dirigiu esse espetáculo no Rio de Janeiro com o Grupo Hombu. Mais uma vez um desafio me foi dado: manipular a centopéia confeccionada pelo Cláudio Cabrera. A montagem não foi feita apenas para contar a história de uma centopeia que quer ser diferen­te, negando a sua essência e o seu encontro com o Príncipe Feliz que teve tudo, menos felicidade. O espetáculo fala de diferenças, de afeto, de amizades, de gestos humanitários, de celebração de vida e presta uma homenagem a um homem também valoroso: Betinho. Em 2008, a montagem de Se o Mundo Fosse Bom, o Dono Morava Nele, adaptação de A Pena e a Lei de Ariano Suassuna. Mais uma vez, Ilo tinha às mãos texto e autor famosos e uma história cheia de situações e complexidades. Mas, sendo um criador de natureza irriquieta, era natural que houvesse modificações na obra de Suassuna, sem com isso haver desrespeito pelo autor. No decorrer dos espetáculos, as dificuldades foram sendo ajustadas. Traba­lhar no Ventoforte é assim, você tem que ir encontrando ajustes até chegar ao ideal. O Padre é o personagem que Ilo faz na peça. A sua entrada pela plateia lhe dá a oportunidade de conversar e brincar com o público que se diverte. Ele É assim. Nos observa em cena e nós o observamos. No meu entender, o texto de A Pena e a Lei serviu de metáfora. O pensamento contestador, político, visionário e atual que existe dentro do espetáculo é do Ilo. A obra de Ariano Suassuna está preservada. Dentro do Parque do Povo está o Ventoforte, agora cercado por grades. As grades não con­seguiram limitar a vida que pulsa há mais de 20 anos nesse coração imenso. Ilo não está sozinho. Em resistência permanente existem pessoas fiéis como escudeiros. Espalhados pelo Brasil e pelo mundo existem tantos outros remanescentes dessa resistência. Os atuais, onde me incluo, estão levando para frente o que os outros já fi­zeram em prol da arte, da educação e da cultura. Não sei se conseguiria viver prosaicamente em um espaço tão inspirador. Provavelmente não. Ilo gosta de viver intensamente, rodeado de emoções. Então, que viva como um criador nato, que faz da arte a sua razão de viver. Lizette Negreiros Cronologia dos Trabalhos 1963 • História de um Barquinho – montagem na Es­colinha de Arte do Brasil, Rio de Janeiro 1972 • História de um Barquinho – virou espetáculo para o Festival do Teatro Gláucio Gill, Rio de Janeiro 1974/75 • História de Lenços e Ventos – estréia em Curi­tiba (PR) /MAM (RJ) 1975 • Da Metade do Caminho ao País... duas versões – infantil e adulto, estréia no MAM-RJ 1977 • O Mistério das Nove Luas – estréia Teatro Ginástico (RJ) 1978 • Sonhos de um Coração Brejeiro Naufragado de Ilusão - duas versões, estréia no Teatro Glauce Rocha (RJ) 1979 • O Mistério das Nove Luas – estréia no Teatro Procópio Ferreira (SP) 1980/81 • História de Lenços e Ventos e História de um Barquinho • Luzes e Sombras -montagem com alunos e His­tória de um Barquinho – montagem com alunos 1981 1982 • HistóriadeumBarquinhoeOsCisnesSelvagens– montagem com alunos • Misteriosos Pássaros de Barro – montagem com alunos 1982/83 1983 • Brisa Branda – montagem com alunos e Estou fazendo uma Flor (em comemoração aos 9 anos do Ventoforte) 1983/84 • As Quatro Chaves – montagem com alunos 1984 • Brinquedo da Noite – montagem com alunos, Caminhadas, • Junto ao Muro – montagem com alunos, Os Cisnes Selvagens – montagem com alunos e Vai Começar Tudo de Novo – montagem com alunos 1985 • História de um Barquinho • Labirinto de Januário • História de Lenços e Ventos – Cuba • Qualquer Homem é Suspeito • Dois Irmãos – O Pássaro de Ouro 1985 1986 1988 1988 1989 • O Pássaro de Deus – montagem com alunos 1989 • Mistério do Fundo do Pote – montagem com alunos • Um Rio que vem de Longe (monólogo) 1990 1991 • História de Lenços e Ventos – com o Grupo Hombu (RJ) 1984 • Casamento de Manuel e Manuela – Uma Rosa para Bela - montagem com alunos 1993 • História de Lenços e Ventos, • Histórias que o Eco Canta • Um Rio que Vem de Longe • História de Lenços e Ventos, • Sete Corações, Poesia Rasgada – estréia em 03/08/1996 • Entre o Céu e o Mar 1994 1996 1997 1998 • Sete Corações, Poesia Rasgada – estréia em 10/10/1998 • Um Rio que Vem de Longe 1998 1999 • O Mistério das Nove Luas -estréia em 24/09/1999 (SP) 1999 • Um Rio que Vem de Longe • História de Lenços e Ventos • Um Rio que Vem de Longe - nova montagem • O Mistério das Nove Luas -Palco Giratório -Sesi • O Mistério das Nove Luas – estréia em 23/02/2002 • História de Lenços e Ventos 2000 2001 2002 Concepção e direção – Ilo Krugli Música – Beto Coimbra e Caíque Botkay Produção – Casa Ventoforte – Centro de Arte e Cultura Integrada Cenário, figurinos e bonecos – Ilo Krugli Realização de figurinos - Ana Maria Carvalho Produção executiva – Tata Beltran Iluminação – Roberto Mello Atores – Ozair Lessa, Eliane Weinfürter, Nana Mattos, Ted Rey, Ana Célia Oliveira, Sônia Gato, Marlon Chaves Músicos – Negro Nei, Ricardo (ou Ricaredo) Lo­pes, Maecira Trevisan, Fábio Atorino Assistente de direção – Rosa Comporte Assessoria musical – João Batista Polleto Equipe de realização artesanal – Peterson de Sou­za Queiroz, Ana Luiza Frangipani e todo o elenco Fotografia – Gil Grossi • Mistério das Nove Luas Texto – Sônia Piccinin, Paulo César Brito, Ilo Krugli Música – Ronaldo Mota Direção-geral – Ilo Krugli Realização artesanal de Bonecos e Objetos Cênicos – Cláudio Cabrera e Oficina do Teatro Ventoforte Direção Musical – João Batista Pires Atores – André Collazi, Dinho Lima Flor, Eliane Weinfürter, Evandro Palma, Fábio Atorino, Ilo Krugli, Lílian de Lima, Márcia Fernandes, Marilda Alface, Paulo da Rosa, João Batista, Fábio Viana, Roberto Mello, Beth Galaz, Cláudio Cabrera, Gil Grossi, Peterson Negreiros, Peterson da Costa, Ana Maria Carvalho • As Quatro Chaves Texto, criação e direção-geral – Ilo Krugli Músicos e atores – Dinho Lima Flor, Ilo Krugli, Paulo de Rosa, Márcia Fernandes, Lílian de Lima, André Collazzi, Cláudio Cabrera, Karu Basso, Jeferson Agostini, Wilker Soares Coordenação musical – Márcia Fernandes, Paulo da Rosa e Evandro Palma Objetos cênicos e contra-regragem – todo o elenco Realização dos desejos dos personagens – atores e público Realização de figurinos – Ana Maria Carvalho Iluminação – Roberto Mello Fotografia e designer gráfico – Fábio Viana Produção – Fábio Viana e Ilo Krugli Produção executiva – Roberto Mello • Victor Hugo, Onde Você Está? Texto e direção – Ilo Krugli Música – Evandro Palma, Caíque Botikay, Wan­derlei Martins, Gustavo Holanda Atores – Ilo Krugli, Marilda Alface, Dinho Lima Flor, Lílian de Lima, Lizette Negreiros, Cláudio Cabrera, Wilker Soares, Thais Pimpão, Rodrigo Mercadante, Marcelo Airoldi, Marise Barbosa, Paulo Miranda, Roberto Mello, Fábio Viana, Malu Borges, Ana Carvalho, Lennon Gonçalves, Eduardo Salino Associados. • Bodas de Sangue Atores -Lizette Negreiros (mãe), Lílian de Lima (noiva), Dinho Lima Flor (noivo), Marcelo Airoldi (Leonardo), Marilda Alface (criada, mendiga, morte), Ilo Krugli (poeta, lua, pai), Thais Pim­pão (mulher), Karen Menatti (sogra), Rodrigo Mercadante (vizinha, jovem, lenhador), Rita Rozeno (amiga), Cláudio Cabrera (lenhador), Lennon Gonçalves (lenhador), todos (cavalos, vizinhos, convidados) Músicos – Débora Saraiva (percussão), Aloísio César (acordeom, viola caipira, piano), Ju Vieira (percussão, viola), Wanderley Martins (violão), William Guedes (violão, bandolim) Criação de máscaras – Malu Borges Iluminação – Roberto Mello Movimento – Marilda Alface Cenografia e figurino – Ilo Krugli Direção musical – João Poletto e Wanderley Martins Assistente de direção – Milton Morales Filho • O Círculo de Giz Caucasiano Autor – Bertold Brecht Prólogo – De Quem é a Rua – Plínio Marcos Criação e direção-geral – Ilo Krugli Montagem – Teatro Ventoforte Atores – Eliane Weinfürter, Marilda Alface, Ilo Krugli, Lauro Gastañaga, Gustavo Trestini, Paulo André, Mariana Marini, Cláudio Cabrera, Analu Fernandes Músicos – Márcia Fernandes (flautas, violão e voz), Ricardo Monteiro (piano, violino, sanfona), Paulo Alexandre (bateria), Lauro Gastañaga (violão) Direção musical – João Poletto Letras – Ilo Krugli Espaço, arquitetura cênica, iluminação – Roberto Mello Cenários, figurino, bonecos e projeto visual – Ilo Krugli Realização de figurinos – Ana Maria Carvalho Assistente de direção – Rosa Comporte Fotografias – Gil Grossi • Brinquedo da Noite Flávia Mariotto Jacqueline Schein Laurent Lucien Luís Carlos Laranjeiras Paulo da Rosa Pedrão do Maranhão Rita Coelho Rosa Comporte Selma Bustamante Thelma Bonavita Wagner Bonetti Júnior Iluminação: Roberto Mello Figurinos: Ilo Krugli Direção: Paulo César Brito Produção: Casa Ventoforte - Centro de Arte e Cultura Integrada • Labirinto de Januário Texto e direção: Ilo Krugli Música (autores): Edgard Lippo, Marta Ozzetti, Fernando Gati, Pedrão do Maranhão, Wagner Bonetti Atores: Ilo Krugli, Fátima Campidelli, Laurent Lucien, Luri de Almeida, Ocimar Barbosa, Pau­lo de Rosa, Rosa Comporte Selma Bustamante, Sidney Cerchiaro, Sueli Cer­chiaro, Luís Laranjeiras, Ana Maria Carvalho Objetos de cena e bonecos: Ilo Krugli, Luís Laranjeiras, Edilson Castanheiras. Trabalho de voz: Ná Ozzetti Figurinos: Ilo Krugli, Ana Maria Carvalho Iluminação: Beto Mello Assistente de direção: Paulo César Brito Músicos: Edgard Lippo, Marta Ozzetti, Fernando Gatti, Pedrão do Maranhão, Wagner Bonetti Prêmios e Indicações 1974 • História de Lenços e Ventos Prêmio Molière Indicação para Prêmio Especial Associação de Críticos do Estado do Rio de Janeiro Recomendação Especial 1975 • Da Metade do Caminho ao País do Último Círculo Prêmio SNT - Rio de Janeiro Um dos cinco melhores espetáculos 1976 • História de Lenços e Ventos Prêmio Molière de Incentivo ao Teatro Infantil Pequenas Histórias de Lorca Premio de Porto Alegre Açorianos Melhor espetáculo do Ano 1977 • O Mistério das Nove Luas Prêmio SNT - Rio de Janeiro Um dos cinco melhores espetáculos Prêmio Mambembe - Rio de Janeiro Prêmio pela Direção: Ilo Krugli Prêmio pelo Figurino: Ilo Krugli Indicação para Autor: Ilo Krugli Indicação para Cenógrafo: Ilo Krugli Indicação para Produtor ou Empresário: Grupo Ventoforte Indicação para Categoria Especial: Jorginho de Carvalho (iluminação) • Coração Naufragado de Ilusão Títere de Ouro Prêmio especial do júri no 1o. Festival Interna­cional de Bonecos, Artigas, Uruguai 1978 • O Mistério das Nove Luas Prêmio Mambembe - São Paulo Indicação para Grupo, Movimento ou Personali­dade: Grupo Ventoforte, Grupo Hombu, Teatro Orgânico Alderã, Marca Produções Artísticas pela abertura do Teatro Bexiga 1979 • O Mistério das Nove Luas Prêmio APCA Melhor espetáculo Sonhos de um Coração Brejeiro Prêmio Mambembe - Rio de Janeiro Prêmio pelo Figurino: Ilo Krugli Indicação para Direção: Ilo Krugli 1980 • Histórias de Lenços e Ventos Prêmio SNT - São Paulo Um dos cinco melhores espetáculos Prêmio Mambembe - São Paulo Prêmio pela Direção: Ilo Krugli Prêmio APCA Melhor espetáculo Prêmio APCA Prêmio pela Contribuição ao Teatro Infantil Grande Prêmio da Crítica 1981 • A História de um Barquinho Prêmio SNT - São Paulo Um dos cinco melhores espetáculos Prêmio Mambembe - São Paulo Prêmio pela Direção Ilo Krugli • Luzes e Sombras Indicação para Grupo, Movimento ou Persona­lidade: Casa do Ventoforte -pelo conjunto de trabalhos na área do teatro infantil, como o curso de atores e a montagem do espetáculo • História de um Barquinho e Luzes e Sombras Prêmio APCA Prêmio para Melhor Diretor: Ilo Krugli • História de um Barquinho Prêmio para Melhor Música: Ronaldo Motta 1983 • Brinquedo da Noite Premio Inacen - São Paulo Melhor Espetáculo Infanto-Juvenil Prêmio Mambembe - São Paulo Indicação para Grupo, Movimento ou Persona­lidade: Teatro Ventoforte -pela pesquisa da cultura popular em suas montagens 1983/1984 • Labirinto de Januário Concurso Nacional de Dramaturgia 1o Lugar: Ilo Krugli 1984 • Grupo Ventoforte -pelo conjunto de trabalhos apresentados nas comemorações dos 10 anos do grupo Prêmio Mambembe - São Paulo Prêmio para Grupo, Movimento ou Personalidade: Prêmio Apetesp de Teatro Indicação para Produtor Executivo: Casa do Ventoforte 1985 • Casa do Ventoforte / Centro de Arte e Cultura Integrada Prêmio Mambembe - São Paulo Prêmio para Grupo, Movimento ou Personalidade: pela conquista e inauguração de seu espaço. • Labirinto de Januário Prêmio Molière de Incentivo ao Teatro Infantil Prêmio APCA Prêmio para o Melhor Espetáculo Prêmio Governador do Estado - Teatro Prêmio Apetesp de Teatro Indicação para Diretor: Ilo Krugli Indicação para Cenografia: Ilo Krugli, Luiz La­ranjeiras e Edílson Castanheira Indicação para Figurino: Ilo Krugli e Ana Ma­ria Carvalho Indicação para Produtor: Casa do Ventoforte -Centro de Arte e Cultura Integrado 1986 • Labirinto de Januário Premio Inacen - São Paulo Um dos cinco Melhores Espetáculos Infantis Prêmio Mambembe - São Paulo Prêmio para Produtor ou Empresário: Teatro Ventoforte Prêmio para Categoria Especial: Edgar Lippo, Maria Ozzetti, Fernando Gatti, Pedrão do Ma­ranhão e Wagner Benetti (pela música) Indicação para Autor: Ilo Krugli Prêmio APCA Prêmio de Melhor Espetáculo Prêmio Governador do Estado Melhor espetáculo de Teatro Infantil Melhor Diretor • História de Lenços e Ventos Melhor Espetáculo Visitante em Cuba 1987 • Casa Ventoforte e Centro de Arte e Cultura Integrada - pelo projeto De quem é a Criança? Prêmio Mambembe - São Paulo Prêmio para Grupo, Movimento ou Persona­lidade 1988 • Dois Irmãos - O Pássaro de Ouro Prêmio Mambembe - São Paulo Prêmio para Grupo, Movimento ou Personalida­de: Casa Ventoforte – por 15 anos de trabalho Indicação para Produtor ou Empresário: Casa do Ventoforte Centro de Arte e Cultura Integrada Prêmio APCA Prêmio de Cenógrafo: Ilo Krugli e Roberto Mello Prêmio Apetesp de Teatro Indicação para Dramaturgo: Ilo Krugli Indicação para Produtor: Casa do Ventoforte -Centro de Arte e Cultura Integrada 1993 • O Casamento de Manuel e Manuela – Uma Rosa para Bela Prêmio Apetesp de Teatro Indicação para Dramaturgo: Ilo Krugli Indicação para Produtor: Casa do Ventoforte 1995 • Histórias que o Eco Canta Prêmio Mambembe - São Paulo Um dos cinco melhores espetáculos Prêmio pela Direção: Ilo Krugli Indicação para Autor: Ilo Krugli Indicação para Atriz: Elaine Weinfürter Indicação para Figurino: Ilo Krugli Indicação para Cenografia: Ilo Krugli Indicação para Coreografia: Ilo Krugli Indicação para Categoria Especial: João Politto e Grupo Musical Prêmio pelos 20 anos do Grupo Ventoforte Prêmio APCA Grande Prêmio da Crítica Prêmio Apetesp de Teatro 1996 • Os Sete Corações - Poesia Rasgada Prêmio Mambembe - São Paulo Indicação para Categoria Especial: Teatro Ven­toforte - pela música Indicação para Grupo, Movimento ou Personali­dade: Teatro Ventoforte - pelo espetáculo Prêmio Apetesp de Teatro Prêmio para Ator Protagonista: Ilo Krugli 1997 • Entre o Céu e o Mar Prêmio Mambembe - São Paulo Prêmio para Cenógrafo: Ilo Krugli Indicação para Direção: Ilo Krugli Indicação para Ator: Dinho Lima Indicação para Categoria Especial: João Politto -pela direção musical Indicação para Grupo, Movimento ou Persona­lidade: Teatro Ventoforte -pelo conjunto de trabalhos 1999 • O Mistério das Nove Luas Prêmio Coca-Cola de Teatro Jovem Indicação para cenografia: Ilo Krugli 2001 • O Portal das Maravilhas Prêmio para Montagem Flávio Rangel Secretaria Estadual de Cultura de São Paulo 2005 • Bodas de Sangue Prêmio Shell Melhor Cenário de Ilo Krugli e Música de Wanderley Martins, Caíque Botkay e João Poletto. • Teses sobre Ilo Krugli e o Teatro Ventoforte Ive Novaes Luna, mestranda da Universdade do Estado de Santa Catarina (Udesc) Título: O Evento Musical no Teatro Ventoforte. Pesquisa sobre a música executada ao vivo nos espetáculos do Teatro Ventoforte. Paralelos entre esta música e a executada nas festas populares tradicionais do Brasil, ambas sendo tratadas como elementos de inclusão e compar­tilhamento. Aproximação da narrativa presente nas músicas dos espetáculos do Ventoforte com a narrativa encontrada nas canções dos espetá­culos de Bertold Brecht. Márcia Pompeu, mestranda da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), 1998. Título: Teatro de meninos de rua. Andréa Cavinatto, mestranda da Universidade de São Paulo, ECA, Departamento de Artes Cê­nicas, 2003. Título: Uma experiência em teatro educação: A história do menino navegador Ilo Krugli e seu indomável Ventoforte. Roberto Mello da Costa Pinto, mestrando da Universidade de São Paulo, ECA, Departamento de Artes Cênicas, 2006. Título: Ventoforte, o espaço da imaginação. Os processos poéticos e o espaço cênico no Teatro Ventoforte. • Publicações História de Lenços e Ventos, editora. Didática e Científica, col. Vertente Teatral, Rio de Janeiro, 2000, editora Record. A História do Barquinho, editora Ática, série infantil Boi Voador, São Paulo, 2002. O Mistério do Fundo do Pote, SM Edições, col. Comboio de Corda, São Paulo, 2007. • Ilo Krugli no cinema Labirinto, ficção em vídeo (DVD), 17 min, PB, SP, 2004. Inspirado no texto O Labirinto de Januário, de Ilo Krugli. Um arte educador que busca resgatar em sua memória a presença de seu filho distante e acaba por identificar este com um de seus alunos. Direção: Fátima Moura -Roteiro: José Geraldo Neres - Elenco: Reginal­do Silveira Lima, Bruno Dias Silva -Assistência de Direção:Luciana Perecin - Fotografia: Mario Augustus -Assistência de Fotografia: Luciana Perecin -Operador de Câmera: Mario Augustus - Assistência de Câmera: Luciana Perecin -Direção de Arte: Andre Okuma - Edição: Alex Moletta - Produção Executiva: Fátima Moura - Produção: Nova Boca do Lixo, Santo André, SP -Cenografia: Cida Ferreira - Figurino: Aline Voguel - Maquia­gem: Bruno Eduardo Maré, ficção, 2005, 12 min. Um velho marinheiro em terra firme vive no alto de um prédio, tendo seus dias regidos pela lua e marés de celofane. Diretor: Guile Martins -Elenco: Ilo Krugli, Ma­rilda Alface -Fotografia: Vladimir Mancaro, Bia Marques -Roteiro: Guile Martins Francisco Craesmeyer - Direção de arte: Maíra Mesquita - Empresa produtora: Festival Brasileiro de Cinema Universitário -Edição de som: Guile Martins, Caio Polesi Produção executiva: Aleques Eiterer -Montagem: André S. Markwald, Oswaldo Jun­queira - Música: Bebeto Von Buetener Festivais Participação nos festivais: Internacional de Cur­tas de São Paulo, 2005 - Internacional de Curtas do Rio de Janeiro, Curta Cinema, 2005 - Home­nageado do Festival de curta-metragem Curta-SE 7, Aracaju, 2007 • Discos O Gigante Azul. História de Ilo Krugli cantada por Ronaldo Mota – Arranjos e direção musical: Túlio Mourão – Vozes: Ronaldo Mota e Vivia­ne – Músicos: Tutti Moreno (bateria), Moacyr Albuquerque (baixo), Jairo Lara (sax e flauta) – Elenco: Alice Gonçalves, Berenice Baeder, Ilo Krugli, Luíz Carlos Laranjeiras, Paulo Cesar Brito, Pedrão do Maranhão, Thaia Perez, Lula Lemes. Coleção Taba – Histórias e Músicas Brasileiras, Abril S/A Cultural e Industrial, São Paulo, 1983. O Barquinho – História de Ilo Krugli – Ilustra­ções: Walter Ono – Músicas: Ronaldo Motta e Ilo Krugli – Vozes: Tavito e Jane Duboc – Direção Musical: Túlio Mourão. Col. Taba, Histórias e Mú­sicas Brasileiras, Abril S/A, Cultural e Industrial, São Paulo,1982. Índice Apresentação – José Serra 5 Coleção Aplauso – Hubert Alquéres 7 Introdução – Ieda de Abreu 13 Infância 25 Com Pedro e os Bonecos pela América Latina 43 A Chegada ao Brasil 53 EAB 59 Amigos, Influências 65 História de Barco e Rio 70 Nasce o Grupo Ventoforte 81 Primeiros Prêmios 91 A Mudança para São Paulo 117 Museu do Inconsciente 133 Rotina e Continuidade ou Música, Dança, Morte e Renascimento 137 O Método: Reflexão, Cubismo 141 Pelo Mundo 149 Crenças 155 A Cada Dez Anos, Lorca em Cena 163 Outro Nome para o Barquinho 169 Teatro para Todos 171 A Trupe 177 Depoimentos 183 Cronologia 191 Crédito das Fotografias Todas as fotografias pertencem ao acervo pessoal de Ilo Krugli, salvo indicação em contrário Todos os desenhos são de Ilo Krugli Beto Coimbra 92 Dinho Lima 12, 156, 157, 158 Fábio Viana 21, 23, 113, 114, 215, 216, 217, 218, 219 Gil Grossi 17, 18, 98, 102, 167, 179 A despeito dos esforços de pesquisa empreendidos pela Editora para identificar a autoria das fotos expostas nesta obra, parte delas não é de autoria conhecida de seus organizadores. Agradecemos o envio ou comunicação de toda informação relativa à autoria e/ou a outros dados que porventura estejam incompletos, para que sejam devidamente creditados. Coleção Aplauso Série Cinema Brasil Alain Fresnot – Um Cineasta sem Alma Alain Fresnot Agostinho Martins Pereira – Um Idealista Máximo Barro O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias Roteiro de Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert e Cao Hamburger Anselmo Duarte – O Homem da Palma de Ouro Luiz Carlos Merten Antonio Carlos da Fontoura – Espelho da Alma Rodrigo Murat Ary Fernandes – Sua Fascinante História Antônio Leão da Silva Neto O Bandido da Luz Vermelha Roteiro de Rogério Sganzerla Batismo de Sangue Roteiro de Dani Patarra e Helvécio Ratton Bens Confiscados Roteiro comentado pelos seus autores Daniel Chaia e Carlos Reichenbach Braz Chediak – Fragmentos de uma vida Sérgio Rodrigo Reis Cabra-Cega Roteiro de Di Moretti, comentado por Toni Venturi e Ricardo Kauffman O Caçador de Diamantes Roteiro de Vittorio Capellaro, comentado por Máximo Barro Carlos Coimbra – Um Homem Raro Luiz Carlos Merten Carlos Reichenbach – O Cinema Como Razão de Viver Marcelo Lyra A Cartomante Roteiro comentado por seu autor Wagner de Assis Casa de Meninas Romance original e roteiro de Inácio Araújo O Caso dos Irmãos Naves Roteiro de Jean-Claude Bernardet e Luis Sérgio Person O Céu de Suely Roteiro de Karim Aïnouz, Felipe Bragança e Maurício Zacharias Chega de Saudade Roteiro de Luiz Bolognesi Cidade dos Homens Roteiro de Elena Soárez Como Fazer um Filme de Amor Roteiro escrito e comentado por Luiz Moura e José Roberto Torero O Contador de Histórias Roteiro de Mauricio Arruda, José Roberto Torero, Mariana Veríssimo e Luiz Villaça Críticas de B.J. Duarte – Paixão, Polêmica e Generosidade Org. Luiz Antônio Souza Lima de Macedo Críticas de Edmar Pereira – Razão e Sensibilidade Org. Luiz Carlos Merten Críticas de Jairo Ferreira – Críticas de invenção: Os Anos do São Paulo Shimbun Org. Alessandro Gamo Críticas de Luiz Geraldo de Miranda Leão – Anali­sando Cinema: Críticas de LG Org. Aurora Miranda Leão Críticas de Rubem Biáfora – A Coragem de Ser Org. Carlos M. Motta e José Júlio Spiewak De Passagem Roteiro de Cláudio Yosida e Direção de Ricardo Elias Desmundo Roteiro de Alain Fresnot, Anna Muylaert e Sabina Anzuategui Djalma Limongi Batista – Livre Pensador Marcel Nadale Dogma Feijoada: O Cinema Negro Brasileiro Jeferson De Dois Córregos Roteiro de Carlos Reichenbach A Dona da História Roteiro de João Falcão, João Emanuel Carneiro e Daniel Filho Os 12 Trabalhos Roteiro de Cláudio Yosida e Ricardo Elias Estômago Roteiro de Lusa Silvestre, Marcos Jorge e Cláudia da Natividade Fernando Meirelles – Biografia Prematura Maria do Rosário Caetano Fim da Linha Roteiro de Gustavo Steinberg e Guilherme Werneck; Story­boards de Fábio Moon e Gabriel Bá Fome de Bola – Cinema e Futebol no Brasil Luiz Zanin Oricchio Geraldo Moraes – O Cineasta do Interior Klecius Henrique Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta Cinéfilo Luiz Zanin Oricchio Helvécio Ratton – O Cinema Além das Montanhas Pablo Villaça O Homem que Virou Suco Roteiro de João Batista de Andrade, organização de Ariane Abdallah e Newton Cannito Ivan Cardoso – O Mestre do Terrir Remier João Batista de Andrade – Alguma Solidão e Muitas Histórias Maria do Rosário Caetano Jorge Bodanzky – O Homem com a Câmera Carlos Alberto Mattos José Antonio Garcia – Em Busca da Alma Feminina Marcel Nadale José Carlos Burle – Drama na Chanchada Máximo Barro Liberdade de Imprensa – O Cinema de Intervenção Renata Fortes e João Batista de Andrade Luiz Carlos Lacerda – Prazer & Cinema Alfredo Sternheim Maurice Capovilla – A Imagem Crítica Carlos Alberto Mattos Mauro Alice – Um Operário do Filme Sheila Schvarzman Miguel Borges – Um Lobisomem Sai da Sombra Antônio Leão da Silva Neto Não por Acaso Roteiro de Philippe Barcinski, Fabiana Werneck Barcinski e Eugênio Puppo Narradores de Javé Roteiro de Eliane Caffé e Luís Alberto de Abreu Onde Andará Dulce Veiga Roteiro de Guilherme de Almeida Prado Orlando Senna – O Homem da Montanha Hermes Leal Pedro Jorge de Castro – O Calor da Tela Rogério Menezes Quanto Vale ou É por Quilo Roteiro de Eduardo Benaim, Newton Cannito e Sergio Bianchi Ricardo Pinto e Silva – Rir ou Chorar Rodrigo Capella Rodolfo Nanni – Um Realizador Persistente Neusa Barbosa Salve Geral Roteiro de Sérgio Rezende e Patrícia Andrade O Signo da Cidade Roteiro de Bruna Lombardi Ugo Giorgetti – O Sonho Intacto Rosane Pavam Vladimir Carvalho – Pedras na Lua e Pelejas no Planalto Carlos Alberto Mattos Viva-Voz Roteiro de Márcio Alemão Zuzu Angel Roteiro de Marcos Bernstein e Sergio Rezende Série Cinema Bastidores – Um Outro Lado do Cinema Elaine Guerini Série Ciência & Tecnologia Cinema Digital – Um Novo Começo? Luiz Gonzaga Assis de Luca A Hora do Cinema Digital – Democratização e Globalização do Audiovisual Luiz Gonzaga Assis de Luca Série Crônicas Crônicas de Maria Lúcia Dahl – O Quebra-cabeças Maria Lúcia Dahl Série Dança Rodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo – Dança Universal Sérgio Rodrigo Reis Série Teatro Brasil Alcides Nogueira – Alma de Cetim Tuna Dwek Antenor Pimenta – Circo e Poesia Danielle Pimenta Cia de Teatro Os Satyros – Um Palco Visceral Alberto Guzik Críticas de Clóvis Garcia – A Crítica Como Oficio Org. Carmelinda Guimarães Críticas de Maria Lucia Candeias – Duas Tábuas e Uma Paixão Org. José Simões de Almeida Júnior Federico García Lorca – Pequeno Poema Infinito Roteiro de José Mauro Brant e Antonio Gilberto João Bethencourt – O Locatário da Comédia Rodrigo Murat Leilah Assumpção – A Consciência da Mulher Eliana Pace Luís Alberto de Abreu – Até a Última Sílaba Adélia Nicolete Maurice Vaneau – Artista Múltiplo Leila Corrêa Renata Palottini – Cumprimenta e Pede Passagem Rita Ribeiro Guimarães Teatro Brasileiro de Comédia – Eu Vivi o TBC Nydia Licia O Teatro de Alcides Nogueira – Trilogia: Ópera Joyce – Gertrude Stein, Alice Toklas & Pablo Picasso – Pólvora e Poesia Alcides Nogueira O Teatro de Ivam Cabral – Quatro textos para um tea­tro veloz: Faz de Conta que tem Sol lá Fora – Os Cantos de Maldoror – De Profundis – A Herança do Teatro Ivam Cabral O Teatro de Noemi Marinho: Fulaninha e Dona Coisa, Homeless, Cor de Chá, Plantonista Vilma Noemi Marinho Teatro de Revista em São Paulo – De Pernas para o Ar Neyde Veneziano O Teatro de Samir Yazbek: A Entrevista – O Fingidor – A Terra Prometida Samir Yazbek Teresa Aguiar e o Grupo Rotunda – Quatro Décadas em Cena Ariane Porto Série Perfil Aracy Balabanian – Nunca Fui Anjo Tania Carvalho Arllete Montenegro – Fé, Amor e Emoção Alfredo Sternheim Ary Fontoura – Entre Rios e Janeiros Rogério Menezes Bete Mendes – O Cão e a Rosa Rogério Menezes Betty Faria – Rebelde por Natureza Tania Carvalho Carla Camurati – Luz Natural Carlos Alberto Mattos Cecil Thiré – Mestre do seu Ofício Tania Carvalho Celso Nunes – Sem Amarras Eliana Rocha Cleyde Yaconis – Dama Discreta Vilmar Ledesma David Cardoso – Persistência e Paixão Alfredo Sternheim Denise Del Vecchio – Memórias da Lua Tuna Dwek Elisabeth Hartmann – A Sarah dos Pampas Reinaldo Braga Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida Maria Leticia Etty Fraser – Virada Pra Lua Vilmar Ledesma Ewerton de Castro – Minha Vida na Arte: Memória e Poética Reni Cardoso Fernanda Montenegro – A Defesa do Mistério Neusa Barbosa Geórgia Gomide – Uma Atriz Brasileira Eliana Pace Gianfrancesco Guarnieri – Um Grito Solto no Ar Sérgio Roveri Glauco Mirko Laurelli – Um Artesão do Cinema Maria Angela de Jesus Ilka Soares – A Bela da Tela Wagner de Assis Irene Ravache – Caçadora de Emoções Tania Carvalho Irene Stefania – Arte e Psicoterapia Germano Pereira Isabel Ribeiro – Iluminada Luis Sergio Lima e Silva Joana Fomm – Momento de Decisão Vilmar Ledesma John Herbert – Um Gentleman no Palco e na Vida Neusa Barbosa Jonas Bloch – O Ofício de uma Paixão Nilu Lebert José Dumont – Do Cordel às Telas Klecius Henrique Leonardo Villar – Garra e Paixão Nydia Licia Lília Cabral – Descobrindo Lília Cabral Analu Ribeiro Lolita Rodrigues – De Carne e Osso Eliana Castro Louise Cardoso – A Mulher do Barbosa Vilmar Ledesma Marcos Caruso – Um Obstinado Eliana Rocha Maria Adelaide Amaral – A Emoção Libertária Tuna Dwek Marisa Prado – A Estrela, O Mistério Luiz Carlos Lisboa Mauro Mendonça – Em Busca da Perfeição Renato Sérgio Miriam Mehler – Sensibilidade e Paixão Vilmar Ledesma Nicette Bruno e Paulo Goulart – Tudo em Família Elaine Guerrini Nívea Maria – Uma Atriz Real Mauro Alencar e Eliana Pace Niza de Castro Tank – Niza, Apesar das Outras Sara Lopes Paulo Betti – Na Carreira de um Sonhador Teté Ribeiro Paulo José – Memórias Substantivas Tania Carvalho Pedro Paulo Rangel – O Samba e o Fado Tania Carvalho Regina Braga – Talento é um Aprendizado Marta Góes Reginaldo Faria – O Solo de Um Inquieto Wagner de Assis Renata Fronzi – Chorar de Rir Wagner de Assis Renato Borghi – Borghi em Revista Élcio Nogueira Seixas Renato Consorte – Contestador por Índole Eliana Pace Rolando Boldrin – Palco Brasil Ieda de Abreu Rosamaria Murtinho – Simples Magia Tania Carvalho Rubens de Falco – Um Internacional Ator Brasileiro Nydia Licia Ruth de Souza – Estrela Negra Maria Ângela de Jesus Sérgio Hingst – Um Ator de Cinema Máximo Barro Sérgio Viotti – O Cavalheiro das Artes Nilu Lebert Silvio de Abreu – Um Homem de Sorte Vilmar Ledesma Sônia Guedes – Chá das Cinco Adélia Nicolete Sonia Maria Dorce – A Queridinha do meu Bairro Sonia Maria Dorce Armonia Sonia Oiticica – Uma Atriz Rodrigueana? Maria Thereza Vargas Suely Franco – A Alegria de Representar Alfredo Sternheim Tatiana Belinky – ... E Quem Quiser Que Conte Outra Sérgio Roveri Tony Ramos – No Tempo da Delicadeza Tania Carvalho Umberto Magnani – Um Rio de Memórias Adélia Nicolete Vera Holtz – O Gosto da Vera Analu Ribeiro Vera Nunes – Raro Talento Eliana Pace Walderez de Barros – Voz e Silêncios Rogério Menezes Zezé Motta – Muito Prazer Rodrigo Murat Especial Agildo Ribeiro – O Capitão do Riso Wagner de Assis Beatriz Segall – Além das Aparências Nilu Lebert Carlos Zara – Paixão em Quatro Atos Tania Carvalho Cinema da Boca – Dicionário de Diretores Alfredo Sternheim Dina Sfat – Retratos de uma Guerreira Antonio Gilberto Eva Todor – O Teatro de Minha Vida Maria Angela de Jesus Eva Wilma – Arte e Vida Edla van Steen Gloria in Excelsior – Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira Álvaro Moya Lembranças de Hollywood Dulce Damasceno de Britto, organizado por Alfredo Sternheim Maria Della Costa – Seu Teatro, Sua Vida Warde Marx Ney Latorraca – Uma Celebração Tania Carvalho Raul Cortez – Sem Medo de se Expor Nydia Licia Rede Manchete – Aconteceu, Virou História Elmo Francfort Sérgio Cardoso – Imagens de Sua Arte Nydia Licia Tônia Carrero – Movida pela Paixão Tania Carvalho TV Tupi – Uma Linda História de Amor Vida Alves Victor Berbara – O Homem das Mil Faces Tania Carvalho Walmor Chagas – Ensaio Aberto para Um Homem Indignado Djalma Limongi Batista Formato: 12 x 18 cm Tipologia: Frutiger Papel miolo: Offset LD 90 g/m2 Papel capa: Triplex 250 g/m2 Número de páginas: 256 Editoração, CTP, impressão e acabamento: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Coleção Aplauso Série Teatro Brasil Coordenador Geral Rubens Ewald Filho Coordenador Operacional e Pesquisa Iconográfica Marcelo Pestana Projeto Gráfico Carlos Cirne Editor Assistente Felipe Goulart Editoração Selma Brisolla Fátima Consales Tratamento de Imagens José Carlos da Silva Revisão Dante Pascoal Corradini © 2009 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Krugli, Ilo Poesia rasgada / Ilo Krugli; Ieda de Abreu - São Paulo : Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2009. 256p. il. -(Coleção aplauso. Série teatro Brasil / coordenador geral Rubens Ewald Filho). ISBN 978- 85-7060-793-5 1. Teatro – Brasil – História e crítica 2. Ventoforte (Grupo teatral) 3. Ilo, Krugli, 1930 I. Abreu, Ieda de II. Ewald Filho, Rubens. II. Título. III. Série. CDD 792.981 Índices para catálogo sistemático: Dramaturgos brasileiros : Crítica e interpretação : Biografia 792. 981 Proibida reprodução total ou parcial sem autorização prévia do autor ou dos editores Lei nº 9.610 de 19/02/1998 Foi feito o depósito legal Lei nº 10.994, de 14/12/2004 Impresso no Brasil / 2009 Todos os direitos reservados. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Rua da Mooca, 1921 Mooca 03103-902 São Paulo SP www.imprensaoficial.com.br/livraria livros@imprensaoficial.com.br SAC 0800 01234 01 sac@imprensaoficial.com.br Coleção Aplauso | em todas as livrarias e no site www.imprensaoficial.com.br/livraria