Reginaldo Faria O Solo de um Inquieto Por Wagner de Assis São Paulo, 2004 Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado Assis, Wagner de Reginaldo Faria : o solo de um inquieto / por Wagner de Assis. - São Paulo : Imprensa Oficial do Estado de São Paulo : Cultura - Fundação Padre Anchieta, 2004. -272p. : il. - (Coleção aplauso. Série perfil / coordenador geral Rubens Ewald Filho) ISBN 85-7060-233-2 (obra completa) (Imprensa Oficial) ISBN 85-7060-265-0 (Imprensa Oficial) 1. Atores e atrizes de teatro - Brasil - Crítica e interpretação 2. Faria, Reginaldo 3. Teatro brasileiro I. Ewald Filho, Rubens. II. Título. III. Série. CDD 791.092 Índice para catálogo sistemático: 1. Atores brasileiros : Biografia e obra : Crítica e interpretação : Representações públicas : Artes 791.092 Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Rua da Mooca, 1921 - Mooca 03103-902 - São Paulo - SP - Brasil Tel.: (0xx11) 6099-9800 Fax: (0xx11) 6099-9674 www.imprensaoficial.com.br e-mail: livros@imprensaoficial.com.br SAC 0800-123401 Dedico este livro a todos da minha família e às famílias de todos Reginaldo Faria Introdução Éramos sete pessoas na balsa. Reginaldo, sua esposa Roseh, a atriz Luiza Thomé, a maquiadora, um câmera, eu e o balseiro. Estávamos sonados, cansados da maratona de gravações na Ilha de Comandatuba, Bahia, onde fora construída a cidade cenográfica da novela Porto dos Milagres, da Rede Globo. Até o amanhecer parecia preguiçoso. A balsa arrastava-se pelo canal até o continente, onde pegaríamos o ônibus para o aeroporto e depois o avião de volta para casa. De repente, vejo, numa espécie de câmera lenta, o corpo do Reginaldo tombar pra frente, cair no assoalho da balsa e dar um rolamento completo, típico dos lutadores de judô. Estávamos exatamente a meio caminho. Diante do inesperado da situação, pensei: "Meu Deus, está enfartando, voltamos para pedir ajuda ou seguimos até o continente? Será que alguém sabe fazer massagem cardíaca? E se for um ataque epiléptico? Precisamos desenrolar a língua dele...", e ainda um inesperado: "Será que ele bebeu todas durante a madrugada?" Olhei a Luiza, seus olhos estavam arregalados; o balseiro largou o leme; a maquiadora soltou um grito nervoso. Todos reagimos. Menos a Roseh, que tinha no rosto um sorriso envergonhado. Com razão. Depois do movimento acrobático, o Reginaldo se levanta e diz: "Que sono... ainda bem que essa balsa é macia". A gargalhada num uníssono espalhou-se pelo canal. "Queria apenas mostrar que realmente estava caindo de sono", ele explicou-me tempos depois. Essa é uma das histórias que sempre lembro quando penso no Reginaldo. Por muito tempo, ainda me divirto ao recordar como a preguiça foi embora naquele dia. Não que ele seja um palhaço que goste de pequenos shows como esse. Muito pelo contrário. Sua figura em nada traz humor estampado. É um homem sério. E talvez surpresas assim sejam parte do segre do. Porque ele se diverte também. Dias antes, por exemplo, na pele do Coronel Jurandir, uma participação especial na primeira fase da história, Reginaldo tinha vivido as maldades de um homem inescrupuloso, impiedoso e cruel, que estupra uma linda mocinha do interior, papel de Luiza Curvo. A menina, tomada de vergonha, enforca-se no quintal da casa. A gravação do estupro foi uma cena e tanto. Com o personagem, Reginaldo olhava para a menina com as pupilas dilatadas. Tinha também no canto da boca um sorriso de perversidade. A participação foi marcante. Até porque, logo depois, ele recebe um balaço de carabina no peito, disparado pelo personagem da Luiza Thomé. Um dia depois, deu o rolamento para "animar" a gente e provar que estava sonado. Acho mesmo é que estava relaxando das tensões da véspera. Esse mesmo Reginaldo também tinha ficado marcado nas minhas lembranças noveleiras (quem não tem uma lembrança noveleira neste país?) ao interpretar o costureiro Jacques Leclair na novela Tititi. Ele e Luis Gustavo, que fazia o outro costureiro, Victor Valentim, passaram a fazer parte dos assuntos, das piadas, enfim, do cotidiano da vida dos jovens brasileiros. "Eu guardo aquele paletó branco do personagem no meu armário como recordação", me confessou também num desses papos de bastidores. Anos mais tarde, quando comecei a trabalhar como repórter no Departamento de Divulgação e Imprensa da Rede Globo, reencontrar profissionais como ele era um prazer quase proustiano. Apenas o som de suas vozes já me fazia rever personagens e histórias maravilhosas perdidos no tempo. Ou medonhas, como o Esquadrão da Morte, personificado no Lúcio Flávio, filme que eu tinha visto escondido num cinema do Rio. Havia paredes pichadas na cidade com o nome do Esquadrão. Conhecer o Reginaldo também me fez pensar em sua família, com quem já tive contato profissional - com seu irmão Roberto, o sobrinho Maurício e também com seu filho, Marcelo. Como seria viver num grupo onde o sangue que corre nas veias de quase todos pulsa ao ritmo de 24 quadros por segundo? O Brasil é pródigo em famílias "audiovisuais e teatrais" talentosas - os Barreto, os Carreiro, os Duarte, os Faria. Vai ver é coisa de reencarnação, que junta ao longo das gerações os grupos de realizadores para continuarem produzindo juntos. Seja por ordem divina ou não, quem ganha é o público. Mas não é só o sangue cinematográfico que corre em seu corpo. Reginaldo é homem de cinema, de televisão - esteve na primeiríssima novela da TV Globo! - e, mais recentemente, de teatro também, já acumulando 14 anos de palco. Além disso, é cidadão consciente, gosta de exercer seu papel político. Quando seu discurso refere-se ao cinema brasileiro, vem com patriotismo, paixão, orgulho de quem o ajuda a existir há tantos anos e também com o conhecimento das falhas e do caminho a seguir. Fica melancólico, sente-se frustrado. Mas minutos depois retoma o prumo do "realizador" e volta a pensar no futuro. Nesse meio-termo, se exalta quando fala do imperialismo americano. Mas não deixa de reconhecer filmes como O Senhor dos Anéis. Em seu depoimento, não poupa críticas aos críticos, que tanto falaram dele no passado, imputando-lhe injustamente o título de precursor das pornochanchadas por conta de seu filme, Os Paqueras. O tempo passou, os críticos também. Reginaldo ficou. Ganhou prêmios. Fez em média um filme a cada dois anos desde o início da década de 60 - sendo que o maior intervalo sem filmar foi no início da década de 90. A maioria deles baseados em temas fortes, ligados ao mundo real. Como Pra Frente Brasil, Lúcio Flávio e mesmo Barra Pesada. São fatos que demonstram o equívoco da crítica especializada. Quem quiser comprovar, que veja com os próprios olhos. Como era boa-pinta, também foi chamado de galã, mas não aceitou o rótulo e buscou nos seus bandidos, policiais, maridos traídos - e mesmo nos conquistadores - que viveu uma verdade que demonstra que seu interesse não era capa de revista, mas vivenciar uma vasta gama de sentimentos que navegam entre risos e lágrimas nos rostos dos espectadores. Este Reginaldo que acabei por conhecer mais a fundo com o depoimento a seguir é um cara aparentemente calmo, (eu disse aparentemente!) que fala pausadamente, pensa sempre antes de se pronunciar, na maior parte das vezes. Suas histórias parecem sempre convergir para um momento engraçado. Porém, ele tem mágoas, medos e não se furta em expor. Dos orgulhos e feitos maravilhosos, fala meio acanhado. É tímido sim. Até para mostrar o importante prêmio que ganhou como Melhor Ator com o filme Lúcio Flávio no Festival Internacional de Taormina, na Itália. Ao melhor estilo "olha só o que eu ganhei", ele foi buscar o quadro emoldurando o papel reconhecendo seu mérito. "Tá certo, Reginaldo, mas não precisamos mostrar o diploma no livro para provar que você ganhou o prêmio", eu argumentei. Ele, na maior ingenuidade, concordou. Apesar do acanhamento, não guarda os sonhos pra si. Tem muitos - e briga para torná-los realidade. Quando fala sobre eles, deixa passar uma força interior que talvez nem ele mesmo saiba a intensidade. E o engraçado é que, mesmo depois de tanto tempo de estrada, Reginaldo diz que seria capaz de pegar uma câmera digital e realizar o filme Em Nome do Filho, sucesso de público e crítica no teatro, que pretende levar para as telas, sem todos os recursos disponíveis. "No peito e na raça", reafirma. Eu ajudo se for necessário. Alô investidores! A história é maravilhosa e de produção barata. Vale as lágrimas de realização assim como as lágrimas do público que ele conta ter visto nas inúmeras apresentações pelos palcos do Brasil. Vale esclarecer um detalhe que será comprovado pelas fotos a seguir: quem, por acaso, cair no erro de dizer que Reginaldo é muito parecido com o Marcelo, não se esqueça quem veio primeiro. É Marcelo que se parece com Reginaldo... Com todo o respeito (na verdade, são chaveiro e chaveirinho mesmo!) No fundo, para tentar encontrar uma palavra ou uma idéia que possa defini-lo, é o sangue de um homem inquieto que corre em suas veias. Acho que um cara como ele deveria ter algo como uma bolsa de produção do Ministério da Cultura para filmar todo ano, do tipo faça-o-quequiser-com-esse-dinheiro. Tenho certeza que os resultados seriam compensadores. Tanto para o público como para o investimento. A proposta deste livro encontrou Reginaldo entre pedaços de textos de uma autobiografia que está escrevendo. Suas histórias ganham propositalmente pitadas de ficção, cheias de romance, fantasia. "Você foi uma luz que veio para iluminar meu passado", disse-me, a cada dia lembrando de uma nova situação, como se essa remexida no baú da memória fosse interminável. Atualmente, enquanto seu próximo filme não sai, enquanto não monta mais uma peça, entre as gravações e os capítulos da novela Cabocla, ele escreve. Por isso, teve horas que não resistiu e exercitou o escritor que está nascendo para ajudar no texto literalmente, defendendo um adjetivo aqui, um pronome ali. Noutras, revirou uma estante enorme com milhares de fotos, recortes de jornais, livros e mais livros, para resgatar algumas das fotos contidas aqui. "Aproveitei e arrumei tudo", contou de forma agradecida. Seus filmes e peças estão guardados em singelas pastinhas de plásticos. No computador, inúmeros arquivos sugerem novos filmes e peças. Nesse ambiente em que passado e futuro estão lado a lado, algumas certezas me bateram: a jornada do cineasta, do artista brasileiro, é cheia de percalços, mas vale a pena quando há verdade e talento no trabalho. E olhar para tantos filmes no passado, mesmo entre sucessos e fracassos, dá a sensação de que o importante é mesmo continuar fazendo. Infelizmente, a época de hoje é de culto a celebridades instantâneas de mentira e sem talento e, principalmente, à privacidade de suas vidas. Saber quantos casamentos ou qual carro dirige parece ser mais importante do que quantos filmes ou peças foram feitos. Ok, aqui vão informações pessoais: Reginaldo nasceu em 11 de junho de 1937, é casado com a atriz e cantora Roseh Ventura e vive numa casa cheia de árvores e cachorros. É um cara tão preocupado com a família que sua única preocupação na hora de escolher as fotos deste livro foi com as fotos dos pais, dos filhos e da esposa. Pronto. O resto ele mesmo conta - até porque não tem o que esconder. Ao longo desse passeio pelas últimas quatro décadas e vendo e revendo alguns filmes, novelas e lendo sinopses de suas peças, uma coisa me intrigava: eu não conseguia encontrar, olhando tantas fotos da vida profissional do Reginaldo, uma imagem símbolo. E também fiquei muito tempo pensando num título adequado para uma pessoa com tantos predicados. Há momentos em que imagens e palavras não dizem o suficiente a respeito de uma pessoa. Mas eis que descubro algo diferente quando ele pega seu violão e começa a tocar. Ali, o som que reproduz diz muito mais de sua alma que qualquer outra forma de expressão. Reginaldo é músico antes de ser ator, diretor, produtor, assistente de câmera, assistente de direção. Já fez músicas para filmes, música para homenagear o pai, para distrair a alma, e, quem sabe?, acalmar o turbilhão de sentimentos que ainda pulsa dentro dele. Poucas pessoas sabem desse talento - a Nara Leão, por exemplo, sabe (e isso o leitor descobre no capítulo 3). Essa seqüência de depoimentos foi gravada ao longo de algumas semanas e as entrevistas aconteceram no mesmo cômodo de sua casa no Rio de Janeiro. Eu chegava e, recostado, em cima do sofá, como o morador mais ilustre, lá estava o violão. Por vezes, Reginaldo mudava-o de posição - segurando como a um cristal raro, trocava de uma almofada por outra. Privilegiado ouvinte fictício, o violão presenciou seu dono emocionar-se em alguns momentos. Se exaltar em vários. Mas, principalmente, compartilhou das incontáveis gargalhadas que suas histórias trazem. Então, estas são palavras e imagens que talvez possam ajudar a compor um pouco da vida pro-fissional de Reginaldo Figueira de Faria. Infelizmente não é um projeto multimídia. Caso fosse, acrescentaríamos também as músicas. Porque, já que estamos falando de um músico, com formação clássica e tudo, este aqui vai ser, mesmo em silêncio, o seu solo mais eloqüente. O solo de um inquieto. Wagner de Assis Capítulo I Reginaldo e Seus Irmãos (e Pais, Filhos e Sobrinhos) Eu tenho orgulho de fazer parte de uma família reconhecida no meio cinematográfico, mas não me sinto parte de um clã, apenas de uma família que ama o cinema, ama as artes. E que se ama, se reúne e quer continuar trabalhando, produzindo suas idéias e realizando seus sonhos. A composição é a seguinte: o mais velho é o Roberto, o pioneiro. Começou fazendo cinema aos vinte e poucos anos com o Watson Macedo. Os filhos dele são o Mauro, Lui, Maurício, todos diretores; e Marize que também lida com cinema. Além disso, o Paulo, filho do Mauro, também trabalha como assistente de produção, é um garoto inteligente e sensível. Depois vem o Riva, administrador da nossa empresa. Sua filha, Márcia, trabalha como assistente de direção. Fez diversos filmes: Carandiru, Cazuza, aquele com o Anthony Quinn que foi rodado aqui no Brasil, chamado Oriundi. Logo estará dirigindo. Eu, Reginaldo, sou o terceiro, pai do Régis, dire-tor, do Marcelo e Carlos André, atores. O Rogério foi o último a ingressar no cinema. Somos cinco irmãos com R: Roberto, Riva, Reginaldo, Rogério e Rosângela, a única que não se interessou por cinema. Deixa eu esclarecer uma coisa: o Roberto Farias tem um "S" a mais. Os demais, não. Houve um erro no cartório. Nosso pai deixou assim mesmo. Dizem que o "S" do Roberto é o do cifrão. Seus filhos seguiram o mesmo Farias; mas o original é Faria. O engraçado é que meu pai não tinha nome com "R". Ele se chamava Guniforte Figueira de Fa-ria. Creio que este nome foi inspirado em alguma ópera alemã. Era filho de portugueses, mas nasceu no Brasil, numa cidadezinha perto de Friburgo chamada Banquete. Meus avós foram morar em Friburgo pelas condições climáticas. Bom mesmo seria perguntar ao Roberto que mergulhou - ou subiu - na árvore genealógica da família até quatrocentos anos atrás. Meu pai era um grande artesão, fazia trabalhos em madeira muito bonitos, móveis lindos. Uma vez, fez uma mesa de botar inveja em qualquer Mont Martre Jorge. Ela está na casa do Roberto como relíquia. Sobre essas qualidade de meu pai, há uma passagem de minha infância que acabei escrevendo e chama-se: O Carrinho da Casa Bizzoto Na vitrine, um belo automóvel conversível acendia e apagava os faróis. Contornando a árvore de natal, uma fita prateada cintilava aumentando a ilusão, aguçando o meu desejo de possuir o brinquedo. Em casa, eu bombardeava a cabeça do meu pai: "O carrinho conversível da Casa Bizzoto". "Que carrinho?". "Um carrinho de pedal, faróis e buzina". "Você quer o carrinho?". "Quero, de presente de Natal". Meu pai levou o garfo à boca e calou-se. Natal chegou e eu sonhei, sonhos que se diluem e se substituem. Ganhei apenas um cavalinho de papelão, patinhas pintadas de preto que se apoiavam sobre uma tábua com quatro rodinhas. Suas crinas branquinhas de algodão desprendiam-se com facilidade e aos poucos deixavam o animalzinho pelado e sujo. Ao vê-lo daquele jeito, não hesitei em colocá-lo debaixo da torneira. O cavalo entortou, tornou-se capenga e desbotado. Vendo minha tristeza, meu pai separou madeiras largas, estreitas e grossas, preparou ferramentas, ajeitou sua banca de carpinteiro, mediu cada peça a olho nu, e delas fez nascer um automóvel conversível. Cria de meus sonhos, cria de suas mãos. "Pronto. Aqui está seu carrinho". Uma obra de arte! Mas não era o da Casa Bizzoto. Meu avô paterno tinha muito dinheiro, morreu cedo e deixou meu pai órfão aos quatro anos de idade. Tinha ido a Portugal fazer negócios com outra pessoa que voltou trazendo a notícia da sua morte. Essa pessoa enriqueceu rapidamente. A família desconfiou, mas ficou por isso. Não houve provas nem acusações. Restou apenas a impressão de que ele havia se aproveitado e usurpado a fortuna do meu avô. Entregou à família a única relíquia deixada por ele: um relógio de ouro que passou para as mãos das irmãs do meu pai. Assim, meu pai foi criado por um tio, o Julio, marido da irmã mais velha dele. Depois, meu pai conheceu o ramo de açougue, no qual trabalhou. Minha mãe chamava-se Ana Malta Pereira de Faria, também de família portuguesa, da Ilha da Madeira e Trás os Montes. Mas tinha miscigenação na história: seu pai, brasileiro, era descendente de índio. Essa mistura só o brasileiro tem. A diferença de idade entre mim, o Roberto e o Riva é de apenas cinco anos. O mais novo, Rogério, tem dez anos a menos que eu. A minha infância era compartilhada com o Riva. Roberto tinha lá a sua patota. Mais tarde o Riva e o Roberto ficaram mais próximos, tinham funções muito parecidas. Independente de ser diretor, o Roberto produzia e administrava ao lado do Riva. Mas o primeiro emprego de todos nós foi no açougue. Lá, trabalhamos duro e sempre muito unidos. Levantávamos cedo, madrugada ainda, para entregar carne na gélida Nova Friburgo. Ainda não estávamos na era dos supermercados, portanto a cidade só comportava três ou quatro açougues e alguns armazéns que vendiam bacalhau, carne seca, lingüiça, sardinha. O pedido para a entrega era muito grande. Para agradar e ganhar fregueses, a entrega era em suas casas. A cidade era pequena, fria, de poucos prédios, preservando a arquitetura bávaro suíça ou estilo colonial português. Hoje é uma cidade bastante povoada, mas na época podíamos con-tar os habitantes com os dedos. Meu pai chegava no açougue por volta de uma da manhã para fazer a "banca", destrinçar o animal. Nós, às quatro, quer dizer... o Roberto chegava. Era o primeiro a acordar, era o mais velho, mais disciplinado. Nós queríamos cama. Mas não tinha jeito. Saíamos de bicicleta para a entrega. Era bem parecido com aquelas cenas do neo-realismo italiano. Eu cheguei a entregar carne em carrinho de rolimã. Éramos tão pequenos ainda que mal conseguíamos andar de bicicleta. O Rogério foi o mais privilegiado, pegou a fase da lambreta. A entrega terminava por volta das sete e meia da manhã. Depois, esfomeados, passávamos em casa para tomar o café. Nossos compromissos não terminavam ali - restava a escola, às oito. Várias vezes dormi na sala de aula. Sonhava com o toque da campainha, às 12 horas. Depois era almoçar, tirar uma pestana e aproveitar a tarde para brincar. Minha infância foi gostosa, livre, rica de experiências. Eu jogava bola, soltava pipa, tomava banho de rio, andava descalço e cortava o pé em caco de vidro. Mas trabalhava. Ajudar no açougue era disciplina da boa. Dessa época, guardo algumas lembranças especiais, do Jolie, nosso cachorro "inteligente". Era um S.R.D. (Sem Raça Definida) com um quê de pastor alemão. Um dia um freguês fez um pedido fora da rotina de entrega. Meu pai chamou o Roberto e falou: "Leve esta carne na Sociedade Esportiva". O Jolie estava no açougue e ouviu. O Roberto pegou sua bicicletinha e partiu. Lá chegando, o Jolie já o esperava, sentado à porta, com a língua de fora, parecendo sorrir. Como não havia televisão, tínhamos o hábito de nos reunir em volta do fogão para ouvir histórias contadas por nosso pai. Havia o rádio, o Repórter Esso falando sobre a II Guerra Mundial, as novelas, mais ouvidas pela nossa mãe. Uma vez ouvi uma novela chamada O Homem Pássaro, viajei com ela, queria ser como ele. No mais, o rádio tocava músicas. Não era um componente de atrações contundentes como a televisão. E, enquanto a televisão não chegava, nosso universo girava em ouvir histórias em volta do fogão. Era muito agregador. Éramos - e somos - muito unidos até hoje por conta disso. A televisão traz coisas positivas mas, em certo sentido, desagrega. Ninguém mais conversa. Você chega em casa e quer falar mas dizem: "Peraí que agora eu tô vendo o programa tal". E o celular? Quer coisa mais terrível, celular. Você está batendo papo com teus filhos, toca o celular; está batendo um papo com amigos, toca a porra do celular. Então, estabeleci um código, pelo menos com meus filhos: "A gente se reúne e desliga tudo". E digo: "Agora é hora de falar besteira, falar sobre nós", e cada qual expõe o que quiser. Isso é fundamental. Não devo esquecer do tio Wilmar - Wilmar Cordoeira de Menezes, irmão da minha mãe. Era um homem forte, formado na Escola Naval. Contava histórias incríveis - dizia que esteve na Revolução de 30, mas levou um tiro na bunda e desistiu de lutar. No fundo, era um tremendo gozador. Mas a gente se divertia. Ele era eletricista-chefe, fazia produção, era considerado pau pra toda obra, sabia de tudo. Construiu um carrinho de travelling que ainda está no depósito da nossa empresa de cinema. Uma vez, encostou as pontas de dois fios eletrificados enquanto uma cena noturna acontecia - a corrente elétrica passava por entre as mãos dele! Noutra vez o Roberto ficou muito assustado com o fogão lá de casa, que era ligado aos canos d’água, chamados de serpentinas, e iam por dentro das paredes para aquecer a água das pias, dos banhos e as paredes da casa. O tio Wilmar disse que o fogo fazia o fogão andar como o trem a vapor. Disse que uma vez o fogão passou pela sala e já ia porta afora. Jogou o laço e o impediu de sair. Levou Roberto ao desespero - ele morria de medo ao ver o fogão aceso. Por causa dessas e de outras histórias fantásticas, resolvi escrever minhas memórias, para não perder esse tempo. Vou romanceando de vez em quando. Mas todas partem de acontecimentos e experiências verdadeiros. Ainda vou publicar. O fato é que ainda sonhamos e fantasiamos. É um bom alimento. Por isso os projetos não morrem. Temos projetos separados e em comum. Mas sempre nos ajudando. Segundo Schopenhauer, a vontade é o único elemento permanente e imutável do espírito. En tão, continuamos com vontade de fazer filmes. A Festa dos Libertos é um deles. E como não poderia deixar de ser, estou sonhando com Marcelo num dos papéis, com minha sobrinha Márcia na assistência de direção, com Régis no set, com Rogério e Riva na administração, produção e tudo mais. Já atuei com o Marcelo apenas em novelas e peças de teatro: Em Nome do Filho, Dia dos Namorados, ambas dirigidas por Régis e, recen temente, Mercedes de Medelim, dirigida por Gustavo Gasparani. Entretanto, por ironia do destino, nunca dirigi o Marcelo em cinema. Ele fez um filme com a Alice de Andrade, filha do Joaquim Pedro, e pisou num set pela primeira vez ainda muito garoto, num filme dirigido por mim, Agüenta Coração, mas isso não conta. Para quem deseja entrar de sola no assunto, é só uma pitada de açúcar. No seriado A Máfia no Brasil, ele também fez uma pequena participação. A primeira vez que contracenamos pra valer foi na novela Lua Cheia de Amor, em 1990. Meu personagem tinha que dar uma espinafração no personagem dele, que era um garoto meio quebrador de regras, enquanto o meu era um cara centrado. Na hora "H" esqueci de atuar e passei a olhar o Marcelo com olhos de diretor, ver o que ele estava fazendo como ator. Esqueci o texto e me perdi completamente. O Régis, que fazia assistência de direção, ficou impressionado, quase "decepcionado" comigo. Dizia: "O que está acontecendo? Está errando o texto toda hora, o que há?" Eu tentava explicar que havia me distanciado do meu personagem por me preocupar com o Marcelo. Mas não deu. Estava amando os dois: um que interpretava, outro que dirigia... enquanto eu não fazia nenhuma das duas funções! No teatro, ao ensaiar, afastava-me da marca estabelecida pelo diretor. Marcelo ficava puto porque eu o colocava de costas para a platéia. Então, para me chamar atenção, ele também se afastava. Resultado, os dois iam parar no fundo do palco. No dia seguinte eu esquecia e repetia. Ele, então, botava o pé atrás de mim ou a mão nas minhas costas. Se fosse outro ator, já tinha me comido na porrada. Ele, para me "zoar", dizia que eu estava a fim de derrubá-lo, não literalmente, mas em cena. Quando o Régis dirigiu a peça que escrevi, Em Nome do Filho, história de relação conflitante entre pai e filho, eu tinha uma visão do espetáculo, o Regis, outra. Mas ele era o diretor, portanto, a partir daquele instante, era também o autor. Eu fazia um enorme esforço para despir-me da imagem de pai e de autor e aceitar outra visão para o meu personagem. Foi difícil, uma vez que as emoções contidas no texto já eram per si o próprio conflito. Quanto mais admiração um pai tem - profissionalmente - por um filho, e vice-versa, o nível de exigência é maior. E quanto mais nos amamos, queremos a perfeição um do outro. Não é fácil temperar as coisas. Mas conseguimos. Tenho um tremendo orgulho disso. Tenho um filho mais novo, Carlos André, que, a priori, é a personificação da auto-exigência. A ele tenho de dosar os conselhos. Cuidado, filho! Capítulo II Cinema Paradiso Meus primeiros contatos com cinema foram marcantes. Nós íamos ao Cine Teatro Leal, uma miniatura do Teatro Municipal. Bem garotinho ainda, lá estava eu, de mãos dadas com o Roberto e Riva. O cinema lotava de adultos e crianças e assistíamos a tudo, do Capitão Marvel, Flash Gordon, Homem de Aço, faroeste, aos mais pesados filmes. Havia censura, mas não controlada. Era o máximo. Havia também o Cinema Eldorado, mais pomposo e moderno; nele, vi No Tempo das Diligências, por exemplo, e fiquei maravilhado. No Cine Leal, os mais bagunceiros ficavam lá em cima, no nível da torrinha, onde estavam as galerias, ou poleiro, ou galinheiro. Uma verdadeira praça de diversão, ou mesmo um galinheiro onde soltavam galinhas, pombos, pipoca, cuspe na cabeça dos que estavam embaixo. Víamos o filme um monte de vezes, já sabíamos de cor o que ia acontecer. Num daqueles filmes históricos sobre revolução francesa, Maria Antonieta caminhava lentamente para o cadafalso. Depois parava, olhava solenemente para trás, quer dizer, para a câmera, voltava a olhar para a frente e subia para morrer. Então, como a gente sabia que ela ia olhar para a câmera, no momento em que estava andando para o cadafalso, a gente gritava: "Maria Antonieta!". Ela olhava compungida, e a gente respondia: "Nada não". O cinema explodia em gargalhadas. Nossa vida era assim, meio Cinema Paradiso. Coincidência ou não, escrevi um roteiro chamado Os Caras Sujas, baseado nessas experiências e um pouco também no filme Anjos de Cara Suja, com James Cagney. Naquela época, os filmes mais atraentes eram os de ficção. Entretanto, o que mais me impressionou foi algo totalmente diferente: Hamlet, com Laurence Olivier. Inesquecível. Eu era muito criança mesmo, e, quando o vi segurar o crânio e falar "To be or not to be", fiquei impressionadíssimo. Eu não sabia ler, mas a marca de Shakespeare ficou gravada em minha memória para sempre. Meu pai cantava à mesa de jantar: "Eram duas caveiras que se amavam, um dia num cemitério se encontraram..." e assim por diante. Eu, particularmente, ficava impressionado. Caveira está no entendimento de qualquer pessoa e as pessoas sabem o que significa "ser e o não ser". E eu já andava me questionando, querendo en-tender o que significava não ser, antes mesmo de ver o Hamlet. Eu tinha quatro anos e pensava no que seria "o nada". As empregadas nos atemorizavam com suas lendas. Distante de nossa casa, havia incêndios nas montanhas, causados por pessoas que pretendiam transformar florestas em pastos e, como nós éramos crianças, aquelas queimadas tomavam dimensões apocalípticas. Elas nos amedrontavam dizendo: "É o fim do mundo!". Depois, para amedrontar mais, completavam: "Deus vai acabar com o mundo com um simples estalar de dedos". Não satisfeitas, diziam: "Os "alemão" (errado mesmo) vão invadir a nossa cidade e pegar os seus pais para trabalhar nas fábricas". Estávamos vivendo o clima da Segunda Guerra Mundial e das empregadas que se deliciavam com o nosso medo. Na minha metafísica, não entendia minha família transformando-se em nada. Não havia "ser nada". Ficava me interrogando: "Como é que o nada pode ser nada se o nada é nada?". E caía em prantos, seguido de angústia depressiva. Não conseguia verbalizar. Imediatamente, estava no colo de minha mãe e todos diziam: "Não será dor de barriga?". E eu ali, com uma tremenda crise existencial aos quatro anos de idade. Meu primeiro filho, Régis, também ia para o meu quarto e dizia que não queria me ver morto. Tampouco a sua mãe. Deitava do meu lado, eu contava histórias até a crise passar. Mas, no dia seguinte, ele voltava. Um dia eu disse que ninguém morre, que as pessoas se transformam. E foi fantástico. Ele começou a querer se transformar em cachorro. Depois refletia dizendo: "Mas o cachorro dorme lá fora, sente frio, as pessoas maltratam". Então, pensou em se transformar em árvore. "Também não. As pessoas cortam as árvores". Por fim, encontrou a solução, transformar-se em montanha. "Montanha ninguém derruba, disse ele". Estava ali com a consciência de eternidade. Pelo menos a montanha parece inabalável. Curiosamente, o Marcelo nunca me falou sobre morte. Um dia, resolveu imitar o Homem de Seis Milhões de Dólares, daquele seriado, e, acostumado a regalar-se com aquelas idiotices, queria desafiar a lei da gravidade e voar. Eu tinha que dar um basta naquilo. Segurei-o pela camisa e levei-o, meio que voando, até a janela. Disse: "Olha lá para baixo. Só o Homem de Seis Milhões de Dólares pode pular daqui sem se machucar. Sabe por que? Porque isso só acontece na televisão. Se cair lá embaixo, você morre, entendeu?". Ele respondeu tranqüilamente: "Se eu cair lá embaixo eu vou ficar com a boca cheia de formiga". E riu. Mas permaneceu olhando para baixo durante um certo tempo, parecendo refletir. A única manifestação existencial do Carlos André foi quando, aos quatro anos, me perguntou aonde estava antes de eu conhecer sua mãe. Capítulo III O Baile Um dia o Roberto chegou em casa com um violão. Era preto e tinha uma estrela branca no meio, a coisa mais cafona do mundo. Eu deitava o violão no colo e tocava (dedilha no braço). "Por que não toca assim, abraçando o instrumento?", dizia Roberto. E assim o fiz, mas sem ter noção alguma. Ele comprou um método em espanhol para mim, Mateo Carcassi. Tive que aprender espanhol para entender o violão, a música, a técnica. Foi bom, aprendi espanhol e a tocar violão. Estudava oito horas por dia. Ia sempre prum canto treinar a mão direita, mão esquerda. Vinha de vez em quando ao Rio de Janeiro aprimorar a técnica com Antonio Rabello, um senhor que suponho ter sido avô do Raphael Rabbello, um músico maravilhoso. Infelizmente faleceu também. Morava na rua Bolívar, em Copacabana. Um dia, o Rogério transportou meu violão num carrinho de mão. O violão escorregou, caiu e rachou aqui (aponta a curva sensual do violão). Como bom artesão, meu pai pegou aquela antiga "cola da Bahia" e o violão ficou ótimo. Durante anos, manteve a acústica, ficou perfeito. Além do violão, eu também tocava gaita. Aprendi de ouvido. Minha mãe me obrigava a tocar para as visitas ou na rádio da cidade. Uma vez me tirou de uma festa de casamento onde eu me fartava de comer doces para tocar na rádio. Fui arrastado, chorando, com raiva dela. A raiva durou pouco. Na rádio, toquei bem e ganhei um prêmio: 50 cruzeiros. O animador do programa perguntou o que eu pretendia fazer com aquele dinheiro. Respondi que ia comprar uma camisa. Gargalhada geral. Um senhor, casado com minha prima, era o meu grande admirador. Dizia: "Toca, meu filho, toca que depois eu lhe dou um presente.". Eu tocava e batia com o pé, parecendo Shirley Temple sapateando. Isso também aos cinco anos de idade. Depois vinha o presente: as gaitas mais lindas do mundo, sonho com elas até hoje. Eram coloridas de dois lados e chamavam-se Pátria Formosa, Sonhadora, Vencedora - eu dava os nomes. Eu era péssimo jogador de futebol, chutava sempre errado, batia nos outros, saia na porrada... Não era um exímio soltador de pipa e perdia todas as minhas bolas de gude. Então, o que eu fazia? Pegava a gaita, sentava no muro e tocava. Ia buscar paz através da música. Sublimava minhas frustrações em sons deliciosos. Era o meu refúgio. A música me acompanha até hoje. Tenho pelo menos umas cinqüenta músicas compostas. E sempre toco nos momentos em que quero ficar sozinho. O tempo passou, mudei para o Rio de Janeiro, desviei meus sonhos de músico para o cinema. Depois televisão. Quando estava com quarenta e dois anos, meu pai faleceu. Eu morava num apartamento que o Paulo Ubiratan deixou, transferindo o contrato de aluguel para mim. Tinha acabado de me separar. Fiz Água Viva e já estava gravando Baila Comigo, era o auge do sucesso. Sozinho, sentado num colchão, comecei a compor uma música com o violão que meu pai consertou. Terminei e disse: "Essa é para você, meu velho!" Encostei o violão na parede, ao lado do colchão e adorme ci. Lá pelas três, quatro da madrugada, acordei ouvindo um barulho estranhíssimo. No escuro mesmo, passei o dedo nas cordas. Estavam todas lá. Acendi a luz, olhei o violão, ele estava rachado exatamente no local onde o meu pai havia colado. Quando morava em Friburgo, a gente se juntava numa praça para tocar violão. A praça era imensa e as pessoas iam dormir cedo. Podia-se ouvir o barulho do gari varrendo na outra extremidade da praça. Numa noite, a Nara Leão me foi apresentada e eu toquei um clássico para ela. O pai da Nara, um grandiloqüente pomposo, falava entusiasmado: "Olha, minha filha, isso é que é música", e a Narinha respondia: "Eu entendo, pai. Mas não é isso que quero." Que-ria seguir a Bossa Nova, tinha personalidade forte e não se deixava levar pelo papo do "papi". Ela me deu o seu telefone do Rio. Morava na Nossa Senhora de Copacabana. Fui transferido para o Banco Comercio e Industria de Minas Gerais no Rio. Nessa época, eu tinha duas calças -uma que espetava e a outra que espetava também. E tinha duas camisas de mangas compridas que usava para trabalhar no Banco. À noite, lavava uma e esperava secar para usar no dia seguinte; quando chegava do banco, suado, lavava a outra e ia revezando. Até que fui convidado a ir até a casa da Nara. Levei meu violãozinho - o que meu pai consertou. Lá chegando, dei de cara com Carlinhos Lyra, Baden Powell e outros que não lembro mais. Todos vestidos com calça jeans, tênis, camisas xadrez, etc. Eu, de sapato, meia e camisa social, sem gravata - e com um paletó das lojas Ducal, bem cafona. O pai da Nara dizia: "Tira o paletó, meu jovem", e eu dizia "Não senhor, está tudo bem". A verdade é que, além de formal, e não ter outra roupa, eu não tirava o paletó porque a camisa tinha um puído na curvinha da gola (parte de trás do pescoço). Que vergonha, meu Deus! Todas as noites passava por aquele pesadelo. Pensava comigo: "Se você quer ir à casa de Nara, tem que ir assim, de camisa puída. O que se há de fazer?". E lá estava eu, e lá estava o pai dela se deliciando: "Tire o paletó meu jovem". Mas eu não tirava. Eu ganhava três mil e oitocentos cruzeiros por mês no Banco. Quando fui trabalhar em cinema, passei a ganhar sete mil cruzeiros por semana! O que fiz com meu primeiro salário do cinema? Comprei a melhor calça jeans, tênis, camisa esporte. E fiz questão: fui de paletó só para ouvir o vozeirão do pai da Nara. "Tire o paletó, meu jovem". Naquele dia, imediatamente tirei o paletó e disse: "Onde é que eu penduro?". E todo mundo riu... Foi a minha ascensão social, entrei para a sociedade. A Nara tentava me dar aula de Bossa Nova. Mas eu não conseguia aprender. Não sei cantar e tocar ao mesmo tempo. Ou toco ou canto. Fazer ritmo e cantar, não sei fazer. Mas fiquei muito amigo dela. Foi um momento muito bonito. Capítulo IV A Terra Treme Quando o Roberto trabalhou com a família Macedo, o Watson disse que queria fazer um filme comigo - eu seria filho de um casal de pescadores interpretados pelo Anselmo Duarte e Eliana Macedo. Eu era muito garotinho mas o convite, assim como o desejo de fazer cinema, permaneceram. O Roberto perguntava: "Você seria capaz de fazer o que o Mickey Rooney faz, por exemplo?". Eu olhava o Mickey Rooney na tela, via o cara dançar magistralmente. Mas como queria fazer o filme, dizia que sim, que fazia até melhor que o Mickey. Cresci com esses sonhos. Um dia apareceu um homem em Friburgo, um cantor lírico aposentado e conhecedor da arte de representar - o Adacto Filho. Disse haver trabalhado com o Nelson Rodrigues. Mudou-se para cima do estabelecimento comercial do meu pai. E nós começamos aquela ronda, "Tem um cara aí que é bom, é professor de teatro". Eu pensei "Vou procurar esse cara". Junto a um amigo, batemos na porta, ele abriu, e eu imediatamente falei: "Queria que o senhor me ensinasse a representar". Ele respondeu: "Eu não posso ensinar você a representar; mas posso te dar al-guns elementos de interpretação. Você é que vai me dizer se tem ou não o dom; ou se isso não passa de fogo de palha". E nossas primeiras aulas teóricas começaram ali, em cima do açougue do meu pai, o Açougue Esperança Telefone 1222. Outro amigo se juntou a nós, mas desistiu. Melhor dizendo, os dois desistiram, eu prossegui. Antes de morrer, o Adacto me deu alguns livros de sua biblioteca: As obras do Shakespeare, um estudo sobre riso do Bergson, um tratado sobre a arte do ponto de vista sociológico de Guyau, um naturalista francês; um livro de dicção de Columbar D’elisère. Foi roubado, porque nunca mais vi. Permaneci com todos aqueles livros, sem ler. Um dia, na casa da família do Luiz Carlos Barreto, estávamos almoçando com o José Barreto, Didimo, Siomara, Luci e um poeta chamado Mário Faustino - que, de súbito, me perguntou: - Você é ator? -Sou. -Já leu Macbeth? - Não, quem é esse cara? -Não sabe quem é Macbeth? -Não. - Um bom ator tem a obrigação de conhecer Macbeth. -Mas quem é Macbeth, poxa? -É personagem de Shakespeare, já leu? -Ainda não li, mas tenho toda a coleção de Shakespeare lá em casa. Ele sorriu e completou: -Não precisa mentir. Compre um livro de cada vez, ou então eu te empresto. Estávamos comendo um vatapá. Quase me enterrei naquele prato. Com o Adacto, aprendi o be-a-bá. Estudava o significado dos textos, o que eles queriam dizer. Trabalhávamos com Camões: "Alma minha gentil que te partiste tão cedo desta vida descontente". Ele ensinava: "É preciso sentir, neste poema, que "você" está aqui (aponta o coração) e "alma", no firmamento (aponta para o alto). Projete a voz ao dizer "alma" jogando-a para o firmamento, e diminua a projeção ao dizer "minha". E assim repetíamos inúmeras vezes. Era um trabalho minucioso onde buscávamos separadamente a intenção ou entonação do texto. Por exemplo: dizíamos "alma" dezenas de vezes; depois dizíamos "minha", também dezenas de vezes; depois uníamos as palavras e sentíamos a diferença, nos surpreendendo com o efeito. Geralmente, dizem assim, de forma monocórdica "Alma minha e gentil que te partiste tão cedo desta vida descontente", e acabou. Essas foram as minhas primeiras lições de interpretação. Isso sem eu conhecer o bandido do Stanislavisk. Até que, finalmente, eu vim para o Rio de Janeiro dar prosseguimento aos meus estudos de violão clássico. Deixei o Banco e fui fazer um teste na empresa telefônica, gerenciada pelo patrão do meu futuro sogro - que acabou não sendo porque não me casei com a filha dele. Sentado numa cadeira de jacarandá, ele girava para todos os lados e me bombardeava com perguntas sobre telefonia. Não me encarava, olhava para cima parecendo gozar, gozar consigo mesmo. Depois me mandou para um depósito da empresa, um porão quente, sem ventilação, superlotado de catálogos, blocos, arquivos, para datilografar alguns títulos de cobrança. Não eram alguns, eram duzentos! Fui embora, deixando um bilhete para ele: "A telefonia é a teledistância que mede uma pessoa sentada numa cadeira de jacarandá com a tele-distância da outra que não está mais aqui". E me mandei. Consegui uma transferência na mesma agência bancária em que trabalhava para uma agência na Rua da Alfândega. Trabalhava das onze às cinco e saía correndo para chegar na Praça Mauá a tempo de pegar o ônibus ainda vazio. Eu morava em Copacabana, na casa do Roberto e Zeza, sua esposa. Era um minúsculo apartamento no qual a generosa Zeza dedicava seu espaço e paciência aos três irmãos, porque lá também estava o Riva. O primeiro filme do Roberto foi Rico Ri à Toa, em 1957. Eu já estava doido para sair do banco e trabalhar com ele; para colocar em prática as aulas do Adacto Filho e concretizar o sonho adiado através da promessa do Watson Macedo. Então, o Roberto me disse: "Olha Reginaldo, o cinema no Brasil é aventura, a profissão não é regulamentada, artista de cinema é considerado vagabundo ou veado; mulher que faz cinema tem fama de puta, é tudo discriminado. Se você quiser vir, venha". E eu fui. Mas comecei como assistente de câmera, minha primeira função num set cinematográfico. No primeiro dia de filmagem, eu estava desarranjado. Falei com meus irmãos. Eles responderam: "Nós também". Todas as manhãs tomávamos um complexo vitamínico chamado Poliplex. Um dia alguém tomou e disse: "Pronto, já tomei o meu Kinevox", que era o nome de um aparelho de som. O complexo vitamínico era forte, inevitavelmente provocava um arroto. Aí outro dizia: "Pronto, já arrotei o meu Kinevox". E desta forma sonora éramos felizes. Bem... Meu começo foi inesquecível - fazendo foco na bunda da Violeta Ferraz, que era enorme, e no Zé Trindade, que era pequenininho, menor que a bunda da Violeta Ferraz. A primeira câmera com a qual trabalhei era um modelo francês muito pesado chamado Superparvo. Parecia um caixote, o tripé era enorme, o cabeçote do tripé também, contendo um parafuso imenso. E ali eu tinha de encaixar o caixote, ou seja, a câmera. A lente da câmera tinha uma mínima tolerância de foco, por isso não acertava. Ou era Violeta ou era o Zé. O limite de foco para frente e para trás, na relação ator e câmera, era crítico. O ator só podia mover-se uns 10, 15 centímetros no máximo, e eu tinha de ajustar manualmente. Imagine isso com os dois dançando. Pior ainda. O cameraman era o Gilberto Azevedo. Mais tarde transformou-se num grande fotógrafo, filmou fora do país. Ele me dava as dicas, mas na hora de filmar eu tinha que segurar a onda sozinho. Era um trabalho árduo. Carregava chassi, um rolo de trezentos metros, ou seja, uns dez minutos de filme, e montava-o no quarto escuro, mexendo com a parte gelatinosa do negativo apenas com o tato para não carregar errado. Era um mundo novo, artesanal, belíssimo e mágico. Não havia essa tecnologia avançada, de ponta, como hoje. Fazíamos tudo no olho, com sensibilidade, sem vídeo assistant (que é um monitor de TV acoplado a um vídeo, usado para acompanhar as cenas ao mesmo tempo). Nós esperávamos uma semana pelo resultado da revelação para ver a cena. Ao acabar a cena, o Roberto perguntava "Foi bom para você?" "Foi", respondia o câmera. "Foi bom pra você?" "Foi", respondia o iluminador. E assim sucessivamente até o contra-regra. "Então copia", e mandava para o laboratório. Quando fomos ver as cenas daquele dia, as minhas primeiras cenas, o erro estava lá, no Zé Trindade e na Violeta. Justamente nas celebridades da época. De qualquer forma, foi uma estréia e tanto. Filas de dobrar quarteirão. O segundo filme do Roberto, No Mundo da Lua, contava com o cantor Aldair Soares para fazer o galã. Só que, no dia da filmagem, ele desapareceu. Roberto imediatamente começou a procurar um substituto. Olhares percorreram a sala. O Riva, mais boa pinta, respondeu imediatamente: "Eu tô fora!" - então o olhar sobrou para mim. Passei uma semana fazendo testes no apartamento do Roberto. Às vezes, tinha vontade de dar uma porrada na cara dele, colocar meu violão embaixo do braço e voltar para Friburgo, para a casa da mamãe e do papai; outras, eu chorava mesmo, impotente. Não conseguia. Mas o Roberto foi verdadeiramente o meu grande mestre, me deu os verdadeiros toques. A intimidade câmera, fotógrafo e fotografado já existia entre nós. Eu era menino e posava para Roberto, fingindo chorar, fingido alegria, raiva. Já era modelo fotográfico dele. Um dia, ele me disse: "Quando acontecer uma determinada situação em que você tenha se emocionado bastante, procure repetir a emoção logo depois. Você vai registrar isso como ator". Uma grande sacada. Eu estimulava minhas emoções diariamente, buscava a memória emotiva recente. O Roberto já tinha isso em mente sem nunca ter lido o bandido do Stanislavsk. Até que fiquei pronto. No filme, representei um paude-arara ao lado do Walter D’Avila. O caminhão parava na praça de São Cristóvão, no Campo de Santana. A primeira cena acontecia com os paus-de-arara descendo da carroceria do caminhão. Inesquecível. Eu estava tão nervoso que, ao saltar, minhas pernas tremelicaram. Quase caí no chão! Como se aquilo fosse parte da cena, continuei. Então o Roberto gritou "Corta", e eu sem saber se ele havia gostado. O diretor de fotografia, Landini, um argentino, percebendo o meu pânico, puxou uma salva de palmas para me estimular - me dar força. E o Roberto então completou: "Essa valeu!". Argentino boa praça! Outro boa praça foi o Walter D’Avila. Olhou para mim e disse com aquele sorriso brincalhão: "Não se preocupe. Isso vai acontecer milhões de vezes em sua vida." Não deu outra. Mas sei que, com aqueles aplausos, passei a me sentir seguro. Perdi o medo de trabalhar em cinema, me senti o "rei da cocada preta". No fundo é disso que o ator precisa, o poder do aplauso. Finalmente, fiz um filme com o Watson Macedo: Agüenta o Rojão, com Araci Rosas. E lá veio uma cena de beijo. Disseram que eu não sabia beijar em cinema. Beijo em cinema é diferente. Não pode agarrar a menina e dar logo um chupão senão sua boca parece uma bola murcha. Chorei muito naquele dia atrás das grandes palmeiras imperiais da Brasil Vita Filmes, a produtora responsável. Serviu como estímulo, como luta, busca. Fiz aulas de teatro aqui e ali. Na época, não havia escola de teatro. Isso era raro, privilégio de outros. Fiz aulas de voz com a Lilia Nunes, o Renê Talbat, e, finalmente, com a Rita de Cássia. Lia tudo que me aparecia pela frente tentando enriquecer meus conhecimentos. A base da minha técnica é o verbo. Vi uma entrevista com o Marcelo Mastroianni que, para mim, foi o toque final. Ele dizia que, quando a bruxa bate, os personagens saem. Bruxa é inspiração. Não se consegue ponderar. De uma forma ou outra, o personagem chega. Quando se cristaliza uma idéia através do verbo, ela passa a fazer parte do seu comportamento, do que você pensa, do que quer realizar. E dá vida a uma outra personalidade, diferente da sua. O ator não pode se basear só através da técnica absolutamente racional, sem antes passar pelo conhecimento profundo do verbo. Uma criança, para fazer-se entender, expressa-se através dele. Primeiro, tem de aprender e viver o verbo. O verbo em teatro é texto. O que o autor diz e vem através do texto. Sabendo o texto, o entendimento racional passa a existir, porque é através da fala que nos expressamos. É óbvio que, para estudar os personagens, recebemos informações a seu respeito. Mas elocubrar informações, sem expressá-las através dos ensaios, das falas, enfim, do verbo, é algo extremamente enfadonho. Sendo redundante, insisto em dizer que o ator pode ter a história, o entendimento, a racionalização, o lugar, os momentos políticos, etc. Mas, se não vivencia aquilo tudo, não pega o real sentido, não incorpora, fica apenas com as informações. O estudo do movimento corpóreo, o entendimento do movimento espacial, a impressão fotográfica, a música, o figurino, o ritmo posto em cena, esses elementos dão o entendimento do personagem. E ainda, se sabemos o texto, através do verbo, tudo flui porque nos libertamos daquilo que a priori parece obstáculo. Porque a gente sabe que o personagem chega em algum momento; porque ele pode vir de várias maneiras, às vezes vem de carro, noutras demora para chegar. Mas chega. Para mim, hoje, depois de tanto tempo, às vezes um simples movimento de alguém, um simples sorriso, me inspiram para um determinado personagem. Se você vir uma folha cair de uma árvore, pode ter um belíssimo insight, ou se achar que a folha naquele local vai oferecer um belíssimo quadro, ou uma belíssima fotografia, pronto, o caminho da magia se abre. O verbo cria, depois vem a matéria. Primeiro fez-se o verbo. Gosto do naturalismo, realismo. E gosto de humor em tudo. Adoro os comediantes italianos -Vittorio Gassman, Hugo Tognazzi, o Totó, o diretor Mario Monicelli e o próprio Mastroianni fazendo comédia eram sensacionais. O cotidiano que nos faz rir. A forma bem-humorada de olhar para a vida me atrai como ator, diretor e, quem sabe um dia, como escritor. Quando comecei a escrever roteiros, era espasmódico, dominado pelo impulso. Começava e ia até o final. No roteiro de Agüenta, Coração, escrevi das seis da manhã até três da madrugada do dia seguinte, direto - só parava para tomar café, comer pão, circular. Hoje me controlo. Percebi a disciplina e, acima de tudo, paciência. Controlar os limites, senão atropela-se o processo. Agora apenas registro uma idéia, coloco uns diálogos de referência e paro. Às vezes de qualquer maneira, sem forma, com erro de português mesmo. Depois, gradativamente, ela ganha forma. Vou decorar capítulo de novela, ler meus livros. Às vezes, ao ver televisão, filme, uma cena me remete àquela idéia. Saio dali e corro para o computador. Neste estágio, com as idéias fervilhando, posso acordar de madrugada e correr novamente para o computador. Registro aquilo e volto a dormir sossegado. Em determinado momento, a história começa a falar por si só. Os personagens já têm vida própria e me conduzem, sugerem caminhos. Já não sou dono deles. Ensinam-me até a sua forma de falar. Deito por volta de meia-noite, levanto oito horas da manhã todos os dias. Sou um reloginho; faço natação, ando, faço yoga, bicicleta ergométrica, estrategicamente colocada diante da televisão. Respeito meu corpo. Dizem que por vaidade. Respondo: "Questão de saúde, necessidade de respirar melhor". Uma vez me flagrei respirando mal. Fumei até os trinta anos e parei ao ver meu pai morrendo aos poucos com o maldito enfisema pulmonar. Sou melhor respirando bem. Uma certa ocasião estava lendo Rainer Maria Rilke, Cartas a Um Jovem Poeta, e não entendia certas coisas. Aquilo me fazia mal. Eu encontrava meus amigos na praça, no cinema, no bar, e todos eram sempre muito alegres, cada um aparentemente com o seu assunto resolvido. Eu pensava: "Alguma coisa de errado acontece comigo". Carregava o peso do não-entendimento. Então, dizia para eles: "Desculpem. Preciso ir, tenho que respirar". Corria para casa, pegava o livro e estudava até entender, até fazer senti-do, até poder respirar de novo. Capítulo V Pai Patrão A melhor forma de um ator se dar bem com certos "diretores" é a de se adaptar imediatamente ao que eles pensam. E também a melhor forma de eles se sentirem bem é a de ficar sabendo disso. O possível atrito ou confronto de opiniões desaparece. De minha parte, aprendi a não tentar expor o que penso porque toda a vez que tentei, só levei fora. Uma determinada cena poderia ser feita de outra forma - e ficaria melhor. Mas quando comentava, o diretor respondia: "Essa cena tem que ser feita da forma que eu quero". Ou seja, da pior maneira. Depois de ter levado algumas dessas, resolvi dar uma anulada nesse meu lado colaborador e fazer estritamente o que o dire-tor pensa. Foi difícil. Conheço todos os processos de produção e sei quando os erros estão acontecendo. Não é conformismo, é claro, o limite do "conhecimento" de certos diretores vai até eles darem um berro com você. Um dia, estávamos no estúdio eu, Marília Pêra, Francisco Cuoco e vários outros atores famosos. E o diretor gritou lá da suíte: "Não interessa quem está aí dentro, se é ator, figurão ou famoso. Todos têm que fazer o que eu mandar!" É importante deixar claro que respeito a opinião de outros diretores. No fundo, quem conduz toda a história precisa ter a noção do todo. Por isso, o diretor está apto a tirar os excessos ou pedir mais dos atores. Vê a emoção de cada cena, vê se a câmera está no tempo, no ritmo da cena. É senhor da situação. Mas não é Deus, e sabe disso. Outros, não. Como diretor, eu decupava todas a cenas antes de entrar no set; sabia cada movimento, cada plano dos atores, e, como atuava no mesmo filme, pedia ao meu assistente de direção para fazer os meus movimentos. Depois, eu ia para o cenário e ele assumia a direção. Sempre procurei aprimorar a técnica. Quem me ajudou muito foi o José Medeiros. Foi ele quem realmente fez com que eu entendesse os segredos da câmera, das lentes, etc. A um diretor novo - e tem tantos atualmente - eu diria que se dedique a tudo que acontece num set cinematográfico. Desde uma parede pintada no cenário, um chão mal-varrido, um figurino malfeito, um refletor com luz rebatida, os movimentos do travelling, o tempo da zoom, dos mínimos detalhes de cada cena até o funcionamento da cabeça dos atores. Caso contrário, ele perde o controle no primeiro dia. O diretor é o senhor de um conjunto e deve saber tocar esse conjunto; deve exercitar a linguagem narrativa; deve respeitar os limites e o melhor momento de cada ator, trabalhar com liberdade para que se sintam bem em sua própria concepção ou criação. Se o diretor marca tudo justinho, dá todos os tons sem a menor chance de variar um pouco, o ator fica aprisionado, não rende o melhor de si. Existem atores que inflexionam mal, deixando os outros de "saia" justa. A esses, dedico atenção diferenciada. Levar um papo com eles, argumentar a partir do entendimento do personagem e jamais pedir que te imitem. Também peço aos atores que olhem pelo visor da câmera, para entenderem o que está no quadro. Comecei fazendo cinema como assistente de câmera, via o filme passar no visor. Quando atuava, sempre pedia ao diretor de fotografia para dar uma olhada. O ator se sente mais seguro sabendo o que está acontecendo pelo olho da câmera. Outros atores preferem trabalhar o sentimento interno do personagem, sem ter essa noção. De certa forma, têm razão. Representar, e ao mesmo se vigiar, nos dá a impressão de fugir do personagem e deixar somente o ator como vigia ou como seu próprio diretor. Quando pensam que há um outro ângulo de visão da situação, podem se perder. Ficam sem noção dos espaços. Mas acontece que, com a minha experiência em cinema, percebi que a imagem vista pela câmera se incorpora à sua imaginação, se apropria da sua mente, de dentro para fora. Você tem o visual. É como contar uma história e imaginar "eu subi a escada" e você está se vendo subir a escada. Um olhar no cinema, num plano fechado, significa dez vezes mais do que um olhar exagerado no teatro. No palco, estamos constantemente em plano geral. Então, o que acontece: a imaginação do ator trabalha os seus próprios planos. Se o ator está no proscênio - focalizado pelo trabalho de luz - e a cena é absolutamente intimista, ele, obviamente, estará em plano próximo. Conseqüentemente, poderá imaginar-se assim. Nunca existe somente o personagem, há um vigilante que é você mesmo, o ator. Tento pesquisar e analisar o que o público quer ver. Tento fazer baseado neste parâmetro e estar sempre em sintonia com a realidade daquele momento. Caso contrário, eu me violento e posso cair num gosto popular questionável. Não existe receita, mas inspirações que levam ao sucesso ou ao fracasso. Tal inspiração pode estar coerente com o que você pensa para determinado público. Mas pode não estar. Não sei escrever nem dirigir sob encomenda. É lógico que sou o meu primeiro público. Quando me apaixono por uma história, e tento ver se ela vai pegar ou não, é porque já vi com olhos de profissional e com olhos do público. Por exemplo, eu tentei escrever um roteiro para minha mulher, Roseh, que é cantora e atriz. Mas, como encontrar o conflito? Talvez criando a história de uma cantora que faz sucesso e outra que a inveja. Pronto, estava criado o primeiro conflito. Mas em relação ao público? Que gênero de música ela cantaria? Qual classe de público compraria seus discos etc. Daí, comecei a buscar diversas situações além da inicial. Ao imaginá-las, eu penso como público. O que vai acontecer? Existem milhares de conflitos - em Shakespeare, o grande achado entre os Capuleto e os Montéquio; com outros auto-res, a menina pobre e o homem rico; são arquétipos que estão prontos a serem recontados a partir de novas idéias, com pessoas diferentes e em épocas diferentes. Eu não gosto de escrever por encomenda, gosto de histórias originais. Mas, há alguns anos, fiz uma adaptação de um conto do maravilhoso Plínio Marcos, chamado Nas Quebradas do Mundaréu. No filme, intitulado como Barra Pesada. Festa dos Libertos, meu próximo projeto, é uma história feita com pinceladas extraídas da coleção Histórias da Vida Privada no Brasil. Não há uma história completa, mas fatos, características e situações como, por exemplo, o escravo que não pode usar sapato porque o estatuto da escravidão proibia-os de usar sapato. Peguei esse fato e fiz uma história. Há outra de uma escrava que tinha os dentes lindos e um dentista se apaixonou por ela. É um mosaico de situações. Capítulo VI Os Boas-Vidas A idéia de fazer Os Paqueras surgiu em meados da década de 60. Havia diversas expressões para ir atrás de uma mulher, como "cantar", "dar bola", "flertar", "piscar o olho". Até que veio "paquerar". Nos áureos tempos de Copacabana, onde eu morava, tinha a turma da paquera. O bairro era fascinante com seus cafés, bares de beira de calçada, praias e os bondes passando. Era a coisa mais bonita de se ver. Andar na rua, ver pessoas bonitas passeando, era o máximo. Se duvidar, até os travestis eram bonitos. Eu bolei a história ali, observando as cantadas... ou as paqueras. Como um paquerador jogava o papelzinho para a mulher. Fazia um aviãozinho com o papel e nele estava o número do telefone; como, discretamente, as mulheres liam; davam sinais de positivo e marcavam encontros. Era uma malandragem diferente daquela do malandro carioca tradicional. Esse cotidiano foi servindo de base para a história. Tinha mais a ver com o playboy, numa concepção mais simples. Outros indivíduos eram mais ousados. Chegavam na orelha das meninas e falavam um monte de histórias. Levavam um tapão ou um sorriso. Arriscar não custava, se desse certo, ótimo, se não, tudo bem. Daí vem um tipo de humor carioca que se perdeu ao longo do tempo. Hoje, a paquera é agressiva e o paquerador é jurado de morte ou acaba com um traumatismo craniano. Eu registrei uma época de humor. Lógico que, na vida real, deve ser muito chato saber que sua mulher levou uma paquerada, mas, no cinema, traduzia-se em humor. Divórcio à Italiana com Marcelo Mastroianni foi assim: havia cantada, havia humor. Em nossa empresa, só o Roberto era diretor, o Riva não queria dirigir. O Roberto me falou: "Você não quer dirigir?". "Quero", respondi. Já tinha sido assistente dele em diversos filmes, como, por exemplo, Roberto Carlos em Ritmo de Aventura. Então topei. O Rogério, nosso irmão mais novo, estava chegando e já o coloquei como boom-man. Comecei a dirigir Os Paqueras em preto e branco. Quando o Roberto e o Riva viram o primeiro copião, resolveram passar o filme para colorido. Então, nós criamos um efeito de laboratório para o preto e branco ficar sépia - e usamos estas imagens na abertura do filme. Escrevi o roteiro com dois amigos, o Xavier de Oliveira, diretor do filme Jipe Sem Capota, que mais tarde passou a se chamar Marcelo Zona Sul, com o Stepan Nercessian; e o André José Adler, um amigo que era a cara de Copacabana. Hoje, ele é comentarista da ESPN e mora nos EUA fazendo comentários sobre o futebol americano. Começou na TV Tupi, ainda bem garoto, e foi o primeiro Pedrinho do Sitio do Pica-Pau Amarelo. Atualmente, também está em cartaz no Rio com a peça Jardim das Borboletas, um infantil que entra e sai de cartaz há 30 anos. Conhecia Copacabana como a palma da mão, me dava todas as dicas. Enfim, apresentou-me àquele mundo. Durante a produção do roteiro, nós decidimos fazer um laboratório completo sobre as coisas do bairro. E ele me levou para fazer uma entrevista com uns caras que fumavam maconha. Aquilo para mim era a própria transgressão. Eu acreditava estar correndo um grande risco. Houve até um pequeno ritual para tal situação. Entramos no apartamento do cara com microfone e gravador Nagra para registrar suas reações. Ele espalhou talco de bumbum de neném para afastar o cheiro, e ficamos com cheiro de criança o dia inteiro. Que ridículo. O personagem do filme, Nonô, fazia o vestibular, passava e não entrava na faculdade - era considerado excedente por conta do número de vagas. Já estava cansado de ser "formado em excedente". O pai, inconformado, exigia suas aplicações no estudo. "Mas pai, eu estudo, já passei, mas não consigo entrar na faculdade, eu sou excedente". O pai não entendia o que significava "excedente". E já que o Nonô era excedente, paquerava. Tinha um amigo fotógrafo, mais velho, um grande "comedor", que transava com o Rio de Janeiro inteiro. Era rico e tinha um carrão. Automóvel causava impacto, era o próprio charme dirigir, botar o braço para o lado de fora e deslizar pela Av. Nossa Senhora de Copacabana. As mulheres achavam sensacional. Na história, meu personagem conhece a filha do fotógrafo, sem saber que ela é filha dele, e apaixona-se por ela. O cara descobre que a filha está grávida. Essa é a trama principal. Fizemos a primeira exibição no estúdio de dublagem do Severiano Ribeiro. Estavam presentes o Roberto, o Luiz Carlos Barreto e mais algumas pessoas. Acabou a exibição, a luz acendeu e fez-se aquele silêncio sepulcral. As pessoas foram levantando lentamente, eu fui me enterrando na cadeira, pensando "Que merda que eu fiz!". Os comentários foram... "É bom, é legal", no máximo. O filme entrou em cartaz na semana do carna val. Ninguém na fila, muito menos na bilheteria. A gente passava de carro pelos cinemas, olhava e nada. Como era carnaval, o Lívio Bruni deu um desconto e dobrou a semana. Quatro pessoas, oito pessoas, dezesseis, e o filme foi pegando. E permaneceu semanas em cartaz. O bocaa-boca foi positivo. Foi um sucesso, a segunda maior bilheteria da época, só perdeu para o primeiro filme da série James Bond. Eu não era apaixonado por filme político, "fil-me cabeça". Na verdade, achava um pé no saco. Mas Macunaíma, adorei de paixão. Assisti mais de dez vezes. O contexto era fazer filme político e tudo se rotulava como "um filme de fulano de tal". Os formadores de opinião alijavam os filmes apolíticos. Radicais, preconceituosos. Era mais ou menos como ser comunista e achar que o resto do mundo é uma merda, ou ser capitalista e achar o mesmo. Eram xiitas que só admitiam suas idéias. O resto que se lixasse. Eu estava influenciado pelas comédias do cinema italiano, que vieram com o neorealismo. Mas queria buscar o lado engraçado, bemhumorado, e não a tragédia social. Queria expor o humor carioca com o qual estávamos acostumados. Na visão desses formadores de opinião, eu era um pornochanchadeiro. Se você vir Os Paqueras hoje, vai encontrar um filme quase ingênuo, filme de carochinha, comparado aos outros que tentaram seguir essa linha. Claro, queriam estourar na bilheteria e apelaram. Era bunda para todos os lados, seios, trepadas de mau-gosto. Quando me lembro da cena em que o Nonô transa com a Margarete, personagem da Irene Stefânia - ambos de roupa - até me arrependo em não colocá-los com as bundas viradas para a câmera, em plano próximo, porque aí seria justificável a opinião desses xiitas. Ainda fiz filmes como Pra Quem Fica, Tchau, Os Machões, O Flagrante, todos comédias. Depois da minha fase de filmes-comédia, interrompi a veia cômica. Fui buscar a realidade com Barra Pesada, Lúcio Flávio, Agüenta, Coração, e ainda o roteiro de Pra Frente Brasil. Então, deixa os fatos falarem mais alto. Capítulo VII Nós que Nos Amávamos Tanto De todos os meus personagens, o Lúcio Flávio foi - e ainda é - um dos mais intensos. Ele foi construído e elaborado numa época em que nós vivíamos em estado de opressão sob o regime ditatorial. Só isso já era um componente emocional muito importante. Estava no inconsciente coletivo. Existia em mim inconscientemente ou eu poderia acessá-lo intuitivamente. O filme foi apontado como um dos dez filmes brasileiros mais importantes na época. Feito sob o regime de exceção, e, embora não seja um filme político contra a revolução, é um filme contra a corrupção da polícia: o Esquadrão da Morte. Não era uma bandeira contra o governo, não tinha essa ideologia. Era uma história baseada em fatos reais. E foi muito importante para mim, como ator, como homem, como profissional. Os locais de filmagem eram ameaçadores. Com o processo de filmagem, percebi que me defendia. Meu instinto de preservação estava eriçado. Só que, ao me defender, passei a ser o personagem, o Lúcio Flávio, que também se defendia absurdamente. O José Louzeiro, autor do livro no qual a história foi baseada, me lembrou que todos esses bandidos não dormem, vivem em estado de tensão, não ficam doentes, a defesa imunológica deles jamais falha, porque estão sempre em estado de alerta. Deu-se o mesmo comigo. Fiquei em estado de alerta constante. Meu medo fez com que eu encontrasse o medo do personagem. Foi a hora da bruxa. Um dos momentos símbolos dessa hora aconteceu na seqüência em que eu caminhava no pátio do presídio Frei Caneca. Era um plano geral, a câmera estava "malocada" e o Babenco me empurrou para dentro do presídio sem avisar aos presidiários que nós estávamos filmando. Para todos os efeitos, eu era um bandido também, um prisioneiro. Então, estava sujeito a qualquer tipo de coisa lá dentro! Passei por um cara que estava afiando um pedaço de pau com um estilete. Ele apenas levantou os olhos, sem parar de afiar. Para mim, foi um olhar absolutamente ameaçador; para ele, aquele momento podia ser traduzido em rotina, sem a ameaça que eu senti. Mas mesmo assim, me caguei de medo! Mais tarde, o Babenco revelou que estávamos filmando e o processo passou a ser outro: eles queriam participar, ficaram felizes. A maioria dos presos acreditava que o Lúcio Flávio não tinha morrido. A tensão, o medo e a crença me transformaram no próprio Lúcio Flávio. Todo o trabalho neste filme foi uma mistura de real e fantasia muito intensos. Houve uma outra cena, num apartamento, em que eu tinha que levar um sujeito para dentro do quarto, empurrá-lo pela nuca até encostar a cabeça dele no parapeito da janela e dar um tiro. Esse sujeito era um policial - representando um bandido - cinco vezes mais forte do que eu. Eu fingia estar empurrando o bandido, mas estava mesmo era sendo arrastado por ele. Meu cotovelo batia nos cantos das portas, eu sentia dores horríveis. Quando assisti a primeira projeção, ao lado do José Medeiros, eu disse: "Zé, esse cara não sou eu". Foi a primeira vez que vi um persona-gem completo, porque nem eu mesmo me reconheci ali. Depois das filmagens, esvaziar todas aquelas emoções até voltar a ser Reginaldo novamente foi um processo extremamente difícil e lento. Eu queria estar em casa, na piscina, na praia, na loja, no cinema. Queria estar com a minha família, tocando meu violão, enfim, subir a montanha de Friburgo. Foi complicado. Restava ainda viver o sucesso do personagem, dar entrevistas, explicações. Aquela corrente de emoções e sensações estava à es preita, pronta a ser reativada. Só o tempo aca bou com ela. No livro de Guyau, aquele que ganhei do Adacto, havia um toque magistral que dizia: "É preciso compreender o quanto a vida sobrepuja a arte, para colocar na arte a maior quantidade possível de vida". Li aquele livro na juventude e segui aqueles princípios sempre. Quando escrevi Pra Frente Brasil, por exemplo, roteiro meu e do Paulo Roberto Mendonça, estava imbuído dos fatos que aconteciam ao nos-so redor. Intensos e bastante reais. O filme conta a história de um sujeito que é preso por engano ao sair do aeroporto. O título original era Sala Escura, porque acontecia dentro de uma sala. O indivíduo, sob a pressão dos interrogatórios, contava a história em flashbacks. Até sua morte. O roteiro passou a existir através de um fato real, acontecido comigo. Peguei um avião para São Paulo e me sentei ao lado de um sujeito muito inteligente. A gente começou a conversar sobre diversas coisas, falar sobre o que estava acontecendo, situação política do país etc. Chegando em São Paulo, fui pegar um táxi. Ele virou-se para mim e perguntou "Você está indo pra onde?" Eu respondi e ele sugeriu "Então, vamos juntos. A gente vai conversando". Caminhamos para o táxi. Mas a boa e velha intuição que sempre me acompanha bateu em mim e disse para eu não ir com ele! Falei: "Olha, me lembrei que preciso pegar uma encomenda aqui aeroporto. Obrigado, não vou agora". O cara entrou no táxi, eu dei um tempo e peguei o meu. Mais adiante, o táxi dele estava parado, cercado por vários soldados apontando metralhadora. O cara estava preso. Imagina se eu estivesse com ele? Nem sei porque ele foi preso, se era de esquerda, se era bandido. A imagem dele não apareceu nos jornais, nunca mais o vi. Daí nasceu a idéia do filme. O resto foi ficcional. Eu nunca fui interrogado, não convivi com filiados. Conheci intelectuais insatisfeitos com o regime, tanto quanto eu. Na época, sempre surgia um exibicionista dizendo ter sido exilado. Eram panfletários querendo ter alguma importância, dizer que também eram politicamente engajados e que estavam contra o regime. Uns babacas. Havia uma espécie de policiamento ideológico. Se o sujeito não se colocasse desta forma, era considerado um alienado. Então, tinha que se enquadrar. Mas, para escrever Pra Frente Brasil, eu não tive esse tipo de conversa com ninguém. Durante o regime militar, fiz um filme que pas-sou pelo crivo da censura. O Ziraldo fez o cartaz e sugeriu o título: Os Bonecas. Era a história de três caras duros precisando sobreviver, representados por Erasmo Carlos, eu e o Flávio Migliaccio. O Erasmo foi premiado com a Coruja de Ouro - um prêmio que tinha no Rio de Janeiro - como melhor ator coadjuvante. Os três personagens desempregados tentavam alguma colocação. Limpavam vidros de automóveis, faziam pequenos expedientes etc. Até que um dia, um deles, o personagem do Flávio, desolado, sentado num banco de praia, vê uma mulher piscando os faróis do seu automóvel para ele. "É comigo?", ele pergunta. Ela confirma e eles saem juntos. Como eram muito amigos e não pegavam ninguém há muito tempo, o personagem do Flávio é forçado a dividir a mulher com os outros dois. Na hora "H", eles descobrem que a mulher é um travesti! O personagem do Erasmo fica indignado, bate no travesti. Só que depois eles descobrem que o travesti é funcionário de um salão de beleza e oferece emprego para eles. Espertos que são, percebem que, através daquele trabalho, poderão conquistar as mulheres. E entram para uma academia onde aprendem os trejeitos afetados dos cabeleireiros. Engraçado é lembrar que anos mais tarde, o Warren Beatty fez o filme Shampoo e eu mesmo acabei fazendo um costureiro que ficou famosíssimo na novela Tititi - o Jacques Leclair. Em Os Bonecas, o personagem do Flávio tem ejaculação precoce e não consegue conquistar as mulheres. Desiludido, ele vira um travesti no final do filme. Mas a censura não aprovou. Ele teve que se "recuperar" com a Elke Maravilha, bancando o machão. O título do filme também foi censurado. Passou a ser Os Machões. Sem querer, a censura colaborou. Afinal, o filme fazia a crítica ao chauvinismo. Noutra situação, os três disputam uma mulher na "porrinha". O personagem do Flávio perde e vai ao banheiro. A cena tem uma passagem de tempo até ele sair, aliviado. Não mostra o que se passa lá dentro. Mas a censura mandou a tesoura também. Na mesma linha de humor, fizemos Pra Quem Fica Tchau. Historinha romântica com Stepan Nercessian. Ele, menor de idade, foge de casa e vem para o Rio de Janeiro. Conhece uma linda mulher, mais velha - Rosana Tapajós - e se apaixona por ela. Este não foi censurado. Na década de sessenta, cada cineasta fazia um filme de 30 minutos. Três filmes formavam um filme de noventa minutos e, assim, até por questões econômicas, os produtores podiam realizálos. Trabalhei num desses ao lado da belíssima e talentosa atriz Vera Viana, ABC do Amor, do Eduardo Coutinho, excelente diretor de cinema. Em Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura, dirigido pelo meu irmão Roberto, eu fiz assistência de direção e participação especial como ator - uma metalinguagem com um personagem engraçado, um diretor de cinema. Foi uma homenagem bem humorada ao pessoal do Cinema Novo. Mas foi no filme Roberto Carlos a 300 km por Hora, que tive o prazer de trabalhar ao lado dos dois: Roberto Carlos e Erasmo Carlos (que não esteve em Ritmo de Aventura). Daí nasceu a idéia de chamar o Erasmo para trabalhar em Os Machões. Lembro-me de dizer para ele: "Basta sentir e acreditar no que está fazendo e esquecer a imagem do Tremendão. Você, além de grande compositor, cantor, já nasceu ator". E assim fizemos o filme. Até meados da década de oitenta, esses filmes reprisavam na Sessão da Tarde e sempre foram sucessos. Roberto Carlos era um fenômeno de popularidade. Porém, os críticos andavam dizendo que ele estava em decadência, o que, para nós da R.F.F. Produções (empresa da família) se-ria um risco filmar com ele novamente. Assim mesmo, peitamos. O homem é fera, é Rei, e o filme foi outro sucesso. Não posso esquecer de mencionar também que, na década de sessenta, entre um filme e outro, eu, Daniel Filho, Norma Benguel, Hugo Carvana, Jece Valadão fazíamos dublagem para ganhar um trocado a mais. O sistema da época era em anéis - o copião (rolo de negativo) era emendado ponta com ponta e o sinal para dublar era feito através de um buraquinho no copião sincronizado com a fita magnética. Ao girar o projetor, a luz era projetada na tela e ouvíamos aquele barulhinho... "ploc", sinal do sincronismo entre imagem e som. Era o momento que deveríamos começar a dublar. O Daniel Filho ficava de costas para a tela e só virava ao ouvir o som do "ploc" para entrar em sincronismo. Dublei Barravento, do Glauber Rocha. Dublei o Antonio Pitanga, que tinha um sotaque carregado, em A Grande Feira do Roberto Pires. Dublei o Carlo Mossy, outro com sotaque carregado, só que estrangeiro. O filme foi O Estranho Triângulo de Pedro Camargo. Ainda dublei filmes do Alex Vianny, enfim, vários. Já na década de setenta, o Pedro Aguinaga fez um comercial para o cigarro Chanceler, o famoso "fino que satisfaz". O diretor, Bili Davis, não conseguia dublar com o Pedro. Saía da sala de projeção, fumava um cigarro, voltava e tentava novamente. Eu estava lá fora. De repente, o Bili olhou para mim e disse: -É você. - Eu o quê?, respondi ressabiado. -Você vai dublar o Pedro Aguinaga para mim. Ele conversou com o Pedro, que topou. A campanha deu certo, fez sucesso, e, então fizeram um outro comercial - sem eu saber - com o Pedro. Recebi um telefonema da empresa do Bili. -Reginaldo. É o seguinte, o Bili disse pra você vir dublar o Pedro Aguinaga. -Dublar o quê? -Outro comercial, me disse o cara com a maior tranqüilidade. -Mas peraí, eu não sou dublador oficial do Pedro Aguinaga. Eu dublei a primeira vez para tirar o Bili do sufoco. Os homens ficaram desesperados. Tinha que ser a minha voz. Insistiram tanto que acabei topan do. Mas tiveram que me pagar o mesmo que o Pedro recebia por cada comercial. De volta ao cinema, quando fiz Quem Tem Medo de Lobisomem, uma pequena metáfora retratando a tensão que pairava no ar durante o regime militar, sem perder a comicidade, mergulhei na década de trinta e, de lá, trouxe algumas cenas de tortura psicológica para fazer uma alusão aos tempos em que vivíamos. Dois camaradas, interpretados por Stepan Nercessian e por mim, saem à procura de umas terras - herança do pai do meu personagem. O personagem do Stepan, estudioso, carrega consigo um livro sobre o folclore brasileiro. De vez em quando fala sobre Mula Sem Cabeça, Boi Tatá, Matita Perê, Saci Pererê e Lobisomem. O fato é que o jipe dos dois quebra e eles encontram uma noiva na porta de uma igreja, interpretada pela Camila Amado. Esta noiva estava esperando o noivo, mas o cara fugiu. Acolhem a mulher e, dali para a frente, só encon tram obstáculos, acidentes. Atribuem tal azar ao personagem da Camila. Chamam-na de "Iracema baixo astral". Enguiçados, com o jipe quebrado, eles procuram ajuda. Encontram uma fazenda abandonada e dormem nela. Mergulham em pesadelos do passado. Encontram o lobisomem, suas irmãs, o pai, um terrível torturador - todos da década de 30. Quando acordam, os mesmos personagens do passado aparecem na época atual, ou seja, década de setenta. O pai, interpretado por Carlos Kroeber, pergunta: "Precisam de ajuda?". Termina o filme, o público não entende que era uma comparação das duas épocas falando sobre o mesmo assunto - a tortura. Meu maior fracasso foi O Flagrante, em 1975. O filme conta a história de um grupo formado por mim, Cláudio Marzo, Carlos Eduardo Dolabella, Flávio Santiago - todos casados, que viviam pulando o muro, armando farras escon didos das suas mulheres. Meu personagem descobre que a mulher, que era interpretada pela Maria Claudia, o traiu. Chama os amigos, arma um flagrante. Arrepende-se depois e perdoa a mulher, volta para ela. O filme mostra a história deste retorno. Mas não bateu porque a moral machista brasileira não aprovou. Rejeitaram o filme, rejeitaram o perdão. O protagonista não podia voltar para a mulher que o traiu. Essa falsa moral ainda repercute muito, até hoje. No filme A Menina do Lado teve uma situação específica com a Flávia Monteiro, que tinha 14 anos na época, e tinha cenas de sexo com o meu personagem. Falaram muito mas o trabalho foi aceito porque, afinal, era um homem com uma menina mais nova e não um marido corno. Enquanto no Flagrante rejeitaram, aqui aceitaram. Coisa de machão. Os pais da Flávia são pessoas encantadoras, cabeças abertas. Eles entenderam a importância do filme. Souberam de todos os detalhes técnicos. Como, por exemplo, filmaríamos as cenas de sexo. O Alberto Salvá e a assistente de direção, Elisa, que também era co-roteirista do filme, passavam horas ensinando a respiração "cachorrinho" a Flavia. Era um truque para ela atuar na hora do sexo, do gozo. Eles, enquanto a cena acontecia, ficavam fazendo "há-há-há-há" (imita a tal respiração) o tempo todo. Eu fazia um esforço enorme para não rir. Não queria estragar a cena da menina. As seqüências ficaram bem convincentes. Em certos momentos, era altamente constrangedor ter aquela criança nua diante de mim; e eu, também pai de um molequinho (o Marcelo) daquele tamanho, fingindo desejos. Foi muito mais difícil do que representar com uma mulher mais velha. Depois, fiquei amigo dos pais da família. Quando o filme terminou, o Marcelo até namorou a Flavinha - namorico de criança que acabou logo. Eu os levava às festinhas e tomava conta dos dois. O filme foi legal. Acabei ganhando um prêmio em Gramado, que eu nem esperava, embora estivesse concorrendo. Estava tomando um café no hall do cinema quando ouvi: "O Kikito vai para Reginaldo Faria". Dos poucos filmes que fiz na década de 90, Memórias Póstumas foi o que mais repercutiu (o filme foi lançado apenas em 2001). Recebi um telefonema do André Klotzel, diretor, que me mandou o roteiro. Era um calhamaço de umas duzentas páginas. Fiquei com medo, inventei uma desculpa e disse que não ia fazer. O André procurou outro ator, tenho a impressão que foi o Paulo Autran. A proposta da narrativa era bem naturalista e acho que o André não conseguiu esse entendimento com o Paulo, que também resolveu sair. Ele voltou a me procurar, tipo dois meses depois, já com o roteiro mais sintetizado. Li novamente e topei fazer. O medo diminuiu, mas não acabou. O personagem não dialogava com ninguém, falava para a câmera - ou para o público, contando a sua própria história. Como minha técnica é a de unir os sentimentos e as verdades a partir do verbo, por questão de princípio eu tinha que decorar o texto todo. Era um texto muito literário, de época. Mas fiz. Depois, trabalhei num texto de época também, a novela Força de Um Desejo, do Gilberto Braga, durante meses. Um sucesso extraordinário no horário da seis. Quase enlouqueci com tanto texto de época! Mas, no caso do Brás Cubas, ele volta como um fantasma, cem anos depois, para contar a sua própria história e comporta-se com um certo distanciamento. Quando vive a história, necessita sentí-la. Então, eu tinha duas coisas a fazer: ser um narrador, que não tinha emoção, e ser personagem que tinha emoção. Foi extremamente difícil. Além disso, fazer Machado de Assis era uma responsabilidade muito grande. Eu achava que não ia me encaixar, com toda a sinceridade. Sempre trabalhei com naturalismo e realidade. E o André dizia: "É o que quero", e citava Roberto Schwarz dizendo que eu deveria contar o absurdo com naturalidade. Há um texto maravilhoso do personagem que diz assim: "Eu tenho a liberdade de contar as minhas memórias pelo fim. Ressuscitei para contar a história, portanto, não sou um autor defunto, sou um defunto autor." O André insistia que, quanto mais natural eu descrevesse a história, mais acreditariam nela. Então, passei a ler Roberto Schwarz e me apeguei aos absurdos do Brás Cubas, fantasma, contando absurdos como se fossem verdades. Foi uma viagem interessantíssima. Li o que pude sobre Machado. Mas literatura é literatura, cinema é cinema e meu texto ainda foi adaptado. Só fui perdendo realmente o medo durante o workshop que fizemos, onde vimos muitas fotografias de época, fizemos um trabalho de composição, experimentando figurinos, vendo cenários. Trabalhamos corpo com a Vivi, filha de Eva Wilma e John Herbert, no tempo e no espaço que pretendíamos. Na época, o ato de apanhar um determinado objeto exigia um gestual diferente - pegar um copo de água, por exemplo (repete o gesto do filme), pedia um gesto arredondado, você tinha tempo para chegar até o copo. O universo do Machado de Assis foi surgindo magicamente à medida que nós íamos lendo, falando e esgotando assuntos. Deixei a barba crescer, trabalhei o bigode com o maquiador e cabeleireiro Vavá Torres. Ele dava verdadeiras aulas de caracterização. Foram componentes interessantes. Ajudaram a encontrar o tom certo do personagem, tanto para o narrador, defunto, e para o personagem, Brás Cubas. A narrativa do André, em termos de enquadramento e movimento, era diametralmente oposta ao ritmo excitado de hoje, que as pessoas têm com a própria vida. Era próxima do acadêmico, e da época do Machado. Mas não de suas idéias. Isso é mágico. Machado é atemporal, transcendental. Difícil explicar racionalmente. Mas é onde você pega o toque do personagem e ele aparece. Na magia. E aí fiz. Mesmo porque, de uma maneira ou de outra, com ou sem workshop, a gente sempre chega aonde quer chegar. O resultado poder nem ser o mesmo, ou pode até ser melhor, mas a gente sabe que faz, o verbo continua verbalizando. Claro que, ao me ver na tela, minha autocrítica mexeu comigo. Exceto em Lúcio Flávio, em todos os personagens que fiz não consegui ver o que imaginei. Acho que ralentei demais numa determinada fala, que não fui sincero noutra, que deixei passar, através do olhar, a timidez. Enfim, que não estava totalmente dentro do personagem. Recentemente, trabalhei no filme Cazuza fazendo o personagem do João Araújo, pai do cantor. Queriam que eu fosse jantar com o João e com a Lucinha, a mãe. Falei "Até posso ir, mas por questão social, para conhecer o casal; bater papo e falar sobre milhões de coisas, não para me espelhar". Isso vai contra com o que o ator deve sentir. Eu ia emprestar meu sentimento àquele persona-gem, não captar a sua fotografia. Se descubro que ele tem um tique vou ficar pensando no ti-que para compor? Se convivesse com ele durante anos, trabalhasse no mesmo escritório, sentisse seus impulsos, conhecesse seus sentimentos, sua vida interior, momentos de explosão, até mesmo por osmose, pegaria um pouco dele. Mas, num jantar? Está errado. Fiz o que achei que deveria fazer. Não jantei com eles. Durante o filme, não me envolvi tanto quanto outras pessoas se envolveram - até mesmo porque o personagem era assim. Um pai aparentemente ausente, mas que, no fundo, ama desbragadamente o filho. Dei o melhor de mim. Tenho muita afinidade com o Walter Carvalho (diretor de fotografia), que já sabe a minha maneira de trabalhar - e eu a dele. Eu não conhecia a vida do Cazuza. O que sabia era através dos jornais. Acho até que esse distanciamento me ajudou. Espero que as pessoas gostem do filme. Capítulo VIII E La Nave Vá A primeira vez que coloquei os pés numa televisão - para trabalhar - foi em 1965, quando inauguraram a TV Globo. Era para atuar na novela Ilusões Perdidas, contracenando com a Leila Diniz, Walter Foster, Iara Lins, Nestor de Montemar, Osmar Prado, Emiliano Queiroz, Telma Elita. Havia atores que faziam parte do elenco global, mas podia-se contá-los nos dedos: Marília Pêra, Agildo Ribeiro, Aldo de Maio, Gracinda Freire, eram poucos. Ilusões Perdidas foi a primeira novela da TV Globo, segundo os dicionários da própria empresa. Quem me convidou foi o Mauro Salles. Ele era meu admirador, achava que eu era um grande ator, não sei se ele acertou. A TV era dirigida pelo capitão Abdon Torres e por ele, Mauro. Depois veio o Walter Clark. Ainda fiz Paixão de Outono, da autora cubana Gloria Magadan e contracenei com a Irene Ravache, que estreava fazendo uma repórter; e estive em Rua da Matriz, dirigida pelo Guto Graça Mello, o pai. Um dia, a Gloria Magadan me perguntou: "Por que não usas mas su sonriso?"(imita o sotaque espanhol) E respondi brincando: "Porque seu texto é prolixo e eu não tenho tempo para sorrir", disse sem pensar, na maior curtição, achando que ela ia rir também. Minhas cenas diminuíram bastante depois disso. Mas é verdade... Cubano e mexicano, em novelas "dramalhão", falam pra cacete. A forma de dirigir essas novelas era muito interessante, não existia o ponto de cue (corte). Não dava para dizer "Vamos parar aqui e continuar daqui para frente". Era tudo direto. Texto decorado na ponta de língua, marcações exatas, trocas de roupa com rapidez etc. Se errássemos, tínhamos que voltar e recomeçar desde o início. Os cenários eram tipo boca de palco, onde a câmera ficava no que se poderia considerar a quarta parede. Havia vários e pequenos cenários montados no mesmo estúdio, ali no Jardim Botânico. A gente fazia uma cena noturna num cenário, abria uma porta e saia correndo, tirava a roupa no caminho, andava vestindo outra, entrando noutro cenário, sentando e já fingindo tomar o café da manhã. Eram maratonas de gravação. Às vezes, das oito da manhã até as três, quatro horas da manhã do dia seguinte. Ensaiávamos muito. Pena que tudo isso se perdeu no incêndio que houve na Globo. Essas novelas eram experimentais, seria um lindo registro. Depois dessas primeiras novelas, veio Um Rosto de Mulher. O Sérgio Britto era o diretor e eu, que ainda estava contratado, faria o namorado da Natália Thimberg. Fizemos uma cena de telefonema. Eu ficava de um lado, a Natalia de outro, cada qual com sua câmera. Eu tinha de falar quando a luz vermelha da minha câmera acendesse, e calar para ouvir quando ela apagasse e acendesse a luz vermelha da câmera da Natalia. Ela, "macaca velha", já sabia dessas coisas. Eu hesitava. Pensando que a luz da minha câmera ia continuar acesa, continuava falando. Só que já tinha apagado. Foi a conversa telefônica mais insana que já tive. Era terrível. E mais terrível era ouvir os gritos do Sergio Britto que abria a porta da suíte, puto da vida: "Porra Reginaldo, assim não é possível!". Meu contrato terminou e eu saí do esquema. A luz vermelha estava acesa pra mim. Meu sinal estava fechado. O Sérgio continuou fazendo novelas com o Carlos Alberto e a Yoná Magalhães. Mas a televisão já era um fenômeno de popularidade. Você fazia um filme de sucesso, como Assalto ao Trem Pagador, e só era reconhecido onde os artistas se reuniam: no restaurante Fiorentina, da época da Zélia Hoffman, no Leme; no Gôndola, no Posto Seis, em Copacabana. De vez em quando alguém se aproximava perguntando "Você não fez aquele filme, é...o...Trem Pagador?". "Fiz". "Ah, então é você mesmo. Vi o teu filme, gostei muito do seu trabalho. Como é mesmo o seu nome?", coisas assim. Hoje, uma menina aparece num programa sensacionalista, falando besteiras ao lado de outros que também falam besteiras, e é imediatamente convidada para participar dos eventos sociais mais importantes do país, os repórteres atropelam quem estiver pela frente para entrevistá-la, acotovelam-se e espocam seus flashes em cima das novas "celebridades". My God! Quando fiz Ilusões Perdidas, eu morava em Copacabana. Entrei num mercadinho para comprar umas frutas. No caixa, estava de costas para rua, e o empacotador olhava para fora o tempo todo. Eu olhei também. Havia uma multidão lá fora, mas nem liguei. De repente, notei que a multidão estava olhando na minha direção. Instintivamente, olhei para trás, para dentro do mercado, e pensei "Deu merda aí dentro". Mas o lance era comigo. Levei um susto. Parei, dei autógrafos. Mas há um detalhe: já tinha feito filmes, já tinha sido premiado como melhor ator em um deles, o Cidade Ameaçada (foto ao lado). Só que essa foi a primeira reação ao perceber o lado da fama. Seria a fama uma questão de momento ou sorte? Ou seria a fama (sucesso) o resultado do trabalho de alguém? Aí eu pude me responder, durante uma situação acontecida no Festival de Cinema em Marília, SP. John Herbert, Eva Wilma, Anselmo Duarte, eu e tantos outros estávamos num desfile de carros com capotas arriadas. As ruas, fantasiadas com bandeirinhas de lado a lado, formavam um verdadeiro túnel. Eu estava num carro ao lado José Carlos Burle, diretor de cinema. Fiquei decepcionadíssimo, ninguém olhou pra mim. Eu era o ator candidato ao prêmio com o filme Cidade Ameaçada. O povo, das calçadas, gritava e aplaudia o Anselmo Duarte. Eu morria de inveja. O Burle percebeu e disse "Não se preocupe porque um dia você vai achar isso tudo muito chato". E é verdade. Com toda a certeza, Anselmo deveria achar aquilo tudo muito chato. Mas conquistou a fama, palmo a palmo, durante anos de trabalho. Não era um idiota qualquer que estava ali. Atores e diretores com mais de 40 anos de profissão lutaram e buscaram reconhecimentos na trajetória de suas carreiras. Merecem o reconhecimento. O lado chato é que tem dias que você quer sumir pela porta dos fundos. Eu e o Marcelo já saímos de um hotel, em Florianópolis, pela cozi nha. Pegamos o carro nos fundos porque pela frente, era impossível. Em 72, fiz a novela Tempo de Viver, na extinta TV Tupi, com texto do Péricles Leal e direção de Marlos Andreuci, um sujeito talentosíssimo, com idéias renovadoras, brilhantes. Infelizmente, morreu novo, vítima de aneurisma cerebral. Levamos nove meses para fazer setenta capítulos. A Tupi não dispunha de tantos recursos. O Marlos saiu, não suportou trabalhar naquele esquema. O Jece Valadão, além de ator da novela, assumiu a direção. O elenco era especial: Rubens de Falco, Otavio Augusto, Zanoni Ferrite, Adriana Prieto, Irene Stefânia, Neila Tavares, Paulo César Pereio, Sebastião Vasconcelos, Aroldo de Oliveira, André José Adler, Xandó Batista e... que me desculpem os outros, não consigo lembrar mais. Os Diários Associados, do Assis Chateaubriand, bancavam os salários, sempre em dia. Era bom, ao menos para os meus parâmetros. Comprei carro, terreno em Cabo Frio, em Friburgo, no Joá, até apliquei dinheiro na Petrobrás. Ainda na década de 70, o Daniel Filho me convidou para fazer uma novela, O Espigão. Entrei na sala onde já estavam ele, o Lima Duarte, um monte de gente. Aí o Daniel falou "O papel é esse e a gente grava amanhã". "Como assim?", perguntei. "Daniel, estou fora, eu não faço isso não". Pô, gravar amanhã? Não tinha feito televisão o suficiente para estar seguro. Tinha feito aquelas novelas experimentais da TV Globo, a novela da Tupi que levou meses e só. O Carlos Eduardo Dolabella fez o papel. Quando fiz o Lúcio Flávio, fiquei super-conhecido realmente. Aí o Daniel Filho e o Renato Pa-cote conversaram novamente comigo. Havia mais tempo para me preparar, e acabei fazendo Dancing Days, do Gilberto Braga. Aí não pude mais sair, não podia andar nas ruas mesmo. Mas o medo continuava. E Dancing Days seria a minha "prova de fogo". Muitos anos atrás eu resolvi lutar judô. Fui a uma academia, levei uns tombos, fiz uns rolamentos, fiquei tonto. Resultado: me dei mal. Então, um médico me examinou e falou "Você já tentou fazer yoga?". Achei estranho. Do judô para a yoga era um verdadeiro abismo cultural. Respondi que não. "Faça yoga, será muito bom para o seu equilíbrio; você é uma pessoa muito ansiosa, vive intensamente, é um turbilhão", ele disse. O cara me sacou direitinho, mas não dei bola. Quer dizer... Registrei a idéia, mas não procurei ninguém. No primeiro dia em que fui gravar Dancing Days, eu estava em pânico. O Roberto, meu irmão, falou: "Tem o meu médico, que é médico do Luiz Carlos Barreto também, é neurologista, vai lá e faz um eletroencefalograma para ver se você tem algum problema. Pode ser disritmia. Eu tenho, você também pode ter". E eu fui. O cara fez o tal eletro e eu não tinha nada. Mas falei: "Estou com muito medo de entrar em cena". Ele me deu um remédio chamado Tombram. Remédio para neurótico avançado. Eu peguei aquela merda daquele remédio e, quando estava faltando uma hora para a grava ção, pensei, "É agora, vou tomar". E fui gravar a minha primeira cena com a Sonia Braga. O Tombram começou a fazer efeito, me enrolou a língua, eu não consegui falar. O Daniel virou para mim e disse: "Reginaldo, vem cá", me levou prum canto, e falou dramaticamente: "Você se drogou?". "Daniel, eu tomei um remédio que o médico me passou porque eu estava muito nervoso" e mostrei o Tombram. Ele olhou e disse: "Vai para casa. Vamos gravar isso noutro dia". Fui para casa andando torto e puto da vida. O subconsciente bateu na porta do consciente e disse: "Yoga!". Lembrei do tal médico, até do seu nome: Dr. Seixas. Procurei a academia do Paulo Salles. Dali pra frente, não tomei mais remédio algum. A yoga segurou a minha peteca. Fiz três anos com ele, e faço até hoje. De vez em quando, em estado de extrema necessidade, tomo um Valiunzinho. Depois, eu fiz Água Viva, também do Gilberto Braga e Baila Comigo, do Manoel Carlos. Só estouro de audiência. Aquele foi o auge do sucesso mesmo. Eu estava gozando dele, na realidade, desde o Lúcio Flávio, em 1977. E, como todo sucesso traz alguns probleminhas, encontrei os meus pela frente. Eu estava em Friburgo, passando o Carnaval com a minha família. Lídia Brondi, Roberto Talma e outros amigos também estavam lá. O Julio Braga, que era namorado da Lídia na época, ainda não tinha chegado. Eu levantava oito horas da manhã, a casa estava abarrotada de gente e não sobrava espaço para estudar os capítulos. Fui para um quartinho e comecei a estudar. Meu compromisso de sempre, levar o texto na ponta da língua. Toca o telefone, eu atendo, era o Julinho Braga. "Estou com um jornal aqui na mão. Posso ler pra você?" E leu: - "Reginaldo Faria preso em Petrópolis com um saco de maconha". -Eu? -É. Você. -Quer dizer que eu estou preso? -Está. -Onde mesmo? -Em Petrópolis. - Chegou perto, estou em Friburgo. E rimos. Mas ouvido de repórter é mais largo do que boca de bueiro. E eles surgiam de todos os cantos: Jornal do Brasil, O Globo, Última Hora e Correio da Manhã, que ainda existiam. Enfim, todos eles. E, é claro, a imprensa menor, imprensa marrom, em peso. O Roberto Talma imediatamente ligou para a Globo dizendo: "Reginaldo está aqui em Nova Friburgo, comigo. Não tem nada a ver com isso". Como sempre, para quem é notoriedade, a repercussão se agiganta e a imprensa marrom vende mais revistas e jornais. Meus filhos estavam dançando num clube da cidade, os pais das garotinhas que estavam com eles buzinavam em seus ouvidos: "O pai deles é viciado em drogas". No Rio de Janeiro, o Dr. Roberto Marinho mandou me chamar. Pediu-me desculpas pessoalmente, disse que a notícia tinha sido veiculada por um repórter dele, de O Globo. Mandou o repórter embora por não haver checado as informações. Na verdade, um tal de Reginaldo Faria Silva foi preso com a maconha. O Dr. Roberto colocou o Fantástico à minha disposição para uma retratação. Não aceitei. Achei que ia dar mais motivo para a imprensa se alimentar, não quis evidenciar uma espécie de protecionismo, embora a intenção dele tenha sido das melhores. Deixei cair no vazio. Fiquei quieto. Só que uma fila de mais de 30 metros de carros com seus paparazzi se posicionava à frente da minha casa no Joá. Havia um portão nos fundos que dava na boca do túnel, lá embaixo onde havia um recente cartaz: "Sorria. Você está na Barra". Kátia, minha mulher, saía pela frente da casa, os paparazzi olhavam bem o interior do automóvel, não viam mais ninguém. Ela saía, descia a estrada do Joá, passava pelo túnel e eu entrava no carro para ir trabalhar. Durante a década de 80, entre as novelas, ainda filmei Agüenta, Coração e Parceiros da Aventura, do meu amigo José Medeiros; Com Licença eu vou à Luta e Lili Carabina - ambos de Lui Fa-ria, meu sobrinho. Os especialistas em novelas apontam Dancing Days como um marco divisor de águas na teledramaturgia brasileira. Novela que influenciou a geração da época. O interessante é que nela eu fui visto por mais gente do que nos vinte anos fazendo cinema. Dancing Days narrava o cotidiano carioca, brasileiro; era uma novela de costumes, muito próxima do que estava acontecendo com as pessoas. Novela também de penetração direta na sociedade. Falava sobre a juventude, na mesma proporção em que falava dos pais, dos filhos, dos colunáveis e de uma certa camada que freqüentava discotecas. Meu personagem era dono de uma discoteca, um celibatário que tinha à disposição diversas mulheres. Vivia aquele universo da dança, do boom das discotecas, do redescobrimento do prazer. Essa linguagem permaneceu, passou para Água Viva, chegou até Vale Tudo. Mérito do Gilberto Braga. Já Vale Tudo pegou um período de inflação, tipo 50% ao mês, uma crise aguda da economia; época da especulação, ninguém estava voltado para ajudar o país. Os nossos líderes políticos, desacreditados; os grandes homens de negócio, que davam os grandes golpes, saíam ilesos e o meu personagem era justamente um desses, o Marco Aurélio. Para mim foi um personagem fantástico. Eu vi uma entrevista muito interessante com o Gian Maria Volonté em que ele dizia: "Fazer um personagem fascista numa história em que você acusa o fascismo é enriquecedor para o ator porque ele está passando uma mensagem política." E meu personagem era isso, não era o fascista mas era um puta de um aproveitador - e eu, como ator, denunciava isso. Naquela época, se andasse nas ruas, eu dava milhares de autógrafos por dia. Não tinha espaço, meu telefone tocava o dia inteiro, era infernal. Hoje, posso andar mais sossegado. Afinal, nossa cultura é assim: o que envelhece perde a essência e a grandeza do que já fez. Uma vez fui convidado para uma tarde de autógrafos num shopping em São Paulo para mais de cinco mil pessoas. As meninas subiam num palanque onde eu estava sentado. Elas me davam um beijo na face, eu dava o autógrafo, elas desciam e iam embora. Uma por uma. Meus dedos incharam. Uma menina parou diante de mim, chorou, desmaiou e caiu lá de cima. Que perigo. Outra vez, em Portugal, no Estoril, depois de tan-to assédio, falei: "Não vou mais sair do hotel". Faltando dois dias para voltar para o Brasil, minha mulher sugeriu: "Vamos tirar umas fotos ali naquela pracinha, pelo menos?". E fomos. No primeiro clique, apareceram duas senhoras portuguesas e um garoto. E elas começaram a discutir entre si (fala com sotaque perfeito) "É o Marco Aurélio! O Marco Aurélio!", e a outra "Não é ele! Não é ele!" Eu disse para a minha mulher: "Vamos fingir que não sou". Mas a primeira senhora insistiu "Ô Marco Aurélio! Ô Marco Aurélio!", e a outra insistia: "Não estas a perceber que não é ele?! Que estás a chamar o gajo pelo nome do personagem. Por que não o chamas pelo nome próprio?". Aí a primeira se tocou e disse: "Ô Antonio Fagundes!". Muitos se identificaram com o Marco Aurélio quando ele deu aquela "banana" para o Brasil no final da história. Ele estava próximo dos grandes especuladores que não faziam outra coisa senão jogar no overnight, no open-market. As pessoas me encontravam e diziam: "Se deu bem hein! Saiu com uma puta de uma grana! E ainda deu uma banana para o Brasil! Que país de merda, não sei quanto de inflação..." Era isso o que falavam. Eu me surpreendi com o final. Achei que ele ia ser preso. Mas assim ficou mais próximo do que acontecia. Outro personagem sensacional foi o Jacques Leclair, da novela Tititi, do Cassiano Gabus Mendes. Eu representava um costureiro rival do Victor Valentin, feito pelo Luis Gustavo, uma verdadeira escola de improviso. Ele tem uma experiência tão vasta na televisão que, às vezes, ao contracenar, eu ficava meio perdido. Ele nunca terminava a "deixa" no lugar certo para eu entrar com meu texto. Mas a cena fluía e eu aprendi muito com ele. A televisão nos dá essa possibilidade, a de improvisar. E nos traz também uma coisa fascinante: a confusão que o público faz entre personagem e ator. Meu personagem tinha o nome de André Espina, dono da confecção. Jacques Léclair era o nome de grife, do costureiro afetado, criado pelo André, para conquistar as mulheres. Quando a novela começou, o André José Adler me disse: "Agora todo mundo vai te chamar de André". Eu disse: "Não. Vão me chamar é de Jacques Léclair". E não deu outra. A Sandra Bréa, que contracenava comigo, me chamava apenas "Jacque", com sotaque francês. Foi um prato para os machistas. Eles se deliciavam com aquilo. Principalmente ao saber que eu vivia cercado de mulheres na novela. Mas como sucesso e problemas às vezes andam juntos, num domingo à tarde, em Friburgo, eu fui a uma padaria comprar aquele pãozinho quentinho para fazer um lanche. Dois rapazes e uma menina, meio drogados, estavam estacionados. Mal encostei o carro, eles começaram: "Jacques Léclaaair, Jacques Léclaaair", com tal deboche que não dava pra segurar. Mas tentei. Eu, minha mulher, Telca, meu filho Régis e uma namorada sentimos o peso da provocação. Falei: "Compra logo o pão para a gente ir embora". Descemos do carro e a Telca se apressou. Os rapazes, não satisfeitos, entraram na padaria e continuaram. Um deles passou a mão na bunda da minha mulher! Aí fiquei puto e decidi logo: "Vocês querem brigar? Então, vamos brigar. Eu vou brigar com os dois". Eu ia apanhar, na certa, mas aqueles moleques tinham passado dos limites. Percebendo que o negócio ia esquentar, a Telca aproximou-se calmamente e disse: "É melhor vocês irem embora porque ele é faixa preta e vai acabar com vocês." E falou com tal convicção que até eu mesmo acreditei. Eles voltaram para o carro. Um deles abriu o vidro, deixando um espaço de quatro dedos, botou a boca para fora e soltou peidinhos com os lábios - boca suja só serve pra isso mesmo. E, entre cada peidinho, dizia lentamente: "Jacques Leclaaaiiiir" Eu não consegui me segurar e dei um soco no vidro do carro, que se espatifou todo. Eles arrancaram. Entrei na padaria, tirei o sangue do braço, muito sangue. Saí, protegendo-o com papel de pão, olhei para a rua, o carro voltou freando violentamente, quase dando um cavalo pau. De dentro sai o cara segurando uma barra de ferro. A irmã dele abriu a porta, correu em minha direção, me abraçou e gritou: "Não bata no meu irmão. Não bata no meu irmão". Eu respondi, "Olha o que ele tem na mão". O cara levantou o ferro e continuou se aproximando. Abri o porta-luvas do carro e fingi estar armado. Gritei: "Se você vier eu vou te dar um tiro". Ele parou. Se a mentira do faixa preta funcionou, a do revólver também funcionaria. Eles acharam que eu estava armado realmente. E foram embora. Levei sete pontos no braço. E acabou por aí. Foi a única vez que perdi a cabeça. Foi uma coi sa agressiva demais. Em novela, você conversa com o autor na estréia, se duvidar, e depois passa cento e oitenta capítulos tentando falar com ele novamente. Há autores que ouvem seus artistas - a Glória Perez conversa, aceita sugestões, discute sobre elas, pondera; Gilberto Braga também. Eu vinha da escola de cinema, onde havia o hábito de conversar com autor, diretor, fotógrafos, cenógrafos etc. Era normal. Levei esses costumes para a televisão e tentei conversar com o Cassiano Gabus Mendes sobre certas cenas da novela Tititi. Ele ficou puto da vida, brigou comigo, disse que eu tinha mania de me intrometer na criação dele. Era questão de diálogo, poder dizer "O que você acha disso ou daquilo." Eu queria apenas sugerir. Mas nunca pude falar pessoalmente sobre as coisas que pensava. Ele acabou morrendo e ficou essa imagem ruim entre nós. Quando fiz Baila Comigo, meu contrato era para "protagonizar" a novela. Eu recebia para ser protagonista. O Tony Ramos fazia dois persona-gens, os gêmeos. Fiquei envergonhado ao perceber que o meu nome estava em primeiro lugar e meu personagem não. Contracenar com Fernanda Montenegro, Fernando Torres, Cristiane Torloni, com o próprio Toni, me deixava desconfortável porque meu nome estava acima do deles e isso não se justificava pelo teor do personagem escrito para mim. Eu recebia para fazer uma coisa que eu não estava fazendo e via todos os dias meu nome encabeçando o elenco. Por ética, decidi retirar o meu nome lá de cima. Procurei o Boni, ele estava na Europa; procurei o Borjalo: "Quero que tirem o meu nome, quero que ele seja proporcional ao personagem que faço, prefiro meu nome como ‘participação especial’". Ele respondeu: "Não, o seu nome vai ficar lá em cima". Fui ao Manuel Carlos, autor da novela, com o Paulo Ubiratan. Ele me mostrou um livro. Tratava-se de uma pesquisa feita pela Globo questionando a popularidade dos atores. O meu nome estava lá. Eu disse: "Gostaria de saber qual é a importância do meu personagem?". O Manoel Carlos disse: "No capítulo sessenta e cinco, mais ou menos, o seu papel vai dar uma guinada". Nunca deu guinada, e, evidentemente, o Manoel Carlos não tinha nada a ver com o meu acerto com a Globo. Na época, fiquei sentido, ele não abriu o jogo. Coitado, estava de saia justa, agiu diplomaticamente me mostrando aquele livro, dizendo que meu personagem iria dar a tal guinada. Fazer o que? Sinto pelo fato de ele nunca mais me chamar para trabalhar. Não sei o que ele pensou a respeito de minha atitude. Parecia que eu estava querendo ser o melhor, querendo o melhor personagem da novela. Contratualmente, poderia processar a Globo e dizer: "Eu exijo que meu personagem seja o principal, senão eu saio da novela". Mas a questão era outra. Era respeito. Por mim e pelos colegas. Hoje, sinto-me muito orgulhoso pelo Tony ser o protagonista da novela Cabocla, onde também atuo. Diferente daquela época em que eu tinha vergonha do meu nome estar acima do dele. Mas a engrenagem da TV distanciava os atores dos realizadores. Em 1987, o Renato Pacote, que era responsável pela área de contratos na TV Globo, me ofereceu um papel - eu seria pai do Lauro Corona. Recusei, não gostei. Entramos em conversação para renovar meu contrato. Ele me ofereceu metade do valor que eu havia recebido para fazer Tititi - disse que eu passaria a receber os 100% quando estivesse gravando novelas. Eu disse: "Quer dizer então que eu vou pagar metade da mensalidade da escola dos meus filhos? Vou colocar metade da gasolina no carro? Vou comer em pires ao invés de comem em prato?" Diante da minha argumentação, ele respondeu que ia resolver o assunto numa reunião de cúpula. Voltei lá umas seis vezes e ele estava sempre na tal da reunião de cúpula. Na véspera do Natal, já pela minha sétima ida, a secretária dele, vestida de poder e arrogância, falou que ele estava fazendo compras de Natal. Eu enchi o saco com todo aquele desrespeito. "Ele que fosse tomar na cúpula dele!" O José Louzeiro, na época, insistia para eu fazer a novela Corpo Santo, na TV Manchete. Eu fui. Assinei contrato por um ano com a Manchete, ganhei mais de dez passagens internacionais, fiz a novela, recebi os 100% que o Renato Pacote havia me negado na Globo e foi muito bom. Quando terminou o contrato, o Grizoli me chamou para gravar um caso especial com Evandro Mesquita e outros na Globo. Li e topei. No primeiro dia, muitas fotos para cenário, roupas, beijinhos pra lá, beijinhos pra cá, hipocrisia de uns, sinceridade de outros etc; no segundo dia, a diretora de arte - não lembro e nem quero lembrar o nome dela - passou a me tratar com desprezo. Achei aquilo estranho. Falei com o Eduardo Figueira, diretor de produção: "O que está acontecendo? Estou sendo tratado de forma diferente?" Ele respondeu: "É chato dizer isso, mas o fato é que você está sendo considerado persona non grata aqui dentro". Me disse que o melhor seria ir falar com Deus. Deus era o Boni. E fui. Fiquei na ante-sala esperando, de vez em quando o Boni passava apressado e me pedia um pouco de paciência, dizia que ia me receber. Fiquei o dia inteiro sentado. Quando me chamou, de sorriso estampado - achei até que era pra mim! - ele estava feliz da vida porque tinha vencido a concorrência para fazer a cobertura do Carnaval. Eu expliquei a situação. Ele respondeu que o Renato Pacote havia dito que eu tinha abandonado uma novela pela metade! Ou seja, aquela que eu não quis fazer como pai do Lauro Corona. Pedi para chamar o Pacote e que ele me provasse o que havia dito. Mas o Boni, para evitar novos conflitos, resolveu tudo e renovou meu contrato. Perguntou: "Quantos anos você quer, um ano, dois, dez?" E voltei fazendo o Marco Aurélio de Vale Tudo. Dessa relação boa que criamos, desenvolvi o hábito de responder a todos os memorandos que o Boni me mandava. Era muito engraçado. Recebi um convite para participar da novela A Próxima Vítima, mas, no final das contas, nem trabalhei na novela porque fui o primeiro a morrer! E disse pro Boni: "Eu não estive realmente em ‘A Próxima Vítima’ porque fui a primeira vítima". Naquela novela do Mário Fofoca, com o Luis Gustavo, Elas por Elas, tinha um texto sobre a derrota da seleção brasileira de futebol na Copa do Mundo de 82. Era uma gozação ao Telê Santana por causa da sua mania de mascar chicletes. O texto colocava a culpa no chiclete. Em comum acordo com o diretor Paulo Ubiratan, achamos que não deveríamos falar aquele texto porque a seleção era - e é - uma mística, um sentimento nacional, e o povo andava triste pela derrota. O Boni mandou um memorando dizendo que o Cassiano tinha ficado puto e que não ia admitir atores mudando o texto dele. Recebi meu puxão de orelha, o Paulo Ubiratan recebeu um pito, o Tatá (Luis Gustavo) idem. Eles também expuseram suas razões. Mas eu expus as minhas num memorando. Na mesma novela, havia uma cena em que o Mário Fofoca dirigia um fusquinha e eu estava de terninho e gravata ao lado dele. Acontece que, ao meu lado, estava um piloto de provas fingindo ser o Mario Fofoca com um puta dum capacete, luvas, joelheiras, óculos e o escambau. A cena se desenvolvia em subidas e descidas de escadas, cavalos-de-pau, andando em duas rodas etc. E eu segurando aquele negócio acima do porta-luvas que a gente chamava de "puta que pariu", sem a menor proteção! Sentindo o perigo, me recusei a gravar. O Boni mandou outro memorando. E eu respondi com o meu memorando dizendo que não era piloto de pro-vas e sim ator. Tinha essa liberdade porque sempre respeitei a empresa por tudo de bom que ela me deu. Mas acho correto a empresa me respeitar por tudo de bom que eu dei a ela. Uma vez o Mário Lúcio Vaz (diretor da Central Globo de Controle de Qualidade) falou: "Reginaldo, você trouxe muita coisa para a TV Globo". Quer dizer, colaboro até hoje com o crescimento dela, e faço com carinho, sem puxar o saco de ninguém. Tanto que eu estava na primeira novela em 1965 e estou na Globo até hoje. Daí pra frente, só Deus sabe - não o Boni - porque não está mais lá. Outro Deus. Capítulo IX Um Dia Muito Especial Eu demorei muito a fazer teatro. Minha primeira peça foi apenas em 1990. No fundo, achava que nunca conseguiria fazer. No cinema e na televisão, o ator sabe que, ao sentar numa determinada marca, a câmera está a seu serviço. O ator trabalha para ela. No teatro, o ator trabalha com o geral e isso me dava pânico. Tinha medo do branco - não conseguir realizar, esquecer o texto. Seria narcisismo? Depois de algumas paranóias a respeito, perguntei: "Por que eu não posso errar?". Conclui que não era só o fato de viajar em torno da minha centralização. Não, aquilo era um respeito por mim e principalmente pelo público. Interpretar e errar significava desrespeito à platéia que pagou para ver o meu trabalho. Mas consegui superar. E olha que demorou, já que desde 1962 eu recebia convites para fazer teatro. Depois que ganhei o prêmio com o Cidade Ameaçada, fui convidado para participar do Câmera 1, na TV Tupi, do Jacy Campos, criador do plano-seqüência na televisão. O programa era só ator e câmera, sem cortar, ao vivo. Um teatro filmado, um monólogo filmado. Quando vi como era, disse: "Tá louco, não consigo fazer isso!". Fui várias vezes lá. Vi o Ítalo Rossi, por exemplo, fazendo esse programa maravilhosamente. Quando gravamos a novela Olho no Olho, tempos depois, o Ítalo me contou que estava fazendo uma cena e as calças dele começaram a cair. Então, o Jacy Campos, para não perder a seqüência, aproximou a câmera lentamente, enquanto alguém, de quatro, aproximou-se do Ítalo e levantou suas calças. Isso é magistral, né? Não só pela presença de espírito do Jacy, como, principalmente pelo Ítalo, que segurou a cena até o fim. Excelente ator que é, não perdeu o tom do personagem. Em Agüenta o Rojão, do Watson Macedo, trabalhei com Zilka Salaberry, uma amigona. Ela fazia o Teatrinho Trol, do Fabio Sabag. Pedi a ela que intercedesse a meu favor para eu fazer uma participação no programa. Conseguiu. Recebi o texto. Era uma história de época. Meu personagem chegava - uma espécie de estafeta - e dizia: "É aqui o castelo do rei tal com a rainha tal? Trago uma mensagem". Fiquei uma semana estudando aquilo. No dia da gravação, me deu pânico e eu não fui. Aí mandei um telegrama dizendo: "Por motivo de força maior, não posso comparecer". Nessa época, conheci o Osvaldo Wadington, um grande teórico do teatro. Dava aulas para um grupinho: Mirian Pires, Suzana Faini, Mario Petraglia, Diva Helena, Rejane Medeiros, Eliano Medeiros. Era um grupo legal. Eu já era um ator premiado do cinema brasileiro e estava ali, entre eles, sem coragem de participar das aulas. Apenas olhava, via de fora. Na verdade, eu gozava da imagem de ator premiado sem ousar. Não queria expor meus erros diante dos colegas. Que bobagem! Demorei quase 30 anos para subir num palco. Para criar coragem fiz até análise, acredita? Um dia consegui. Escrevi um texto chamado Somente entre Nós, uma comédia. Fazendo humor eu me senti mais livre, pude brincar, não me levar tão a sério. Éramos eu, Ângela Viera, Toni Ferreira, Felipe Martins e Chico Tenreiro. Direção do Roberto Frota. Estreamos em Niterói, no Teatro Abel. Foi marcante. Deixou saudades. Fiquei nos bastidores pulando e socando o ar, parecendo um boxeador, meu coração parecia que ia sair pela boca. Minha tensão era enorme. Eu precisava jogar a energia para fora antes de entrar em cena. E toda a tensão foi embora quando tirei a primeira gargalhada do público, me senti absolutamente seguro. Nunca mais tive aquele medo. Evidente que sempre carregamos um certo medinho antes de entrar em cena, claro, mas não aquele desespero, aquela ansiedade de que "eu não faço", "não vou conseguir subir no palco". Agora, o medo é produtivo. No dia seguinte, em casa, relaxado, abaixei para pegar um pedaço de papel, tive um pinçamento no nervo ciático. Conseqüência das tensões vividas na véspera. Uma semana esticado na cama. Depois, recebemos um convite e fomos para Portugal. Representamos no Teatro do Cassino Estoril. Eu ainda estava no auge do sucesso. A novela Vale Tudo estava passando - ou havia passado - por lá. Era uma loucura, eu não conseguia andar nas ruas, uma febre de gente em cima de mim. O empresário que nos levou fez um cartaz todo cinza, com a minha cara cinza, as letras cinzas. Ao passar de carro, via-se apenas o cinza. Era preciso aproximar-se bastante para ler: Uma peça teatral com o Marco Aurélio da novela. Não com Reginaldo Faria. Nós ficamos num hotel em frente ao cassino. Na noite da estréia, uma multidão se formava em frente ao teatro. Eu chamei o pessoal e dis-se: "Olha lá gente, que loucura! Nós vamos arrebentar!". Faltava meia hora para começar o espetáculo. Fomos andando para o teatro, impressionados com a fila. De repente, abriram as portas. A multidão entrou atropelando-se, mas para jogar no cassino. Umas quatro pessoas dirigiramse para a bilheteria do teatro. Cada platéia é diferente da outra. Pode ser o mesmo palco, o mesmo cenário, os mesmos atores, mas a reação nunca é igual. E é dela que você vai depender. A peça se reinventa toda noite. Cada espetáculo é único, por mais que o texto seja igual. Às vezes, você espera um determinado efeito e ele não vem, o público não reage da forma que você imaginou. O ator é obrigado a se virar, senão a platéia o engole. Errou? A resposta não veio? Vá em frente. Algumas vezes, encontramos platéias bem educadas, outras, não. Já parei cena porque o bonitão lá estava falando no celular. Na peça Em Nome do Filho, o Marcelo falou "Vamos esperar aquela senhora atender ao telefone pra gente poder continuar". No Brasil, só no Brasil!, damos uns quinze minutos de tolerância para a entrada do público antes de cada espetáculo. Mais, é impossível. É desrespeito com quem já está na sala, e desgaste com quem está querendo entrar em cena. O ator se prepara durante muito tempo, se maquia, se veste, faz exercício de voz, relaxamento, aquecimento para entrar no pique do personagem e ainda é obrigado a esperar os retardatários? É horrível. É igual a jogador de futebol que entra em campo e espera o outro time. Perde o aquecimento. No Cassino Estoril, eles são pontualíssimos e, quando a cortina abre, aplaudem as entradas dos atores, antes do espetáculo começar. Beleza, porque se a peça for ruim, já fomos aplaudidos no início. Quando fiz a peça Monsieur Amedée, do francês Alain Reynaud Fourton, em português Amândio, o Bem-Amado, com tradução do Flávio Marinho, eu tive o tal "branco". Ou seja: esqueci, não sabia o que falar. Eu fazia um professor de português, a Tânia Loureiro era uma cafetina que introduzia em minha casa dois cafetões, um padre e duas prostitutas. Meu personagem até que tinha razões para ter o tal "branco", porque, além da cafetina, e das duas meninas, havia um padre. As meninas, novinhas e bonitinhas, representadas por Roseh Ventura e Claudia Ventura, também balançavam o coração do professor. A Tânia percebeu que eu parava sempre na mesma fala - "A senhora... a senhora... a senhora..." - e empaquei naquela "senhora", olhando para ela, pedindo socorro. Ela me salvou e disse: "Eu já sei o que o senhor quer me dizer!" Segundo o bendito - nem sempre bandido! - Stanislavski, quando isso acontece em cena, entramos no momento de vaguidade, que traz a verdade do ator e não do personagem. Basta, então, saber administrar e canalizar o que está acontecendo para o personagem. Às vezes, acontecem pequenos acidentes. No palco do Cassino Estoril, um refletor estourou e caiu entre mim e o Toni Ferreira. Aproveitei a situação e disse: "Você está com a carga tão negativa que até estourou a lâmpada". O público aplaudiu. Já pulei falas, mas não comprometi o espetáculo. Colegas também pularam e a gente segurou. Nunca fiz Shakespeare, vim do naturalismo no cinema, e nunca tive vontade de segurar o crânio e declamar, mesmo tendo sido uma imagem muito forte nos meus tempos de criança - o Laurence Olivier segurando o crânio. Minha formação, e parte da minha luta, como sobrevivência, foi através do cinema. Viver no Rio de Janeiro e usar duas calças que espetavam, fazer e comer fritada de banana, lavar as camisas, as cuecas, esconder o paletó puído, olhar as pessoas comendo doces nas Casas Colombo, salivar e não poder estar lá, e fazer um filme que tivesse alguma coisa semelhante a isso, era um caminho mais próximo, mais verdadeiro, para meu crescimento. O artista tem que trabalhar no que lhe motiva. Se você não sabe nada sobre determinado assunto e quer dissertar sobre ele, o melhor é pesquisar muito, vivenciar muito, e depois ver se é possível trabalhar alguma verdade sobre ele - sabendo que as verdades são tantas. Que vivência eu poderia ter de Shakespeare se nem escola shakesperiana havia? Se houve, foi difícil saber ou até participar dela. No Brasil, ninguém é obrigado a passar por Shakespeare para chegar a algum lugar. Ele não é um tema imposto em nossa cultura para você atuar. Como trabalho, estudo, até admito, porque o teatro é a grande escola. Mas meus caminhos foram outros. Meu filho Carlos André tem dezenove anos e está apaixonado por Brecht. Maravilha. Para ele. É uma ação dele e tem essa chance. Ele está estudando, montou recentemente Os Pequenos Burgueses, dirigido por Cecil Thiré. Eu jamais ousaria fazer aquele personagem. Hoje, com a idade que estou, imagino interpretar um homem velho que conta sua história. Falar de seus amores, sonhos realizados ou não. Isso, por exemplo, me motiva porque faz parte da minha vida e iria alimentar a minha inquietude. Tenho até um título já registrado na Biblioteca Nacional: Confissões de Um Velho Adolescente. Em Nome do Filho, uma peça teatral dirigida por Régis Faria que pretendo filmar, conta a história de um filho drogado, em fase terminal, que tenta tirar uma confissão do pai enquanto o pai tenta tirar esse filho da droga. Quando o pai confessa, é tarde demais, o filho já está morto. A história acontece em flashbacks. Não foi estouro de bilheteria, mas vi a platéia chorando. Depois, me abraçavam contando suas histórias, assumindo que algo através do texto era semelhante às suas vidas. Foi um trabalho que me deu imensa satisfação! Essas coisas não têm preço, elas remontam ao ser social que o ator é. Dia dos Namorados foi um espetáculo muito bem feito, bem dirigido pelo Régis, com boa carpintaria. Ganhei algum dinheiro, fiz uma boa comédia sem apelações ou vulgaridades. Fui até comparado àquele autor americano, Neil Simon. No divertimento, no entretenimento, na possibilidade de brincar e fazer a platéia rir, ou mesmo rir com a platéia, interagir, é algo positivo e gostoso, essa é a motivação. Capítulo X Roma, Cidade Aberta Em algum momento da carreira de um artista, ele sonha com prêmios, seja em Hollywood, com aquele glamour todo, ou em outros festivais. Isso passou pela minha cabeça através do cinema francês, italiano, que na minha época tinham mais importância e reconhecimento. Comecei a ter um pouco de prestígio quando meu terceiro filme, Cidade Ameaçada, foi para o Festival de Cannes. Eu não fui. O Itamarati não convidou os atores principais: Eva Wilma e eu. De qualquer forma, foi ótimo, o filme foi aplaudidíssimo, Roberto Farias elogiado. Conta o Roberto que as pessoas o confundiam comigo. Deu autógrafos em meu lugar. Com esse filme, eu ganhei um prêmio de Melhor Ator no Festival de Cinema de Marilia. Depois, o prêmio da Associação Brasileira dos Críticos Cinematográficos em 1960. O Geraldo Queiroz escreveu uma crítica interessante cuja manchete era mais ou menos assim: "Aconteceu um milagre", que enaltecia a qualidade do filme e do cinema brasileiro, diferente do que ele estava acostumado a ver. Um dia, em Friburgo, minha terra natal, houve uma homenagem aos irmãos Farias no Clube dos Cinqüenta. Sofri muito até conseguir um terno emprestado que desse em mim. Com o Assalto ao Trem Pagador, fomos ao Festival de Veneza. Fiquei no mesmo hotel onde o Visconti fez o filme Morte em Veneza. Anos depois, vendo o filme, relembrava aqueles instantes em que eu cruzava com a nata do cinema internacional naquele hotel. No cinema, após a exibição, as pessoas viravam-se para nós e aplaudiam de pé. Roberto e Herbert Richers venderam o filme para diversos países. Eu saí do Festival e fui para a casa da Norma Bengell, que já estava filmando na Itália. A casa era quase um castelo, em Roma antiga. Uns paparazzi começaram a rondar o castelo da Norma, achando que ela estava tendo um caso com o Alain Delon. Ela falou: "Olha Reginaldo, eu vou ter que fazer um trabalho agora, você fica no cinema com o Aurélio e depois eu passo pra pegar vocês". E deslizamos naquele carrão conversível, sem capota. Era verão e o ventinho com cheiro de Velho Mundo batia em nossos rostos. Eu e o falecido Aurélio Teixeira, diretor de cinema, fomos assistir ao polêmico Mondo Cane. Filme proibidíssimo em diversos países. Depois, a Norma passou e nos pegou. Quando estávamos chegando na casa dela, os paparazzi pularam das árvores, dos muros e começaram a me fotografar. Eu pensei "Tô famoso mesmo, só pode ter sido o filme lá em Veneza!" Sabe aquela frase da novela O Clone, "Cada sorriso é um flash!" ou "Famoso por um flash?" Pois é, eu fiquei famoso por alguns flashes porque os fotógrafos estavam me confundindo com o Alain Delon. Eles disseram: "Não é ele! Non é o Delon. Ah, vá fan culo!" Na cidade de Roma, a gente ia para a Via Venetto. Era o point da época, o lugar das fantasias, onde as pessoas iam para ver o Marcelo Mastroianni e Anita Ekberg do filme La Dolce Vita - da contradição poética do Fellini, realizado em Roma entre o verão de 1958 e outono de 1959. Nada mais propício, nada mais convidativo. E lá estávamos nós, tomando café com sambuca, uma bebida parecida com cointreau, servida com um grão de café torrado. De vez em quando surgia alguém parecido com Anita Ekberg e começava a correria, a gritaria, o atropelamento. Mas mesmo quando não aparecia ninguém a gente se divertia, claro. Estávamos na Europa. Uma vez, em Cannes, o filme Toda Nudez Será Castigada, do Paulo Porto, Arnaldo Jabor e nos-so (RFF Produções), foi convidado a participar. Levamos outros filmes para a feira de amostras também. Eu e o Paulo Porto entramos num bar e lá estava o Gene Kelly sorvendo um coquetel, solitário, sentado num tamborete. À saída do palácio, onde exibiam os filmes, vi o Tarzan, o Johnny Weissmüller descendo as escadas, de pileque, batendo as mãos no peito, gritando como gritava nos filmes. Era a personificação da decadência. Foi um choque. No hotel onde estava hospedado, no quarto ao lado estavam o Carlos Saura, Geraldine Chaplin e a menina que fez o filme Cria Cuervos. Abrimos a porta e caminhamos lado a lado pelo corredor até o saguão do hotel. Emoções como essas me davam a sensação de inserção, de participação, mas, ao mesmo tempo, tão distante delas. Estávamos ali, brasileiros, concorrendo com produtos iguais, admirando o trabalho deles como provavelmente eles admirariam os nossos. Se os vissem. É difícil, e ainda é, fazer parte constante dessa indústria, nossa classe ainda sofre em busca de incentivos. Fazemos filmes, isoladamente, sem indústria consolidada. E, como ator, só mudando para lá estudando a língua deles, penetrando no universo deles. Ainda assim, falando sem sotaque. Isso tudo foi muito divertido, claro, não posso negar. Fazia parte da mentalidade da época, em que todos tinham que fazer filmes, inscrever no Itamaraty e ser aceitos para os festivais. Hoje, com toda a experiência vivida, e acho que o Roberto também pensa assim, isso não resolve. Não adianta fazer filme pensando que vai ganhar o Leão de Ouro ou o Oscar. Pode-se fazer um puta de um filme, mas faça o seu melhor filme para o público do cinema, para o Brasil, ou o público em geral. Em conseqüência, inscreva-o num festival. Mas nunca pensando: "Eu vou fazer o melhor filme para isso ou para aquilo!". Ganhei um premio internacional, o que foi conseqüência do trabalho. O Hector Babenco inscreveu o Lúcio Flávio no festival de Taormina, na Itália, para o qual não fui convidado. Só soube do festival e do prêmio através de um telefonema dele. "Você acaba de ganhar o prêmio concorrendo com filmes tais como o de Joseph Losey e outros. Como atriz feminina, ganhou uma russa". O Babenco mandou o prêmio, um diploma e um cartaz bonito do D. Quixote de La Mancha. Capítulo XI O Incrível Exército de Brancaleone Desde quando o Brasil começou a ter uma produção constante de filmes, o parâmetro crítico foi criado a partir dos filmes que vinham de fora. Era algo do tipo: "Faça um filme como um filme estrangeiro". Tinha um programa na Rádio Nacional que dizia "Falem mal, mas falem do cinema nacional". Era do Adolfo Cruz. As pessoas interpretavam de outra forma e levavam para o lado pejorativo. Tudo que vinha de fora era melhor. E diziam assim: "Não assisto cinema nacional". Os que faziam filmes cabeça não admitiam que se pudesse fazer alguma coisa fora de sua área. Ou se fazia filme cabeça ou se fazia merda. Hoje em dia, com uma diferença, sem filme cabeça, a preocupação está em fazer filme para ganhar o Oscar. Que Oscar porra nenhuma! Os americanos estão voltados para o próprio umbi go, até o útero! Só pensam neles! Eu não tiro o mérito do Cidade de Deus, acho o filme maravilhoso, mas a preocupação em ficar fazendo filme para ganhar Oscar é equivocada. A Academia de Cinema Americano dificilmente dará um prêmio a um filme brasileiro. A não ser que não tenham nada de bom a que possam premiar. Eles não querem premiar o que é nos-so porque temem que nossa indústria cresça. Não podem perder o quinhão do mercado. O cinema ideológico americano vendeu tudo. Do chiclete até as guerras que fizeram. Quando eu era criança, japonês era inimigo terrível. Índio era filho da puta. Depois, vieram os super-heróis que eles criaram para poder jogar na guerra do Vietnã. E por aí foi. Não estou dizendo que O Senhor dos Anéis não seja um bom filme. Adoro O Poderoso Chefão, adoro ver Al Pacino, De Niro, Marlon Brando e muitos outros. Mas eles sabem vender o que é deles. Temos filmes maravilhosos. O Andrucha (Waddington), fez um filme maravilhoso que vi recentemente, o Eu Tu Eles. Que filme lindo! Ali não tem nada de estrangeiro, é absolutamente nosso, vende o que é nosso. Mas para vender, é preciso indústria e não andar de pires na mão. Precisamos de leis mais ousadas, precisamos segurar as nossas bandeiras, colocá-las em nossas janelas para que entendam, para que possamos fazer filmes ideológicos. Ou será que só pintamos as ruas de verde e amarelo quando há Copa do Mundo? Sei que o próprio Fernando Meirelles (diretor de Cidade de Deus) disse que nunca almejou o Oscar e acabou sendo levado para o Oscar, ou seja, criou-se, e aí novamente estamos falando de formadores de opinião, uma mística em cima do Oscar. Temos que fazer filme para o cinema brasileiro. Temos que nos voltar para o nosso umbigo, enaltecer o Festival de Gramado, fazer dele o nosso Oscar, sem politiqueiros. Uma vez me chamaram para fazer parte do júri no Festival de Gramado e deram o melhor prêmio para a atriz do filme De Salto Alto, do Pedro Almodóvar, a Marisa Paredes. Eu fui contra. Não aceitei dar prêmio de atriz principal a uma coadjuvante. A principal era a que fazia o papel da filha dela. Disse que preferia dar o prêmio para a Betty Faria, que também era coadjuvante. Mas fui voto vencido. Estavam preocupados com a possibilidade de um mercado via Espanha?, me questionei. A Betty, para mim, estava muito melhor do que a tal de Paredes. Política em festival é f.! Falar de imprensa é sempre uma faca de dois gumes. Uma vez me perguntaram numa entrevista o que eu achava de ser símbolo sexual. Eu falei: "Não sou símbolo sexual. Eu sou baixinho, não tenho calcanhar, não tenho bunda, tenho varizes, acordo com mau hálito, arroto, peido..." e saiu tudo isso na matéria. Minha mãe ficou p. da vida, falou "Meu filho como é que você faz uma coisa dessas?" Mas nunca mais me perguntaram se eu era símbolo sexual. Eu faço exercício físico para manter a saúde, para me acalmar, não para ter um belo corpo, isso não me interessa. Uma repórter da revista Playboy passou quatro dias me entrevistando e, numa das perguntas, ela disse: "E o assédio das mulheres em cima de você?". "Milhares, de trezentas a quatrocentas por semana". Obviamente estava falando sobre as pessoas que chegavam para me pedir autógrafo, enfim, querer me abraçar, tocar em mim. Eu vivi esse momento. Ela, maliciosamente, publicou: "Reginaldo Fa-ria diz que já comeu mais de trezentas mulheres!". Começou a chover telefonema de outras pessoas querendo fazer entrevista comigo, querendo se aproveitar daquele momento. E, porra, eu não disse aquilo. Minhas amigas de verdade ficaram putas comigo. Ela deturpou. Mas não pedi correção. É de um corporativismo, um exercício de poder muito sacana. Eles estão resguardados pela liberdade de imprensa, falam o que querem, a gente se estrepa e eles ficam impunes. São covardes e cínicos. E o seu direito de resposta vai para a coluna de cartas do leitor. Há jornalistas corretíssimos, sem dúvida. Não vou generalizar. Uma vez fiquei embaraçado dando uma entrevista para a Leilane Neubarth sobre arquétipos. Num daqueles dias em que nada dá certo, eu não conseguia pronunciar a palavra arquetípica, eu dizia: arquétipica, arqueptitica, e ela gravou aquilo. Eu disse: "Cuidado, falei errado aí, por favor, não me derrube". Ela foi ética comigo. Não foi para o ar. É interessante registrar isso porque a atitude dela é rara e é muito comum isso acontecer com a gente. No teatro, tem críticos doentes que poderiam viver suas vidas ao invés de infernizar a dos outros. Já têm cristalizadas em suas mentes idéias e paradigmas dos quais não se libertam. Ficam enterradas ali porque acham que toda a crítica que fazem, ou todo o espetáculo que vêem, têm que ser sob o ponto de vista deles, e não sob o ponto de vista do espetáculo, da proposta de quem o criou. Ou mesmo simplesmente o que aquilo está querendo dizer para outras pessoas. Tem críticos saudáveis, imparciais, que sabem criticar, mesmo que não gostemos. Mas temos a certeza de que foram verdadeiramente críticos. Porém, há uma outra questão: com boa crítica ou não, onde reside o sucesso? O Assalto ao Trem Pagador fez sucesso e deu dinheiro porque o público gostou; Lúcio Flávio fez sucesso e deu dinheiro porque o público também gostou; Carandiru, Cidade de Deus. Todos sucessos. Se tiveram boa crítica ou não, eu não sei, não lembro. Mas será a crítica o componente necessário para levar multidões ao cinema? Aqueles são filmes que retrataram a realidade. Não foi necessário pintar a rua, não foi necessário esconder as crianças dos sinais, tirar os mendigos das sarjetas. Precisamos contar as nossas histórias, nossas verdades, e, principalmente, mostrá-las. O cinema americano mostra o Bronx, mostra tudo o que eles têm lá, inclusive as merdas que fazem; olha a quantidade de filmes sobre o que fizeram na Guerra do Vietnã, como Corações e Mentes, onde eles mostram a cagada que fizeram. E ainda faturam em cima disso, ganham em cima de tudo para suprir essa mesma indústria e continuar filmando. Mostram também seus heróis de guerra, mesmo que de forma distorcida. São ideológicos, porque, no fundo, o que interessa é o coração americano, capitalista ou não. Eu fui ver o World Trade Center depois do atentado. Fui lá dentro, eles não cobram a entrada mas vendem livros e mais livros. Comprei um sobre toda a trajetória do 11 de setembro. Uma seqüência de fatos narrada fotograficamente. Eles transformam a tragédia em comércio. Vendem prediozinhos do World Trade Center. Não estou querendo dizer que tenhamos de ser tão capitalistas, tão selvagemente capitalistas. Quero dizer é que, na nossa ideologia, precisamos mostrar muita coisa nossa ainda. São pouquíssimos os filmes históricos que nós fizemos, por exemplo. Quantos filmes históricos americanos já vimos? Perdi a conta. Se, em conseqüência dos bons filmes, nós entrarmos na festa do Oscar, tudo bem. Se ganharmos, melhor ainda. Mas fazer filme para ganhar prêmio no exterior faz parte de nossa mente colonizada. Vamos pensar na nossa indústria. Conquistar nosso próprio mercado, dominado pelas multinacionais há anos. Continuamos com a auto-estima baixíssima. Conquistando o próprio mercado, forçaremos o nosso espaço, outras leis de exibição e assim por diante. É triste pensar que os políticos entendam o cinema como algo supérfluo. Não! Não quero pensar assim e creio que eles também não. É triste imaginar que as verbas se destinem, em sua maioria, aos outros ministérios, enquanto a cultura permanece marginalizada. Na década de 70, quando o cinema brasileiro conquistou 50% do mercado brasileiro, num instante o Jack Valenti (presidente da Motion Pictures of America) estava aqui andando pelos bastidores do poder. Coincidência ou não, logo depois o cinema brasileiro deu uma parada. Ficaram célebres as discussões do Roberto, que era presidente da Embrafilmes, defendendo o cinema brasileiro, quando o Jack Valenti esteve aqui. Eu fui a Brasília com Luiz Carlos Barreto, Nelson Pereira dos Santos, Joaquim Pedro de Andrade, Betty Faria e Sonia Braga conversar com o expresidente João Batista Figueiredo para liberar dinheiro para o cinema brasileiro. E o Figueiredo disse: "Nós estamos em economia de guerra. Precisamos do dinheiro para o petróleo." E fim de papo. Nunca mais voltei a Brasília. Pensei: "Vou falar o quê com esses caras?" Nunca recebi ameaças, nunca tive problemas diretos com o governo militar. Mas o Pra Frente Brasil ficou preso um ano porque falava de tortura. A Embrafilmes foi decaindo, vários cineastas dessa época foram fazer filmes de publicidade; técnicos que viviam do cinema brasileiro foram trabalhar em televisão, em casas de shows, etc. Arnaldo Jabor teve que voltar para o jornalismo. Aliás, um bom jornalista, mas o cara é um puta diretor de cinema! Depois do Figueiredo, veio o Sarney com uma espécie de Lei Rouanet; depois, o Collor acabou de ceifar o cinema brasileiro. Acabou com a Embrafilme, com o Concine, com tudo. A classe artística não votou nele e ele ficou puto da vida. Ouço sempre as pessoas dizerem: "Americano é rico, poderoso, primeiro do mundo, pode fazer essas coisas". Mas como é que eles se transformaram em primeiro do mundo? Lutaram, expulsaram os ingleses de lá. Houve corrupção, houve máfia? Houve. Mas impuseram a ideologia deles através do cinema. Venderam até seus pensamentos. Hoje estão em baixa. Não de grana. Também não quero dizer que aqui só tem corrupção e péssimos políticos. Impossível. Não quero pensar assim. Tem que sobrar algum. Quanto aos cineastas, temos jovens maravilhosos, talentosíssimos. Vamos fazer os filmes dos jovens, vamos investir nos mais experientes. Oferecer opções para o público, abrir o mercado, e, com o tempo, os resultados virão e o público vai ficar orgulhoso de se ver na tela, como fica orgulhoso de se ver na televisão. Por que o mercado está restrito? Por que a gente só tem direito a exibir nossos filmes por al-guns dias por ano. Porque nossos filmes precisam dar a mesma média de bilheteria que um filme americano que gastou milhões de dólares em publicidade, senão saem de cartaz. Eu me empolgo porque enquanto há vida, há esperança. Mas, ao mesmo tempo, fico melancólico. Dependemos de uma série de intrincadas coisas para poder exercer o nosso trabalho. A Globo Filmes foi criada há algum tempo como uma grande parceria com o cinema brasileiro - e despertava novas esperanças. Mas, para fazer seu filme com a Globo Filmes, você entra num esquema que ainda não está rápido o suficiente - por exemplo, faz tempo que deixei o roteiro do Em Nome do Filho por lá mas ainda não tive resposta se interessa ou não. A televisão aliar-se ao cinema traz novas possibilidades: divulgação mais ampla, reconhecimento etc. A televisão alcançou o grande mercado com todos os méritos do mundo, e pode ajudar o cinema a reconquistar o seu. Eu sou ator de cinema e televisão e, quando faço teatro, sei que tenho mais público no teatro porque estou na televisão - e o público quer ver o ator da televisão no teatro. Quer ver qual a diferença entre o ator de tv e o de teatro. O mesmo pode acontecer no cinema. Claro que, ao olhar um set cinematográfico nos dias de hoje, com tantos recursos, duas fotografias batem na minha mente: a do passado e a do presente. E me dá também uma dor que, a priori, paralisa os meus sentimentos; em seguida torna produtiva a minha inquietude, porque tem tanta parafernália que eu posso usar para contar as minhas histórias. Eu tenho uma câmera de vídeo digital, não sei mexer nela totalmente e também odeio computador. Sou da máquina de datilografar. Ainda faço parte do romantismo mas quero realizar a porra do trabalho. Para isso, tenho que me adaptar ao puta do computador, mesmo que com uma puta duma dor. Sei que, na hora em que estiver no set, vou colocar esse sentimento lá, e quem vai captar esse sentimento vai ser o câmeraman com sua câmera, o iluminador com seu fotômetro, e vou dizer: "Eu quero esse movimento". Mas quem faz a mágica ainda é o artista, o homem. Com toda a evolução tecnológica, o processo não muda para quem faz cinema. Evidente que o comportamento social, através desse avanço, modifica as pessoas. Antes, uma cena podia acontecer com um personagem fechando uma porta, andando pelo corredor, entrando no elevador, descendo do elevador, saindo para o hall, indo para a calçada, abrindo a porta do carro, ligando o carro e saindo. Hoje, o personagem fecha a porta da rua e a cena já está com ele dirigindo seu carro. O público jamais percebeu essa evolução, mas assimilou e aceita a convenção. Entretanto, o que quero dizer é que o criador, o artista, na essência, continua o mesmo. É dele que saem as idéias. Os instrumentos estão à sua disposição. É ótimo termos excelentes câmeras, computadores, desde que nos sirvam e não nos tornem servidores. A linguagem, a forma frenética com as quais o mundo cinematográfico interage hoje com as pessoas, fazem parte de um mundo novo e o artista é aquele que cresce com ele. Senão, pifa. Eu sei que eu vou realizar o mesmo cinema que realizei quando fiz o meu primeiro filme. Com histórias diferentes, com vivência e com equipamentos diferentes. Durante esses trinta anos, desde o primeiro filme que fiz, aprendi muita coisa trabalhando como ator e vendo as pessoas trabalhando; vi outros diretores, e trabalhei percebendo suas qualidades, percebendo seus erros e seus acertos. Até porque sucesso e fracasso estão sempre caminhando lado a lado. Quando qualquer pessoa faz um trabalho, espera o sucesso, acredita que vai ser um sucesso. Ótimo. Hoje, para mim, e acredito que para muitas pessoas, conseguir realizar e completar o seu trabalho já é um sucesso. Não podemos perder a motivação artística. Deixar o tempo passar é triste. Já fiz história, por exemplo, acreditando que não ia ter grande público. Mas quis fazer porque ela me agradou e acreditei nela. Fracasso? Dói! Mas serve como espírito de luta. Se deixar o fracasso massacrar, já era, você morre como ser humano, acaba, vai se aposentar, botar pijama e ficar vendo na televisão o filme dos outros. O mosaico da história Festa dos Libertos, por exemplo, que vou filmar, me impressiona muito por causa da cidade de Goiás velho, que é linda e contribui para a beleza estética do filme. Só isso já é um fator que me move a realizar, a acreditar nele. Os fragmentos da história, extraídos da história geral do Brasil, em seus mínimos detalhes e, esquecidos pela história oficial, são os mais ricos porque são simples em suas particularidades. Eu me cobro por ainda não estar realizando esse filme. Assim como, na peça Em Nome do Filho, em que vi pessoas chorando e demonstrando que algo do espetáculo passou para elas, existe também a minha cobrança, porque quem cobra primeiro é a minha autocrítica. Quando você exagera na autocrítica, você se destrói, acaba não encontrando mais o lado estético que te causa prazer, felicidade e admiração pelo trabalho. Ao pensar nesse ato de criação e na crítica dele, me dá vontade de poetisar e penso que... "Quero mergulhar nos matizes da sua beleza para depois criar, e se, ao criar, estiver com excesso de cores, me criticar, mas não a ponto de me perder no arco-íris". Ator no teatro? Se é fraco, se deixa abater pela platéia, o espetáculo vai para o chão. Se é forte, tenta superar aquele momento, ergue-se. Depois, descobre que cresceu como ator. No trabalho seguinte, percebe-se melhor. Eu tinha dificuldades em fazer determinadas cenas em novela. Quando comecei a fazer teatro, percebi que aquelas cenas na novela se desenvolviam melhor. Um dia, fui fazer uma mínima participação na novela Celebridade e percebi que estava mais solto. Se melhorei como ator, não sei. Essas participações acontecem quando se acredita na sintonia entre atores e diretores. Agora, acho também que bobeiam aqueles autores que esquecem ou que não têm interesse em ter afinidades com atores; perdem pessoas maravilhosas. E os atores perdem chances com eles também. Um exemplo é uma participação que fiz na novela do Aguinaldo Silva, com quem trabalhei pela primeira vez em Tieta. Fiz o Cel. Jurandir de Porto dos Milagres. Um cara que estupra a irmã mais nova do personagem feito pela Luiza Thomé, personagem representado pela Luiza Curvo. Nunca tinha feito nada tão asqueroso. Mesmo depois de tantos anos, me fascina o fato de continuar aprendendo. A prática é a melhor universidade. Vivência, experiência, amadurecimento, fizeram com que eu percebesse as minhas possibilidades e os meus limites. Deixei de me vigiar tanto e mergulhei mais nos personagens. Pude me permitir jogar com algo que antes eu não jogava. Diversifiquei meus personagens na televisão. Briguei muito por isso, não me permiti permanecer na linha do eterno galã. Fiz o Jacques Léclair, fiz um mafioso em A Máfia no Brasil, fiz um homos-sexual em Boca do Lixo, o Marco Aurélio em Vale Tudo, o Barão Sobral de Força de Um Desejo, o Leônidas Ferraz de O Clone etc. O teatro está me ensinando a pensar. Às vezes, faço uma peça durante um ano, e lá pelo nono mês, descubro que a cena está errada, embora tenha sido eu quem a escreveu, quem a ensaiou. E digo: "Meu Deus, a cena é isso! Agora que eu percebi!". O imediatismo de certos trabalhos não nos deixa pensar mais profundamente. Sou contra o caco. O ator que fica, mesmo numa comédia, criando cacos, é porque perde o conteúdo e o ritmo do espetáculo. Numa determinada cena, podemos dar o máximo possível para extrair o riso, mas sem o caco. O caco é muleta, exibicionismo, insegurança. Ao terminar um trabalho, devemos reencontrar a própria vida, a família. Senão trazemos o cotidiano da televisão para casa. O personagem da TV toma o café da manhã, almoça e janta com pessoas que não são da sua família. Por isso é importante não levar o personagem para a cama. Ter o domínio da técnica para mergulhar e sair ileso depois. É saudável. Adoro o trabalho com realismo, naturalismo. Eu vivencio os sentimentos dos meus personagens. Se fosse fazer um filme como o Cidade de Deus hoje, com certeza penetraria num daqueles personagens com muito mais facilidade do que no personagem do Brás Cubas. Fazem parte do meu dia a dia, do meu social. Realismo fantástico? Interessante. Tenho de fazer um exercício muito grande para me abstrair do que é lógico. Por isso Brás Cubas foi tão difícil. Já Nelson Rodrigues, por exemplo, é um caso fantástico, genial. Ele ironiza o pudor, o moralismo das pessoas. Exacerba os sentimentos e traz à tona o humano. Ele exagera no drama e o drama é aceito, é verdadeiro; exagera no dramalhão do drama e o dramalhão é aceito. Esta é a grande sacada do Nelson Rodrigues. Acho que os únicos diretores que o entenderam realmente no cinema foram o Arnaldo Jabor e o Flávio Tambellini. Enquanto espero os filmes que tenho inscrito nas leis de benefício da cultura, estou escrevendo contos, exercitando uma atividade literária. Pode ser até que ninguém leia, mas não posso é parar. É uma forma de permanecer vivo. Já escrevi peças de teatro, roteiros de cinema. As pessoas olham os velhos como mais velhos e ponto final. Tudo que aprendemos fica atrás da linha, do limite permitido pela sociedade. Mas como, em minha carreira, ainda podemos representar alguns personagens mais caquéticos, ainda nos aceitam. É uma fase interessante, porque dependemos cada vez mais do nosso solitário talento. Por isso, escrevo meus contos que falam do passado, do rico passado que vivi. Com certeza, isso irá acontecer com os outros, de uma maneira ou de outra. Com alguns, nem isso. Deixa eu ler um pedaço de um texto que eu escrevi sobre essas coisas de "Falem mal mas fa lem do cinema nacional", daquele programa do Adolfo Cruz, num dos meus contos: "Esse slogan inteligente levava o público a amar o que era seu. Mesmo que o objeto do amor estivesse classificado como produto de baixa categoria. Essa ambígua forma de pensar também alimentava outros sentimentos, valorização do produto estrangeiro. Como bons colonizados, temos o beneplácito para nos tornar inteligentes e dotados de personalidades. Na época, enquadrar-se ao espírito da chanchada era extremamente difícil e cada qual sentia-se atraído a participar de outra linha de pensamento. O estilo da Atlântida, considerado arte menor pelos críticos, hoje é relíquia e obra nostálgica do nosso cinema. Permanece uma questão: do que lembramos mais, dos filmes ou dos críticos? Éramos também criticados pelos descrentes, invejosos e preconceituosos. O namorado de uma amiga de minha namorada foi enfático - "Mas esse cara é ator? Um filho de açougueiro?" Era um sujeito rico da cidade, dono de um edifício na praça. A minha inquietação não se abalou e eu jamais aceitaria uma volta, um retorno, desistência, medo, covardia, pusilanimidade e tão pouco o acolhimento de um quarteirão inteiro de edifícios de minha propriedade para viver num marasmo eternamente como o dele". Capítulo XII La Strada Dá para separar a minha carreira dessa forma: os anos 60 e 70 foram cinematográficos; os anos 80 tiveram bons filmes mas vieram com as explosões de popularidade e com os trabalhos das novelas; e os anos 90 foram mais teatrais, com algumas novelas, embora com menos filmes, infelizmente. Desse início de século, ainda estou contando. Olho para o futuro e é difícil saber o que vai acontecer. Estamos perdendo as nossas referências. Nossos símbolos e mitos perderam o senti-do. Como diz Joseph Campbell: "Só nos resta a terra". E eu digo: "Daqui a pouco nem a terra, se não pensarmos urgentemente nela". O desejo de poder, aquilo que mais causa satisfação, poder externo - não o subjetivo, não o poder do conhecimento, não o poder da espiritualidade - é uma aberração da natureza humana. Ser importante ou ser famoso por cinco minutos não leva a nada. E o violento nasce como filho rebelde dessa vertiginosa morte cultural. Todos estão ligados ao processo políticosócio-econômico mal-resolvidos. Ou será a raça humana mais próxima da imperfeição? A nossa história começa lá em mil e quinhentos e, de lá para cá, depois de tantas representatividades, fomos afundados até chegar aos dias de hoje, com CPIs, escândalos governamentais, corrupção em todas as áreas e tudo mais. Historicamente nada foi resolvido. Tudo é falso, mentiroso, manipulado. Quando se tem um país enterrado em dívidas, enterrado moralmente, enterrado com seus líderes, ninguém mais quer se levar a sério. Vamos esperar por um milagre? Não o milagre brasileiro daquela época. O milagre de encontrar alguém com vontade de solucionar, de recomeçar em outras bases. Revolução não seria pegar em armas e sair dando tiro. Revolução espiritual, sim. Mudar esses conceitos que esbarram em lutas acirradas pelo poder, disputas de cargos, disputas partidárias. Em todos os governos, só ouvi opiniões que se chocaram. Coesos para governar, poucas vezes soube existir. Acredito na honestidade dos que querem levar seus planos a sério; acredito até que se cansem no meio do caminho. Mas como uma partícula insignificante do povo, também me canso. No mundo das celebridades, por exemplo, existe tanta competição, inveja, ódio, que as pessoas se transformam em coisas e olham os outros como coisas. Eu não faço parte disso. Há um ponto em que as pessoas precisam se encontrar. E isso acontece ao encontrar a sua própria espiritualidade. E o povo encontra, em si mesmo, uma saída. Não tem Pentágono, não tem poder americano, não tem FMI, dívida externa, não tem produto interno bruto, não tem porra nenhuma que vá dizer ao o povo o que ele deve fazer. Ele acaba por negar-se em aceitar o narcótico cultural. O organismo fala mais alto, reage internamente, mesmo que de forma ainda desconhecida. Com essa reação, deixa de agir como autômato e vai experimentar o que é realmente seu. Se acredito em Deus? Sim. Acredito naquilo que faço acreditando em Deus, numa espiritualidade cósmica. Na yoga, há o que se chama de Ekagrata, um termo que significa concentrar-se em um ponto só. Ao se concentrar num único objeto, você se abstrai das coisas mundanas, criadas pelo sistema e descansa, relaxa, encontra a paz onde não há disputa. Encontra-se aí o Eu, diferente do ego, do egoísmo. Isso não quer dizer que eu não tenha as minhas angústias. Mas procuro superá-las, viver a vida e aceitar a angústia porque ela faz parte do processo. Se está comigo, tudo bem, eu não sou onipotente para dizer: "Estou acima da angústia, acima da angústia da morte". Eu tenho que aceitar a minha morte, seja ela no momento em que for. Não sei se vou agüentar, mas é assim que é. No meio disso tudo, vou fazendo uns filmes, umas novelas e umas peças. Cronologia de Trabalhos 2004 Cabocla (novela) Sinopse e personagem: Joaquim, viúvo, pai de Luís Jerônimo. Próspero comerciante, de caráter forte, educado, que vive apenas para o trabalho, pensando no futuro do rapaz. Preocupa-se com o tipo de vida que o filho leva, principalmente depois que descobre que ele está doente. No elenco, Daniel de Oliveira, Mauro Mendonça, Tony Ramos, Patrícia Pilar. Cazuza - O Tempo Não Pára (filme) Direção: Sandra Werneck e Walter Carvalho -Roteiro: Sandra Werneck Sinopse e personagem: Cinebiografia do cantor e compositor Cazuza. Reginaldo faz João Araujo, pai de Cazuza. No elenco, Daniel de Oliveira, Marieta Severo, Leandra Leal. 2003 Celebridade (novela) Direção: Dênnis Carvalho - De: Gilberto Braga Sinopse e personagem: Reginaldo faz Evaldo Corrêa, um milionário que quer ser famoso e procura a empresária Maria Clara Diniz (Malu Mader). Mercedes de Medellín (teatro) - Comédia Direção: Gustavo Gasparini - Texto: Reginaldo Faria Sinopse e personagem: Reginaldo é Gastão, um bandido que vive em guerra com seu maior rival pelo domínio da cidade, mas que é atormentado também por uma terrível obsessão: a fidelidade de sua esposa Mercedes. No elenco, Carlos Bonow, Diego Matos, Deborah Lobo. 2001 O Clone (novela) Direção: Jayme Monjardim - De: Gloria Perez Sinopse e personagem: Leônidas Ferraz, empresário e par romântico de Ivete, personagem de Vera Fischer. No elenco, Giovanna Antonelli, Murilo Benício, Juca de Oliveira, Dalton Vigh, Carla Dias, Daniela Escobar, Débora Falabella, entre outros. Memórias Póstumas (filme) Direção e roteiro: André Klotzel Sinopse e personagem: Baseado no romance homônimo de Machado de Assis, Reginaldo faz o personagem principal, Brás Cubas, um homem que volta depois de sua morte para contar a sua vida. E faz também o personagem Brás Cubas, vivendo no Rio de Janeiro do século XIX. No elenco, Petrônio Gontijo, Vietria Rocha, Sonia Braga (participação espe cial). Porto dos Milagres (novela) Direção: Marcos Paulo - Autor: Aguinaldo Silva e Ricardo Linhares Sinopse e personagem: Numa pequena cidade, o Cel. Jurandir de Freitas estupra a jovem Cecília (Luiza Curvo), que se suicida por vergonha. Mas a irmã mais velha dela, Rosa Palmeirão (Luiza Thomé) vinga-se assassinando-o com um tiro de espingarda no peito. Faz parte da primeira fase da novela. No elenco, Antonio Fagundes, Marcos Palmeira, Flávia Alessandra, Zezé Polessa. Dia dos Namorados (teatro) Direção: Regis Faria - Texto: Reginaldo Faria Produção: Produções Cinematográficas R. F. Farias Sinopse e personagem: Reginaldo Faria interpreta o intelectual Alfredo, marido de Mimi, mulher fútil e contida que vive uma relação intelectual com o marido. A semente da desconfiança é plantada no lar do casal quando eles têm suas flores e cartões trocados no Dia dos Namorados com os de outro casal e uma série de coincidências cômicas leva-os a desconfiarem da fidelidade de seus parceiros. Apenas na temporada em São Paulo, a peça acumulou um público de 14 mil pessoas em apenas quatro meses. No elenco, Reginaldo Faria, Thierry Figueira, Lorena da Silva, Nina Morena, Leandro Hassum. 1999 Força de Um Desejo (novela) Direção: Marcos Paulo - Autor: Gilberto Braga e Alcides Nogueira Sinopse e personagem: Reginaldo faz o poderoso Barão Henrique Sobral, casado com Helena (Sonia Braga), e pai do jovem Inácio (Fabio Assunção), que vive um romance proibido com a dona do mais famoso bordel da corte. Sobral tem inimigos políticos e acaba assassinado. No elenco, Malu Mader, Paulo Betti, José Lewgoy, Selton Mello, Nathalia Timberg, Lavinia Vlasak, Carlos Eduardo Dolabella, entre ou tros. 1997 Em Nome do Filho (teatro) - drama Texto e produção: Reginaldo Faria Sinopse e personagem: Reginaldo faz um bem sucedido executivo que é pai de um jovem chamado Junior (Marcelo Faria), que está à beira da morte por conta de uma overdose de drogas e tenta obter de seu pai uma confissão sobre suas origens - e a verdade de sua paternidade. Ao mesmo tempo, o pai tenta convencer o filho a deixar as drogas. A peça mostra o abismo no relacionamento entre duas gerações, com erros e acertos de cada uma. Foi assistida e aplaudida por mais de 30.000 pessoas em todo o Brasil. No elenco, ainda Regiane Antonine, substituída por Luiza Thiré e depois por Roseh Ventura. Zazá (novela) Direção: Jorge Fernando - Autor: Lauro Cesar Muniz Sinopse e personagem: Reginaldo faz Roberto, um cineasta contratado por Zazá (Fernanda Montenegro) - uma mãe de sete filhos que resolve transformar a vida medíocre que eles levam recebendo mesada e sem sonhos nem ideais, partindo ela própria para uma aventura de voar como Santos Dumont. No elenco, Ney Latorraca, Jorge Dória, Paulo Goulart, 1995 Engraçadinha... Seus Amores e Seus Pecados (minissérie) Direção: Denise Saraceni Direção Artística: Carlos Manga - Autor: Leopoldo Serran, adaptado da obra de Nelson Rodrigues Sinopse e personagem: Reginaldo faz uma participação especial como o Dr. Areal, um médico sem muitos escrúpulos que atende a jovem Letícia (Mylla Christie), filha da protagonista Engraçadinha (Claudia Raia), mulher que esconde os impulsos sexuais depois de um trauma no passado. Explode Coração (novela) Direção: Dennis Carvalho - Autor: Glória Perez Sinopse e personagem: Reginaldo faz César, um homem pouco fiel que vive envolvido em suas armações. Ele é padrasto de Serginho, personagem de Rodrigo Santoro. No elenco, Tereza Seiblitz, Paulo José, Eliane Giardini, Ricardo Macchi, Edson Celulari, Nívea Maria, Floriano Peixoto, Maria Luisa Mendonça, Rodrigo Santoro, Renée de Vilmond, entre outros. A Próxima Vítima (novela) Direção: Jorge Fernando - Autor: Silvio de Abreu Sinopse e personagem: Uma série de assassinatos acontece no desenrolar da trama buscando apenas um só assassino, com todos os persona-gens sendo vítimas e culpados em potencial. Reginaldo faz uma participação especial como Paulo Soares, um empresário que é a primeira vítima do assassino em série. No elenco, Suzana Vieira, José Wilker, Tony Ramos, Tereza Rachel, Aracy Balabanian, Claudia Ohana, Viviane Pasmanter, Cecil Thiré, Antonio Pitanga, Norton Nascimento, André Gonçalves, Lui Mendes, Zezé Motta, Lima Duarte, Alexandre Borges, Selton Mello, entre outros. 1994 Amândio, o bem-amado (teatro) Inspirada no original Messieur Amedée, de Alain Reynaud Fourton - Tradução Flávio Marinho - Direção: Gilles Gwizdek Elenco: Reginaldo Faria, Tânia Loureiro, Expe dito Barreira, Claudia Ventura, Gustavo Ottoni, Jupiro Lee e Roseh Ventura. Sinopse e personagem: Reginaldo faz um professor de origem portuguesa que conhece uma "moça de família" acidentalmente - mas ela é uma prostituta que vai morar com ele e ainda leva para sua casa uma série de persona-gens marginais como um cafetão, uma outra prostituta. No final, o professor transforma-se no cafetão de todos eles. 1993 Olho no Olho (novela) Direção: Ricardo Waddington - Autor: Antonio Calmon Sinopse e personagem: Reginaldo faz Cesar Zapata, um empresário que usa a força de jovens paranormais como Fred (Nico Puig) para fazer o mal, ter poder e destruir todos os que lutam pelo bem, como um ex-padre, Guido, papel de Tony Ramos. No elenco, Stênio Garcia, Felipe Folgosi, Natalia do Vale, Danielle Winitz, Patrícia de Sabrit, Alessandra Negrini, Felipe Pinheiro, Rodrigo Santoro, Rodrigo Penna, Patrícia Travassos, Maria Zilda Bethleem, Mario Gomes, Milton Gonçalves, Thales Pan Chacon, Tony Tornado, Selton Mello, Gerson Brener, Helena Ranaldi, Fernando Almeida, Cleyde Yaconis, Jorge Dória, Antonio Calloni, entre outros. Contos de Verão (minissérie) Direção: Roberto Farias - Autor: Domingos Oliveira, com roteiro final de Roberto Farias e Sérgio Marques Sinopse e personagem: Reginaldo vive Cabral, um escritor que resolve refurgiar-se em Búzios para escrever uma minissérie para a televisão, onde narra histórias de sua própria vida. Todas as histórias têm como tema central os conflitos do homem de meia idade. Cabral tem cinco casamentos desfeitos e uma filha, Samanta (Ana Kutner), uma jovem atriz; e está casado com Glorinha (Vera Zimmerman), que tem 20 anos a menos do que ele, é cheia de sonhos e um pique de vida que ele perdeu. No elenco, Ana Kutner, Aline Vargas, Antonio Caloni, Nuno Leal Maia, Maitê Proença, Deborah Secco, entre outros. Um Caso de Amor (teatro) - drama Texto de David Stevens - Tradução de Flávio Marinho Sinopse e personagem: Reginaldo interpreta o pai de um homossexual que cuida do filho fazendo o papel de pai e mãe ao mesmo tempo. O rapaz, quando está em casa, trans-forma-se num verdadeiro machista, exigindo o melhor para si em detrimento de seu pai. Quando o pai arruma uma namorada, e ela quer "corrigir" o comportamento homossexual do filho, o rapaz encontra no pai um aliado, que o ama acima de qualquer julgamento. No elenco, Tadeu Aguiar e Thaís Portinho (depois Mara Reis) 1992 As Noivas de Copacabana (minissérie) Direção: Roberto Farias - Autor: Dias Gomes, Ferreira Gullar e Marcilio Moraes Sinopse e personagem: Reginaldo faz o detetive Jorge França, que busca um assassino em série que atua matando suas futuras noivas - o assassino é Danilo (Miguel Falabella), um conceituado restaurador de obras de arte. As investigações do detetive narram a trama. Ele usa sua própria amante, Leiloca (Branca de Camargo), para atrair o assassino e prende-o no final. No elenco, Patrícia Pillar, Yara Lins, Christiane Torloni, Tássia Camargo, Ricardo Petraglia, Hugo Carvana, Zezé Polessa, Branca de Camargo, Ewerton de Castro, Marcelo Faria, Marieta Severo, Milton Gonçalves, Domingos Oliveira, Suely Franco, Lady Francisco, Fabio Junqueira, entre outros. 1991 Vamp (novela) Direção: Jorge Fernando - Autor: Antonio Calmon Sinopse e personagem: Na fictícia Armação dos Anjos, Reginaldo vive o capitão reformado da marinha Jonas Rocha, um viúvo, pai de seis filhos, que se apaixona por uma viúva, Carmem Maura (Joana Fomm), mãe de seis filhos. A cidade é pacata até a chegada da cantora Natasha (Claudia Ohana), uma mulher misteriosa que conseguiu fama mundial porque fez um pacto com o poderoso vampiro, o Conde Vlad (Ney Latorraca). O capitão Jonas é o único que pode destruir o vampiro. No elenco, Bia Seidl, Paulo Gracindo, Otavio Augusto, Patrícia Travassos, Nuno Leal Maia, Flávio Silvino, André Gonçalves, Evandro Mesquista, Bete Coelho, Tony Tornado, Pedro Vasconcelos, Rodrigo Penna, Vera Zimmerman, Luciana Vendramini, Paulo José, Norma Geraldy, Jonas Torres, Carol Machado, Fabio Assunção, Aída Lerner, entre outros. 1990 Lua Cheia de Amor (novela) Direção: Roberto Talma - Autor: Ana Maria Moretzsohn, Ricardo Linhares e Maria Carmem Barbosa Sinopse e personagem: Reginaldo faz Vinícius, namorado de Laís Souto Maia, personagem de Suzana Vieira. Primeira novela em que contracena com Marcelo Faria. No elenco, Marilia Pêra, Isabela Garcia, Francisco Cuoco, Roberto Bataglin, Mauricio Mattar, Sylvia Bandeira, Cláudio Cavalcanti, Arlete Salles, Mario Gomes, Maria Mariana, Fernando Almeida, Chica Xavier, Geraldo Del Rey, Inês Galvão, Paula Lavigne, Guga Coelho, Bete Mendes, entre outros. Boca do Lixo (minissérie) Direção: Roberto Talma - De: Silvio de Abreu Sinopse e personagem: Reginaldo faz Henrique Ribeiro, um grande industrial que arruma um casamento de conveniência com uma ex-atriz de pornochanchada, Claudia Toledo (Silvia Pfeifer) para esconder sua ho mossexualidade. Ele arma um plano para desaparecer após dar um golpe financeiro. No elenco, Alexandre Frota, Suzana Vieira, Stênio Garcia, Claudio Correa e Castro, Mario Gomes. Somente Entre Nós (estréia em teatro) Direção: Roberto Frota - Texto: Reginaldo Faria (inspirado em O Curioso Impertinente, de Miguel de Cervantes) Sinopse e personagem: Reginaldo é Tony, um conhecido ator desempregado que está em busca de financiamento para a sua peça até que um amigo resolve ajudá-lo, porém impondo uma condição: que Tony o ajude a testar a fidelidade de sua esposa, personagem de Ângela Vieira. No elenco, ainda estão Toni Ferreira e Felipe Martins (depois Chico Tenreiro). 1989 Tieta (novela) Direção: Paulo Ubiratan - De: Aguinaldo Silva, Ricardo Linhares e Ana Maria Moretzsohn, adaptado do romance de Jorge Amado Sinopse e personagem: Na fictícia cidade de Santana do Agreste, onde todos fingem ser o que não são, e o ódio e a inveja imperam na vida dos cidadãos, Reginaldo faz Ascânio Trindade, um ex-morador que volta à terra natal 20 anos depois com o intuito de trazer progresso e civilização. Ele torna-se secretário do prefeito e une-se a Tieta (Betty Faria) para colocar a obra em prática. Ao mesmo tempo, faz parte de um grupo conhecido como "cavaleiros do apocalipse", formado pelos amigos Timóteo (Paulo Betti), Amintas (Roberto Bonfim) e Osnar (José Mayer). No elenco, Joana Fomm, Cássio Gabus Mendes, Ary Fontoura, Tássia Camargo, Arlete Salles, Yoná Magalhães, Renato Consorte, Claudia Alencar, Danton Mello, Flávio Galvão, Françoise Fourton, Elias Gleizer, Paulo José, Paulo César Grande, Otávio Augusto, Cristina Galvão, entre outros. 1988 Lili, a Estrela do Crime (filme) - policial Direção: Lui Farias - Roteiro: Lui Farias, Vicente Pereira Sinopse e personagem: Reginaldo faz Renato, um policial às vésperas de se aposentar que persegue uma criminosa famosa, Lili Carabina, personagem de Betty Faria, e seu bando. No elenco, Patricia Travassos, João Siggnorelli, Mario Gomes. Vale Tudo (novela) Direção: Paulo Ubiratan, Dênnis Carvalho e Ricardo Waddington - Autor: Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Basseres Sinopse e personagem: Reginaldo faz Marco Aurélio Catanhede, braço direito da empresária Odete Roitman (Beatriz Segall), na companhia aérea TCA. Ele vira amante de Maria de Fátima (Gloria Pires), menina pobre que quer subir na vida a qualquer custo. Casado com Leila (Cassia Kiss), é ela quem mata Odete Roitman por acaso, pensando que estava atirando em Fatima. No final, Marco Aurélio engana a todos, consegue milhões e foge do país dando uma banana para a câmera - na cena que ficou antológica. No elenco, Regina Duarte, Daniel Filho, Antonio Fagundes, Pedro Paulo Rangel, Carlos Alberto Ricelli, Cássio Gabus Mendes, Lídia Brondi, Renata Sorrah, Adriano Reys, Bia Seidl, Carlos Gregório, Cláudio Correa e Castro, Danton Mello, Dennis Carvalho, Fabio Junqueira, Fabio Villaverde, Fernando Almeida, Flavia Monteiro, Lilia Cabral, Sebastião Vasconcelos, Sergio Mamberti, Marcos Palmeira, entre outros. 1987 A Menina do Lado (filme) - romance Prêmio: Festival de Gramado, Melhor Ator Direção: Alberto Salvá - Roteiro: Alberto Salvá e Elisa Tolomelli Sinopse e personagem: Reginaldo faz Mauro, um escritor maduro que aluga uma casa na praia a fim de terminar seu romance - e conhece uma menina adolescente, personagem de Flavia Monteiro, com quem vive uma aventura amorosa, a despeito de todas as censuras sociais. No elenco, Deborah Duarte, John Herbert, Sergio Mamberti, Adriano Reys, Tania Scher. Corpo Santo (novela) - Rede Manchete Direção: Ari Coslov, supervisão de José Wilker De: José Louzeiro Sinopse e personagem: Reginaldo faz Téo, um bandido que chefiava uma quadrilha de criminosos. No elenco, Christiane Torloni, Lídia Brondi, Silvia Buarque, Otavio Augusto, Chico Diaz, Antonio Pitanga, Márcia Rodrigues, entre outros. 1986 Com Licença, Eu Vou à Luta (filme) Festival de Gramado - indicado a Melhor Ator Coadjuvante Direção: Lui Farias - Roteiro: Alice de Andrade, Lui Farias, Roberto Farias, Eliane Maciel (baseado no livro de Eliane Maciel) Sinopse e personagem: Reginaldo faz Mílton, um militar aposentado com problemas neurológicos, casado com a personagem de Marieta Severo e pai da jovem interpretada por Fernanda Torres - que desafia as convenções da família para ser dona de seu próprio destino. No elenco, Fernanda Torres, Marieta Severo, Carlos Augusto Strazzer, Yolanda Cardoso, Tânia Boscoli, Duce Nacarati, Ilva Niño, Analu Prestes, Carlos Wilson, Caio Torres, Paulo Porto. 1985 Tititi (novela) Direção: Wolf Maya, com supervisão de Paulo Ubiratan e Daniel Filho - Autor: Cassiano Gabus Mendes Sinopse e personagem: Reginaldo é André Spina, um conceituado costureiro da alta sociedade paulistana que, em seu trabalho, intitula-se com o nome de Jacques Leclair e finge ser afeminado - o que o aproxima das mulheres e aumenta suas conquistas. Ele e sua amante Clotilde (Tania Alves) realizam as mais engraçadas fantasias sexuais. Com o tempo, ele vai perdendo poder porque seu ex-amigo de infância, Ariclenes (Luiz Gustavo), revoluciona o mundo da moda com o costureiro Victor Valentin e usando modelos criados por Cecilia (Natalia Thimberg), uma paciente com deficiências mentais que vive esquecida num sanatório. O que André/Jacques não sabe é que Cecília é sua mãe desaparecida há anos. No elenco, Cássio Gabus Mendes, Malu Mader, Marieta Severo, Paulo Castelli, Aracy Balabanian, Myrian Rios, Adriano Reys, Betty Gofman, Cleide Blota, Guilherme Fontes, Lucia Alves, Mila Moreira, Sandra Bréa, Thaís de Campos, Yara Cortes, Tato Gabus Mendes, entre outros. 1984 Agüenta, Coração (filme) - drama Diretor: Reginaldo Faria - Roteiro: Reginaldo Faria Sinopse e personagem: Na história, Reginaldo faz João, um corretor de imóveis casado com a modelo Maria (Christiane Torloni), que, nas horas vagas, exerce o hobby de filmar curtametragens. Numa de suas imagens, ele registra o momento de um assassinato e consegue entrar para a televisão - ficando famoso como repórter. Mas sua fama não condiz com o casamento e com a profissão de sua esposa. No elenco, Osmar Prado, Cristina Aché, Jorge Botelho, Gilda Guilhon, Milton Moraes, Alvaro Freire, Lady Francisco, Raul Cortez, Mila Moreira. A Máfia no Brasil (minissérie) Autor: Leopoldo Serran, a partir do romance homônimo de Edson Magalhães Roteiro final: Paulo Afonso Grisolli e Roberto Farias - Direção Geral: Paulo Afonso Grisolli Direção: Roberto Farias e Maurício Farias Sinopse e personagem: Reginaldo é Lucien, um dos principais líderes da máfia no país. Ele vive um romance arrebatador com Heloisa (Marcia Porto), moça de família que sonha com um futuro melhor por conta de suas origens humildes. Por causa do romance, Lucien acaba fugindo às responsabilidades com a organização e é punido por ela ao ser eliminado. No elenco, Denise Del Vecchio, Cláudio Macdowel, Gilles Gwizdek, Leonardo José, Claudio Mamberti, Antonio Pompeo, Alba Valeria, entre outros. Transas e Caretas (novela) Direção: José Wilker e Mario Marcio Bandarra, supervisão de Paulo Ubiratan - Autor: Lauro Cesar Muniz Sinopse e personagem: Reginaldo faz Jordão, irmão de Tiago (José Wilker) e filho da rica empresária Francisca Imperial (Eva Wilma). Jordão é conservador, comporta-se como um homem do século XIX com convicções monarquistas; toca cravo, tem mordomo e até mesmo mucama. Seu irmão é totalmente oposto, moderno, cibernético. Os dois se apaixonam pela mesma mulher: Marília (Natália do Vale) que, na verdade, foi contratada pela mãe dos rapazes para que ao menos um deles se case e lhe dê um herdeiro. Ao longo da história, Jordão vai se modernizando e acaba casandose com uma prostituta, papel de Lady Francisco. No elenco, Carlos Zara, Carlos Kroeber, Christiane Torloni, Cláudio Correa e Castro, Clementino Kelé, Cininha de Paula, Jece Valadão, Lídia Brondi, Milton Moares, Zezé Motta, Sergio Mamberti, entre outros. 1983 Louco Amor (novela) Direção: Paulo Ubiratan - De: Gilberto Braga Sinopse e personagem: Reginaldo é Guilherme, dono de uma revista de moda chamada Stampa, casado com Muriel (Tonia Carreiro), mulher que enfrenta a vilã Renata Dumont (Tereza Rachel), a mulher de um embaixador que tenta evitar que sua família se envolva com a classe baixa - e tenta impedir o casamento da filha Patrícia (Bruna Lombardi) com o jovem Luis Carlos (Fabio Junior), rapaz pobre e estudioso. No elenco, Mauro Mendonça, Nicette Bruno, Gloria Pires, Lauro Corona, Tônia Carreiro, Thereza Rachel, Lady Francisco, Carlos Eduardo Dolabella, Christiane Torloni, Antonio Fagundes, Arlete Sales, Milton Moraes, Mario Lago, Carlos Alberto Ricelli, Bia Seidl, Arlete Sales, Fernando Torres, entre outros. 1982 Elas por Elas (novela) Direção: Paulo Ubiratan - Autor: Cassiano Gabus Mendes Sinopse e personagem: Reginaldo é Renê, um advogado sem projeção, parceiro do persona-gem Mario Fofoca (Luis Gustavo). Ele se envolve com suas clientes no intuito de conquistálas. Ele se apaixona por Yeda (Cristina Pereira), filha de Marcia (Eva Wilma), que pensa que ele está dando o golpe do baú por conhecer as armações de Mario e René. No elenco, Aracy Balabanian, Sandra Bréa, Mila Moreira, Joana Fomm, Maria Helena Dias, Mario Lago, Nathalia Timberg, Lauro Corona, Carlos Zara, Tassia Camargo, Herson Capri, Neuza Amaral, Suzana Vieira, Stênio Garcia, Norma Blumm, Marco Nanini, Christiane Torloni, Carlos Gregório, Cássio Gabus Mendes, Ney Latorraca, Thaís de Campos, Deborah Duarte, Irene Ravache, Ivan Candido, Fabio Sabag, entre outros. Pra Frente, Brasil (filme) - drama -Prêmio: Festival de Gramado, Melhor Filme Direção: Roberto Farias - Roteiro: Roberto Farias - Argumento de Reginaldo Faria e Paulo Roberto Mendonça. Sinopse e personagem: Reginaldo faz Jofre, um homem capturado pela polícia e confundido com um terrorista, que é barbarizado em uma espécie de calabouço, enquanto as pessoas celebram a vitória do Brasil na Copa do Mundo de 1970. No elenco, Natália do Valle, Antônio Fagundes, Lui Farias, Maurício Farias, Irma Álvarez, Neuza Amaral, Expedito Barrei ra, Rogério Blum, Dennis Bourke, Ivan Cândi do, Renato Coutinho, Newton Couto, João Batista do Reino, 1981 Baila Comigo (novela) Direção: Roberto Talma e Paulo Ubiratan -Autor: Manoel Carlos Sinopse e personagem: Saulo Martins, um médico homeopata. A história gira em torno dos gêmeos univitelinos interpretados por Tony Ramos, Quinzinho e João Vitor. No elenco, Fernanda Montenegro, Lílian Lemmertz, Raul Cortez, Tereza Rachel, Betty Faria, Lauro Corona, Lady Francisco, Mario Lago, Milton Gonçalves, Natalia do Vale, Otavio Augusto, Suzana Vieira, Cláudio Cavalcanti, Arlete Sales, Carlos Zara, Beth Goulart, Myrian Pires, entre outros. Parceiros da Aventura (filme) - drama Direção e roteiro: José Louzeiro Sinopse e personagem: Reginaldo faz uma participação especial. No elenco, Banzo Africa-no, Rodolfo Arena, Leonidas Bayer, Maria Zilda Bethleem, Milton Gonçalvez, Wilson Grey, Flávio Migliacio, Paulo Moura, Ana Madalena. Água Viva (novela) Direção: Roberto Talma e Paulo Ubiratan -Autor: Gilberto Braga Sinopse e personagem: Reginaldo é Nelson Fragonard, um campeão de pesca que vive de renda e um dia perde tudo. Obrigado a reconstruir sua vida, ele se apaixona por Lígia (Betty Faria), mulher humilde mas que deseja ascender socialmente. O irmão de Nelson é Miguel (Raul Cortez), cirgurgião plástico famoso internacionalmente que também se apaixona por Ligia. No elenco, Beatriz Segall, Tonia Carreiro, Lucélia Santos, Carlos Eduardo Dolabella, Isabela Garcia, Lucélia Santos, Fabio Junior, Eloísa Mafalda, José Lewgoy, Milton Moraes, Maria Zilda Bethleem, Ivan Candido, Kadu Moliterno, Licia Magna, John Herbert, Tetê Medina. 1978 Dancin’ Days (novela) Direção: Daniel Filho - Autor: Gilberto Braga (a partir de um tema de Janete Clair) Sinopse e personagem: Reginaldo é Hélio, o dono da boite Frenetic Dancin’ Days, onde a personagem principal Julia Matos (Sonia Braga), uma ex-presidiária que tenta reconstruir sua vida, dá um show de dança logo na inauguração. No elenco, José Lewgoy, Beatriz Segall, Glória Pires, Joana Fomm, Lauro Corona, Lídia Brondi, Antonio Fagundes, Ary Fontoura, Mauro Mendonça, Ivan Cândido, Jacqueline Laurence, Neusa Borges, Eduardo Tornaghi, Pepita Rodrigues, Cleide Blota, Yara Amaral, Ney Latorraca, Milton Moraes, Sandra Pêra, Suzana Faini, entre outros. 1977 Barra Pesada (filme) - drama policial Prêmio: Festival de Gramado, Melhor Trilha Sonora composta por Edu Lobo; Melhor Atriz para Kátia D ‘Angelo; Melhor Ator Coadjuvan te para Ivan Cândido. Stepan Nercessian - Melhor Ator pela Imprensa do Festival Direção e roteiro: Reginaldo Faria (a partir de um conto de Plínio Marcos) Sinopse e personagem: Um jovem assaltante, filho de uma prostituta que se suicida ateando fogo às vestes, envolve-se com dois policias que o chantageiam. No elenco, Cosme dos Santos, Stepan Nercessian, Katia D´Angelo, Milton Moraes, Itala Nandi, Elza Gomes, Ivan Candido. Reginaldo faz uma pequena participação como um cafetão. Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia (filme) - policial Prêmio: Festival de Gramado, Melhor Ator -Prêmio: Festival Internacional de Messina e Taormina, Itália, Melhor Ator Diretor: Hector Babenco - Roteiristas: Hector Babenco , Jorge Durán, José Louzeiro - inspirado no livro homônimo de José Louzeiro Sinopse e personagem: Reginaldo faz Lúcio Flávio, um ex-policial que transforma-se em criminoso ao liderar um grupo de extermínio de bandidos chamado Esquadrão da Morte, no Rio de Janeiro. O filme é baseado numa história real e mostra os últimos momentos da vida do bandido, que conta sua história a um repórter. No elenco, Ana Maria Magalhães, Ivan Cândido, Lady Francisco, Álvaro Freire, Milton Gonçalves, Stepan Nercessian, Grande Otelo, Sergio Otero, Paulo César Peréio , Ivan Setta, Érico Vidal, Ivan de Almeida. 1975 O Flagrante (filme) - comédia Direção: Reginaldo Faria Roteiro: Reginaldo Faria (a partir de argumento de Ronaldo Graça) Sinopse e personagem: Reginaldo é integrante de um grupo de amigos casados que resolvem dar uma escapadinha da vida conjugal e passar o carnaval numa festa de solteiros. Ele descobre que sua mulher, personagem de Maria Claudia, vai se vingar com a mesma moeda - traindo-o - e decide armar um flagrante para ela. No elenco, Carlos Eduardo Dolabella, Flávio Santiago, Antonio Pedro, Grande Otelo, Carlos Alberto Barros, Rodolfo Arena, Silvia Cadaval, Claudio Marzo. 1973 Quem Tem Medo de Lobisomem? (filme) Direção e roteiro: Reginaldo Faria Sinopse e personagem: Reginaldo faz Lula, um rapaz que, junto com seu amigo, Neto (Stepan Nercessian), resolve procurar por terras que pertenceriam à sua família. Eles conhecem Iracema (Camila Amado), uma noiva que foi abandonada no altar. Juntos, os três envolvem-se numa aventura a bordo de um jipe. Eles param numa cidade e imaginam voltar aos anos 30, e encontram presos políticos torturados. No elenco, Neuza Amaral, Cristina Aché, Carlos Kroeber, Fatima Freire. 1972 Os Machões (filme) - comédia Direção e argumento: Reginaldo Faria - Roteiro: Bráulio Pedroso Sinopse e personagem: Reginaldo faz Didi, integrante de um trio de amigos que tentam conquistar mulheres e ganhar dinheiro facil mente; mas eles acabam contratados num salão de beleza e precisam aprender trejeitos afeminados para fazer sucesso. No elenco, Erasmo Carlos, Flávio Migliacio, Neuza Amaral, Tania Scher, Danton Jardim, Kate Hansen, Monique Lafond, Elke Maravilha. 1972 Tempo de Viver (novela) - TV Tupi Direção: Marlos Andreuci, Jece Valadão, Péricles Leal - Autor: Péricles Leal Sinopse e personagem: Reginaldo faz um ascensorista de elevador e se apaixona pela personagem de Adriana Prieto, jovem rica da sociedade carioca. No elenco, Jece Valadão, Camila Amado, André José Adler, Haroldo de Oliveira, Rubens de Falco, Myriam Persia, Paulo Cesar Pereio, Sebastião Vasconcelos, Neila Tavares, Irene Stefânia, Zanone Ferriti. Roberto Carlos a 300 km Por Hora (filme) Roteiro: Roberto Farias, Braulio Pedroso Direção: Roberto Farias Sinopse e personagem: Um jovem mecânico (Roberto Carlos) sonha ser piloto de corrida e ganha uma chance quando um dos profissionais se machuca e não vai poder correr. Reginaldo faz uma participação especial como um cliente da oficina de Roberto. No elenco, Erasmo Carlos faz outro mecânico, Walter Forster, Flávio Migliacio, Cristina Martinez, Raul Cortez, Libânia Almeida. 1970 Pra Quem Fica, Tchau (filme) - comédia Direção e roteiro: Reginaldo Faria Trilha Sonora: Reginaldo Faria, com a música "A estrada Azul", em parceria com Paulo Roberto Mendonça. A canção é a primeira gravada por seu intérprete, Ney Matogrosso. Sinopse e personagem: Na história, Reginaldo vive um carioca esperto que ajuda o primo, personagem de Stepan Nercessian, um jovem que vem para o Rio de Janeiro e se envolve com uma mulher mais velha, personagem de Rosana Tapajós. No elenco, Flávio Migliacio, Irma Alvarez, José Lewgoy, Tania Scher, Henriqueta Brieba, Wilza Carla, Jorge Cherques. Estranho Triângulo (filme) Direção: Pedro Camargo Trilha Sonora: Reginaldo Faria 1969 Os Paqueras (filme) Estréia como diretor Direção: Reginaldo Faria - Roteiro: Reginaldo Faria, André José Adler e Xavier de Oliveira Sinopse e personagem: Reginaldo faz Nonô, um paquerador de Copacabana que acaba se envolvendo com a filha de seu melhor amigo, Toledo (Walter Foster), outro paquerador inveterado. No elenco, Irene Stefânia, Adriana Prieto, Leila Diniz, Darlene Gloria, Irma Alvarez, Valentina Godoy, Sonia Dutra, Suzana Faini, Diva Helena, Francis Kan, Ambrosio Fregolente. 1968 Lance Maior (filme) - drama Direção: Silvio Back - Roteiro: Silvio Back e Nelson Padrella Sinopse e personagem: Reginaldo faz Mario, um jovem estudante universitário que enfrenta dilemas sociais e políticos - continuar trabalhando em um banco e seguir uma carreira estável ou entrar para a luta armada contra a ditadura; e dilemas amorosos - uma menina rica, apolitica e liberada sexualmente ou uma jovem de família classe média com problemas. No elenco, Regina Duarte, Irene Stefânia, Isabel Ribeiro. Roberto Carlos em Ritmo de Aventura (filme) - aventura/musical Direção e roteiro: Roberto Farias - Reginaldo faz Assistência de Direção Sinopse e personagem: Uma gangue internacional persegue um cantor de sucesso que está fazendo um filme. Reginaldo faz o diretor desse filme. No elenco, Roberto Carlos, José Lewgoy, Rose Passini, Ana Levy, Marisa Levy, Federico Mendes, Elizabeth Pereira. 1967 Sabor do Pecado, O (filme) Direção: Mozael Silveira Trilha Sonora: Reginaldo Faria ABC do Amor (filme) - drama Co-produção Brasil, Argentina e Chile Episódios Noite Terrível, O Pacto e Mundo Mágico Diretores: Eduardo Coutinho, Rodolfo Kuhn, Helvio Soto Roteiristas: Roberto Arlt, Eduardo Coutinho, Carlos Del Peral Sinopse e personagem: Reginaldo faz Mário, personagem de O Pacto, um dos episódios da trilogia, escrito e dirigido por Eduardo Coutinho. A história é uma situação de risco que envolve os namorados dos personagens de Reginaldo e Vera Vianna. No elenco ainda estão Vera Vianna, Jofre Soares, Mario Petraglia, Isabel Ribeiro. Ilusões Perdidas (Primeira novela da TV Globo) Autora: Enia Petri - Direção: Líbero Miguel, substituído depois por Sérgio Britto Sinopse e personagem: Reginaldo faz o mocinho que se apaixona pela vilã, personagem de Leila Diniz. 1966 Toda Donzela Tem Um Pai Que É Uma Fera (filme) - comédia Direção: Roberto Farias - Roteiro: Roberto Farias (a partir da peça de Glaucio Gill) Sinopse e personagem: Reginaldo faz Joãozinho, rapaz que namora uma jovem escondido do pai dela, um severo general (Walter Forster), até o dia em que o pai resolve visitar a filha e descobre o segredo. No elenco, John Herbert, Milton Gonçalves, Vera Vianna, Rosana Tapajós. 1965 O Beijo (filme) - drama Diretor: Flávio Tambellini - Roteirista: Glauco Couto (a partir de peça de Nelson Rodrigues) Sinopse e personagem: Reginaldo faz Arandir, o famoso arquiteto que vê sua vida desmoro nar depois que é despedido e um amigo à beira da morte lhe pede um beijo de despedida. Ele beija o amigo e o fato torna-se um escândalo. No elenco, Xandó Batista, Norma Blum, Jorge Cherques, Raul da Mata, Jorge Dória, Liana Duval, Betty Faria, Nely Martins e Ambrósio Fregolente. Paixão de Outono (novela) Autora: Glória Magadan - Direção: Líbero Miguel, substituído depois por Sergio Britto e Fernando Torres Sinopse e personagem: Reginaldo faz outro par romântico com Leila Diniz. Triângulo amoroso formado por Verônica (Yara Lins), Alberto (Walter Forster) e Linda (Rosita Thomas Lopes). No elenco, Emiliano Queiroz, Irene Ravache, Jaime Costa, Thelma Elita. 1964 Morte para um Covarde (filme) Direção: Diego Santillan - Roteiro: Victor Lima (baseado em texto de Orígenes Lessa) Sinopse e personagem: Reginaldo faz um bandido. No elenco, Virgínia Lago, Leonides Bayer, Sadi Cabral, Paulo Copacabana. 1963 Selva Trágica (filme) - drama Direção: Roberto Farias - Roteiro: Roberto Farias (baseado no livro de Ernani Donato) Sinopse e personagem: Reginaldo é Pablito, um trabalhador de uma empresa de mate que é escravizado pelas terríveis condições de trabalho. Ele lidera uma fuga que acaba trazendo severas conseqüências para o grupo. No elenco, Rejane Medeiros, Aurélio Teixeira, Mauricio do Vale, Jofre Soares, Labanca. 1962 Porto das Caixas (filme) - drama Direção Paulo Cesar Saraceni - Roteiro: Paulo Cesar Saraceni (a partir do texto de Lúcio Cardoso) Sinopse e personagem: Uma mulher procura amantes apenas para assassinar seu marido cruel. Reginaldo faz o homem que aceita a proposta dela. No elenco, Irma Alvarez, Paulo Padilha, Josef Guerreiro e Henrique Belo. O Assalto ao Trem Pagador (filme) Diretor: Roberto Farias - Roteirista: Roberto Farias (colaboração Luiz Carlos Barreto e Alinnor de Azevedo) Sinopse e personagem: Reginaldo é Grilo Peru, um dos assaltantes de trem do grupo de Tião Medonho (Eliezer Gomes), que efetua a ousada aventura baseada num fato verídico - o roubo de um trem pagador do Banco do Brasil no Rio de Janeiro, em 1960. No elenco, Grande Otelo, Átila Iório, Miguel Rosemberg, Clementino Kelé, Helena Ignez, Luisa Maranhão, Ruth de Souza, Jorge Dória, Mozael Silveira, Ambrosio Fregolente. 1960 Cidade Ameaçada (filme) - policial Prêmio: Festival de Cinema de Marília, SP. Melhor Ator Diretor: Roberto Farias - Argumento: Alinor de Azevedo - Roteiro: Roberto Farias Sinopse e personagem: Reginaldo faz o bandi do Passarinho, inspirado no personagem Promessinha, um bandido que existiu e atemorizou a cidade de São Paulo. Com Jardel Filho, Eva Wilma, Pedro Paulo Hatheyer, Ana Maria Nabuco, Milton Gonçalves. 1958 Agüenta o Rojão (filme) - comédia Direção e roteiro: Watson Macedo Sinopse e personagem: Reginaldo faz Pedro, amigo de Mané Fogueteiro (Zé Trindade). A história do filme é baseada na letra da famosa música de festas juninas conhecida como Pula a Fogueira, que diz "...com a filha de João, Antonio ia se casar, mas Pedro fugiu com a noiva, na hora de ir pro altar." No elenco, Anabela, Aracy Rosas, Aurélio Teixeira, Vicente Marchelli, Zilka Salaberry. No Mundo da Lua (estréia como ator) Diretor : Roberto Farias - Roteiro: Roberto Farias e Riva Faria Sinopse e personagem: Reginaldo faz Mauro, nordestino amigo do personagem de Walter D´Avila, um nordestino que vai para o Rio de Janeiro com o sonho de ser cantor. No elenco, Violeta Ferraz, Aracy Rosas, Consuelo Leandro. 1957 Rico Ri à Tôa (filme) Direção: Roberto Farias - Roteiro: Roberto Farias e Riva Faria - Assistente de Câmera: Reginaldo Faria Elenco: Zé Trindade, Violeta Ferraz, Armando Camargo, Silvia Chiozzo Sinopse: Taxista (Zé Trindade) encontra herança que pensa ser de um membro da família mas é dinheiro de um assalto a banco. Créditos das fotografias Págs.163 / 208 / 209 / 223 / 233 / 236: TV Globo / CEDOC Págs.121 / 140 / 143 / 229 / 238 / 251: TV Globo / Nelson Di Rago Págs.149 / 153 / 221: TV Globo / Bazílio Calazans Pág.216: TV Globo / Jorge Baumann Demais fotografias: Acervo pessoal Reginaldo Faria Fotolito, impressão e acabamento Imprensa Oficial Rua da Mooca, 1921 São Paulo SP Fones: 6099-0800 - 0800 123401 www.imprensaoficial.com.br